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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.330' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

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Coisas do nosso amor

Mário Raínho / Francisco J. Marques *fado zé negro*
Repertório de Maria Armanda

Dei à noite a minha voz
Contei-lhe coisas de nós
Fiz da noite, companheira
Mas a noite inconsciente
Foi contar a toda a gente
Do nosso amor, a maneira

Até ao vento contou
Que o nosso amor começou
Na ternura de um olhar
Como se fosse um recado
Correu o vento, apressado 
Foi falar de nós, ao mar

O mar contou esta trova
Ao luar, à lua nova 
Às estrelas e a Deus
E o nosso amor, agora
É cantado a toda a hora 
Até no reino dos céus

Cuidei que tinha morrido

Pedro Homem de Mello / Alain Oulman
Repertório de Amália Rodrigues

Ao passar pelo ribeiro
Onde às vezes me debruço
Fitou-me alguém corpo inteiro

Dobrado como um soluço

Pupilas negras tão lassas
Raízes iguais às minhas
Meu amor quando me enlaças 
Por ventura as adivinhas

Que palidez nesse rosto 
Sob o lençol de luar
Tal e qual quem ao sol posto 
Estivera a agonizar

Deram-me então por conselho 
Tirar de mim o sentido
Mas depois vendo-me ao espelho 
Cuidei que tinha morrido

Quando por fim amanhece

Pedro Assis Coimbra / David Zacaria 
Repertório de Joana Amendoeira

Quando por fim amanhece
E Lisboa se desperta
É que os teus olhos perfeitos
Batem às janelas dos meus

Os dedos finos ainda não voltaram
E como o fado está à minha espera
Uso as metáforas do povo
E deixo a ternura rimar


Permaneço por isso distante
Longe de ti, longe dos maus
Bem perto do coração do vento
De toda a alegria da minha canção


Sim, porque no Tejo de todos
E nos lábios dos amantes
Navega um barco do pensamento
Feito em fogo, desfeito em luz

Porquê a verdade à noite

Silva Ferreira / Jaime Santos Jnr 
Repertório de Ricardo Ribeiro 


Porquê dizer agora o que não quero
Porquê falar agora do passado
Porquê tentar agora ser sincero
Porquê falar falar de amor em mais um fado

Rasgar a tua noite com verdades
Porquê se as estrelas são mentira
E as penas com que escrevem a saudade
São setas que o ciúme ainda me atira

Porquê esperar agora como espero
Que voltes a deitar-te a meu lado
Porquê dizer agora o que não quero
Porquê falar agora do passado

Lisboa no coração

João Monge / Bernardo Sassetti
Repertóriio de Joana Amendoeira

Gosto da tua ternura
Da maneira de abraçar
Do teu jogo de cintuta
Nem vale a pena falar

Gosto de ti como és
Feita para regressar
A fingir que não vês
Despida até aos pés
Deitada á beira mar


Garota do Bairro da Bica 
Morena da madragoa
De perna ao léu em Benfica 
Mulata de Lisboa
Menina das avenidas 
Garina do Conde Barão
Mulher de muitas vidas 
Lisboa no meu coração

Este meu amor secreto

Manuel Carvalho / Pedro Rodrigues *fado primavera*
Repertório de Amélia Maria


Este meu amor secreto
Vive tão longe e tão perto
Faz minha vida em pedaços
Mas de tão lindo e profundo
Eu sinto que tenho o mundo
Quando ele está nos meus braços

Um dia se não o vejo
A saudade e o desejo 
Vão aumentando em meu peito
Eu vivo nesta ansiedade
E esta cumplicidade 
Traz minha vida sem jeito

Estendo o braço na cama
Mas o frio não me engana 
O meu peito é um deserto
E com ele quando sonho
Muitas vezes eu suponho 
Que está comigo tão perto

Seu beijo é bebida
Que sacia a minha vida 
Na sede do meu afeto
É tão doce e sublime
Que de tão puro redime 
Este meu amor secreto

Profissão mulher

Rui Manuel / Carlos Macedo
Repertório de Carlos Macedo


Só tu sabes fiar dias sem hora
Numa roca de cansaços
Erguer quatro paredes no teu mundo
Com o linho dos teus braços

