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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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Fado passado

Nuno Júdice / Franklin Godinho
Repertório de Ricardo Ribeiro


Queria dançar contigo
Levar-te à lua mais alta
Esquecer campa e jazigo
Não pensar que fazes falta

Via o fim à nossa volta
Mesas de grupos vencidos
Mas nós os dois em revolta
Falando de heróis traidos

Bebia p’la tua boca
Todo o vinho desta vida
Na noite mais funda e louca
Não te via já tão perdida

Acendias o cigarro
Que eu fumava até ao fim
E tudo a que me agarro
Não voltou a ser assim

Muda o tempo dia a dia
É uma sombra o teu fado
E a tua lembrança fria
Uma pedra no passado

O nosso lugar

Letra e música de Fábia Rebordão
Repertório da autora


Acordei de manhã
Já não estavas comigo aqui
Levantei-me da cama
Espreitei, mas não te vi;
Não dobraste o pijama
Saíste sem avisar
Daqui do nosso lugar

Eu pensei que era fácil
Se entre nós há amor demais
Porque é tão difícil
Concordarmos com coisas banais?
Se por vezes reclamo
Não ligues, eu sou mesmo assim
Assim, mas eu gosto de ti

O relógio da sala
Conta as horas tão devagar
Não levaste a mala
Reparei, estava no lugar;
0 meu peito em soluços
Descansou, não estava a contar
Que tu pudesses voltar

Eram cinco p'rás quatro
Quando a porta então bateu
Tu chegaste mansinho
Encostaste o teu rosto no meu
E disseste baixinho:
Não ligues, eu sou mesmo assim
Assim, mas eu gosto de ti"

Do silêncio saímos

Letra e música de Fernando Tordo
Repertório de Ricardo Ribeiro


Fala-me dos tempos que já foram
Fala-me daqueles que já não estão
Conta-me da pena que nos faz
Que só estejamos nós e outros não

Mas viva a vida esta que ainda temos
O riso, o amor, por dentro e por fora
O futuro que nunca aprendemos
Mas sendo sábios do que é sermos agora

Do silêncio saímos cheios de versos
E com versos fizemos as cantigas
Que nos lembram momentos tão dispersos
Que não há cantigas velhas, só cantigas


Conta-me dos passados recentes
Fala-me dos sonhos, se quiseres
Que eu digo-te das dívidas que temos
Do quanto nós devemos às mulheres

Diz-me das paisagens dos caminhos
Das montanhas dos desertos e das flores
Fala-me de não estarmos sózinhos
Conta-me a verdade dos amores

Meus sonhos proibidos

Artur Ribeiro / Cavalheiro Júnior *fado porto*
Repertório de Maria Valejo


No dia em que dei por ti
O que até então vivi
Varreu-se dos olhos meus
Saiu da minha memória
E agora só tenho história
A partir dos olhos teus

Os sonhos mais proibidos
Foram todos atendidos
Duma maneira tão louca
Dum modo tão absurdo
Que me fez esquecer de tudo
A partir da tua boca

Tudo o que não for contigo
Não tem nada a ver comigo
Nem mora na minha voz
E até nos fados que canto
Tu ficas ali ao canto
Ouvindo falar de nós

O xaile

Letra de Artur Soares Pereira
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Este meu xaile velhinho
Sobre os meus ombros traçado
Tem palmilhado o caminho
Que eu já palmilhei no Fado

Não o deixo um só momento
É meu conselheiro e guia
Conto-lhe o meu sofrimento
Conto-lhe a minha alegria

Põe meu peito em alvoroço
Põe minha alma a vibrar
Sem ele, cantar não posso
Sem ele, não sei cantar

É o meu maior amigo
Na alegria ou desventura
Quando eu morrer vai comigo
Para a minha sepultura

Se eu pudesse, bem à vista
Na minha campa gravava
Aqui jaz uma fadista
E o xaile com que cantava

Chave da memória

Letra e música de Carminho
Repertório de Ricardo Ribeiro


Se julgas ter a chave da memória
Guardada pra servir a tua vida
Erraste pois lembrar a tua história
Não é escolha que dês por garantida

E mesmo quando falta te fizer
Toda a experiência que a vida te deu
Darás por ti rezando por manter
A bendita memória do que é teu

Há dias em que sentirás saudade
Que tinhas daquele tão distante amor
Só por andares tu livre p’la cidade
E a avenida já estiver toda em flor

Desconcertadamente lembrarás
Passado que te foi perda ou vitória
E sem controlo compreenderás
Que tu não tens a chave da memória

Nunca mais

Letra e música de Agir
Repertório de Fábia Rebordão


Nunca mais, nunca mais
Nunca mais, nunca mais
Provei o teu beijo
Mas ainda o vejo
Quando os olhos fecham
Nunca mais, nunca mais
Direi que é tarde demais
E o vento que sopre
Mesmo que não voltes
Nunca mais


Se eu soubesse,se eu soubesse
Não tinha deixado o peito aberto
Que de tão aberto, acabou fechado
Deixei-te ir embora
Deixei fugir e agora

Quem diria que eu um dia iria mudar
Quem diria, e eu não sabia, que ia acabar
Deixei-te ir embora
Deixei fugir e agora

Vou deixar de dizer que te quero
P'ra nunca mais ter de dizer
Nunca mais, nunca mais
Direi que é tarde demais
P’ra ter o teu beijo
Mas ainda o vejo
Nunca mais

Purinha

Maria do Rosário Pereira / Frederico de Brito *fado azenha*
Repertório de Ricardo Ribeiro


Chegaste e eras tão bonita
Que o meu olhar encantado
Viu na menina a mulher
Foste a imagem bendita
Que acorda um homem cansado
Da vida que já não quer

Se eu soubesse que existias
Bem me teria guardado
Para ser teu e só teu
Mas na lonjura dos dias
Eu tinha dado o meu fado
A quem seu fado me deu

O beijo que me pediste
E que eu te dei, que loucura
Foi o começo e o fim
E de alegre me fiz triste
Por saber que assim tão pura
Não devias ser p'ra mim

Hoje ninguém acredita
Que eu pudesse ter recusado
Ser o teu primeiro amor
Mas, sendo tu tão bonita
Quase parecia pecado
Que não tivesses melhor

Que maneira de gostar

Artur Ribeiro / João do Carmo de Noronha *fado joão*
Repertório de Maria Valejo


Tu dizes sentir por mim
Amor como tu lhe chamas
Se tu amando és assim
O que serás se não amas

Se amando fazes de conta
Que és  meu rei e senhor
Diz-me lá a quanto monta
Esse teu profundo amor

A tua forma de amar
É da minha tão diferente
Que não sei avaliar
Esse teu amor ardente

P’ra te falar com franqueza
Depois das coisas que vi
Até nem tenho a certeza
Se tu gostarás de ti

Por muito que tu apostes
Que sou o teu maior bem
O mais certo é que não gostes
Nem de mim nem de ninguém

Orgulhosos

Letra de Linhares Barbosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado
Letra publicada no jornal “Guitarra de Portugal” de 29 de Março de 1928


Os “c’roa ou graxa”, coitados
Que nas valetas da Baixa
Vivem a rir e a cantar
Trabalham ajoelhados
Fazendo da suja caixa
O seu verdadeiro altar

Boina rota, posta a jeito
Fato de ganga ou caqui
Em bandos, como uma praga
Alegram meia Lisboa
Ó vossência engraxe aqui
Se não ficar bem não paga

Alguns deles, conheci-os
Vadiavam, desprezados
Eram pequenos ladrões
Deixaram de ser vadios
Não roubam mas são roubados
Pois pagam contribuições

Que viver! Que liberdade!
Alguns são tão pequeninos
E têm tanta esperteza
Que a gente sente vontade
De trazer esses bambinos
P’ra os pôr em cima da mesa

Têm orgulho os gaiatos
No seguinte: é que os janotas
Quando lhes dão a engraxar
Os luxuosos sapatos
E as luxuosas botas
Precisam de se curvar

O Estado fá-los pagar
A cruel contribuição
E o que eles ganham com a graxa
A Lei lá lho vai buscar
Pode não chegar p’ra pão
Mas tem de chegar p’ra a taxa

Os ledos engraxadores
Os pobres industriais
Ladinos e desdenhados
Fazem curvar os senhores
Tenho visto generais
Limpando os pés... mas... curvados

Quem sou na tua vida

Artur Ribeiro / Joaquim Campos *fado tango*
Repertório de Maria Valejo


Quem sou eu na tua vida
Diz-me por que ao mundo vim
Diz à minh’alma sentida
Quem sou eu na tua vida
Eu que já nem sei de mim

Quem sou eu nos sonhos teus
Eu que só sonho contigo
Às vezes pergunto a Deus
Quem sou eu nos sonhos teus
Mas Deus não fala comigo

Dorme alguém nos teus sentidos
Ou não dorme lá ninguém
Nos teus sonhos proibidos
Dorme alguém nos teus sentidos
E nos teus braços também

Quem sou afinal de contas
Tenho lugar no teu fado
Se não são perguntas tontas
Quem sou afinal de contas
Quando vou contigo ao lado

E conta quem eu sou

Francisco Guimardes / Angelo Freire
Repertório de Ricardo Ribeiro


Tudo me prende à terra onde me dei
Tudo se acende ao pé donde morei
Mudo me torno em torno donde amei
Mas adormeço e sonho onde chorei

Fui vento e mar que foi e enfim voltou
Um rio que ocorre e corre sem morrer
A flor que emerge e morre por nascer
Como um lugar que a sós, assim ficou

Sobrou o vento e tudo o que ele deixou
Nomes e datas escritas na madeira
E no lugar da minha cabeceira
Há uma criança e conta quem eu sou


E no caminho o aroma se mantém
Resiste a casa, o resto que sustém
Uma janela, um pai e uma mãe
Mas quando acordo e o sono se detém;
Abro uma porta e mesmo sem ver bem
Eu vejo, já não mora lá ninguém

O outro lado da viela

Fábia Rebordão / Alfredo Duarte *fado cravo*
Repertório de Fábia Rebordão


Eu sabia que tu estavas
Na viela, onde me olhavas
Sob a luz dum candeeiro
Sentia no teu olhar
Enfeitiçado ao passar
Que era nosso o fado inteiro

Senti vaidoso o teu ar
Que desdenha e quer comprar
Que qualquer homem assume
Passaste por mim, olhaste
Acenaste e tentaste
O convite do costume

Sem resposta p’ra te dar
No meu rosto de chorar
Mostrei desgosto e descrença
Foste embora amargurado
Que a história de cada fado
Nem sempre é o que se pensa

Ainda tenho tão presente
Como quem olha e que sente
Um amor que ali perdi
A pena que nos desgarra
Como cordas de guitarra
Num fado a falar de ti

Novo horizonte

Carlos Baleia / António Machado
Repertório de Ana Margarida


Novas coisas em Lisboa
Agitam esta cidade
Não há lugar p'rá canoa
Vai de férias a saudade

Começa o riso em Marvila
Vai até aos Olivais
Lisboa está mais reguila
Se tem muito ‘inda quer mais

De braços no ar em onda contente
Não sabe cantar para pouca gente;
Ninguém tem inveja de tanta alegria
E corre a cerveja até vir o dia;
Com outro milénio mesmo a começar
Ela ganha o prémio por saber sonhar


Com o rio mesmo à beira
Com um barco e outra ponte
Ficou agora à maneira
E eu nem sei se vos conte

Ninguém trava esta cidade
E nada a pode parar
Apenas há a saudade
Do que está para chegar

Por cada sonho

Artur Ribeiro / Alfredo Duarte *fado bailado*
Repertório de Vasco Rafael

Por cada sonho desfeito
Cada lágrima caída
Por cada amor sem direito
Nascido dentro do peito
São menos anos de vida

Por cada sonho trazido
Dos sonhos da mocidade
Por cada beijo traído
Por cada amor sem sentido
Cada fado de saudade

Por cada sonho diferente
Que morre feito desgosto
É ness’altura que a gente
Dá conta que o sonho mente
E deixa rugas no rosto

Quando mesmo assim transponho
Essa linha imaginada
Quando ter tudo suponho
No final de cada sonho
Acordo de mãos sem nada

Meu rio, meu pão de trigo

Letra de João Fezas Vital
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Meu rio, meu pão de trigo
Meu fruto, meu vinho novo
Meu gesto, meu verso antigo
Cravo que trago comigo
Maria, mulher do povo

Corpo de sol e sargaço
Areal ao mar doado
Promessa dum novo espaço
Carne dos mundos que traço
Fora das leis do pecado

Meu barco, minha aventura
Meu riso, minha verdade
Céu aberto em noite escura
Meu morrer, minha loucura
Maria, minha cidade

Aos quatro ventos

*Como não acreditas*
Artur Ribeiro/ João Blak*menor do porto*
Repertório de Lenita Gentil
As duas últimas estrofes não foram gravadas


Não acreditas, pois não
Então tomo a liberdade
De dizer toda a verdade
Que me vai no coração

Posso falar da tortura
Que a tua ausência me traz
Pois sei de fonte segura
Que nunca acreditarás

Sendo assim sempre me atrevo
A confessar o que sinto
Pois sei que pensas que minto
E é falso tudo o que escrevo

Se eu cantar aos quatro ventos
Minha canção de saudade
Tu dirás que ouviste centos
De canções com mais verdade

Se eu chorar pedindo a Deus
Que termine este abandono
Vais achar que os olhos meus
Andam vermelhos de sono

Mas se a minha voz amua
E afirma chegar o fim
Gritarás de rua em rua
Mentira gosta de mim

Sinto-me portuguesa

Letra de João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Eu sinto-me portuguesa
Desde a alma ao coração
A cantar sinto a nobreza
Do povo e da tradição

Foi nas terras mais castiças
Que o fado me deslumbrou
Ao ouvir velhos fadistas
Que o destino nos deixou

Gostei desta descoberta
Das festas, dos arraiais
Onde o Fado nos liberta
A sentir cada vez mais

É pois de enorme prazer
De cantar com esta alma
Que Deus me deu ao nascer
Com tempestade e com calma

Eu trago por companhia
Uma guitarra no peito
Quer de noite, quer de dia
Me faz cantar a meu jeito

Lisboa amargurada

Carlos Baleia / António Redes Cruz
Repertório de Ana Margarida


Com o vento a empurrar
O seu destino de mar
A caravela zarpou
Ia à vela na lonjura
Por estrada de aventura
Quando Lisboa acordou

Num sofrimento profundo
Quis saber se o novo mundo
o seu destino ia mudar
Mas ninguém lhe respondeu
Só a amargura cresceu
E pôs-lhe mágoa no olhar

Ouviu-se um fado dif’rente
Desconhecido da gente
Que sempre vinha à janela
Um cantar que foi marcado
P'lo sabor do mar salgado
E um leve gosto a canela

Alguém falou de conquistas
E de coisas nunca vistas
Que estarão além do mar
Mas Lisboa amargura
Fica de dor destroçada
E o barco tarda em voltar

Passei a ser quem sou

Artur Ribeiro / Fernando Freitas *fado noquinhas*
Repertório de Maria Valejo

O meu sonho deixou de ser uma quimera
Depois de teres chegado por fim à minha beira
Passei a ser quem sou ao esquecer quem era
Passei a ser o fado da tua vida inteira

No teu olhar trazias o sol que me faltava
E vinhas tão diferente que logo que te vi
Eu soube que serias o tal que eu esperava
Este sentir-me gente que começou em ti

Vi que a palavra sonho já tem significado
E vi que o meu fadário é ser como tu dizes
Meu fado era tristonho antes de teres chegado
Agora o meu rosário só tem contas felizes

Ninguém pode censurar

Letra de João de Freitas
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Porque gosto tanto dele
E a causa deste meu querer
Até a Deus perguntei
Penso noite e dia nele
Sem nunca vir a saber
A razão por que o amei

Gosto dele, isso que tem
Ninguém pode censurar
Este amor insatisfeito
Pertence a outras, bem sei
Mas terá sempre lugar
Num cantinho do meu peito

Dizem que foi desordeiro
Que frequentou as vielas
E a desgraça conheceu
Mas é um bom companheiro
Meu e de todas aquelas
Que o adoram como eu

O nome do meu amado
Vou dizer-vos, mas imploro
De todos vós o perdão
É o nosso lindo fado
O fado que eu canto e choro
E vive em meu coração

Os fados que me acontecem

Artur Ribeiro / Edgar Nogueira
Repertório de Jorge Martinho


Os fados que me acontecem
Nestes meus lábios incertos
Nascem de mim tão libertos
Que às vezes nem meus parecem

Aqueles que me conhecem
Mas não sabem donde vim
Julgam que falam de mim
Os fados que me acontecem

Muitas vezes lembram certos
Fados que já foram teus
Por isso parecem meus
Nestes meus lábios incertos

Parecem gumes abertos
Aos meus anseios dispersos
Talvez por isso meus versos
Nascem de mim tão libertos

Fados que de mim se esquecem
Desde quando te perdi
E tanto falam de ti
Que às vezes nem meus parecem

Riso impreciso

Jorge Rosa / João Noronha *fado pechincha*
Repertório de Alice Maya


Não façam fé no meu riso
Se me ouvirem gargalhar
Só eu sei quanto preciso
Sorrir p’ra não soluçar

Rir pouco é muito cuidado
Rir muito é pouco juízo
O meu não é controlado
Não façam fé no meu riso

Todos me dizem feliz
Por ser feliz o meu ar
Duvidem do que se diz
Se me ouvirem gargalhar

Quem esteja atento repara
E há-de notá-lo impreciso
Sorriso que a dor mascara
Só eu sei quanto preciso

Quando o amor é fracasso
Que não se quer demonstrar
Faz-se apenas o que eu faço
Sorrir p’ra não soluçar

Nem Deus, nem rei, nem cometa

Letra de João Fezas Vital
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Não olhes para mim, criança
Que não te posso dar nada
Tive um bocado de esperança
Mas, como tudo o que cansa
Foi-se embora já cansada

Não te zangues, por favor
Nem finjas que vais chorar
Não tens que entender a dor
Fogo em brasa deste amor
Que quero e não posso dar

Não sou nada, podes crer
Nem Deus, nem Rei, nem cometa
Só sei que te vi nascer
E que amanhã vou morrer
A imaginar-me poeta

