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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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Quem me quiser

Rosa Lobato Faria / José Cid
Repertório de António Pelarigo
Estes versos também foram gravados por Carla Pires com o título
*Aprende o meu coração* com música de Mário Pacheco


Quem me quiser há-de saber as conchas
A cantiga dos búzios e do mar
Quem me quiser há-de saber as ondas
E a verde tentação de naufragar

Quem me quiser há-de saber as fontes
A laranjeira em flor, a cor do feno
A saudade lilás que há nos poentes
O cheiro da maçã que há no inverno

Quem me quiser há-de saber a chuva
Que põe colares de pérolas nos ombros
Há-de saber os beijos e as uvas
Há-de saber as asas e os pombos

Quem me quiser há-de saber a espuma
Em que sou um turbilhão subitamente
Ou então não saber coisa nenhuma
E embalar-me ao peito, simplesmente

Ao menos tu

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Se mais ninguém se lembrar
Ao menos tu tem presente
E quando a data chegar
Não te esqueças de mandar
Um postal sem remetente

Se mais ninguém fizer caso
Ao menos tu por favor
Nem que seja por acaso
Lembra tudo que deu azo
Ao nosso caso d’ amor

Ao menos tu faz de conta
Que tudo voltou atrás
E de novo em nós desponta
Esse amor que nem dá conta
Do mal que ainda nos faz

Ao menos tu vai rezar
E pedir perdão a Deus
Por em sonhos te beijar
E o teu corpo ficar
Perdido nos sonhos meus

O amor quando se revela

Fernando Pessoa / Paco Bandeira
Repertório de Nuno de Aguiar


O amor, quando se revela, se revela
Não se sabe revelar
Sabe bem olhar p’ra ela
Mas não lhe sabe falar

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há-de dizer
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer

Ah, mas se ela adivinhasse
Se pudesse ouvir o olhar
E se um olhar lhe bastasse
P’ra saber que a estão a amar


Mas quem sente muito, cala
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala
Fica só, inteiramente

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar

Olhei tão longe

Artur Ribeiro / Acácio Gomes da Silva *fado acácio*
Repertório de Armando Morais


Olhei tão longe de mim
Que não vi ninguém no fim
E ninguém me viu, decerto
Olhei tão longe afinal
Tão longe que por meu mal
Não via que estavas perto

Olhei tão longe e tão alto
E acordei num sobressalto
Como quem anda às escuras
Quem sobe assim num repente
Nunca fica bem assente
E cai de lá das alturas

Olhei tão longe de ti
Tão longe que não te vi
Senão agora no fim
E agora até tinha graça
Se tu por minha desgraça
Também não desses por mim

Riso de criança

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

Riso lindo, o das crianças
Lindos olhos, loiras tranças
Riso alegre e sem maldade
Como o cantar dos pardais
Chilreando joviais
Pelo céu em liberdade

Cabeças loucas de vento
Sem pensar um só momento
Nas tristezas de amanhã
É assim naquela idade
Riso alegre e sem maldade
Uma vida livre e sã

Por isso não tenhas pena
Lá por te chamar pequena
E ao teu riso de criança
Pois ele é felicidade
Rosto lindo de bondade
Loiros anos, verde esperança

São Martinho

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credivel

Põe-se na brasa o chouriço
Há vinho novo a provar
Há burburinho castiço
Cavalos a relinchar

Tipoias e boleeiros
E as carroças do povinho
Milordes e cavaleiros
É dia de São Martinho

Na Chamusca, de manhã
Há grandiosa corrida
E à tarde, na Golegã
É a festa mais garrida

Cavalos a relinchar
Fadistas cantarolando
A festa vai começar
O povinho vai andando

Os breakes aos solavancos
Cavalos à desfilada
Não faltam os Saltimbancos
Para animar a toirada

Manhã do melhor ensejo
À tarde prova-se o vinho
Ó povo do Ribatejo
É dia de São Martinho

Maçadeiras

Tema popular recolhido por Gonçalo Sampaio
Repertório de Amália


Este linho é mourisco
A fita dele namora
Quem aqui não tem amores
Tira o chapéu, vai-se embora

Ai lalila ai lalela
Lalila ó meu bem
Regala-te ó meu amor
Regala-te e passa bem


Ó minha mãe dos trabalhos
Para quem trabalho eu
Trabalho mato meu corpo
Não tenho nada de meu

Se vens por bem

Carlos Conde / Joaquim Campos
Repertório de Raúl Pereira


Se é de longe que tu vens
Se gostas de Portugal
E da gente portuguesa
Podes entrar porque tens
A fé de gente leal
E um lugar em cada mesa

Se é por bem, por por amizade
Como deve ser o tom
Da amizade que é um bem
Podes entrar à vontade
Que este povo amigo e bom
Não fecha a porta a ninguém

Mas se vens com fitos viz
Vai p'ra longe impor a guerra
Leva contigo os maus trilhos
E diz lá que o meu país
Não cede um palmo de terra
Nem vende a honra dos filhos

Meu coração partido

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

Que teria acontecido
Para me deixares assim
Assim coração partido
Sem nada fazer sentido
Nem sequer saber de mim

Porque foi assim deixado
Nos olhos este desgosto
E o pranto recusado
Que no meio do meu fado
Teima em cair no meu rosto

Assim coração pendente
Do que no teu acontece
Eu pergunto a toda a gente
Se sabem o que o teu sente
E porque de mim se esquece

Algo me faz ir sem norte
Assim qual barco perdido
Como se nada me importe
Sem tentar virar a sorte
Assim coração partido

Sei que a perdi

T.Silva / A.Rodrigues / I.Miranda
Repertório de Tristão da Silva


Lamento não ter sofrido
Cada momento vivido
Ao pé daquela mulher
Fugindo à realidade
Sem termos nossa verdade
Nem a nentira, sequer

Sei que a perdi
Perdido também fiquei
Deste saber que não sei
De dores que nunca senti
Sei que a perdi
Sem nunca tê-la querido
Com pena de haver sofrido
O mal que nunca sofri


Momentos de minha história
Sem lembrança, sem memória
Do que fomos, eu e ela
A mim só resta a certeza
Desta tremenda tristeza
De não mais lembrar-me dela

Rapariga tola, tola

Cancioneiro popular
Repertório de Amália


Rapariga tola, tola
Rapariga tola, tola
Olha o que tu vais fazer
Ó, és tão linda
Olha o que tu vais fazer

Vais casar com um soldado
Vais casar com um soldado
Mais te valera morrer
Ó, és tão linda
Mais te valera morrer

O nosso pecado

José Fernandes Castro / Francisco Marques *fado zé negro*
Repertório de Amélia Maria


Tu não és a sombra negra
Tu és sublime pecado
Cometido com fervor
Num jogo d’amor sem regra
O amor foi o culpado
Deste pecado d’amor

Se a vida não nos condena
É porque a nossa paixão
Por ser pura, calou fundo
P’ra que ninguém sinta pena
Troquemos de coração
Calando as vozes do mundo

Acreditando na vida
Tudo o que vier depois
Para nós será bem vindo
Deixa que o tempo decida
Se ficaremos os dois
Vivendo este sonho lindo

Saudade

Leontina da Piedade / Carlos Macedo
Repertório de Pedro Lisboa


Saudade é sonho que treme
Saudade é canto que chora
É como um beijo que geme
Como um ai que se evapora

É dormir sem saber onde
Chorar sem saber porquê
Chamar quem não nos responde
Abraçar quem nos não vê

É rezar de olhos quietos
É lembrar de olhos fechados
Os nossos sonhos diletos
Os nossos anos passados;
Saudade é gozo que dói
É pranto que na alma rola
É doçura que nos rói
Tristeza que nos consola


Saudade é como amar
Alguém que foge de nós
É como um querer cantar
E prender-se-nos a voz

É ter o coração cheio
De espinhos e desejos
É sentir dentro do peito
Um punhal que nos dá beijos

Não houve ninguém ainda
Que soubesse definir
Essa tristeza infinda
Que às vezes nos faz sorrir

Ilusão são castelos
Dourados, da mocidade
Pode o tempo desfazê-los
Mas não desfaz a saudade

Velha Lisboa

João de Freitas / Popular *fado corrido*
Repertório de Francisco Martinho


Ó Lisboa do passado
Que é feito da tradição
Em que o fado era mais fado
E falava ao coração

Da tua grande beleza
Deves sentir-te orgulhosa
E ao mesmo tempo saudosa
Da passada singeleza;
Tu eras bem portuguesa
Tinhas nisso galardão
Mas hoje o lindo pregão
Já não se ouve em qualquer lado
Ó Lisboa do passado
Que é feito da tradição


Já não te lembras das hortas
Das esperas e tipóias
E dessas belas rambóias
Que haviam fora de portas;
Ali, até horas mortas
Em tempos que já lá vão
O fado linda canção
Em silêncio era escutado
Porque o fado era mais fado
E falava ao coração