O mundo é a tua casa e deve ter
Alicerces tão profundos
Que não te sobra tempo p’ra saber
D’outros mundos que há lá fora

Dona de casa
Quantas rugas tem o ano
A noite insiste em dizer 
Que só dormes por engano

Dona de casa 
E dona da solidão
Que te vê envelhecer 
Entre a cama e o fogão

Dona de casa 
A quantos queiram saber
Qual a tua profissão
Responde; apenas mulher

Os teus silêncios são gritos do amor
Que não fazes mas consentes
E as lágrimas que escondes são o berço
Duma espera permanente

Ninguém te diz que é teu o coração
Que sustenta o universo
E a terra se desloca em rotação
Porque gira em teu redor

O pão das palavras

Pedro Assis Coimbra / Pedro Pinhal
Repertório de Joana Amendoeira


Vem meu amor, vem até mim
Traz-me manhãs claras no pão das palavras
E os afluentes da musica nas açucenas dos lábios

Vem meu amor, vem até mim
Traz-me tardes de sol nas janelas dos dedos
E as cinzas mornas do fogo no forno das carícias

Vem meu amor, vem até mim
Traz-me noites secretas no teu sorriso de cetim
Lareira da minha alegria, da nossa canção sem fim

Vem meu amor
Vem comigo... vem por mim

Condição

Diogo Clemente / Paulo Loureiro
Repertório de Ana Laíns


Parti com as horas e a razão
Cheguei, mais um adeus, mais uma vez
Porque há-de ser maior 
Que a angústia o meu perdão
Porque hei-de estar sempre 
Na soma que Deus fez

Parti, já sem longe, sem olhar
Cheguei com olhos d’água á tua mão
No fundo, nada tem a casa por esperar
E deixo o frio a dor e as roupas pelo chão

Depois, pouco mais que um Outono
Vem p’ra ficar sobre mim
Sei de cor esta entregue à noite vã
Meu amor, somos barcos de outro mar
Nós morremos devagar
E nascemos p’la manhã

Parti do teu mundo e como vês
Aqui me tens inteira por te amar
Sou como a beira-mar 
Do Inverno e as marés
Que vão e voltam sempre 
À areia, sempre ao mar

Esta saudade não quer partir

Letra e musica de Samuel Lopes
Repertório de Ana Laíns


Se ao acordar chamasse por ti
E o eco do quarto não soasse assim
Os muros da saudade que não parti
São hora de silêncio que vivem sem mim

Esta inocência tarda em abalar
A fragilidade não se quer quebrar
E a incerteza que me faz procurar
O rasto deixado pelo teu olhar

Esta saudade não quer partir
Os meus sentidos não a deixam ir
Esta saudade que me quer seduzir
Invade o meu corpo qe espera por ti

És a poesia que me dá prazer
E a medalha que canto sem querer
A cumplicidade ao amanhecer
És a loucura que me faz viver

Fado de um amor que ficou

João Monge / Paulo Paz
Repertório de Joana Amendoeira

Bem sei que tinhas os olhos no mar
Quando te via chegar
Com a camisa engomada
Bem sei que procuravas o jeito
Que eu tenho, de abrir o peito
Quando não querias mais nada

Trazias uma flor na lapela
E eu espreitava à janela
Quando te ouvia chamar
Trazias a lua no teu sorriso
Trazias aquilo que era preciso
Para te deixar entrar

Quem sabe as juras que nós fizemos
A estrela que prometemos
Um ao outro, noite fora
Quem sabe porque cegou essa estrela
Se não voltarmos a vê-la
Quem sabe de nós agora

Eu guardo no fundo do coração
Que o amor é só perdão
E um sonho em duas metades
Eu guardo tudo o que deixaste em mim
Desde sempre, até ao fim
E às vezes guardo saudades

Porta do coração

José Pereira (ou) Carlos Conde? / Pedro Rodrigues
Repertório de Manuel Dias 
No registo discográfico de Manuel Dias esta letra aparece atribuída a 
José Pereira
No registo discográfico de Ricardo Ribeiro esta letra aparece atribuída a 
Carlos Conde

Feia ou bonita, que importa 
Se nos assalta a paixão 
A quem nos sabe vencer 
O coração tem uma porta 
E a porta do coração 
Abre-se às vezes sem querer 

Cruzei um dia na vida 
Um olhar tanto a preceito 
Que me toldou a presença 
Ela não pediu guarida 
Mas bateu com tanto jeito 
Que entrou sem eu dar licença 

O amor é um imprevisto 
Faz-nos rir, faz-nos chorar 
Faz-nos viver e sentir 
O meu coração tem disto 
Às vezes tento fechar 
Mas ele teima em abrir 

Que importa o riso, a traição 
Quem ama, tudo suporta 
E o resto não tem valor 
Só quem não tem coração 
É que não uma porta 
P’ra dar entrada ao amor

Trago o teu fado guardado

Pedro Rapoula, Ricardo Parreira / Pedro Pinhal, J.Amendoeira
Repertório de Joana Amendoeira

Trago o teu fado guardado
Dentro do meu coração
Hei-de cantá-lo de noite
E na hora mais sombria

Trago o teu fado guardado 
Dentro do meu coração
Hei-de cantá-lo ao vento
Como se este meu lamento 
Fosse a voz da solidão

Trago o teu fado marcado 
Nas profundezas da alma
Hei-de chorá-lo sózinho
Cantando pelo caminho 
A toda a gente que passa

Trago o teu fado escrito 
No brilho do meu olhar
Hei-de cantá-lo p’ra sempre
Mesmo sabendo-te ausente 
Porque nasci p’ra te amar

Fria claridade

Pedro Homem de Mello / Pedro Rodrigues
Repertório de João Braga 


No meio da claridade
Daquele tão triste dia
Grande, grande era a cidade
E ninguém me conhecia

Rostos, carros, movimentos 
Traziam noite e segredo
Só eu me sentia lento 
E avançava quase a medo

Só a saudade da pátria 
Longínqua, me acompanhava
Quisera voltar à serra 
E ouvir o vento e a água brava

Quisera voltar ao bosque 
Onde sei que sou lembrado
Voltar às l
eiras de Afife
E ouvir a canção tão mansa 
Do pastor que guarda o gado

Mas nas ruas sinuosas 
Ainda o rumor crescera
E eu contemplava assombrado

Minhas mãos ontem com rosas
Minhas mãos hoje de cera

Então passaram por mim 
Uns olhos lindos, depois
Julguei sonhar, vendo enfim 
Dois olhos, como há só dois

Em todos os meus sentidos 
Tive presságios de adeus
E os olhos logo perdidos 
Afastaram-se dos meus

Acordei, a claridade 
Fez-se maior e mais fria
Grande, grande era a cidade 
E ninguém me conhecia

Da morte não espero nada

Letra e musica de Amélia Muge
Repertório de Ana Laíns


Não sei se parta se fique 
Da morte não espero nada
Vou mas é fazer-me à estrada
Andar co'a vida ao despique;
E sobretudo no Entrudo
Manter a cara lavada 
A cantar à desgarrada
A cavalo numa espiga 
Se assim quiser a cantiga;
E bailar e fazer pose 
No prato do arroz doce
P’ra alegrar a madrugada
Vou mas é fazer-me à estrada 
Da morte não espero nada

Não sei se entenderam bem 
Não é uma brincadeira
A história, se é verdadeira 
Dá sempre aquilo que tem;
A fantasia escondida 
De qualquer coisa perdida
Não sei se fico, se vou
Eu já nem sei onde estou;
Com tanta hora de estrada 
Eu já nem sei estar parada
E se oiço um assobio 
Continuo, mas sorrio
Vou mas é fazer-me à estrada 
Da morte não espero nada

Não sei quem veio acudir 
Ouço contar uma história
Com voz de pai ou de mãe 
Ao pé de mim está alguém
E nunca é a fingir
Quando estou quase a dormir;
Chegado o tempo das mágoas 
Com as luzes apagadas
Eu olho o mundo daqui 
E que lindo que ele é
E ao vê-lo eu sinto até 
Que já morria por ti
Vou mas é fazer-me à estrada 
Da morte não espero nada

Disfarçando

Letra e musica de Zé Manuel de Castro
Repertório do autor


P’ra mascarar 
A afeição que por ti sinto
Sacrifico-me a chamar 
Ao nosso amor, amizade
Mas no olhar
Nada escondo, nunca minto
Porque a força de gostar 
Me obriga a falar verdade