Janela escancarada

Ana Moura, Pedro Máfama, Kalaf Epalanga, Toty Sa’mette / Alberto Janes
Repertório de Ana Moura

Trago este fado de viver intensamente
No peito a chama que há-de sempre arder
Gaivota em terra, tempestade iminente
De cruz ao peito, não há nada que temer

Bordei palavras e signos na pele
E deixei lágrimas à mercê da sorte
Os meus segredos não rimam no papel
E até rendida eu não me dou à morte

Tenho uma janela aberta
No meu peito, escancarada
De ferro forjado, não te piques a entrar
Eu vou esconder-me por trás
Da renda branca, bordada
E pelo rio dos meus olhos navegar

Ó Santo António, ensina-me os limites
Desta vivência eterna num segundo
Para os meus olhos não brilharem sempre tristes
E o coração não andar tão moribundo

Pois neste fado dispenso normalidades
E vivo o instante como se não houvesse fim
Eu me apaixono por pessoas e cidades
E hei-de morrer deste amor que nasce em mim

Dama da noite

Letra de João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Dama da noite à janela
Para quando eu respirar
Cada saudade, uma estrela
Água da fonte do mar

Dama da noite singela
Só de noite tens perfume
Dama da noite à janela
Da saudade e do ciúme

Tristezas e abandonos
Tudo se passa a cantar
Dama da noite dos sonhos
De que não quero acordar

Não demores

Letra e música de Carolina Deslandes
Repertório de Cuca Roseta


Há um passarinho
Que vem à minha janela
Avisar-me de que tu estás a chegar
E eu, bem apressada
Corro p'rá minha capela
E peço aos anjos que te cuidem ao volta

Vou comprar as flores
E até os manjericos
Na janela fico à espera de te ver
Não oiço as notícias
Nem tão pouco os mexericos
Que o meu coração não pára de bater

Não demores meu amor
Corre logo bem cedinho
Que até o sol dança, no meio da praça
E ouve-se o cantar dos passarinhos
Não demores meu amor
Corre logo até mim
O jantar está na mesa e a rua toda em festa
À espera de te ver chegar por fim


Há um passarinho
Que vem pousar no meu ombro
Pr’avisar-me de que tu estás a chegar
E o meu coração, dispara como louco
E saio pela casa a cantar
Arranjo o cabelo, ponho a fita cor-de-rosa
Num suspiro vejo a cama tão vazia
É hoje o meu amor, e eu estou tão ansiosa
Que o relógio se falasse até se ria

Quem me dera ser o vento

Artur Ribeiro / Joaquim Campos *fado vitória*
Repertório de Norberto Martinho
Repertório de Manuel Dias na música do fado Pedro Rodrigues

Há pedaços de Lisboa
Na canção que o vento entoa
De forma triste e magoada
Quem me dera ser o vento
P’ra cantar sem sofrimento
E chorar sem sentir nada

Num beco da velha Alfama
O vento passa e derrama
O som de notas plangentes
Quero ser louco varrido
Como tu vento fingido
E mentir como tu mentes

Chora alguém na Mouraria
E o vento durante o dia
Parece uma alma penada
Quando eu choro a minha sorte
O vento soprando forte
Ri de mim à gargalhada

Há pedaços de Lisboa
Na canção que o vento entoa
Sobre os telhados sem fim
Vento corta-me em pedaços
E leva-me nos teus braços
Para bem longe de mim

Tema da noite

Artur Ribeiro / Alfredo Duarte *eu lembro-me de ti*
Repertório de Maria Valejo


Eu sou tema da noite em versos transformado
Sou canto de viela que teima em ser de esp’rança
Às vezes sou açoite de vento transviado
Umas vezes procela outras vezes bonança

Sou a quadra sentida que vai de boca em boca
História recontada que sempre faz chorar
Sou a corda partida duma guitarra louca
Que sempre que é pisada quer outra vez cantar

Eu sou tema da noite perdido na cidade
Sou grito de desejo em noite de luar
Meus olhos cor da noite molhados de saudade
Sabem que não te vejo quanto a noite findar

Fui fazer festa de vento

Letra de João Fezas Vital
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Fui fazer festa de vento
À praia de vento antigo
Em cada vento que invento
Há outro vento comigo

Muitas dunas algum mar
E o sul a vir do norte
O sol todo por lembrar
Quase vida quase morte

Incensos por existir
Arderam a hora toda
O silêncio de não rir
Andou sempre à roda à roda

A hora ficou na asa
Do abutre que passou
Hora a hora feito brasa
Em toda a hora que sou

Amor de domingo

Letra e música de Cuca Roseta
Repertório da autora


Eu quero um amor de domingo
Que às vezes me deixe sozinho
Que me saiba esperar
Sem ter pressa de amar
Que me saiba querer quando há lugar

Eu quero um amor de domingo
Que se sente tão devagarinho
Que conversa à lareira
O sossego e uma ideia
Sabe a paz e a pão quente da aldeia

Eu quero um amor de domingo
Que vai e que volta ao ninho
Que vem e que vai
E que vai e que vem
Ao domingo que sabe tão be
m

Eu quero um amor de domingo
A janela da chuva e do vinho
De horas cheias de nada
Melhor nada da vida
Só e mais nada
Tu e eu e a almofada

Eu quero um amor de domingo
No silêncio que não está sozinho
De cabelo mal atado
Maquilhagem de lado
De aconchego infinito deitado

Soltas

João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


É na paz que vive a liberdade
É na dor que vive a solidão
É no amor que vive a felicidade
É no povo que vive esta canção

É na saudade que tudo está distante
É na alegria que vive o amor
É na esperança que morre o instante
É na paz que se afugenta a dor

Meu amor, a liberdade
Tem sempre a cor da razão
Ter-se amor, não tem idade
Ser-se livre, também não

Canto um fado à despedida
Do sol e da madrugada
Do dia-a-dia da vida
De cada hora passada

(in Fado – É No Povo Que Vive Esta Canção)

Onde estás?

Artur Ribeiro / José Maria Antunes
1a versão / Repertório de Augusta Ermida 
2a versão / Repertório de Carlos Ramos

Versão Augusta Ermida

Aonde estás, o que farás, quem sai contigo
Chego a tentar adivinhar mas não consigo
Quem amarás, quem beijarás com ansiedade
Quero saber, para correr com a saudade

Onde estás, como tens passado
És feliz tal como adivinho
Como estás, sem mim a teu lado
Deus o quis, segue o teu caminho


Aonde vais sempre que sais tão de fugida
A quem vais dar o meu lugar na tua vida
Quem te dirá pela manhã; muito bom dia
Quem roga a Deus p’los passos teus, como eu fazia
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Versão Carlos Ramos


Aonde estás, o que farás, quem sai contigo
Quero tentar adivinhar mas não consigo
Quem amarás, quem beijarás com ansiedade
Quero saber, para correr com a saudade

Onde estás, como tens passado
És feliz, tal como adivinho
Onde estás, sem mim a teu lado
Deus o quis, segue o teu caminho


Aonde vais sempre que sais tão de fugida
A quem vais dar o meu lugar na tua vida
Quem te dirá pela manhã; muito bom dia
Quem roga a Deus p’los passos teus, como eu fazia

Manhã perdida

Artur Ribeiro / Miguel Ramos *fado margarida*
Repertório de Jorge Barradas

Perdi toda a manhã e não achei
Motivo para mais uma canção
Dei voltas ao papel, improvisei
Mas nada achei em mim, foi tudo em vão

Lembrei os olhos teus, fiz o teu nome
Senti a tua voz nos meus ouvidos
Lembrei o teu andar e senti fome
Senti fome de ti nos meus sentidos

Lembrei-me do sabor dum beijo nosso
O nosso estranho amor surgiu também
Mas são coisas tão nossas que não posso
Dizê-las nos meus fados a ninguém

Depois lembrei a dor que mata a gente
A nossa vida imposta e separada
Mas se entrasses a porta num repente
Dava a manhã perdida por achada

De cabelo solto ao vento

Jorge Rosa / Popular *fado menor*
Repertório de Celeste Rodrigues


De cabelo solto ao vento
Corro e não sei onde vou
Da lembrança que ficou
Trago o meu corpo sedento

Seca-me a boca sem esperança
Dos beijos que tu me davas
Trago nos olhos lembrança
Dos futuros que embalavas

Trago ainda no ouvido
Ecos das tuas canções
E presas ao meu sentido
Ai, quantas recordações

E neste meu desalento
Trago vida e sei que morro
Não sei onde vou, mas corro
De cabelo solto ao vento

Ingratidão

Letra de João de Freitas
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado
Publicada no jornal Canção do Sul, número 193, de 20 de Dezembro de 1937


É tão feia a ingratidão
Que causa tanto desgosto
Fere mais um coração
A bofetada sem mão
Do que a estampada no rosto

Acontece tanta vez
Trabalharmos toda a vida
E aparecer a malvadez
A ferir a nossa honradez
Que fica comprometida

Vêm-se tantas fingirem
Amizade figurada
E os nossos corpos servirem
De degraus para subirem
Aquel’s que não valem nada

Muitas vezes é preciso
Sofrer a desilusão
Para tomarmos juízo
E acabarmos com o riso
Dessa feia ingratidão