Retalhos da vida de um médico

Ary dos Santos / Tózé Brito
Repertório de Carlos do Carmo


Serras, veredas, atalhos
Fragas, estradas de vento
Onde se encontram retalhos
De vidas em sofrimento

Retalhos fundos nos rostos
Mãos duras e retalhadas
Pelo suor do desgosto
Retalha as caras fechadas

No caminho que seguiste
Entre gente pobre e rude
Muitas vezes tu abriste
Uma rosa de saúde

Cada história é um retalho
Cortado no coração
De um homem que no trabalho
Reparte a vida e o pão;
As vidas que defendeste
E o pão que repartiste
São lágrimas que tu bebeste
Dos olhos de um povo triste


E depois de tanto mundo
Retalhado de verdade
Também tu chegaste ao fundo
Da doença da cidade

Da que não vem na sebenta
Daquela que não se ensina
Da pobreza que afugenta
Os barões da medicina

Tu sabes quanto fizeste
A miséria não segura
Nem mesmo quando lhe déste
A receita da ternura

Verdade e mentira

Letra e música de Pedro Osório
Rpertório de Francisco Moreira *Kiko*


Tantas palavras são ditas
P’ra disfarçar a mentira
Tantas palavras bonitas
Para encobrir a verdade
Tanta bondade fingida
Tanta mentira doirada
Tanta notícia esquecida
Tanta verdade calada

Se dizem que trazemos ao nascer
O destino já marcado... mentira

Se dizem que devemos aprender
A mudar o nosso fado... verdade
A vida não se pode deitar fora
Passando cada dia como quem faz um recado
Quem pensa que o destino marca a hora
Ou anda ao desengano ou então foi enganado



Eu hei-de ter o meu fado
Feito p'la minha vontade
Com o futuro agarrado
Hei-de matar a saudade
Hei-de enganar a mentira
Hei-de beber a verdade
E não me venham dizer
Que isto são coisas da idade

Regresso áquele beijo

Mário Raínho / Casimiro Ramos *janelas enfeitadas*
Repertório de Maria da Fé


Às vezes rasgo tempo e a distância
E regresso ao passado, novamente
Ao balancé dos meus sonhos d’infância
Ao meu primeiro beijo adolescente

Cantigas e namoros, dessa era
Desfolham-se em meus olhos qual bonina
Que logo, após partir a primavera
Perdesse todo o encanto de menina

Demoro mais um pouco, assim perdida
Nas ruas da saudade, a recordar
Mas há sempre uma lágrima, atrevida
Que teima em vir espreitar no meu olhar

Porque o supremo enleio, eternamente
Que deixei na memória , no passado
É esse teu amor que, sendo ausente
Deixou em minha voz nervoso fado

Noite de saudade

Florbela Espanca / José da Conceição Fernandes
Repertório de Elsa Laboreiro


A noite vem poisando devagar
Sobre a terra, que inunda de amargura
E nem sequer a benção do luar
A quis tornar divinamente pura

Ninguém vem atrás dela a acompanhar
A sua dor que é cheia de tortura
E eu oiço a noite imensa soluçar
E eu oiço soluçar a noite escura

Porque és assim tão escura, assim tão triste
É que, talvez, ó noite, em ti existe
Uma saudade igual à que eu contenho

Saudade que eu sei donde me vem...
Talvez de ti, ó noite... ou de ninguém
Que eu nunca sei quem sou, nem o que tenho

Meu amor de sempre

Jorge Rosa / João Blak *fado menor do porto*
Repertório de Pedro Vilar


Meu amor, mesmo nas horas
Em que não estás a meu lado
Eu sinto-me acompanhado
É no meu peito que moras

Meu amor, mesmo nos dias
Que não tenho o teu amor
Só tu consegues dar cor
A todas as fantasias

Meu amor, mesmo nos meses
Que me forças a esperar
Não canso de te beijar
Em sonho centos de vezes

Meu amor, há tantos anos
A viver esta ilusão
Contigo no coração
Contigo nos meus enganos

Meu português marujinho

Mário Raínho / Fernando Ribeiro
Repertório de Alice Pires


Quando Deus criou o mar
Logo pensou, quando o fez
Tenho agora que criar
Um marujo português

Faz-me ao mar a força viva
Deste português de fé
Nau duma esperança festiva
Que não andou à deriva
Como a arca de Noé

Meu português marujinho
Infante de muitas rotas
Quantas paisagens remotas
Colheste pelo caminho
E do mar ao regressar
Num porão de caravela
Trazias cheiro a canela
Com mistura de cravinho


Venceste o Adamastor
Com essa fé que sentias
Peito erguido sem temor
Nas caravelas dos dias

O olhar, perdido, em frente
Sentindo que o mundo o chama
Assim foste ao Oriente
A esse cais de nova gente
Nas naus de Vasco da Gama

Gaivota, sonho em viagem
que um dia regressa ao ninho
Sobre o convés da coragem
Meu português marujinho

Janela da cidade

Carlos Cardoso Luís / José António Sabrosa
Repertório de Rolando Silva


Abro a janela, cidade
Vejo o Castelo altaneiro
Os pombos em liberdade
As gaivotas no Terreiro

Varinas, o Cais Sodré
Estivador, Chafariz
Uma igreja, fado e fé
Ginjinha, Martim Moniz

Santa Engrácia imponente
Sol a bater como outrora
Feira da Ladra com gente
Em São Vicente de Fora

Jerónimos lá distante
Tejo está lá também
A Torre é sua amante
A namorar em Belém

Janela de par em par
Que me ilumina e seduz
Abro os olhos a sonhar
Lisboa, cidade-luz

Ai de quem sofre chorando

Conde Sobral / Popular *fado menor*
Repertório de Carlos Ramos

Se sofro, sofro cantando
Não faço sofrer ninguém
Ai de quem sofre chorando
Que a todos diz o que tem

Dor e prazer são dois mundos
Vê lá em qual deles moras
Na dor contam-se os segundos
No prazer esquecem-se as horas

Gosto de ti com firmeza
Embora pouco te veja
Há muita gente que reza
E pouco vai à igreja

Cantar o fado é soltar
A alma pela garganta
Ouvir o fado é sondar
A alma de quem o canta

És maré que vai e vem

António Mendes / Alfredo Duarte*menor-versículo*
Repertório de Henriqueta Batista


Quando a separação aconteceu
Quem sabe até se o mundo quis parar
O dia estava triste como eu
E as aves não quiseram chilrear

O astro rei zangado não brilhou
O dia escureceu pela tardinha
Em sinal de protesto o céu chorou
Lágrimas de chuva miudinha

Tu sabes que sem ti não sou ninguém
Eu sei que tu sem mim não vais passar
És igual à maré que vai e vem
Que não pode viver sem ver o mar

Meu amor é teu, só teu, não o reparto
Tu és a mais sincera das mulheres
Ainda tens a chave do meu quarto
E podes voltar sempre que quiseres

Corpo interdito

Fernando Campos de Castro / Alfredo Duarte *fado cravo*
Repertório de Sandra Correia


Das coisas que não vivi
E do mais que não senti
Tenho saudades violentas
Ando tão longe de mim
Que este silencio sem fim
É maior quando te ausentas

Da boca que em vão sonhei
E dos beijos que não dei
Tenho um gosto de abandono
Um travo que me tortura
E que acendeu de loucura
Cada estrela do meu sono

Até do corpo interdito
Onde sonhei infinito
Tenho mais do que saudade
Tenho nuas, desoladas
Duas mãos abandonadas
Com sinais de tempestade

Meu amor porque me deixas
Neste naufrágio de queixas
Donde não sinto saída
Porque me negas a boca
Duma noite breve e louca
No fado da nossa vida

Nem parece meu

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


O meu fado nem parece
Nem parece ser o meu
E quando agora acontece
Quem diferente me conhece
Nem repara que sou eu

O meu fado lembra fados
Fados que são doutra gente
Lembra manta de bocados
Ou rosário de pecados
De quem só pecados sente

Meu fado cuja cadência
Anda a par do meu sentir
Às vezes fala d’ ausência
Outras vezes n’ aparência
Deixa meus olhos a rir

O meu fado e com razão
Nem parece ser o meu
Pois este meu coração
Em qualquer ocasião
Vai atrás do tom do teu

Natal

Leonel Moura / Alberto Correia *fado solene*
Repertório de Leonel Moura


Noite fria de dezembro
Com um desígnio divino
No Natal que hoje relembro
Veio ao mundo o Deus menino

Trazendo esperança infinita
De uma farta bonança
Não há coisa mais bonita
Que o Natal de uma criança

As prendas no sapatinho
Deixadas na Chaminé
E o Pai Natal já velhinho
Ilusão da nossa fé

Foi Deus, mas fez-se mortal
E nasceu de uma mulher
E ensinou-nos que o Natal
É quando um homem quiser