Quando o amor 
Por ser verdade acontece
Mascará-lo mais parece
Vontade de o revelar
Seja lá qual for 
O disfarce que o encubra
Há sempre alguém que descubra
E o vá contar


P’ra que fingimos 
Uma amizade banal
Se a fingir não conseguimos 
Desmentir nosso sentir
P’ra quê fingir 
Se realmente, afinal
A fingir não conseguimos 
Desmentir nosso sentir

Meu amor é primavera

Rosa de Lobato Faria / Mário Moniz Pereira
Repertório de Joana Amendoeira

Bem sei que o nosso amor 
É como uma andorinha
Que vai e volta e
 era e já não era
Setembro trouxe a chuva miúdinha
Partiste e eu fiquei á tua espera;
Mas já há rosas de Abril no meu jardim
Regressa meu amor, é Primavera

Agora espero por ti
Por fim, mais uma vez
Seremos dois
A casa até parece que sorri
O céu guardou a chuva 
P’ra depois
Agora espero por ti
Até o verde mar 
Tem outra cor
O teu lugar, bem sabes, é aqui
Se não vieres eu morro
Meu amor

Bem sei que o nosso amor 
É como a tempestade
Que o vento é trovoada e furacão
Ás vezes somos feitos de saudade
Ás vezes somos feitos de paixão;
Mas já há sementes de oiro abrindo ao sol
Regressa meu amor, é quase Verão

Minha nau de amargura

Gonçalo Salgueiro / Alfredo Marceneiro
Repertório de Gonçalo Salgueiro

És fado que não cantei
És o amor que não fiz
És o verso inacabado
Deste meu poema triste
Tudo por ti deixei
Mas o destino não quis
Que fosse meu o teu fado
E meu coração não viste

És fado que não cantei 
Minha nau de amargura
Partida deste meu corpo 
Na fé que eu perdi
Tanto por ti esperei 
Qu’alcancei a desventura
De ver em outro porto
 A flor que não colhi

És fado que não cantei 
Minha canção d’ansiedade
Que de mim anda perdida 
Deste que te olhei
Nada mais desejei 
Que matar esta saudade
Tu és meu fado na vida 
Um fado que não cantei

Fado para a minha mãe

José Luís Peixoto / Pedro Pinhal
Repertório de Joana Amendoeira

Escondida no meu rosto
Menina de claridade
O tempo levou-te para longe
No teu lugar, apenas saudade

Aqui, onde canta esta voz
Aqui, onde o tempo não manda
És hoje aquilo que foste
Menina, coração de brilho, menina
Coração a trnsbordar de liberdade

Este ar que respiro por ti
Esta vida que levo só emprestada
É tua de novo, menina
Aqui serás sempre cantada

Aqui, onde canta esta voz
Aqui, neste tempo secreto
Serás sempre aquilo que foste
Mãe, meu segredo de luz, minha menina
Instante incandescente de eternidade

Os bravos

Letra e musica de José Afonso
Repertório do autor 

Eu fui à terra do bravo
Bravo meu bem... 
Para ver se embravecia
Cada vez fiquei mais manso
Bravo meu bem... 
Para tua companhia

Eu fui à terra do bravo
Bravo meu bem... 
Com meu vestido vermelho
O que eu vi lá de mais bravo
Bravo meu bem... 
Foi um mansinho coelho

As ondas do mar são brancas
Bravo meu bem... 
No meio são amarelas
Coitadinho de quem nasce
Bravo meu bem... 
P’ra morrer no meio delas

As quatros operações

Vasco Graça Moura / Pedro Pinhal, Joana Amendoeira
Repertório de Joana Amendoeira


Fui deitar contas à vida
Fiz as quatro operações
Num instante e de seguida
Tirei certas conclusões

Comecei pela adição 
Porque te amei mais e mais
Se fiz essa soma à mão 
Fiz também contas mentais

Aprendi a tabuada 
E vi que multiplicar
Era a forma acelerada 
De o meu amor aumentar

Depois vi que subtraia 
A tua deslealdade
E o total se reduzia 
Para menos de metade

Essa foi a consequência 
Da mentira repetida
E assim a minha existência 
Acabava dividida

E agora não me comove 
Dar-te uma prova provada
Fiz sempre a prova dos nove 
E deu noves fora nada