A servir de trepadeira
Andamos nesta quezília
Desprezando a vida inteira
A amizade verdadeira
Da nossa querida família

Nunca mais

Artur Ribeiro / José Duarte *fado seixal*
Repertório de Fernanda Maria


Eu não quero nunca mais
Entre nós dois despedidas
Ficar distantes jamais
Não quero lonjuras tais
Entre as nossas duas vidas

Nunca mais ir ao correio
As tuas cartas buscar
Nunca mais o louco anseio
Duma carta que não veio
Perdida em qualquer lugar

Amor nunca mais terás
De andar sem mim por aí
Nas horas boas e más
Eu irei onde tu vás
Não quero ficar sem ti

Nunca mais fazer de conta
Que vivo enquanto não vens
Nem sentir a mente tonta
Sem saber a quanto monta
A saudade que tu tens

O mundo é ela

Artur Ribeiro / Júlio Proença *fado puxavante*
Repertório de Artur Batalha


Vejo o mundo da janela
No seu mais vasto horizonte
Para mim o mundo é ela
E ela mora defronte


Desde manhã ao sol-pôr
Na sua expressão mais bela
Quando vejo o meu amor
Vejo o mundo da janela

Vejo a terra vejo o mar
A brisa a correr no monte
Vejo tudo num olhar
No seu mais vasto horizonte

E quando da boca sua
Sai uma frase singela
Vejo o mundo ali na rua
Para mim o mundo é ela

Cá no meu quarto alugado
Modesto como uma fonte
Vejo Deus do outro lado
E ela mora defronte

Lei do fado, do amor e da vida

José Fernandes Castro / Pedro Rodrigues *fado primavera*
Repertório de Catarina Dionísio *ao vivo*


Perguntei ao fado amigo
Porque lhe chamam antigo
Mais antigo que a saudade
O fado disse: sou jovem
E os sonhos que então me movem
São todos da minha idade

Antigo é não ter noção
De que a voz do coração
É um hino intemporal
Lei do fado é lei cumprida
Lei do amor é lei da vida
Lei do tempo é transversal

Antigo nunca serei
Pois sempre caminharei
À frente do meu destino
Quem quer estar a meu lado
Tem de se manter ligado
Ao sonho mais genuíno

Fado mágoas

Silva Tavares / Popular *fado menor*
Repertório de Fernanda Maria


Preto pode ser vaidade
Não traduz luto nem dor
Sentida dor é a saudade
E a saudade não tem cor

Saudades não as merece
Toda a gente que as inspira
Ter saudade de quem esquece
É ter crença na mentira

Vai tão longe a mocidade
Sinto tão perto o meu fim
Que às vezes tenho vontade
De deitar luto por mim

Linda rosa

Letra de João de Freitas
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado
Publicada no jornal Canção do Sul, número 206, de 1 de Julho de 1938


Por ser de tez tão rosada
Quando ela foi baptizada
Deram-lhe o nome de Rosa
Pois seu rosto encantador
Parecia mesmo uma flor
Uma flor linda e viçosa

Criada com mil carinhos
Numa roseira sem espinhos
Sua vida foi ditosa
Sendo diferente das mais
Era o enlevo dos pais
Essa pequenina Rosa

Foi crescendo entre roseiras
Sonhando com as mais fagueiras
Esperanças belas, infindas
Rendendo ao seu nome preito
Trazia sempre no peito
Uma das rosas mais lindas

E depois contou-me alguém
Que ela casou e foi mãe
Tornando-se mais formosa
Pois o céu fez-lhe a vontade
De dar-lhe a felicidade
Num lindo botão de rosa

Despe-me

Letra e música de Tó Zé Brito
Repertório de Fábia Rebordão


Despe-me o medo, a saudade sem pressa
Despe-me as dúvidas bem devagar
Despe-me toda a ansiedade num beijo
Despe-me agora a vontade de me entregar

Despe-me o frio, o cansaço sem pressa
Despe-me a roupa, e bem lentamente
Pousa o teu corpo no meu
Sente o meu peito no teu
E somos um, assim de repente

Somos o mar a bater
Já não há nada a fazer
Somos as ondas no mar
Que vão e vêm sem parar
Já não há nada a fazer
Já não temos solução
Despe-me agora
O meu coração

Menina do olhar travesso

Jorge Rosa / Joaquim Campos *fado rosita*
Repertório de Francisco Pedro


Menina de olhar travesso
Onde travessas meninas
Andam a brincar ladinas
C’o preço do meu apreço

Se tento a sua atenção
No seu modo desatento
Fugidias como o vento
Buscam outra direcão

Se me finjo distraído
Pressinto que elas me seguem
E que os meus olhos perseguem
Seguindo o mesmo sentido

Vê lá tu se as aconselhas
Diz-lhes que tenham maneiras
E acabem as brincadeiras
Antes que cheguem a velhas

Menina de olhar travesso
Diga às travessas meninas
Que não se armem em finas
É amor que eu lhes ofereço

Cada dia que passa

*Mais um dia sem vida*
Artur Ribeiro / Miguel Ramos *fado margarida*
Repertório de Florinda Maria

Cada dia que passa sem te ver
Sem nada ter contigo de comum
São vinte e quatro horas a sofrer
Resta saber se para cada um

Cada dia que passa é mais um dia
Que não quero somar aos dias meus
São vinte e quatro horas de agonia
Resta saber como passas os teus

Cada dia que passa sem lograr
Saber quando esta ausência terá fim
São vinte e quatro horas a rezar
Resta saber se tu rezas por mim

Todo o intento arrefece

Letra de João Fezas Vital
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Todo o intento arrefece
Em dedos de dizer não
Houvera quem me trouxesse
Uma brasa em cada mão


Nem a morte nem a morte
Dum olhar que não viesse
Nem a morte só a morte
Todo intento arrefece

Eu subo à fraga mais alta
Até perder a razão
Só o medo não me falta
Em dedos de dizer não

Fora eu quem não quisesse
Abriria o coração
E diria a quem morresse
Não morreste sem perdão;
Houvera quem me trouxesse
Uma brasa em cada mão

A pobres não prometas

Artur Ribeiro / Franklim Godinho
Repertório de Lena Silva


Teus olhos que se intrometem
No que falamos os dois
E ficam no meu olhar
A meu ver, eles prometem
Tais coisas que tu depois
Nunca poderás pagar

Por isso toma cuidado
Que esses olhos inquietos
Andam a troçar do p’rigo
Não os deixes no meu fado
Diz-lhes que fiquem quietos
Quando conversas comigo

Teus olhos intrometidos
Sem que os vejas tomar parte
De tudo quanto desejo
Passeiam nos meus sentidos
Eu não sei se devo amar-te
Ou fingir que não os vejo

Alguém que não conheço

Artur Ribeiro / Renato Varela *fado varela*
Repertório de Januário Trindade


Alguém que Deus não pôs no meu caminho
Alguém que não passou à minha porta
Alguém a quem não dei o meu carinho
Alguém que por acaso nem me importa

Alguém que deve ter forma de gente
Mas a quem mal ou bem eu não conheço
Alguém que gritará constantemente
Palavras que decerto não mereço

Há-de p’ra além de nós cantar a esmo
Os versos que te fiz hora após hora
Canções que são pedaços de mim mesmo
E hão-de falar de ti p’lo tempo fora

Simplesmente ser

Letra e música de Rita Viana
Repertório de Carminho


Vem contar-me
O que andaste a fazer
Em quem tropeçaste
No que te tornaste
Sem prever

Como transformaste
Tanta certeza no contraste
Só p’ra amadurecer

Quando sobraste
Como te multiplicaste
Sem perder

Estou a tentar
Simplesmente ser

Ter saudade

Jorge Rosa / Pedro Rodrigues
Repertório de Armando Morais


Saudade é palavra nossa
Tão nossa tão portuguesa
Que não há outra não há
Que melhor traduzir possa
A verdade, a tristeza
Que a triste ausência nos dá

Palavra má que se uniu
À rima dum fado triste
Todo feito p’ra chorar
P’ra dizer a quem partiu
Finda o teu sonho, resiste
Está na hora de voltar

Pobre de quem algum dia
Sentiu a alma a sangrar
De saudosa desventura
Vive a mais longa agonia
Sofre o mais duro penar
Padece a maior tortura

Saudades finos punhais
Que eu sinto com crueldade
Na minha alma a doer
Meu amor escuta os meus ais
E vem matar a saudade
Que aos poucos me faz morrer

Meu estilo

Jorge Rosa / João de Vasconcelos
Repertório de Ada de Castro


Há tantas maneiras tantas
De o fadinho se cantar
Eu canto assim e tu cantas
Como melhor te agradar

Cada qual canta o seu fado
Como bem lhe apetecer
Seja d’hoje, do passado
Ou de quando Deus quiser

Quem canta o fado é fadista
E é o que eu sou
Quem lhe dá estilo é estilista
E é o que eu dou
Não quero tê-lo, nem espero
Vê-lo mudado
Não espero vê-lo, nem quero
Ter outro fado


Há quem por isto ou aquilo
Ou p’lo gosto de mudar
Deixe o estilo do seu estilo
P’ra novo estilo arranjar

Não louvo o gosto a quem teima
Em fazer do fado um jogo
E é sabido que se queima
Quem muito brinca c’o fogo

