Desgarrada escrita para o espetáculo de Maria João Quadros
no Coliseu dos Recreios, Lisboa, interpretada por Maria João Quadros
António Pinto Basto, Celeste Rodrigues, João Ferreira-Rosa, Lenita Gentil
Vicente da Câmara, Tereza Siqueira, Ada de Castro e Peu Madureira.
O fado quando se canta
Faz tais contas com a vida
Que o coração se adianta
Esquecendo a própria batida
Guitarras pedem ao fado
O que o fado não lhes dá
E o fadista já cansado
E o fadista já cansado
Canta essa dor que não há
O fado quando se chora
O fado quando se chora
É um segredo tão triste
Que a saudade vai-se embora
Que a saudade vai-se embora
E finge que não existe
Mas quando nós nos perdemos
Mas quando nós nos perdemos
O fado encontra a razão
Que junta o que não vivemos
Que junta o que não vivemos
Aos dias que não virão
O fado quando é sentido
O fado quando é sentido
É uma dor que se lavra
Tendo por norte o Corrido
Tendo por norte o Corrido
E por bandeira a palavra
Faço caber um país
Faço caber um país
Nas quadras do Mouraria
Onde me sinto aprendiz
Onde me sinto aprendiz
De tudo o que já sabia
O fado quando se inventa
O fado quando se inventa
Descobre dentro de nós
Que quando a alma se ausenta
Que quando a alma se ausenta
De pouco nos serve a voz
Mas quando a alma é fadista
Mas quando a alma é fadista
Não faz dif’rença a idade
Há fado a perder de vista
Há fado a perder de vista
Dentro da nossa saudade
O fado quando se sente
O fado quando se sente
Percebe que a tradição
É uma alma descrente
É uma alma descrente
Das coisas que tem à mão
No fundo só acredita
No fundo só acredita
Naquilo que não se vê
Ora segreda ora grita
Ora segreda ora grita
Mas nunca sabe porquê
O fado quando se agarra
À barra do meu vestido
Pede às cordas da guitarra
Que dedilhem o Corrido
E como a alma vigia
O fado quando se agarra
À barra do meu vestido
Pede às cordas da guitarra
Que dedilhem o Corrido
E como a alma vigia
O que a dor sabe de cor
Confesso no Mouraria
Confesso no Mouraria
O que calo no Menor
O fado quando se reza
Fala da fé que não tem
O passado que lhe pesa
É que o liberta também
Guitarras, versos, saudade
O fado quando se reza
Fala da fé que não tem
O passado que lhe pesa
É que o liberta também
Guitarras, versos, saudade
Numa tristeza infinita
São a mais santa trindade
São a mais santa trindade
Em que um fadista acredita
Mas se o fado ao ser cantado
É Deus, pátria e é destino
Também quero ser do fado
E fazer dele o meu hino
Dá-me o braço anda daí
Mas se o fado ao ser cantado
É Deus, pátria e é destino
Também quero ser do fado
E fazer dele o meu hino
Dá-me o braço anda daí
Não faças figuras feias
Desde o dia em que te ouvi
Desde o dia em que te ouvi
Sei que tens fado nas veias