Enfim... não leves a mal
Que eu te diga em voz serena
Não tiro a prova real 
Porque já não vale a pena

Lisboa pequenina

Tiago Torres da Silva / Casal Ribeiro
Repertório de Linda Leonardo

Oh Lisboa pequenina
És um pregão de varina 
A menina dos meus olhos
Põe-me o braço na cintura
Dá-me um beijo com ternura 
Veste uma saia de folhos

Pus no dedo uma aliança
Mandei vir uma criança 
Que é filha da Madragoa
Outra linda assim, não vejo
Fui batizá-la no Tejo 
Dei-lhe o nome de Lisboa

Lisboa, Lisboa
Menina que canta
És um coração
Que a minha canção 
Leva na garganta
Lisboa, Lisboa
Velhinha que ri
És uma canção
Que o meu coração 
Só canta p’ra ti

Oh Lisboa tão velhinha
Quando tu quiseres ser minha 
Vou queimar uma alcachofra
E tu, rezas amiúde
Na senhora da saúde 
P’ra que o meu peito não sofra

Corri ao ver-te num grito
Tão alegre, tão bonito 
Que parecia a própria vida
Era a Amália a cantar
Uma marcha popular 
Que descia a avenida

Marcha do pião das nicas

Letra e música de Carlos Paião
Gravado por Dulce Guimarães


Anda p'la vida à futrica
O estica larica, o mangas portuga
Fecha-se em copos e copas 
Cafés e cachopas, trabuca e madruga

Galfarro afiambrado 
Pachola arremelgado
De grimpa levantada e garrafal
Amigo do amigo 
Farelo e muito umbigo
Vestiu-se e veio a pé p'ró arraial

Viva o Santo António, viva o São João
Viva o 10 de Junho e a restauração
Viva até São Bento se nos arranjar
Muitos feriados para festejar

Gosta de armar ao efeito 
Baboso e com jeito p’ra ser bagalhudo
Mas na mulher do carteiro 
Já manca o dinheiro, alfaces e é tudo

Se ele anda com nerveco 
Grazina dum caneco
Lá vai o lascarino pró granel
E faz as partes gagas 
Fosquinhas de aldeagas
Palrando até fazer 
Grande aranzel

Chorou por causa da seca 
Que a terra ficou viúva
Até correu seca e Meca 
Fartou-se de pedir chuva
A chuva quis-lhe agradar 
Banhou a terra as culturas
A água deu-lhe p'la barba 
A fome em farturas

Ás vezes já nem petisca
A doença na isca é má pró vistaço
Os vinhos e os jaquinzinhos 
São só descaminhos, vai dar ao esquinaço

És tu pião das nicas 
Das bocas e das dicas
Que pegas nos calcantes e te vais
Adeus leão dos trouxas 
Chupado das carochas
Que foste no embrulho uma vez mais

Tristes horas

Gonçalo Salgueiro / Armando Machado *fado licas*
Repertório de Gonçalo Salgueiro


Encontro-me na noite em horas vás
Quando essa tua imagem me acontece
Recolho-me ao vazio p’las manhãs
Negando a luz do sol que me anoitece

Entrego-me à loucura sem ter o dia
De não ver este amor dentro de mim
Reduzo-me à tortura e à poesia
Onde te esqueço e posso dar-lhe fim

E nestas tristes horas em que me iludo
Cantando sentimentos de outro alguém
Lançando em minha voz o grito mudo
Do mal que é não querer amar ninguém

Sonhando volto ao leito por ti deixado
Torno a beijar a boca que me mente
À luz do dia cumpro um triste fado
De noite serei teu eternamente

Não passas sem mim

Frederico de Brito / José António Sabrosa
Repertório de Cândida Ramos

Vamos fazer uma escolha
És o tronco, eu sou a rama
És o vento, eu sou a folha
És o proveito, eu a fama

És o sol, eu sou a sombra 
És o braço, eu sou a lança
És o mato, eu sou alfombra 
És o desejo, eu a esperança

És o mar, eu sou a areia 
És o pincel, e eu a cor
És o sangue, eu sou a veia 
És o riso, eu sou a dor

És o mundo, eu sou o espaço 
És o princípio, eu o fim
Mas eu sem ti já não passo 
E tu não passas sem mim