Saudades minhas

Letra de João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Tenho um barco junto à fonte
P’ra melhor ouvir cantar
A água que vem do monte
A caminho para o mar

Passa no tanque da horta
Parte dela vai regar
Cai em espuma na ribeira
Na pedra negra a brilhar

Passa, azenhas velhinhas
As pontes por restaurar
Murmura, saudades minhas
Sempre, sempre, sem parar

Alfama

Letra de Henrique Rego
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado Letra
Publicada no jornal Ecos de Portugal em 1953


Minha Alfama das vielas
Aonde o labor se abriga
És um alvo de aguarelas
Da nossa Lisboa antiga


Tuas ruas sinuosas
São, numa paz desmedida
Colmeias laboriosas
A latejarem de vida;
Os teus becos, sem saída
Com pitorescas janelas
São incomparáveis telas
Dum passado que se encobre;
És velhinha, honesta e pobre
Minha Alfama das vielas

Como outrora os cavaleiros
Defendiam sua dama
Serei sempre um dos primeiros
A defender minha Alfama;
Neste bairro brilha a chama
Que, sempre, sempre, me obriga
E, talvez, nunca consiga
A ser mais do que devoto;
Por este bairro remoto
Aonde o labor se abriga

Santa Luzia proteja
Este burgo envelhecido
Que a toda a hora lhe beija
A orla do seu vestido;
Eu, que tenho percorrido
De Alfama as pobres ruelas
Digo, pondo os olhos nelas
E o meu pensar a distância;
Alfama da minha infância
És um alvo de aguarelas

A desfiar seus desgostos
Há longos anos a vejo
Enlevada, de olhos postos
Nas verdes águas do Tejo;
Nesta vida o que desejo
Dum olhar de rapariga
Era pôr numa cantiga
Toda a gratidão que devo;
A este bairro de enlevo
Da nossa Lisboa antiga

Chico da Guia

Jorge Rosa / António Chaínho
Repertório de Fernando de Sousa
*também gravado por Aurélio Perry com música de Jorge Fontes


Com a banza a tiracolo
E o boné de pala ao lado
A cantarolar um fado
Lá vai o Chico da Guia

Ao vê-lo até me consolo
Por desmentir quem já disse
Há muito que a fadistice
Se afastou da Mouraria

Não há navalhas, pois não
Não há rufias, p’ra já
Cenas canalhas no Capelão
Também já não há
Não há Severas, bem sei
Nem Marialvas, tão-pouco
Mas fado sim
Pois passou por mim
Ainda há bem pouco


Dois copos no Zé da esquina
A alma põem-lhe em fogo
E um fado aparece logo
À sua boca colado

Há quem lhe lamente a sina
Mas gosto de o ver bebido
Pois com vinho é já sabido
Que o Chico todo ele é fado

Não peças ao meu olhar

Jorge Rosa / Alberto Costa *fado dois tons*
Repertório de Maria Amélia


Não me peças p’ra guardar
Segredo do nosso amor
Eu sei bem que o meu olhar
Não te faz esse favor

Pode ser que a minha fala
A perguntas não responda
Mas meu olhar não se cala
Não há segredo que esconda

Se uma paixão me sacode
E o amor me rouba a calma
Sei que o meu olhar não pode
Esconder segredos da alma

Pede ao calor que arrefeça
E ao frio que dê calor
Mas ao meu olhar não peças
Silêncio p’ró nosso amor

Um estranho silêncio

Jorge Rosa / Popular *fado corrido*
Repertório de Eurico Pavia


Um estranho silêncio mora
Na minh’alma de poeta
Nenhuma musa indiscreta
Me vem visitar agora

Tive uma, mandei-a embora
Esqueci-me dos meus versos
Andam no vento, dispersos
Perdi-os, deitei-os fora

Mal que partiste, partiu
A força do meu talento
Que a força do desalento
Os meus olhos destruiu

Mal me deixaste, deixou-me
O mundo de inspiração
O mel do meu coração
Azedou-se e azedou-me

Nenhuma musa indiscreta
Me vem visitar agora
Um estranho silêncio mora
Na minh’alma de poeta

A razão dos meus pecados

Artur Ribeiro / João Maria dos Anjos
Repertório de Maria Valejo


A razão dos meus pecados
Vai nos versos dos meus fados
P’ra quem os saiba entender
Pecados que em mim mantenho
Mas resta saber se tenho
Razão de pecados ter

Estes pecados tão feios
Que nascem nos meus anseios
E morrem nos braços teus
São tão grandes e sem lei
Que quando morrer nem sei
Como contá-los a Deus

A razão dos meus pecados
São teus olhos espantados
A transbordar de paixão
E essa boca bonita
Que quando me beija incita
A pecar meu coração

Eu disse que não

Artur Ribeiro / Carlos Neves *fado tamanquinhas*
Repertório de João Cabral


Eu disse que não à vida
Quando fui duro contigo
A vida ficou sentida
Deixou de me dar guarida
Deixou de contar comigo

Eu disse que não à sorte
Quando te deixei por nada
Agora sigo sem norte
E sem que nada me importe
Até ao fim da jornada

Eu disse que não ao sol
Que nos teus olhos trazias
Apagou-se o meu farol
E a vida pôs-me no rol
No rol das coisas vazias

Eu disse que não ao sonho
Quando parti do teu lado
E foi um não tão medonho
Que deixou assim tristonho
Este arremedo de fado

Pedra solta

António Campos / Carminho
Repertório de Carminho

Não vás à fonte sozinho
Que os rouxinóis do Mondego
Ao ver-te tão coradinho
Ficam em desassossego


Não andes assim descalço
Sendo lindo como és
Há sempre uma pedra em falso
A querer beijar os teus pés

Não tragas tal sol, tal vento
O teu cabelo doirado
Que o vento a todo o momento
Dá-lhe um beijo malcriado

Não passes mais sem olhar
Não passes sempre a correr
Se passas sem me falar
Eu não passo sem te ver

Forcado

Letra de Isidro de Oliveira
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


De calção e meia branca
Com jaqueta de ramagem
Vais ver se um toiro se arranca
Com uma arrancada franca
Levas contigo a coragem

É assim que entras na praça
Bravo moço de forcado
Orgulho da minha raça
Pegas com alma e com graça
É p’ra ti este meu fado

Fazes arte por amor
Não procuras um tesoiro
Forcado que és amador
Com alegria e valor
Bates as palmas ao toiro

Quando surge uma arrancada
Tu não te furtas ao perigo
Levando o corpo e mais nada
A cabeça é abraçada
Como se fosse um amigo

Então o toiro arrancado
Com fúria feroz e cega
Tem na cabeça o forcado
E por fim é dominado
Assim se faz uma pega

Domingo e cafuné

Letra e música de Carolina Deslandes
Repertório de Fábia Rebordão


De todas as coisas que conheço
És a única que sei de cor
Meu lugar onde adormeço
Meu único lugar de amor

Eu vim do outro lado
De um mundo triste de solidão
Onde o todo é um bocado
Um bocado amargo, sem solução

Debaixo da correnteza
Na raiva da maresia
Vim parar à tua mesa
Quem diria
Que debaixo da lama
Na fúria da maré
Vim parar à tua cama
De domingo e cafuné


De todas as coisas que pergunto
És a única que sei responder
Meu único assunto
Meu bem querer

Vim de onde não há calma
A correr para lugar nenhum
De sítios sem cor e sem alma
No vazio do grito e do zum-zum

Meu viver

Jorge Rosa / Francisco Viana *fado vianinha*
Repertório de António Mourão


Não avalia ninguém
O peso da minha dor
Amar-te calando bem
Dentro de mim este amor

A adorar-te a vida inteira
Condenei meu coração
Agora não há maneira
De o livrar dessa prisão

Não duvides do meu querer
Para tal não tens motivo
É p’ra ti o meu viver
E é do teu amor que eu vivo

Mais louco que tu, sou eu
Que vivo a tua loucura
P’ra este errar teu e meu
Não há remédio nem cura

Trama

Vânia Duarte / André Dias e Vânia Duarte
Repertório de Vânia Duarte

Parto a loiça
Parto os pratos, largo a raiva, faço a trama
Que ideia, não me invento
Não comento, é vazio o meu tormento

Estrago a mala, que importa
Tranco a porta de uma vez
Faço como ele fez
Já não há duas sem três

É preguiça ou altivez
A razão, o coração
Canta só o teu refrão
Faz de ti um rei Leão


É de noite
Alguém canta qualquer tom de saudade
Melodias de verdade
São as portas da loucura, liberdade

Vida dura
Rebuliço ou confusão
Faço como ele fez
Já não há duas sem três

Tu és o Deus do meu fado

Letra de João Ferreira Rosa
Repertório de Teresa Tarouca
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


O tempo dantes corria
Que parecia não ter fim
Agora não passa um dia
Sem passar um ano em mim

Disse-te adeus sem saber
Se a minh’alma, à despedida
Fica comigo a sofrer
Ou se vai à tua unida

E ao abrir os olhos meus
Quando triste canto o fado
Olho p’ra ti, vejo Deus
Pois és o Deus do meu fado

