Henrique Rego / Popular *fado das horas*
Repertório de Alfredo Marceneiro
De ferro três tabuletas
Todas três números seguidos
Dizem: eternas moradas
Desses três na morte unidos
Vindos do espaço sidéreo
Os ventos fortes, agrestes
Açoitavam os ciprestes
Do pequeno cemitério;
Envolta em denso mistério
Mais triste que as violetas
Uma pobre, em vestes pretas
Parou junto dos covais
Que só tinham por sinais
De ferro, três tabuletas
Interrogou o coveiro
Se em certo dia atrasado
Ali tinha sepultado
Um famoso cavaleiro;
Respondeu-lhe o triste obreiro
Com modos desiludidos
Foram três desconhecidos
Que eu nesse dia enterrei
E as jazigas numerei
Todas três, números seguidos
E a pobre, louca de dor
Chorando silenciosa
É qual márter dolorosa
Junto à cruz do redentor;
Com carinho e com amor
Olha as campas desprezadas
E às placas levantadas
Interroga-as mudamente
Mas as três chapas, somente
Dizem: eternas moradas
Sem saber qual sepultura
Pertence ao seu filho amado
De olhar triste e magoado
Beija a terra negra e dura;
Inundada de ternura
Em torturantes gemidos
Com gestos por Deus ungidos
Repartiu as flores suas
P’las campas rasas e nuas
Desses três na morte unidos
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia
Livro *Poetas Populares do Fado-Canção*
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia
Livro *Poetas Populares do Fado-Canção*
Por uma vez, H. Rego refere algo de tauromáquico.
É em «Três Tabuletas», quando se percebe que era de «um famoso cavaleiro»
a sepultura que sua mãe buscava.
De novo uns laivos de romantismo tardio e alguma erudição na descrição do cenário
«vindos do espaço sidéreo / os ventos fortes, agrestes / açoitavam os ciprestes».
De notar, também, a fluidez da narrativa, numa aparente impressão de facilidade
a coloquialidade do discurso (se esquecermos o «espaço sidéreo» e a «marter dolorosa»)
como se de prosa se tratasse e como se as rimas acontecessem por acaso.
São as regras de ouro das letras de Fado, desta vez cumpridas com superior mestria: