Repertório de Alice Maria
Não me chamem pelo nome
Que me deram ao nascer
Sou como folha caída
Que não chegou a viver!...
Se eu sem riquezas nasci
Cheguei a sonhar com elas
Na esperança de ser alguém
Mas bem depressa deixei
A tortura de quem quer
Conquistar o que não tem
Os nervos mortos na terra
Dos meus planos iludidos
Mentiram à própria fome
Por isso nesta indiferença
Peço apenas e é tão pouco
Não me chamem pelo nome
Sou como folha caída
Içada por quem passeia
Alheio à luz e à beleza
E de todas as venturas
Só me encontro nos silêncios
Que tem a minha tristeza
Perdi-me no sofrimento
Que nos dão as aparências
Que julgamos entender
Da vida não quero nada
Não me falem no nome
Que me deram ao nascer
Sou como flor esquecida
Nos canteiros da ilusão
De um jardineiro traidor
Sou como fonte discreta
Entre folhagens, cantando
Tristes cantigas de amor
E ao fim de tanta vileza
Já não me posso iludir
Com as promessas da vida
Tudo em mim sabe a derrota
E até da morte duvido
Sou como folha caída
Sou como a tonta que passa
No giro do pensamento
De uma criança a brincar
E os meus débeis desejos
Morrem aos ais
Na lembrança de quem
Se esqueceu de amar
Nada no mundo me prende
Nem a saudade dum beijo
No momento do prazer
Pobre corpo sem destino
Renúncia firme de artista
Que não chegou a viver