Aquela Rosa da Mouraria

António José / Rocha Oliveira
Repertório de António Severino


A Rosa da Mouraria
Na moldura da janela
Um poema feito povo
E o povo gostava dela

Não conheceu pai nem mãe
Tinha um encanto qualquer
Uma Rosa diferente
No jeito de ser mulher

E quem diria na viela tão estreitinha
Toda a velha Mouraria fez da Rosa uma rainha
Mas caprichosa fez-se a Rosa, quando um dia
Deixou a Rosa para sempre a Mouraria


Nessa janela fechada
Falta a silhueta dela
E quem lá mora não tem
Nenhuma flor na janela

E o povo que se rendia
Junto à janela vistosa
Sente que hoje a Mouraria
Está mais pobre sem a Rosa

Amor ladrão

Cuca Roseta / Sara Tavares
Repertório de Cuca Roseta


Ele chega de sorriso gingão
E no guião traz a vergonha no bolso
Se a coragem fosse uma condição
Ele era chefe da patrulha-ladrão

Ela não sonha, não quer sequer sonhar
Ele tem um segredo p’ra contar
Ela hesita sempre a desconfiar
Ele acredita isto vai dar que falar

O que será que ele tanto me quer
E se quiser, mas não quer
De onde vem e quem é
Se é cigano só se for adorado
Esse que tem encantado
Será que é, ou não é?


Eu vim p’ra roubar o teu coração
Mas quem roubou o meu foi a paixão
Dizem que ladrão que rouba ladrão
Tem direito a cem anos de perdão

Se o teu bom Deus me vai perdoar
Diz-lhe que cem anos hei-de te amar
E quem sabe um dia acreditar
Que foi ele quem nos fez encontrar

Amarra quebrada

Jorge Rosa / Georgino de Sousa
Repertório de Tristão da Silva


Quebraste a amarra dourada
Que a nossa paixão prendia
Que o nosso amor segurava
E quaise sem dares por nada
Transformaste em noite fria
Meu dia em que o sol brilhava

Foste outono repentino
Que o meu sonho verde, verde
Ressecou e fez cair
Meu destino destroçado
Fez-se folha morta à sede
Esquecida no teu fugir

Que importa que esteja aberta
A porta dessa paixão
Onde um amor me prendeu
Sem ti, a vida é deserta
Sem ti, há mais solidão
Sem ti, sou apenas eu

A marcha real da vida

José Fernandes Castro / Carlos Neves *fado tamanquinhas*
Repertório de Júlia Cancela


Na marcha real da vida
Não há certezas futuras
Na hora da despedida
A coragem da partida
Tem o sal das desventuras

Na marcha real do tempo
Não há destinos iguais
A dor que gera tormento
Põe no nosso pensamento
A força dos vendavais

Na marcha do amor perfeito
O tempo não tem idade
Na solidez do meu peito
Há sopros que não rejeito
Porque me dão felicidade

Na marcha do amor veloz
São enormes os desejos
Amando, tal como nós
Os sonhos não estarão sós
Nesta solidão de beijos

O tempo que me acordou

Vasco Lima Couto / Manuel dos Santos
Repertório de Carlos Macedo


Dei tempo ao tempo que me acordou
Nessa infância que sonhou
Um corpo sem alma certa
E o tempo contou-me o fechar passado
Mas eu era um madrugado
Poeta de voz aberta

Passei por muita cidade
Sem amor e sem idade
P’ra roubar um coração
Doía-me na canção
Sem vontade estar nú
Mas foi assim que eu te achei
Porque o poema eras tu


Falaste, meu amor, da tua vida
Que era um cais da despedida
Sem barco p’ra navegar
Contaste que não pudeste fugir
Ao grito de amar e ouvir
O teu sonho de acordar

Mulher diferente

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Quanto pode a cor mudar
Se o próprio gesto o olhar
Em ti se tornou diferente
Foste mulher, és princesa
Da cama subiste à mesa
Foste nada, hoje és gente

Beijos de rei ou senhor
Tiraste deles o sabor
Dos beijos que dás agora
Foi amor ou foi escalada?
Que importa, se não tens nada
Da mulher que foste outrora

O teu xaile e o luar

Letra de João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Oiço sinos, oiço vozes
Que de ti vêm falar
Lua cheia, nuvens brancas
O teu xaile e o luar

Fico assim até às tantas
Olho o céu e oiço o mar
Que empurra as águas do Tejo
E faz as ondas cantar

Vão suportar as saudades
De toda a nossa razão
As mentiras, as verdades
P’ra ser menos rendição

Portugal, amor traído
O que dói mais e se não esquece
Por nunca vermos perdido
O amor que nunca mais merece

Este fado que trago

Leonel Moura / Raúl Ferrão *fado carriche*
Repertório de Leonel Moura

Trago o fado no meu peito
Por destino ou por condão
Trago este fado a preceito
Dentro do meu coração


Trago alegria na alma
Do fado trago este jeito
Dou a voz à noite calma
Trago o fado no meu peito

Trago um sorriso no rosto
E o fado com devoção
Trago o fado de que gosto
Por destino ou por condão

Trago do sol o calor
E o fado com respeito
E numa trova de amor
Trago este fado a preceito

E trago o fado gravado
Na palma da minha mão
E trago o fado guardado
Dentro do meu coração

Nem sempre fui assim

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Nem sempre o meu cantar foi de tristeza
Nem sempre tive sede de carinho
Nem sempre caminhei nesta certeza
De rosas não colher no meu caminho

Nem sempre andei de mãos abandonadas
Nem sempre andei assim de mão em mão
Nem sempre eu encontrei portas fechadas
Nem sempre ouvi dizer somente não

Nem sempre me lembrei do que vivi
Nem sempre houve saudade no meu fado
Em tempos tive mais do que pedi
Mas não soube guardá-lo bem guardado

Confissão fadista

Martinho d’Assunção (pai) / Popular
Repertório de Manuel de Almeida

Escutei com atenção
Um fadista do passado
E a sua linda canção
Prendeu-me p’ra sempre ao fado


Cantava o Fado Corrido 
Fado que eu fui decorando
E cantava historiando
O seu tempo decorrido

Cantou essas madrugadas
Do São João do Rossio
Cantigas ao desafio 
Harmónios e guitarradas;
O Fandango, as desgarradas
Cantadas por todo o lado
Muito embora já cansado 
Pela sua cantoria;
Mostrou-nos quanto valia
Um fadista do passado

As marchas à filambó 
Junto à Praça da Figueira
E em qualquer rua, a fogueira
Com bailes de Solidó;
Como o tempo hoje é tão só
Tão parco (?) de animação
Santo António, São João 
Como o fadista os dispôs;
À saudade me transpôs 
A sua linha canção

Tempos em que a mocidade
Ia às Festas da’Atalaia
A Cacilhas em Catraia 
E em Burros p’rá Piedade;
Tudo se foi, que saudade 
Cantou ele, apaixonado
Depois de me ter mostrado
Ter sido um bom guitarrista;
Fez de mim também fadista 
Prendeu-me p’ra sempre ao fado

Nossos filhinhos

Leonel Moura / Franklim Godinho
Repertório de Leonel Moura

Se um dia o mundo parasse
E o nosso amor acabasse
Tudo seria tristonho
O bater dos corações
Fruto das nossas paixões
Fazem um mundo risonho

Felizes no nosso lar
Neste sonho de encantar
Junto com nossos filhinhos
O amor nos vai sorrindo
Sonhamos um sonho lindo
Cheio de amor e carinho

Fizemos juras um dia
Que o amor nos levaria
Aos caminhos da verdade
O nosso amor é profundo
É o mais nobre do mundo
E nos leva à eternidade

O julgamento da Rosa Maria

De Artur Soares Pereira
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Juiz:
Vai-se julgar, nesta sala uma grave acusação
Que é contra Rosa Maria da Rua do Capelão;
Tem a palavra o queixoso, senhor Manuel Xavier
Vai dizer por que motivos acusa sua mulher

Queixoso (no Fado Laranjeira)
Senhor Juiz, eu peço p’ra ser divorciado
Dessa mulher que pôs meu coração em brasa
Porque eu, em certo dia, ao voltar já cansado
Vi um vizinho meu sair de minha casa

Perguntei-lhe quem era, ela não quis dizer
Mas eu desconfiei daquele mariola
Por portas e travessas, vim depois a saber
Que, em pequenos, andaram os dois na mesma escola

Advogado de acusação
 (no Fado Laranjeira)
Pode-se a ré levantar e dizer, a meu pedido
O que tem p’ra contestar à queixa do seu marido;
Mas vou-a já prevenir p’ra pensar bem no que diz
Porque não deve mentir perante o Doutor Juiz

Ré (no Fado A Tendinha)
Senhor Juiz, juro que não vou mentir
A verdade vou dizer: ele foi lá, não foi por mal
Chamei-o lá, para ele me acudir
E me espetar uma estaca que caiu, no meu quintal

Advogado de acusação:
Isso não é a razão, por certo não estava em perigo
Não era uma aflição
O ver a estaca no chão até vir o seu marido

Ré:

O Senhor não pense nisso, era preciso muita resignação
Para estar para ali a olhar ‘té o meu marido chegar
E ver a estaca no chão

Advogado de acusação:
Quase, quase que adivinho
Que isso é tudo ladainha
Porque é que, em vez de um vizinho
Não chamou uma vizinha?