Diz-me

Letra e música de Jorge Cruz
Repertório de Fábia Rebordão


Diz-me inquieto, diz-me sem escudo
Diz-me ao perto, diz-me tudo
Diz-me em perigo, diz-me inocente
Diz-me renascido quase o mesmo, mas diferente

Diz-me como um anjo agora
Frágil, gentil comigo
Diz-me que te vais embora
Diz aquilo que eu não digo

Diz que imploras, que te arrependes
Pensaste bem e afinal me compreendes
Lança um incêndio em que eu arda de ternura
Diz inebriado que um amor assim tem cura

Traz um sopro de alegria
Salva-me com um sorriso
Diz-me tudo o que eu queria
Diz aquilo que é preciso

Diz-me sem rodeios, diz intensamente
Certo, sem receios, possa tudo ser diferente
Diz-me em modos brandos ou cego de revolta
Não fiques imóvel à porta


Diz tolice, faz qualquer coisa
Perde o juízo, dá um berro, parte a loiça
Diz que amanhã não será só mais um dia
Agarra-me os braços, adivinha o que eu diria

Prova o bem que me conheces
Sabes o que ninguém sabe
Mesmo longe não me esqueces
Vá, inventa uma verdade

Não sei se morro se vivo

Jorge Rosa / Alfredo dos Santos Correeiro
Repertório de Artur Batalha

Mais que viver, revivi
Cada minuto por ti
Em quantas horas te dei
Perdi da vida o motivo
Não sei se morro, se vivo
Sem ti, já nem de mim sei

Grito o teu nome onde passo
E sinto que me desgraço
Agarrado a uma lembrança
Persegue-me a tua imagem
E sigo atrás da miragem
Que o meu braço não alcança

Se alguém não tivesse ainda
Inventado essa tão linda
Palavra que diz: Saudade
Era eu, quase apostava
Que essa palavra inventava
Na tristeza que me invade

Andorinhas

Pedro Má Fama / Ana Moura
Repertório de Ana Moura


Passo os meus dias em longas filas
Em aldeias, vilas e cidades
As andorinhas é que são rainhas
A voar as linhas da liberdade

Eu quero tirar os pés do chão
Quero voar daqui p'ra fora
Ir me embora de avião
E só voltar um dia
Vou pôr a mala no porão
Saborear a Primavera
Não me esperem na estação
Um dia disse uma andorinha


Filha, o mundo gira
Usa a brisa a teu favor
A vida diz mentiras
Mas o sol avisa antes de se pôr

Eu quero tirar os pés do chão
Quero voar daqui p'ra fora
Ir me embora de avião
E só voltar um dia
Vou pôr a mala no porão
Saborear a Primavera
Não me esperem na estação
Já a minha mãe dizia


Solta as asas, volta as costas
Sê forte, avança para o mar
Sobe encostas, az apostas
Na sorte, não no azar

O candeeiro

Letra de João de Freitas
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


A minha rua é estreitinha
Tem um candeeiro ao fim
Que abre os olhos à noitinha
E fica a olhar p’ra mim

Quando a rua está deserta
Quando a madrugada vem
Está o candeeiro alerta
P’ra ver se lá vem alguém

E por demais é sabido
Que eu não posso dar um passo
Sem que aquele atrevido
Não veja sempre o que eu faço

Está sempre de pé atrás
Se vou à porta ou janela
O candeeiro é capaz
De se pôr de sentinela

A porta sei que se cala
A janela é de bons modos
Mas se o candeeiro fala
Ando na boca de todos

Fado verdade

Fernando João / André Teixeira *decassílabo da Leonor*
Repertório de Leonor Santos


A vida é mensageira da saudade
O tempo traz o fim da solidão
A força do amor está na verdade
Oue faz bater mais forte o coração

O remorso vem sempre após o erro
O perdão muitas vezes chega tarde
Se o errar é humano e eu também erro
É porque sou humano e sou verdade

O tempo concedido p'ra viver
Caminha mão na mão com o passado
Se a ambição deitar tudo a perder
A humildade fará sombra ao pecado

Neste mundo que está por descobrir
Desejo que o bom senso prevaleça
E vou passar o tempo a sorrir
A quem uma afeição minha, mereça

Chaga de sol

Letra de João Fezas Vital
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Despi teu corpo, deixei-o
Ser campo ao sul e ser mar
Ser caule de seiva cheio
E noite quase a chegar

E foste quase ternura
Vinho claro, amanhecer
Mãos de fogo em água pura
E verdade até morrer

E foste quase gaivota
No espaço que nos faltou
Asas da nossa derrota
E do frio que ficou

Agora, de ti, nem o espanto
Nem a raiva, nem a dor
Teu corpo, chaga de sol
É meu frio… e foste amor

Contos e ditos

Fábia Rebordão / Pedro Rodrigues dos Santos
Repertório de Fábia Rebordão


Tu e ela não falavam
Mas ainda namoravam
Coisas de contos e ditos
Disseram-te que ela lá estava
E que de outro gostava
Chegou-te logo aos ouvidos

O café da rua ao lado
Nem era mal frequentado
Todos diziam que não
Diziam que quando lá ia
Só ia durante o dia
P’ra se encontrar com o João

Tu temias o pior
Porque lhe tinhas amor
Não querias acreditar
No que ela se tinha tornado
Tu ficaste incomodado
Custou-te muito a aceitar

Um dia foste atrás dela
Espreitaste pela janela
No café, estava o João
Vestiste o teu melhor fato
Viste-a entrar com recato
Apenas p'ra comprar pão

Sonho sereno

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Naquela noite o luar
O silêncio, o murmurar
Tudo me fala de ti
Sopro ou brisa, vento ameno
Foi esse sonho sereno
Que nessa noite vivi

Quando as roseiras florirem
E os malmequeres cobrirem
A campina toda em flor
Iremos pelas estradas
Seguiremos de mãos dadas
O trilho do nosso amor

Aos poetas dos meus fados

*Nós somos culpados*
Artur Ribeiro / Carlos Neves *fado tamanquinhas*
Repertório de Zélia Lopes

Eu choro de vez em quando
E rio quando há razão
Nos fados que vou cantando
Eu vou rindo e vou chorando
Conforme te vejo ou não

Se canto o fado mais triste
E tu entras de surpresa
Minh’ alma ao riso resiste
E no meu peito (a) persiste
O mesmo ar de tristeza

Mas se canto o Mouraria
E sais sem dizer adeus
Embora seja alegria
O que o meu rosto irradia
Há pranto nos olhos meus

Aos poetas dos meus fados
Perdão por nós vou pedir
Pois só nós somos culpados
De andarem desencontrados
Seus versos (b) do meu sentir

a) No poema original lê-se rosto e não peito
b) No poema original lê-se fados e não versos

Amor sem trono

Fernando João / Júlio Proença *fado proença*
Repertório de Leonor Santos


Noite escura, noite triste
Noite chorando a pureza
Do dia que não vivi
No silencio que persiste
Sou poema sem beleza
Só porque vivo sem ti

Noite que vem longa e calma
Marcando com desespero
A fronteira do meu sonho
A dor que me vai na alma
Faz-me sentir que não quero
O dia que vem tristonho

Vou ficar ao abandono
Nesta noite em que o amor
Passa sem olhar p'ra mim
Meu amor é rei sem trono
E o sal do meu calor
É uma paixão sem fim

Domingo na Mouraria

Letra de Jorge Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


No quase nada que resta
Da velhinha Mouraria
Há um Domingo de festa
Tão puro e sem fantasia

É quando Nossa Senhora
Sai a dar o seu passeio
Por entre o povo que a adora
E faz da fé seu recreio

Alfazema e rosmaninho
Perfumam o ar e o chão
Reza-se o fado baixinho
Canta-se alto uma oração

E pelos recantos sujos
Da Moirama, da Severa
Há mais tropa, mais marujos
E Maio é mais Primavera

Classe

Conan Osíris / Francisco José Marques *fado zé negro*
Repertório de Ana Moura

Que eu caia de uma cadeira
Da escada, d' uma ladeira
Se eu me esqueci de estudar
Cada palavra certeira
Cada gestinho e maneira
Que usas p’ra me arreliar

E que eu morra aqui viúva
Seca que nem passa d’uva
Se alguma vez revelei
No teste que fiz à chuva
Calçaram como uma luva
Os lábios que ali beijei

Toda a flor em ti floresce
Toda a raça, toda a prece
O regaço laça o enlace
Ai se a tua avó soubesse
O sabor dessa benesse
De passar a quarta classe

As flores podem murchar
A minha terra rachar
Do Algarve até ao Minho
Eu hei-de sempre cantar
Nunca havia de chumbar
Na classe do teu beijinho

À partida

Letra de Manuel de Andrade
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Estava a cidade despida
Estavam meus braços caídos
Estava negra, negra a vida
Mais negros os meus sentidos

Perdido na multidão
Teu lenço branco acenava
E o meu pobre coração
Branco, mais branco, ficava

Teu riso, quase chorava
Teus olhos, esses não li
Teu olhar tão longe estava
Tão longe que nem o vi

À partida como à morte
Tudo se torna diferente
Já não há tempo que importe
Importa partir, somente

Contrato

Letra e música de Fábia Rebordão
Repertório da autora

Controvérsias e conversas
Estamos sempre às avessas
Não vou por ali
Tu dizes: "tens de ir”
Se pequeno ou grande
Se eu disser que "até depende”
Se o que quero ou não quero
És tu a decidir