Resposta fácil

Domingos Gonçalves da Costa / Popular *fado das horas*
Repertório de António Rocha


Perguntas-me o que significa
Saudade, vou-te dizer
Saudade é tudo o que fica
Depois de tudo morrer


Tu que jamais conheceste 
A dor que as almas tortura
Que só conheces ventura 
E por amor não sofreste;
Tu, que uma saudade agreste 
Nunca te fez padecer
Nem cravou no teu viver 
Um espinho que mortifica
Perguntas-me o que significa
Saudade, vou-te dizer


Saudade é um bem ruim 
Que tortura o coração
É o princípio do fim 
De um sonho sonhado em vão;
Saudade é doce ilusão 
De um amor que não nos quer
Que a gente teima em esquecer 
E a própria dor glorifica
Saudade é tudo o que fica
Depois de tudo morrer

Um fado só para ti

Maria de Lourdes Carvalho / Martinho d'Assunção
Repertório Pedro Lisboa


Fiz-te um poema tristonho
Onde o teu amor risonho
Era promessa e desejo
Moldei teu corpo dormindo
E nos teus lábios, sorrindo
A paz serena dum beijo

Podes ler neste poema
Todo o meu amor por tema 
Minha alma em cada verso
Faz dele um hino de vida
Na grandeza desmedida 
Do descrente universo

És o mote dum poema
Misto de amor e ternura 
De alegria e de verdade
És o retrato feliz
Daquilo que em ti mais quis 
E em mim deixou saudade

Adolescência ferida

António Rocha / Raúl Ferrão *fado carriche*
Repertório de António Rocha


Poema da minha vida
Sem velhice nem infância
Adolescência ferida
No mar da minha inconstância

Poema da minha vida 
Fogo que perdeu a chama
Caminhada resumida 
A sulcos feitos na lama

Sem velhice nem infância 
Vão as verdades morrer
No limite da distância 
Que há entre mim e o meu ser

Adolescência perdida 
Em busca de mundo novo
E da paixão construída 
Com gritos vindos do povo

No mar da minha inconstância 
Naufraga a causa perdida
A que tu dás importância 
Poema da minha vida

Levas nas mãos amarradas
Vontades amordaçadas

Desdobro a madrugada

Rui Manuel / Manuel Mendes
Repertório de Vasco Rafael


Desdobro a madrugada nos meus olhos
As mãos da minha voz despem guitarras
E o fado é flor sem tempo que desfolho
Silêncio que de mim se desamarra

Passeio devagar entre as palavras
Respiro-lhes a dor, a solidão
E sinto que um sorriso lhes bastava
P’ra darem ao silêncio um coração

Pendentes do cansaço como frutos
Há sonhos perfumados, transparentes
Enquanto trocam horas por minutos
O fado é que lhes serve de semente

É fado esta saudade onde recolho
A vida que de mim se desamarra
Desdobro a madrugada nos meus olhos
As mãos da minha voz despem guitarras

Aqui na verde varanda

José Luís Gordo / Francisco Viana *fado vianinha*
Repertório de Ricardo Ribeiro


Aqui na verde varanda
Do meu peito á tua espera
Não amarei quem me manda
Outra nova primavera

Dos verdes ramos dos campos 
Ganhei esperanças de tempo
E sequei todos os prantos 
E parei todos os ventos

Quantas vezes te esperava 
Debulhado em lençóis de água
Só por ti amor cantava 
Chorando estrelas de mágoa

E assim de verde me visto 
E assim de verde te amo
Assim de verde resisto 
Assim de verde te chamo

Água louca da ribeira

Armando Varejão / José António da Silva *fado bacalhau*
Repertório de Ricardo Ribeiro


Água louca da ribeira
Que corres em cavalgada
Porque não vais devagar?
Essa corrida é cegueira
Não vês nem olhas p’ra nada
Na pressa de ver o mar


Já corri dessa maneira
Nas asas duma ilusão 
Na loucura de chegar
Fui deixando p’la ladeira
Pedaços do coração 
Beijos loucos sem amar

Vida que foste vivida
A correr tão velozmente 
Paraste à beira do mar
Agora vives perdida
São saudades o que sentes 
Por não poderes regressar