Ré:
Oh, isso nem se pergunta, é fácil compreender
Não chamei uma vizinha
Porque uma mulher não tinha jeito prá estaca meter

Então resolvi tomar a atitude que se impunha
Não estou aqui p’ra aldrabar
E, para o poder provar, eu tenho uma testemunha

Juiz (no Fado Triplicado)
Mande a testemunha entrar
P’ra melhor avaliar / Esta questão duvidosa
Por isso, meu caro senhor
Pode depor a favor / Da Senhora Dona Rosa

Testemunha 
(no Fado Triplicado)
A Dona Rosa ao me pôr / Por testemunha, a favor
Deve estar “inquivocada”
Ia a passar no local / Calhei olhar pró quintal
E o que vi foi pouco ou nada

Porém, o pouco que vi
Eu posso dizer aqui / Sem receio de me enganar
Vi-a co’a estaca na mão
Mas, se ela espetou ou não / Isso não posso afirmar

Advogado:
A sua testemunha, Dona Rosa
Acho que em pouco ou nada a ajudou
E a Senhora, se for conscienciosa
Diga se ele espetou ou não espetou

Ré:
Acho a pergunta tão disparatada
Por que o Senhor a faz, isso eu não sei
Ele espetou a estaca, e bem espetada
Porque foi para isso que o chamei

Está-me a fazer isto confusão
Está-me a atarantar tanta demora
E, se é o divórcio a discussão
Eu estou pronta a assinar, a qualquer hora

Juiz:
Não, isto não fica assim
Vou rever, tim por tim-tim
Tudo quanto aqui ouvi
Depois, na vossa presença
Eu é que leio a sentença
Pois sou eu quem manda aqui

A Dona Rosa Maria
Pelo que vejo até queria
Livrar-se de pesadelos
Dou a causa por julgada
E a ré fica condenada
A pagar custas e selos

Alfama rainha do fado

Leonel Moura / Raúl Pereira *fado zé grande*
Repertório de Leonel Moura


É linda a minha Alfama, tão velhinha
Princesa debruçada sobre o mar
Vestida com um manto de rainha
P'ra ver o Santo António no altar

Tem tantos monumentos ancestrais
Dos tempos quando as cortes ‘Inda reinavam
Fidalgos, marialvas e outros mais
Nas ruas estreitinhas passeavam

Pintores te pintaram em aguarelas
Alfama das mais velhas tradições
Há sempre um Santo António nas vielas
Batendo forte em nossos corações

És o bairro mais castiço de Lisboa
Fadistas te cantaram com agrado
P’las ruas deste bairro o fado entoa
Alfama és a rainha do fado

Minha voz, minha raiz

Leonel Moura / João Maria dos Anjos
Repertório de Leonel Moura


Esta voz que vem de mim
Nasce dentro do meu peito
Bem juntinho ao coração
O meu cantar é assim
Dou à voz um certo jeito
E ao fado dou meu condão

A cantar p’la vida fora
Tantas cantigas de fado
De sentimento e valor
Como nos tempos de outrora
Os fadistas do passado
Cantavam versos de amor

Porque o fado é minha sina
A ele me quero dar
Com todo o meu sentimento
Como fonte cristalina
Do meu peito vem brotar
Um fado a cada momento.

Nascem tantas primaveras
Com as aves a chilrear
E o mundo é mais feliz
Neste mundo de quimeras
No fado quero deixar
Minha voz, minha raiz

Moda da amora negra

José Guimarães / Rezende Dias
Repertório de Florência


Minha amora negra
Minha flor silvestre
Toda a gente soube
Que um beijo me déste
Um beijo é desejo
Que a ninguém se nega
Minha flor silvestre
Minha amora negra


Eu vi-te de manhãzinha
Pela tarde te falei
E o que dissemos à noite
E o que dissemos à noite
Isso a ninguém contarei

Eu peço a Deus que me leve
Para longe, esta afeição
Tudo nasce, tudo morre
Tudo nasce, tudo morre
Só este amor é que não

Loucura

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Nesta loucura, sozinho
Sigo triste o meu caminho
Sem olhar para ninguém
Seguem-me ao longe as pisadas
Soam ecos de risadas
Do mais constante desdém

Nesta vida de loucura
Vivo à constante procura
Do que não posso encontrar
É um riso cruel e rouco
Como quem diz a um louco
Que um louco não pode amar

O valor do Fado

Mote de Conde Sobral / Glosa de Joaquim Matinha (a)
Música de Guilherme Coração *fado sem pernas*
(a) Repertório de José Pinto
Repertório de Gabino Ferreira


Há senhores que desconhecem
O valor que o fado tem
Mas talvez quantos quisessem
Cantar o fado também


Chamou-lhe, em hora cruel 
A canção do desalento
Um senhor, cujo talento
Só irradiava fel;
Triste canção do bordel
Chamou-lhe um, dos que merecem
Que os bons fadistas lhe dessem 
Uma lição de moral;
Isto do fado, afinal
Há senhores que desconhecem

É um misto de saudade
E nostalgia que acalma
A dor que nos vai na alma
Quando a tristeza a invade;
Cheio de suavidade
Doce alívio, porém
Sendo cantando por quem
Viva a sofrer, certamente;
Então é que a gente sente
O valor que o fado tem

Dizem que espalha desgraça
Onde nasceu ninguém sabe
Mas dentro de nós não cabe
É o hino da nossa raça;
Que deixa, por onde passa
Louvores que o enaltecem
Os detratores que confessem
Seus direitos de conquista;
É feio, é mau ser fadista
Mas talvez quantos quisessem

Cantar as trovas singelas
Elevar bem alto a fama
Da reles canção de Alfama
Mas que andou nas caravelas;
É encher as páginas belas 
Que a nossa história contém
Defeitos quem os não tem
Mas quem disser mal do fado;
Que venha pró nosso lado
Cantar o fado também

Andei atrás de mim

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Eu andei por aí a noite inteira
De rua em rua em busca doutro bem
Andei a ver se achava quem me queira
Mas ninguém quer os restos de ninguém

Andei atrás de mim num desvario
Andei ouvindo os fados que te dei
De fado em fado num errar vadio
Nem sei bem em que mundos me busquei

Andei atrás de mim e nem sabia
Que neste errado andar dos passos meus
Eu andava somente a ver se via
Se via em qualquer lado os olhos teus

Há festa na Mouraria

*Senhora da Saúde*
Gabriel de Oliveira / Manuel Maria Rodrigues
Repertório de Manuel de Almeida

Há festa na Mouraria
É dia da procissão
Da senhora da saúde
Até a Rosa Maria
Da rua do Capelão
Parece que tem virtude

Naquele bairro fadista
Calaram-se as guitarradas
Não se toca nesse dia
Velhas tradições bairristas
Vibram no ar badaladas
Há festa na Mouraria

Colchas ricas nas janelas
Pétalas soltas no chão
Almas crentes, povo rude
Anda a fé p'las vielas
É dia da procissão
Da senhora da saúde

Após um curto rumor
Profundo silêncio pesa
Por sobre o largo da guia
Passa a Virgem no andor
Tudo se ajoelha e reza
Até a Rosa Maria

Como que petrificada
Em fervorosa oração
É tal a sua atitude
Que a rosa já desfolhada
Da rua do Capelão
Parece que tem virtude

Vês

Domingos Costa / Alice Maria
Repertório de Alice Maria


Vês… como eu tinha razão
Quando às vezes te dizia
Que da boca ao coração
Vão mundos de fantasia

Vês… como tudo acabou
Como é cruel na verdade
Castigar-se quem sonhou
Com um pouco de felicidade

Diz-me onde estão 
Essas risonhas promessas
E juras sem par
Castelos de sonho 
Que o vento medonho
Levou para o mar
Diz, que eu vou buscá-las
Pois quero lançá-las de novo a teus pés
P'ra que as guardes bem
Ou as dês a quem não saiba quem és


Vês…. como a minha loucura
De te amar com ansiedade
Se tornou em desventura
Tristeza, dor e saudade

Não vês…. mas vives sem esp’rança
Pois não pode, na verdade
Na vida colher bonança
Quem semeia tempestade

Fado Corrido

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Cantar o Fado Corrido
Não é coisa p’ra qualquer
Tem decerto mais sentido
Na boca de uma mulher

Para o cantar a preceito
Como manda a tradição
É preciso ter no peito
O fogo de uma paixão