Sempre, só desculpas
Subtilmente pões-me as culpas
E ocultas a verdade p'ra me confundir
Dizes que a razão está ao teu lado
Pois então pontuas a conversa "ponto"
Sem sequer me ouvir

E assim segue o desfecho sempre igual
Da história que sem história é o teu papel
Sem ter qualquer definição moral
Que o preço a pagar é tão cruel


Mas este contrato não tem termos vitalícios
E acredita que os indícios dão em rescisão
A cláusula três dizia que
De quando em vez devias pensar nos porquês
Porque nem sempre tens razão

A rua onde ninguém mora

Artur Ribeiro / Cavalheiro Júnior *fado porto*
Repertório de Renato Mota


A rua onde ninguém mora
Duma cidade perdida
Num país por descobrir
É o que me lembra agora
Este arremedo de vida
Que tu deixaste ao partir

Este ficar acordado
No meu quarto de ti cheio
A ver o tempo passar
Este arremedo de fado
Que num murmúrio, eu trauteio
Mas nunca chego a cantar

E enquanto a minha razão
Grita razões que eu aprovo
Para não ver-te jamais
Este doido coração
Tanto quer ver-te de novo
Como não quer ver-te mais

Maldita dor

José Fernandes Castro / André Teixeira *fado guilherme*
Repertório de Leonor Santos


Oh maldita dor que marcas presença
Trazendo a amargura violentamente
Causadora-mor da dor mais intensa
Que deixas escura a alma da gente


Sabemos que tens a vil crueldade
Usada a destempo de forma mordaz
E sempre que vens roubar felicidade
Trazes o tormento que tanto mal faz

Oh maldita dor, vai-te lá embora
E deixa comigo a minha verdade
Eu quero supor que a alma só chora
Porque tem consigo a luz da saudade

O fado que nos encanta

Letra de João de Freitas
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

O Fado que nos encanta
Tem por lema este ditado
Tão fadista é o que canta
Como o que aprecia o Fado

O Fado que nos encanta
A mais linda das canções
Quando sai duma garganta
Entra em nossos corações

E na saudade que encerra
Tem por lema este ditado
Quanto mais longe da Terra
Mais se torna desejado

E se uma voz se levanta
Num verdadeiro ambiente
Tão fadista é o que canta
Como quem o ouve e sente

Porque às vezes – notem bem
O cantador mais louvado
Não sabe sentir tão bem
Como o que aprecia o Fado

Sozinha lá fora

Letra e música de Ana Moura
Repertório da autora


Se deixar o coração de fadista falar
Vou pedir-te que venhas agora
Mas tarde, lembro que pode matar
E eu não quero ficar mais sozinha lá fora

Não quero ficar sozinha lá fora
Mas lanço-me e apresso a hora
Não quero ficar sozinha lá fora
Quero acalmar este peito que chora


Quem vem salvar-me quando me deito
No pranto que agoniza o meu canto
Talvez seja Pedro e entretanto
As mãos em cruz sobre o peito
Das mãos de Deus tudo aceito

Talvez que eu morra lá fora
Talvez que eu morra entretanto
Não quero ficar sozinha lá fora
Quero-me na luz do meu canto

Talvez que eu morra lá fora
Talvez que eu morra entretanto
Não quero ficar sozinha lá fora
Vem que é já hora e eu canto

Tenho um encontro marcado

Letra de João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Tenho um encontro marcado
Com o sol do fim do dia
Mais um dia, mais um fado
P’ra me fazer companhia

Céu azul, branco e dourado
De beleza e fantasia
O Tejo iluminado
Resplendor da agonia

Vejo Sintra, vejo os montes
Vejo Lisboa encantado
Recordo o cantar das fontes
Quando estavas a meu lado

Arco-íris deslumbrante
Tão vivo eu nunca vi
E nesse preciso instante
Tive saudades de ti

Ai isso era saberes demais

Rui Rocha / Miguel Rebelo
Repertório de Fábia Rebordão


Ai isso era saberes demais
Nem pouco te hei-de eu contar
Não vou falar nem dissimular bem
Isso era saberes demais
Não revelar nem te segredar bem
Isso era saberes demais


Contam-me histórias sem verdades
Queres saber?
De quem só sofre de saudades
Sem sofrer
Da velha feira das vaidades
Que irá ter
Mil bancas cheias de ansiedades

Contam-me enredos de novelas
Sem guião
E das meninas às janelas
Na canção
Que o fado escorre nas vielas
Por condão
E já fumegam as tigelas

Já sei que o homem descartou
O que aprendeu
E a tristeza até chorou
Quando nasceu
Que o tempo esquece que parou
Porque correu
E nem ele próprio reparou

Já sei que queres que eu te diga
Finalmente
A vida é breve na intriga
Simplesmente
Que a sorte existe e nos obriga
Estando ausente
A ser assim como a formiga

Não me apoquento nem te sobressalto
Bendito seja o domingo
E o passeio costumeiro
Não me perguntes sem que eu te responda
Entre ti e o final
Esta história acaba mal
Não queiras saber demais

Denunciar nem me declarar bem
Isso era saberes demais
Manifestar nem te conjurar bem
Isso era saberes demais
Me desviar nem me lastimar bem
Isso era saberes demais

Desabafos

Letra de João de Freitas
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado
Publicada no jornal Guitarra de Portugal, de Setembro de 1945
com dedicatória ao prezado amigo Óscar Silva Tavares.

Conta só à minha mãe
Coração, o teu amor
Não contes a mais ninguém
Podem rir da minha dor


Se não podes mais, desata
O nó que a apertar-te vem
E o martírio que te mata
Conta só à minha mãe

Tens um segredo guardado
E passas horas de horror
Se é sem esperança, desgraçado
Coração, o teu amor

Sufoco os ais na garganta
E aconselho-te, meu bem
Se contares àquela santa
Não contes a mais ninguém

Das más línguas tenho medo
Coração, mostra valor
Se não guardas teu segredo
Podem rir da minha dor

Palma

David Mourão-Ferreira / Carminho
Repertório de Carminho


Lisas, as costas da mão
Cerrada, rugosa, a palma
Teu corpo deixou-me a alma
Na sombra da confusão

Lisas, as costas da mão
Mas por dentro, mas por dentro
Que labirinto sangrento
As unhas encontrarão

Ai… quando a palma se alcança
Ai… quando a alma se acalma
Na superfície da palma
Que sorrisos de criança

Ai… quando a palma se alcança
Logo no dorso da mão
Veias, nervos, mostrarão
Inquietação, desesperança

Velho Bairro Alto

Fernanda de Castro / Daniel Gouveia
Repertório de Daniel Gouveia

Bairro Alto… até a lua
Já sabe cantar o Fado
Cada pedra, cada rua
Tem o seu nome gravado

Janelas do Bairro Alto
Canários e sardinheiras
Roupa branca a esvoaçar
Como pombas ou bandeiras

Ó meu bairro, Bairro Alto
Dos garotos dos jornais
Dos fadistas, das guitarras
Dos pregões e dos pardais;
Bairro Alto sempre novo
Dos fidalgos e do povo


As casas do Bairro Alto
Mesmo as feias, são bonitas
Pois todas parecem feitas
De retalhinhos de chita

E as janelas e postigos
Com seus vestidos de cassa (a)
Parecem dizer adeus
A toda a gente que passa

(a) tecido transparente de linho ou algodão

No fim

*Mentir por nós é amor*
Diogo Clemente 
Carlos Simões Neves *fado tamanquinhas
Júlio Proença *fado proença*
Repertório de Sara Correia

Não penses que não te vejo
Ou tão pouco és indiferente
Fico e suspendo o desejo
Imagino a dor e o beijo
Mesmo aqui à minha frente

Muitas vezes sem que visses
Eu cantava p’la cortina
Nas horas em que passavas
Talvez se um dia ouvisses
Ia ver-te ao fim da esquina
Rua abaixo onde moravas

Por muito que me afastasse
O destino é de quem ama
Rasga-me a alma, perder
Nunca pedi que te amasse
O amor é que me chama
Sempre que quero esquecer

É a vez de nos olharmos
Aqui me tens para ti
Mentirei se nos beijarmos
Acredito que ao jurarmos
Rompi o medo e menti

Saltei contigo à fogueira

Letra de Artur Soares Pereira
Desconheço se esta letra foi gravida
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Saltei contigo à fogueira
Na noite de São João
Numa ingénua brincadeira
Queimei o meu coração


No nosso beco enfeitado
Deu-se um dia um bailarico
Onde o cheiro a manjerico
Andava por todo o lado
Para ser mais animado
O baile, encheu-se um balão
No meio dessa animação
Eu, alegre e prazenteira
Saltei contigo à fogueira
Na noite de São João


Aquilo é que foi dançar
Até ao romper do dia
Eu nem sequer compreendia
Que te começava a amar
Depois do baile acabar
É que eu voltei à razão
E vi que, nessa função
Sem saber de que maneira
Numa ingénua brincadeira
Queimei o meu coração

O fado é eterno

Fernando João / Franklim Godinho
Repertório de Leonor Santos


Não me venham cá dizer
Que esta prece morrerá
O fado não vai morrer
Enquanto eu andar por cá