Amor sem tréguas

António Gedeão / Mário Pacheco
Repertório de Rodrigo da Costa Félix


É necessário amar 
Qualquer coisa ou alguém
O que interessa é gostar
Não importa de quem
Não importa de quem
Não importa de quê
O que interessa é amar 
Mesmo o que não se vê

Pode ser uma mulher
Uma pedra, uma flor
Uma coisa qualquer
Seja lá o que for
Pode até nem ser nada 
Que em ser se concretize
Coisa apenas pensada 
Que a sonhar se precise

Amar por claridade 
Sem dever a cumprir
Uma oportunidade 
Para olhar e sorrir
Amar como um homem forte
Só ele o sabe e pode-o
Amar até à morte
Amar até ao ódio

Que o ódio, infelizmente
Quando o clima é de horror
É forma inteligente
De se morrer de amor

Só espero que as folhas caiam

Letra e música de Diogo Clemente
Repertório de Gonçalo Salgueiro

Só espero que as folhas caiam neste Outono
P’ra dar cor às palavras que não digo
P’las ruas que passei 
E as bocas que guardei comigo
Só espero que as folhas caiam neste Outono

Que os tons sejam d’amor, quentes de calma
Com aromas de ternura e de desejos
Que o mel dos lábios teus 
Desenhe sobre os meus mil beijos
Que os tons sejam de amor quentes desejos

Porque esta noite trago do mar
Memórias de um navio
Que é noite e o meu olhar treme de frio
No céu d’amor a que me dou
Há uma gaivota que me diz
Que ter-te em mim, amor, é ser feliz

Só espero que o meu bastante não te chegue
Nem cheguem as canções pra te cantar
Por cada melodia
Acorde um novo dia no olhar
E acorde o teu sorriso ao acordar

Se não souberes ainda o que te quero
Por entre alguns segredos e quimeras
Serei numa ansiedade 
Um misto de saudades e esperas
Que o inverno sempre traz as primaveras

Banco de jardim

António Vilar da Costa / Arlindo Carvalho 
Repertório de Emílio dos Santos 


De bibes e laços brincamos os dois
Ao sair da escola, tu esperavas por mim
E o primeiro beijo, trocamos depois
No banco velhinho daquele jardim

Tuas loiras tranças, meus negros cabelos
Já se vão tornando pálido marfim
Num sorriso triste, lembro sempre ao vê-lo
O banco velhinho daquele jardim

Meu saudoso banco de outras mocidades
Alquebrado e velho como os meus avós
Companheiro franco das minhas saudades
És fiel espelho do que somos nós

Já o tempo ingrato lhe mudou a cor
Só não muda o rumo da paixão em mim
'inda nos sentamos a falar de amor
No banco velhinho daquele jardim

Mais tarde, chorando nossas mocidades
Quando a nossa história for chegando ao fim
Vamos concerteza desfolhar saudades
No banco velhinho daquele jardim

Glosa da saudade

Mote: Fernando Machado Soares / Glosa: Saudade dos Santos
Jaime Santos *corrido do mestre zé*
Repertório de Ricardo Ribeiro


Mandei a saudade embora
Atirei-a p’la janela
Mas fui buscá-la lá fora
Já tinha saudades dela


Essa atrevida dizia / Relegada do meu peito
Que era minha por direito / E dali não sairia
Eu que bem a conhecia / Por andar sempre com ela
Já não me revia nela / E então sem mais demora

Mandei a saudade embora
Atirei-a p’la janela

Com o ego aliviado / Desse peso, desse fogo
Decidi entrar no jogo / Doutro ego consolado
E não ouvi de bom grado / A voz da saudade, aquela
Que nos chama e interpela / Como alguém que nos namora

Mas fui buscá-la lá fora
Já tinha saudades dela

Estranha forma de ser

Gonçalo Salgueiro / José António Sabrosa
Repertório de Gonçalo Salgueiro

Eu pertenço ao forte vento
A um triste pensamento
De um Deus que me criou
De uma centelha perdida
Apagada p’la vida
Neste ser me transformou

Voltei aqui p’ra sofrer
Em estranha forma de ser 
Sem saber bem o que sou
Serei misto de loucura
A razão que te procura 
Quando estás onde não estou

Minh’alma te entreguei
Meu corpo te abandonei 
Apenas me resta a voz
Tenho a forma da saudade
Sou memória da verdade 
Sombra apagada de nós