Fado Corrido
Cantado fora de portas
A horas mortas, com devoção
Era batido 
Nas cordas duma guitarra
Tinha mais garra, mais coração


Quando penso no encanto
Duma Severa a cantar
Choro baixinho não canto
E fico triste a rezar

Para que o fado velhinho
Do tempo dos meus avós
Renasça todo inteirinho
Através da minha voz

Basta um sorriso rasgado

José Fernandes Castro / Alfredo Duarte *mocita dos caracóis*
Repertório de Silva Machado (ao vivo)

Basta um sorriso rasgado
No rosto de quem nos fala
Para decifrar um fado
Bem escrito e bem cantado
Que por amor, nos embala

Basta um aperto de mão
Dado no momento certo
P’ra sentir a emoção
Bem dentro do coração
E ter o amor mais perto

Basta uma frase vulgar
Dita com voz de verdade
P’ra poder valorizar
Cuidar e perpetuar
Uma perfeita amizade

Basta um sorriso profundo
Com brilhos de luz florida
P’ra que apenas num segundo
Todas as flores do mundo
Ponham aromas na vida

Mais que tu

Rodrigo Costa Félix / Armando Machado *fado maria rita*
Repertório de 
Rodrigo Costa Félix

Mais que tu, é o amor
Que me envolve a alma em dor
E me confunde o caminho
O meu corpo em solidão
Negras noites sem paixão
Onde vagueio sozinho

Mais que tu, é a tristeza
Maré cheia de incerteza
Que não tem rumo nem fim
Verso mais triste de um fado
Este pranto amordaçado
De não ver p’ra além de mim

Mais que tu, é a loucura
De andar à tua procura
Sem saber por onde ir
É perder-me na ilusão
De encontrar um coração
Que se dê sem mais pedir

Mais que tu, por fim, sou eu
Neste encanto que morreu
Sem aviso nem memória
Apaixonado e errante
Vou ditando a cada instante
Os versos da minha história

O cante de um rouxinol

Leonel Moura / Armando Machado *fado santa luzia*
Repertório de Leonel Moura

Ainda não é sol raiado
Já se ouvia num silvado
O cante de um rouxinol
A anunciar novo dia
Cheio de imensa alegria
Esperava a luz do sol

No seu cante a nostalgia
De uma linda melodia
Com todo o seu esplendor
Entoa lindas canções
Que parecem orações
Ou lindos hinos de amor

Nos delírios do seu canto
Toda a magia e encanto
Como um lindo pôr do sol
Com esta voz dolorida
Eu canto as penas da vida
Como canta o rouxinol

Cavador

Glosa de Henrique Rego
Mote de Francisco Radamanto (ou) José Rodrigues?
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

Cavador, meu camarada
Tu dizes que a pena é leve
Pesa tanto como a enxada
A pena com que se escreve


Anda cá, meu velho amigo
Vem mesmo de enxada ao ombro
Pretendo, com desassombro
Trocar impressões contigo;
Se alguém, por sistema antigo
Te informou de forma errada
Que a pena não produz nada
Nem revigora as ideias;
Dá-lhe desprezo, não creias
Cavador, meu camarada

Como a pena facilmente 
Se maneja com dois dedos
Faz-te lembrar os brinquedos
Duma criança inocente;
Até há muito imprudente 
Que a toda a hora se atreve
A dizer que não se deve;
De à pena prestar-lhe culto
E a secundar esse insulto
Tu dizes que a pena é leve

Quantas lágrimas de fel 
Em louvor de bons intuitos
Caem dos olhos de muitos
Sobre laudas de papel;
Não sejas, então, cruel 
Pensa de forma acertada
Porque a pena manejada
Em favor dos infelizes;
Não é leve, como dizes
Pesa tanto como a enxada

Penas de bons escritores 
Quando p’ró bem se inclinam
São lâmpadas que iluminam
O porvir dos produtores;
O sol, o luar, as flores
A pena tudo descreve
E por muito que se eleve; 
Quem nos campos ganha a vida
Também deve ser erguida
A pena com que se escreve

Tempo

Tiago Torres da Silva / Ivan Cardoso
Repertório de Rodrigo Costa Félix

Há palavras por dizer
Que eu pressinto mas não digo
Não tenho como esquecer
Há palavras a nascer
Sempre que falo contigo

Por cada palavra nova
Que nos teus olhos aprendo
O meu corpo é posto à prova
Porque o tempo se renova
No tempo que vou vivendo

O que dizes, o que eu disse
Foi-nos tornando mais sábios
É como se eu me cumprisse
Nesta nova meninice
Que me ofereces nos teus lábios

As palavras que me dizes
Que eu nunca tinha escutado
Fazem com te eternizes
Nas rugas e cicatrizes
Que eu trazia do passado

Canção de outono

Letra de Cecília Meireles
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível


Perdoa-me, folha seca
Não posso cuidar de ti
Vim para amar neste mundo
E até do amor me perdi

De que serviu tecer flores
Pelas areias do chão
Se havia gente dormindo
Sobre o próprio coração?

E não pude levantá-la
Choro pelo que não fiz
E pela minha fraqueza
É que sou triste e infeliz

Perdoa-me, folha seca
Meus olhos sem força estão
Velando e rogando aqueles
Que não se levantarão

Tu és folha de outono
Voante pelo jardim
Deixo-te a minha saudade
A melhor parte de mim

E vou por este caminho
Certa de que tudo é vão
Que tudo é menos que o vento
Menos que as folhas do chão

P’ra lá de cada beijo

Tiago Torres Rolo / Valter Rolo
Repertório de Rodrigo Costa Félix


Não, eu não sei falar de mim a ninguém
Não, eu não sei dizer que sim a ninguém
Não, eu não sei amar assim, oh meu amor
Mas sei que o amor só é verdade
Quando o silêncio nos invade
E já não temos vontade
De o dizer seja a quem for

Não, eu não vou falar de ti a ninguém
Não, eu não conto o que sofri a ninguém
Não, eu não vou sair daqui, oh meu amor
Aqui sei que tu só és verdade
Porque o silêncio nos invade
E eu já não tenho vontade
De dizer seja o que for

Sei que p’ra lá de cada beijo
Há um mundo que eu não vejo
Acho que isso é que é amor

Fiz um fado com teu nome

Letra de Jorge Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Fiz um fado com teu nome
Que canto a todas as horas
Para matar essa fome
Feita das tuas demoras

Como o cantar me alimenta
Quando a ausência me consome
P’ra afastar essa tormenta
Fiz um fado com teu nome

Esse teu nome moldado
Com luz de sol e auroras
É todo luz esse fado
Que canto a todas as horas

Se vejo que te não vejo
Canto uma saudade enorme
Para matar o desejo
Para matar essa fome

Minha cantiga de mel
Fado d’horas e desoras
Canção p’ra adoçar o fel
Feito das tuas demoras

O que tenho para ti

Tiago Torres da Silva / Fred Martins
Repertório de Joana Amendoeira com Fred Martins


O que esperas de mim, não me peças
O que pensas de mim, não me digas
Fala-me antes do vento e do mar
A paixão é só uma brisa, vai passar

O que escondes de mim, não me interessa
O que dizes de mim, não me abala
Fala-me antes do vento e do mar
A paixão é só uma brisa, vai passar

E desta vez deixa-me ser eu mesma
Deixa-me ser o que eu quiser
E desta vez não me dês mais do que eu te der

Ah, meu amor
O que te dou a ti é a vida
O que tenho para ti
Vai nesta canção

Acaso sabes tu

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

Acaso sabes tu como te quero
Como conjugo em ti o verbo amar
Que desde que te vi eu não tolero
Nem aceito ninguém no teu lugar

Acaso sabes tu que no meu sonho
Compartilhas da minha vida inteira
E que meu coração anda tristonho
Enquanto não morar à tua beira

Acaso sabes como vão sedentos
Estes meus braços desse corpo teu
Se não sabes de cor os meus intentos
É que andas mais ceguinho do que eu

Três relíquias de fado

Leonel Moura / Joaquim Campos *fado rosita*
Repertório de Leonel Moura


Três fados há neste fado
Que contam o fado antigo
Três relíquias do passado
Que trago sempre comigo

O velho fado menor
Dolente e com emoção
Dos fados é o maior
Que trago no coração

O Mouraria a preceito
Em desgarrada garrida
Mora dentro do meu peito
É parte da minha vida

O corrido bem gingado
Na boca do nosso povo
Tem mais alma é mais fado
Sendo velho é sempre novo

Três fados há neste fado
Que o fado, retratam bem
Três relíquias do passado
E do presente também

Na volta da maré

Tiago Torres da Silva / Fred Martins
Repertório de Joana Amendoeira

O que pode uma voz se não souber uma canção?
O que pode um corpo nu se não tem quem abraçar?
O que pode um coração se o amor já terminou?
O que podem os meus olhos sem os teus?
O que posso eu depois do teu adeus?