O fado, canção dolente
Não se pode ignorar
É a voz de toda a gente
Que diz a vida a cantar

Não canto só fado antigo
Mas também o atual
Os dois eu trago comigo
Pois ambos são Portugal

Por isso esta verdade
Direi hoje e amanhã
O fado não tem idade
Portanto não morrerá

Voltei à vida

José Fernandes Castro / Júlio de Sousa *fado loucura*
Repertório de Lúcio Bamond


Estou aqui
Votei à vida
Voltei p’ra continuar
A ser o que quero ser
Estou aqui
De voz erguida
Se nasci para cantar
A cantar quero viver

Venci o medo que me trazia amarrado
E me dizia que o fado
Que era meu, ia ter fim
Venci as dores da alma que Deus me deu
Agora olho p’ró céu
Porque o céu olha por mim


Estou aqui
De corpo inteiro
O meu tempo derradeiro
Tem o destino p’la frente
Estou aqui
Na minha praia
Sou onda que não desmaia
Nem se perde na corrente

Sorri Alfama

Letra e música de Carlos Leitão
Repertório de Vânia Duarte


Fechei a porta, deitei fora a chave antiga
Fiz-me ao caminho, p’ra ver Lisboa daqui
Senti que Alfama não me dava só guarida
Dava-me à luz, como o sol se dá aqui

Não há pregões nem há canoas por cantar
É outra coisa, menos dor, mais alegria
Se eu quis Alfama p’ra sorrir e para amar
É- porque Alfama canta o fado todo o dia

Sorri Alfama e vem brincar
Que os meus dois putos querem ser a tua rua
Sorri, Alfama, que o sol nasceu
E quer ser teu como a saudade é sempre tua
Sorri, Alfama se a noite acaba
E a fadistice já tem horas p’ra dormir
Sorri, Alfama, queres acordar
Trago os bons dias p’ra te dar sempre a sorrir

Se amanhã eu me despir

Letra de João Fezas Vital
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Se amanhã eu me despir
De encontro ao frio da cidade
E alguém me descobrir
Aonde dói a verdade;
És tu, amor, a vestir
O meu corpo de saudade

Se amanhã me ouvires gritar
À janela de te ver
É que a vontade de amar
Me faz ter medo de ser;
Como quem vai a afogar
Mesmo antes de nascer

Se amanhã vier descalço
P’los caminhos do amor
É porque perdi os sonhos
A sorrir à minha dor;
Se amanhã vier descalço
Não me deixes, por favor

Meu Fado de hoje e de sempre

Letra de José Fernandes Castro e Mónica Costa
Música de Raúl Portela *fado magala*

Com a voz que Deus me deu
Eu canto de olhar fechado
Guitarras são o meu céu
Sopro profundo do fado

Enquanto o meu xaile dança
Minha alma esquece tudo
Eu pareço uma criança
De coração tão desnudo

Canto e choro de contente
Enquanto o xaile bailar
Dou-me toda inteiramente
O meu é destino cantar

Fado de ontem, fado de hoje
Redenção, alento e puro
Enquanto o tempo não foge
Faço valer o futuro

Com a voz que Deus me deu
Eu canto de olhar cerrado
Ao dar aquilo que é meu
Sinto bem que sou do fado

Que da voz te nasçam pombas

Letra e música de Pedro Abrunhosa
Repertório de Sara Correia


Dizem que o meu fado é triste
Mão vazia desencontrada
Triste adeus este que existe
No beijo que não pediste
Tua voz amortalhada

Coração parou de espanto
Por outrem despedaçado
Foi no cais onde me viste
Contra o chão de peito em riste
Dizem que é triste o meu fado
Dizem que é triste o meu fado

Que da voz te nasçam pombas
Cresça luz onde houver sombras
Pode ser alegre ou triste
O teu fado em mim resiste
Que da voz te nasçam pombas


Dizem que é triste o meu fado
Na distância do teu beijo
Na dor de um quarto fechado
Um quarto ainda lembrado
Do teu corpo que não vejo

Barco que levas meus ais
Num balanço de ternura
Olhos que não voltam mais
Meu fado para onde vais
Deixa em mim esta loucura
Deixa em mim esta loucura

Meu coração

Letra de Isidoro de Oliveira
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fad
o

Ansiedade vivida
Em busca dum grande amor
Eu sigo à toa na vida
Entre a tristeza e a dor

Vontade de Deus, que quero
Guardar no meu coração
É da sua mão que espero
Receber a salvação

Meu coração, sem que eu queira
Andas de amor à procura
Andas sem eira nem beira
E já ninguém te segura

Não mando em ti, coração
Que mudas constantemente
Vais de paixão em paixão
Julgas ser independente

Independente não és
Não és tu, nem é ninguém
Entre ventos e marés
Nós dependemos de alguém

Onde vais, sempre a fazer
Teus erros, pecados meus
Pára, deixa de bater
Deixa que eu parta p’ra Deus

Marcha de Alcântara de 1969

José da Silva Nunes / Jorge d’Ávila
Repertório de Carminho


Meu par gingão é refilão judeu
Mas no amor é o melhor
Que Alcântara tem de seu
Alcântara vê o Tejo aos pés
Que vem ao mar e anda a bailar
No vaivém das marés

Cantar e rir, não há melhor p'ra mim
E notem bem, feliz de quem
Sabe viver assim
Venham ver para depois contar
Como eu cá sou feliz
Com o meu par

Alcântara vai com a cantiga que apregoa
Na melhor marcha que tem Lisboa
Deixem passar, sim
Porque Alcântara quando passa
Traz na alma doce e calma
E o valor da nossa raça

Parai, olhai, que Alcântara vai cantar
Lindas canções
Com mil balões para atirar ao ar
Venham cá ver o bairro audaz
Que nos seduz e encheu de luz
O balão que hoje traz

Alcântara vem, se queres viver e amar
Não digas não que ao coração
Sabe-lhe bem cantar
Venham ver a marcha popular
Que traz meu coração a palpitar

Tenho uma pedra encarnada

Letra de João Ferreira Rosa
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Tenho uma pedra encarnada
Que me deram em menino
Que é a prova mais provada
Do amor do meu destino

Melhor que as rocas de prata
P’ra calar o meu chorar
Quando no berço gritava
E me não queria calar

Ao colo de minha mãe
Aquela pedra encarnada
É verdade lembro bem
Como com ela brincava

Estava na mão de meu pai
Que minha mãe enlaçava
De pequeno, sei também
Como ela me encantava

A Marcelina

Raquel Tavares e Vânia Duarte / Raquel Tavares *fado primeiro*
Repertório de Vânia Leal

Na esquina da minha rua
Já morou a Marcelina
Vivia histórias de amor
Emprestadas à menina

Ao destino deu a vida
No pecado quis ficar
Pudesse ela escolher
Outra história p’ra contar

Ficou só ela e o fado
E a vontade de o cantar
P’la janela trauteava
Recados que qu’ria dar

A menina foi mulher
Deu à dor o coração
Só nos seus versos vivia
As horas de solidão

Disse adeus à Marcelina
E ao nada que era seu
Deixou saudades à rua
E à menina que era eu

Desde que tu partiste

Carminho / Joaquim Campos *alexandrino*
Repertório de Teresa Siqueira


Desde que tu partiste eu não voltei à casa
Aonde eu fui criança, aonde fui feliz
Desde que tu partiste, trago a memoria baça
Regresso com a lembrança do que alguém me diz

Dizem-me cores transparentes duma lareira acesa
Contam ser das amoras, o cheiro desses meses
Memórias são sementes, promessa de algo inteiro
Mas são esperas e horas que morrem muitas vezes

Não recordo a saudade, porque a distância destrói
A casa onde viveste, eu já não lembro por fim.
Mas p’ra dizer a verdade, aquilo que mais me dói
Desde que tu partiste, é não me lembrar de mim

Amor mudo

Mote popular / Glosa de Artur Soares Pereira
Desconheço se esta letra foi gravada
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível

Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado


Mote popular
Não fales, faz-me sinais
Por causa da minha mãe
Os mudos também não falam
E entendem-se muito bem


Nós namoramos, é certo
Sem licença dos meus pais
Quando houver alguém por perto
Não fales, faz-me sinais

Sei que há outras raparigas
Que gostam de ti, também
Comigo não quero intrigas
Por causa da minha mãe

Se nos virem a falar
As más línguas não se calam
Quando estão a namorar
Os mudos também não falam

Calamos a nossa voz
Se perto estiver alguém
Os olhos falam por nós
E entendem-se muito bem

A mesma canção

Letra e música de Fábia Rebordão
Repertório da autora


Se eu viver p'ra ti
Como tu vives p'ra mim
Quem dança a mesma canção
É feliz até ao fim


Para quê ferir amores
Quando o laço é tão mais forte
Partilhámos tantas dores
Juntos demos com o Norte

Das palavras que dissemos
Boca fora sem querer
Não é dito o que sentimos
É só dito por dizer

Quando o amor é amor louco
E por mal de amor se morre
Se outro amor não nos socorre
Por amor se morre um pouco

Só quero viver de ti
Para ti, e por ti ser
Alma gémea, flor aberta
Que renasce e quer viver