Manuela de Freitas / Pedro Rodrigues *fado primavera*
Repertório de Ana Moura
Vestido negro, cingido
Cabelo negro, comprido
E negro xaile bordado
Subindo à noite a avenida
Quem passa julga-a perdida
Mulher de vício e pecado;
E vai sendo confundida
Insultada e perseguida
P’lo convite costumado
Entra no café cantante
Seguida em tom provocante
Pelos que querem comprá-la
Uma guitarra a trinar
E uma sombra, devagar
Arranca pró meio da sala
Ela começa a cantar
E os que a queriam comprar
Sentam-se à mesa a olhá-la
Canto antigo e tão profundo
Que, vindo do fim do mundo
É prece, pranto ou pregão
E todos os que a ouviam
À luz das velas pareciam
Devotos em devoção
E os que há pouco a ofendiam
De olhos fechados ouviam
Como a pedir-lhe perdão
Vestido negro, cingido
Cabelo negro, comprido
E negro xaile traçado
Antando pr’aquela mesa
Ela dá-lhes a certeza
De já lhes ter perdoado
E em frente dela, na mesa
Como em prece a uma deusa
Em silêncio ouve-se o fado