O que procuram os homens quando olham para o mar?
O que esperam as mulheres na volta da maré?
O que escondem os seus olhos que já não sabem chorar?
A quem reza quem não acredita em Deus?
O que faço eu depois do teu adeus?

Tudo passou em vão
Tudo chegou ao fim
Voltei a chorar por mim
Deixo ao coração a dor
Deixo ir a leilão o teu amor

O que faço à saudade que ela não me faça a mim?
O que faço da tristeza para não entristecer?
O que faço dos meus passos se já não tenho onde ir?
Em que lábios posso esquecer-me dos teus?
Que me resta a mim depois do teu adeus?
O que faço eu depois do teu adeus?
O que posso eu depois do teu adeus?

Redondilha

Rodrigo Costa Félix / Fontes Rocha *fado isabel*
Repertório de 
Rodrigo Costa Félix

Falta-me tempo p’ra ser
Sobra-me a doce ilusão
Resta-me pouco a fazer
Muito menos de paixão

Falta-me fé p’ra sonhar
Sobra-me pouco prazer
Resta-me um mundo p’ra dar
Muito mais p’ra conhecer

Falta-me força p’ra amar
Sobra-me tudo o que amo
Resta-me a voz p’ra cantar
E saber como me chamo

Falta tanta gente boa
Sobra-me a mala desfeita
Resta-me a cor de Lisboa
E pouco mais me aproveita

Fado bolero da capicua

Vasco Graça Moura / Ricardo Cruz
Repertório de Inês de Vasconcellos


Telefonei-te da rua
32123 urgente
Dizes que te deixe em paz
Azar o da capicua
Que se lê de trás p’rá frente;
Azar o da capicua
Que se lê de trás p’rá frente
E da frente para trás

Moras no beco da lua
101 lado nascente
Mas em casa nunca estás
Má sina a da capicua
Que se lê de trás p’rá frente;
Má sina a da capicua
Que se lê de trás p’rá frente
E da frente para trás

Será dia 11 a tua festa
Festa sem eu estar presente
33 anos farás
Há sempre uma capicua
Que se lê de trás p’rá frente;
Há sempre uma capicua
Que se lê de trás p’rá frente;
E da frente para trás

De 1001 modos flutua
A sonhar-te a minha mente
Nas horas boas e más
Ansiosa capicua
Que se lê de trás p’rá frente;
Ansiosa capicua
Que se lê de trás p’rá frente
E da frente para trás

Mas se o olhar nos desagua
E em meus olhos de repente
O par dos teus se compraz
É bonita a capicua
Que se lê de trás p’rá frente;
É bonita a capicua
Que se lê de trás p’rá frente
E da frente para trás

Eu canto melhor assim

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Eu canto melhor assim
Quando este meu fado é reza
Quando a minha reza é fado
E conta coisas de mim
Coisas que tenho a certeza
Nunca teria contado

Nos versos que vou cantando
Às vezes falo verdade
Assim a fingir que minto
E os meus olhos vão chorando
E vou falando à vontade
Desta saudade que sinto

Meus fados tão meus parecem
Que eu ia jurar que são
Roubados à minha dor
Eu sei que alguns acontecem
Mas fico na ilusão
De falar do nosso amor

Qualquer lugar

Tiago Torres da Silva / Fred Martins
Repertório de Joana Amendoeira

Aqui, ali, ou em qualquer lugar
Fingir, sorrir, é mais do que chorar
É ter alguém, é ter por quem perder o chão
Poder falhar e não pensar, pedir perdão

Aqui, ali, ou em qualquer lugar
Saber perder é mais do que ganhar
Perder o pé, perder a fé, perder a voz
Perdi-te a ti, mas não perdi a fé em nós

Gastei os meus sentidos
Na ânsia de encontrar
Vento a favor do nosso amor
À beira mar
Mas dou por ti aqui, ali
Qualquer lugar


Aqui, ali, ou em qualquer lugar
Não ter prazer é mais do que negar
E se eu neguei é porque sei
Que tenho em mim
A sensação que ao dizer não, tu ouves, sim

A sangue frio

Tiago Torres da Silva / Pedro Jóia
Repertório de Rodrigo Costa Félix

Perdi qualquer resquício de decência
Mendigo sem pudor o teu carinho
E porque me aborrece estar sozinho
Namoro a maldição da tua ausência

A vida, por ser curta, quer prudência
E pede que eu regresse ao meu caminho
Mas eu que sei da vida o que adivinho
Só escolho a perversão por inocência

Talvez nas horas tristes de ressaca
Haja um perdão qualquer, quase uma morte
Que me faça esquecer que o meu vazio
Se vira contra mim como uma faca;
Que em ti venho afiando, corte a corte
P’ra me matar a ti a sangue frio

Oiço as queixas que se fazem

Letra de João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

Almoço em velhas tascas
Bom cozido à portuguesa
O bom bacalhau às lascas
O bom vinho, uma riqueza

Mesa corrida p’ra todos
Que vêm de trabalhar
Que trazem conversa a rodos
No gosto de conversar

Falam alto p’ra que eu oiça
E não resisto a falar
Entre o talher e a loiça
E a travessa a tardar

Oiço as queixas que me fazem
Dói-me o corpo, dói-me a alma
Penso, não têm coragem
Ou então, demais a calma

De onde vens

Flávio Gil / Valter Rolo
Repertório de Inês de Vasconcellos


De onde vens
Que eu não vejo no teu olhar
Os caminhos que ferem o teu andar
Diz-me onde foi que se perdeu essa criança
Que se acendia
No teu olhar cheio de esperança
E o teu cabelo numa trança
Tinha a cor da alegria

De onde vens, onde moras
Que eu já não sei
Onde estás nessas horas
Em que és ninguém
Diz-me onde foi que se perdeu a tua idade
Diz-me onde estás
Que eu vou ficar até ao fim
P’ra encontrar algo de mim
Por onde quer que vás

De onde vens
Quando chegas sem me avisar
E não sabes, não tentas
Não queres ficar
Diz-me onde foi que se perdeu a ilusão
Que era maior que o tempo que agora parou
Que o tempo que ao tempo roubou
O tempo deste amor

Noites de fado em Alfama

Leonel Moura / Alfredo Correeiro *marcha do correeiro*
Repertório de Leonel Moura


Noites de fado em Alfama
E as tascas mais bairristas
Com uma guitarra a trinar
P'las vielas de má fama
Entoam vozes fadistas
Que á noite lá vão cantar

Esse bairro popular
E de velha tradição
Beber e cantar o fado
Onde tudo faz lembrar
Os tempos que já lá vão
E os fadistas do passado

Bairro de fado castiço
Numa taberna velhinha
Ou numa tasca bizarra
Canta-se o fado e por isso
Esta Lisboa alfacinha
Acorda ao som da guitarra

Vasos de flores nas janelas
Um Santo António de barro
Numa varanda enfeitada
E as baiucas nas vielas
Com vinho servido em jarro
E fado até madrugada

Noites de fado em Alfama
Que nos lembram tantas vezes
Como o fado era tratado
Disse um poeta de fama
Enquanto houver portugueses
Não deixam morrer o fado

Foram noites

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

Foram noites, foram dias
Doces luas, sóis radiantes
E das frases que me ouvias
Oiço ainda ecos distantes

Foram noites, foram mundos
Foram noites, noites loucas
E entre segredos profundos
Uniram-se as nossas bocas

Foram noites, foram luas
Foram dias, sol e mar
E eu trago palavras tuas
Caladas no meu olhar

Tudo te dei

José Guimarães / Marcírio Ferreira
Repertório de Valdemar Vigário


Um dia que se vai outro que vem
E eu não sei a razão porque demoras
A quem com ansiedade espera alguém
Os minutos são longos como as horas

Espero sempre o dia de amanhã
E o amanhã vem sempre e tu não vens
De mim, dentro de mim, já nada há
Pois tudo o que era meu és tu amor que tens

Tudo te dei
E nada quis receber
Hoje nem sei
O que ganhei em te querer
Passam as horas
Eu continuo a esperar
Que não sei porque demoras
E tardas tanto em voltar

Os dias vão passando lentamente
E eu nasci prá saudade e para ti
Toda a minha ventura no presente
É lembrar o passado em que vivi

Posso tentar fazer seja o que for
Que esta afeição por ti nunca mais finda
Eu queria sentir ódio em vez de amor
Mas cada vez te quero, te quero mais ainda

Cigana calé

Carlos Conde / Raúl Silva *fado valejo*
Repertório de Manuel Cardoso de Menezes


Naquele antigo café
Que ficava mesmo ao lado
Da estalagem dos Camilos
Uma cigana calé
Era a raínha do fado
E criadora de estilos

Porque era volúvel, incerta
Essa cigana fadista
Não tinha questões d’amor
Mas havia rixa aberta
Entre o Zé Contrabandista
E o João Alquilador

O primeiro era atrevido
Provocador e brigão
Mas sabia muito bem
Que o segundo era temido
Da rua do Capelão
Ao poço do Borratém

Certa noite turbulenta
Em que a cigana cantava
Ao piano do café
Uma desordem sangrenta
Na rua escura se dava
Entre o João mais o Zé

Nunca mais se ouviram motes
Ambos foram degredados
Voltaram, mas sem ralé
São aqueles dois velhotes
Que esmolam ambos sentados
Nos degraus frios da Sé

Zé vigarista

Domingos Gonçalves da Costa / Joaquim Pimentel
Repertório de Joaquim Cordeiro


O Zé Vigarista
Esperto e grande artista
Larápio dos bons
A um pobre saloio
Vendeu um comboio
Com 30 “vagons”

Quis vender a ponte
A um trouxa, defronte
Que só a não quis
Porque era pesada
E a ponte coitada
Escapou por um triz

Ó Zé vigarista
Mas que linda história
Deixaste gravada
Na nossa memória
Ó Zé vigarista
Se a morte não vem
Buscar-te em má hora
Não havia agora
Torre de Belém


Com tanta mestria
Suas mãos metia
Em tanta algibeira
Que o Zé se passava
A gente apertava
Com força, a carteira

À hora da morte
Chamou a consorte
Pediu-lhe perdão
Abraçou-se à querida
E por despedida
Roubou-lhe o cordão

Filho da escola

Carlos Conde / Alfredo Duarte *fado louco*
Repertório de Alfredo Duarte Júnior


Andei na escola do fado
Tirei o curso de artista
Sou artista diplomado
P’la grande escola fadista


Tive mestres muito bons
Um até bem consagrado
Decorei rimas e tons
Andei na escola do fado

Nos motes ao desafio
Aprendi a fazer vista
Andei no fado vadio
Tirei o curso de artista

De "fait fais" em gingão
Fiz exames, sou formado
Até no falar calão
Sou artista diplomado

Não é só no bem cantar
Que o bom nome se conquista
O que é preciso é passar
P’la grande escola fadista

Vou amar-te até ao fim

Letra e música de Fernando Girão
Repertório de Joana Amendoeira


Eu abro a minha janela
E respiro o ar da madrugada
E sinto a cidade parada, sem fulgor
No sono dos adormecidos
Assim ao estar mais sozinha
Tento inventar mais um pedaço de caminho
Só os meus anjos e eu

Viajo no meu quarto a tais distãncias
Que a mente não consegue calcular
Eu quero viajar
E ser a terra e o mar… em mim
Contigo ao meu lado eu sou o mundo
Ajuda-me que eu quero ajudar
Eu sei que vou te amar
Eu sei que vou te amar… até ao fim

Fado de aquém e além mar

Manuel Alegre / Popular *fado corrido*
Repertório de João Braga


De todo o lado e nenhum
De todo o mundo e ninguém
Somos vários e só um
Fado d’aquém e de além

Já fomos antes, da Europa
Europa por sobre o mar
Nosso fado é vento à popa
Nosso verbo, o verbo amar

O vento canta o seu cântico
Vem com recados na voz
Onde sabe a sal e Atlântico
Esse país somos nós

Amor sem mas nem talvez
Que não tem cor nem tem raça
É este amor português
Que fica por onde passa

O fado conheço eu

Letra de Jorge Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


O fado conheço eu bem
Há muito que anda a meu lado
Sei as virtudes que tem
E as faltas de que é culpado

Por ter nascido infeliz
Os infelizes entende
E porque a sorte o não quis
A má sorte compreende

Se perde as noites e passa
As noites como um vadio
É p’ra aquecer a desgraça
A quem o frio é mais frio

Faz saudades, faz chorar
Cria nas almas tormenta
Mas acaba por matar
As saudades que alimenta

Sei as virtudes que tem
E as faltas de que é culpado
Que o fado conheço eu bem
Há muito que anda a meu lado

Há pouco vi-te na rua

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Há pouco vi-te na rua
Ias tu com a mulher
Que no teu braço se enleia
E se isto assim continua
Eu tenho que agradecer
A quem contigo passeia

Passaram de mim tão perto
Tão perto que de certeza
Tu sentiste o meu perfume
Eu estremeci é certo
Mas foi mais pela surpresa
De já não sentir ciúme

Há pouco vi-te e confesso
Que senti nos olhos pranto
E uma raiva medonha
Trocei de mim pois mereço
E por ter-te amado tanto
Eu chorei mas de vergonha

Um congresso de gatos

Letra e música de Mário Marques
Repertório de António dos Santos

Tudo traz o progresso
Nestes tempos debulatos
Hoje houve um congresso
Um congresso de gatos;
Muitos, brancos e pretos
Muitos, quase mulatos

A razão do congresso é andarem irritados
Por causa das antenas que há agora p’los telhados
As gatas, assustadas, deixaram de aparecer
E os gatos, coitadinhos, passam a noite a sofrer

Não bastava o carapau
Custar já um dinheirão
Agora renhau, nhau, nhau
Veio inda a televisão

Ora oiçam então
O discurso fluente
Que lhe fez o presidente
Logo ao abrir a sessão

A nossa vida agora, é tristonha, mete dó
Nenhum gato ao nascer, quer nascer p’ra viver só
Se fossem proibir também os homens de amar
Teríamos que ouvir muitos homens 
Refilar, também, podem crer
Nos telhados a miar

No reino das formigas

João-Gigante Ferreira / Tino Flores
Repertório de Helena Sarmento


Na largura da planície
A formiga não duvida
Da certeza do carreiro
Não pergunta quem lhe disse;
Da certeza dessa vida
Dos perfumes um só cheiro

A compasso recrutada
Passo a passo sem saber
Para além do formigueiro
Passo a passo leva nada;
Leva tudo sem querer
Dos perfumes um só cheiro

Leva a arma apontada
Da cabeça não precisa
Basta a ordem do primeiro
Leva a morte preparada;
E na vida não precisa
Dos perfumes um só cheiro

Diz que sempre foi assim
Que não tem tempo a perder
Toma a parte por inteiro
De joelhos chega ao fim;
Perde a vida sem saber
Dos perfumes um só cheiro

Horas boas, horas más

Letra de Jorge Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Das horas boas da vida
A melhor, estou convencida
Que me pôde acontecer
Foi essa hora bendita
Em que te vi, acredita
Na minha vida aparecer

Benditas foram depois
As horas em que nós dois
Lado a lado caminhámos
Como benditas soaram
Horas boas que marcaram
Os carinhos que trocámos

Mas tudo o que é bom definha
No meu céu, já se adivinha
Da tempestade o fragor
É que em breve partirás
E um rosário d’horas más
Desfiará este amor

E quando amanhã, meu Deus
A má hora do adeus
Marcar a tua partida
Será, meu amor, será
D’entre tanta hora má
A pior da minha vida

Moirama

Frederico de Brito / M.A. Félix
Repertório de Fernanda Peres


Moirama bairro que o tempo atraiçoa
Cansado do embalar numa esperança
Má fama que se estendeu por Lisboa
Num fado que eu aprendi em criança

Que mal fará 
A minha pobre Moirama
Que é irmã gêmea de Alfama
Bairro tal como não há
Será talvez
Por já ter sido agarena
Mas arrasá-la faz pena
Eu não sei que mal fará


Agora são mais estreitas as ruas
Parece que até confrange humildade
Embora numa viela das tuas
Nascesse da nossa eterna saudade

Desencontro

Luís Vaz de Camões / Popular *fado corrido*
Repertório de Lina


Reinando amor em dois peitos
Tece tantas falsidades
Raiando amor em dois peitos
Tece tantas falsidades;
Que de conformes vontades
Faz desconformes efeitos

Igualmente vive em nós
Mas por desconcerto seu
Vos leva, se venho eu
Me leva, se vindes vós

Qual terá culpa de nós
Neste mal que todo é meu
Qual terá culpa de nós
Este mal que todo é meu;
Quando vindes, não vou eu
Quando vou, não vindes vós

Longe da pátria

António Vilar da Costa / Armandinho
Repertório de Fernanda Farinha


Se queres saber a dor pungente
Que um peito encerra
E o que é sofrer um dia ausente
Da tua terra
Sai barra fora, porque uma vez
No alto mar
E nessa hora, se és português
Tens de chorar
Saindo a barra

Uma guitarra 
No seu trinar fagueiro
E a voz de um marinheiro
Numa canção bizarra
É Portugal
Com a sua meiga voz
Sentimos a palpitar
Saudades dentro de nós


O português, triste suspira
E ninguém fala
Só no convés à voz da lira
O peito embala
Tudo emudece ao recordar
A pátria mãe
E até parece que o próprio mar
Chora também

Sou do fado cantador

Leonel Moura Casimiro Ramos *fado três bairros
Repertório de Leonel Moura


Há mais um fado no fado
Na história que eu vou contar
Desde os tempos de menino
P'ra cantar em todo o lado
Ando na vida a cantar
Deus Traçou-me este destino

Cantei fado nas tabernas
Dei novos fados ao mundo
Sem receber nenhum prémio
Cantei cantigas modernas
De sentimento profundo
No fado fui um boémio

Levei o fado ao estrangeiro
P'ra mostrar a outras gentes
Esta canção sem igual
Percorri o mundo inteiro
Cantei em sítios diferentes
A canção de Portugal.

Sou do fado cantador
Desde a tenra meninice
Tive o destino marcado
Canto o fado e sou autor
Não mentia quando disse
Que há mais um fado no fado

Contradição

Letra e música de Mário Junqueiro
Repertório de Estela Alves


A tua alma é vazia
De sentimento leal
Só está bem quando faz mal
Vê lá tu, a ironia
Tens a doçura do mel
Andas perto e ‘stás distante
O teu coração amante
Não tem sangue só tem fel

Por mais que queiras fingir
Uma afeição que não sentes
Não consegues iludir
Quanto mais juras mais mentes
Dizer que gostas de mim
É pura contradição
Pois quando afirmas que sim
Teu olhar sem fim
Está dizendo não


Se pretendes enganar
Mostrando ciúmes loucos
Acredita são bem poucos
Os beijos que te vou dar
Quero quebrar a magia
Dos carinhos que me dás
Porque vejo por detrás
Apenas hipocrisia

Dentro da tempestade

Tiago Bettencourt / José Marques do Amaral
Repertörio de Ana Moura


Fico presa na tempestade
Onde não durmo comigo
Há restos de verdade
A que a dor tirou sentido

Caída entre os espaços
Do meu corpo destruído
Já não há restos de verdade
E a dor perdeu sentido

Deixei armas dos meus braços
Larguei roupas que vesti
Deixei ruas onde as pedras
Tatuaram os meus passos

No mar de mãos turvas
Nadavas transparente
Encontramo-nos num gesto
Inteiro e indiferente

Choramos como quem nasce
Escorrendo a saudade
Vens no sol de madrugada
Como a mão na tempestade

Aquela mesa vazia

Letra de Artur Ribeiro
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Quando canto e não te vejo
Minh’ alma fica sombria
Porque não estás presente
E tanto ali te revejo
Que a mesa fica vazia
Mesmo cheia doutra gente

E passo a sentir-me perto
Bem perto dos olhos teus
Naquela mesa a beber
Tentando saber ao certo
Se vês o que vai nos meus
Ou disso não queres saber

E como a mesa vazia
Não me sabe responder
Eu espero amargurado
Que tu venhas cá num dia
Em que eu te possa dizer
O que sinto neste fado

Preciso aprender a ser só

Paulo Sérgio Valle / Marcos Valle
Reprtório de Pedro Moutinho


Ah, se eu te pudesse fazer entender
Sem teu amor, eu não posso viver
Que sem nós dois, o que resta sou eu
Eu assim tão só
E eu preciso aprender a ser só
Poder dormir, sem sentir teu calor
A ver que foi só um sonho e passou

O amor
Quando é demais ao findar leva a paz
Me entreguei, sem pensar
Que a saudade existe e se vem é tão triste

Vê, meus olhos choram a falta dos teus
Estes teus olhos que foram tão meus
Por Deus, entende que assim eu não vivo
Eu morro pensando no nosso amor

Noite bem castiça

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Numa tasca esfumarada
Entre mulheres, guitarrada
Foi o desfecho final
Duma noite bem castiça
Em que um grupo bem fadista
Fez uma noitada real

Tinham vindo da Azervada
Onde houvera guitarrada
Mesmo na noite anterior
Em Santa Isabel ouviram
Fadistas que se exibiram
Numa festa de primor

Depois bateram tipóias
P’rós recantos mais rambóias
Dessa Lisboa bairrista
Aí, beberam, cantaram
Discutiram, desgarraram
Numa noitada fadista

Houve até cenas canalhas
De bofetada e navalhas
Com rufias servidores
Os Andrades, os Vasconcellos
Os Maltas e mais os Bellos
São fadistas, meus senhores

Fado para dois

César de Oliveira / Rogério Bracinha / João Vasconcelos
Repertório de Tony de Matos


Deito-me à noite num xaile
Escondi-me nele, também
Andam as sombras num baile
Onde não dança ninguém

E no teu quarto fechado
Pecado sem pecador
Colhi um resto de fado
Que me parecia uma flor

Um fado p’ra dois
P’ra mim e p’ra ti, começa
No dia perdido que à noite regressa
Sabemos os dois
Que o fado depois não vai durar
Melhor é fingir
Deixá-lo partir sem o cantar
Um fado para dois
Poeira do meu caminho
Sem mim e sem ti
Que fique pr’áli sozinho


Mordem a pele dos teus braços
Meus olhos negros, sombrios
As aves sabem dos espaços
Os barcos sabem dos rios

Onde os meus olhos não moram
Sei que há estrelas a luzir
Sóis que os outros olhos devoram
Numa emoção de existir

Derrota

Pedro Homem de Mello / João Paulo Esteves da Silva
Repertório de Ricardo Ribeiro


Na face do seu rosto adolescente
Há uma flor que morre e dá perfume
E a minha voz acorda, de repente
Para abafar, talvez, esse queixume

E a minha voz inventa uma canção
À qual, desesperado, me confio
Pressinto a insónia, o pesadelo e o frio
Das pálpebras, batidas sempre em vão

A palidez inspira-me o desejo
De erguer ainda aqueles dedos lassos
Que longe, longe, muito longe vejo

Mas eis que chegam pérfidos cansaços;
Boca pisada, à míngua do meu beijo
Inerme peito, à míngua dos meus abraços

Sal e mel

Manuel Justino Ferreira / Jaime Santos *fado alfacinha*
Repertório de Margarida Guerreiro

Na praia do teu olhar
Em ondas de sal e mel
Por ti amor fiz-me ao mar
No meu barco de papel

Nas águas das sete luas
O meu barco naufragou
Procuro por notícias tuas
Porém ninguém te encontrou

Cada vez ‘stá mais distante
O navio onde embarcaste
Mas ‘stá mais perto e constante
A dor em que me deixaste

Pescador ou marinheiro
Que no teu rumo aparecem
Procuro o teu paradeiro
Respondem, não te conhecem

Ao regressar, afinal
Na maré de uma quimera
Sentado no areal
Estavas tu à minha espera

De volta pró aconchego

Dominguinhos / Nando Cordel
Repertörio de Nuno da Câmara Pereira


Estou de volta pró meu aconchego
Trazendo na mala bastante saudade
Querendo um sorriso sincero, um abraço
Para aliviar meu cansaço
E toda esta minha vontade

Que bom, poder ‘star contigo de novo
Roçando teu corpo e beijando-te a ti
P’ra mim tu és a estrela mais linda
Teus olhos me prendem, fascinam
A paz que eu gosto de ter

É duro, ficar sem ti de vez em quando
Parece que falta um pedaço de mim
Alegro-me na hora de regressar
Parece que vou mergulhar
Na felicidade sem fim

Meu álbum de saudades

Leonel Moura / Armando Machado *fado maria rita*
Repertório de Leonel Moura


Fui reviver o passado
Que tinha tão bem guardado
Num álbum de estimação
Álbum das minhas lembranças
Cheio de tantas esperanças
Que trago no coração

Regressei à juventude
Quando tudo nos ilude
Tudo parece risonho
E o mundo não tem escolhos
Nem desgostos nem abrolhos
E o mundo parece um sonho

O meu álbum já velhinho
Cheio de tanto carinho
De sentimento e valor
Conta os momentos da vida
Como outrora foi vivida
E as loucuras do amor

É quando a saudade chega
Que a gente mais se apega
Ao passado de ilusões
O meu álbum de saudades
Encerra tantas verdades
E tantas recordações

Nova Mariquinhas

Letra de Jorge Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


A Mariquinhas foi tola
Deixou a vida que tinha
A sorte deu-lhe por esmola
Um treze no Totobola
E julgou-se uma rainha

Deu largas ao pensamento
Deu largas ao seu dinheiro
Toda cheia de espavento
Comprou um apartamento
P’rós lados do Areeiro

Saiu da Rua da Rosa
Esqueceu-se do Bairro Alto
E da casinha famosa
Já velhinha e carunchosa
Decidida deu o salto

Agora nada em riqueza
Tem tudo o que de bom há
Vive à grande e à francesa
Boa cama, boa mesa
Trocou o tinto por chá

De fadistices agora
Nem falar, que mau seria
Pois no sítio aonde mora
A Mariquinhas d’outrora
É hoje a D. Maria

Mariquinhas, Mariquinhas
Erraste, estás convencida
Deixaste a vida que tinhas
E as saudades que adivinhas
Hão-de amortalhar-te em vida