No meu fado rogo ao vento
Que a ti leve este lamento 
P’la solidão esmagado
Vou dar forma a outro ser
Quero à terra pertencer 
P’ra viver sempre a teu lado

Menina da saia verde

Amália Rodrigues / Carlos Gonçalves
Repertório de Gonçalo Salgueiro

Menina da saia verde
Menina do verde olhar
Quem por amores te perde
Muito terá que chorar

Menina da saia verde 
E do avental de folhos
Quem por amores se perde 
Não sabe onde põe os olhos

Menina da saia verde 
Que bem que lhe fica a saia
Quem por amores se perde 
Deixa-me a mim de atalaia

Menina da saia verde 
Eu já lha vejo encarnada
Quem por amores se perde 
Troca as cores não vê nada

Somos do mar e do vinho

Letra e musica de Fernando Girão
Repertório de Ricardo Ribeiro

A nossa vida é tão chata 
E ficamos a pensar
Se merece mesmo a pena 
Nós andarmos a penar

Eu escuto as palavras 
Mas não vejo as ações
Temos muitas teorias 
Mas não temos soluções

Depois bebemos 
Um copo de aguardente
E a vida parece melhor
Somos da terra e do vinho
Temos falta de carinho
E o futuro ainda pior

Mas se surgem os problemas 
Enfrentamos de uma forma audaz
Nós já perdemos o medo
Seja o que for tanto faz

Ah... a nossa vida
É um labirinto de paixões

Quem não fala com verdade
Quem em si não acredita
Quem não joga o jogo certo 
Só semeia a confusão

E nunca mais de mim

Mário Raínho / Alfredo Duarte *alexandrino*
Repertório de Ricardo Ribeiro

E nunca mais de mim, infinita metade
Hás-de sentir saudade, do tempo de nós dois
E nunca mais de mim, terás mais do que agora
Mandei amores embora, e em ti fiquei depois

E nunca mais de mim, noites de lua meia
Se trago a lua cheia, á noite que tu és
E nunca mais de mim, o ciúme de ver
Ondas de mar por querer, beijarem os teu pés

Oh estrela do meu peito, oh fonte de água boa
Cantar que me abençoa, oh torre de marfim
Se em ti tudo é perfeito, pelo amor que me dás
Que eu saiba onde estás, e nunca mais de mim

Fim da saudade

João Fezas Vital / Alfredo Duarte *fado cravo*
Repertório de Joana Amendoeira

Parecendo o vento mais frio
Na margem esquerda do rio
Onde a saudade é só minha
Quem me dera, quem me dera
Que chegasse a primavera
Mas que viesse sózinha

Queimando as horas do dia
Desperdiçando a alegria
Inventei outra afeição
Uma história por contar
Que adormece o meu olhar
Numa ãnsia de perdão

Se a primavera viesse
E em segredo me dissesse
Que te perdes na cidade
Voltaria por canoa
Cantar ao céu de Lisboa
O fim da minha saudade

Como chuva em agosto

Letra e música de Tó Zé Brito
Repertório de Gonçalo Salgueiro

Como chuva em Agosto
Nunca nada é para sempre
Tudo muda tudo passa
Nunca nada é permanente

Como chuva em Agosto 
A vida nunca é igual
Tudo nela é passageiro 
Nada é intemporal

Por isso te vou esquecer 
Vou pensar em mim primeiro
Vou ser frio como o gelo 
Como a chuva de Janeiro

Como chuva em Agosto 
Não há dois dias iguais
Alguns marcam-nos o rosto 
Outros são dias banais

Como chuva em Agosto 
Nada na vida é eterno
Por vezes vamos ao céu 
Outras vezes ao inferno

Naquele tempo

Letra e música de Diogo Clemente
Repertório de Gonçalo Salgueiro


Naquele tempo, amor, a esta hora
Saía para a rua devagar
Deixando-te ao silêncio, como agora
Era uma quase noite
Uma noite quase aurora
E a rua amanhecia ao meu olhar
Naquele tempo, amor, a esta hora

Cansado, o meu corpo tão cansado
Deixava o teu na cama de nós dois
E a força de um adeus antecipado
Guardava uma outra noite p’ra depois
Guardava este silêncio de nós dois

E mesmo com o correr dos quatro ventos
A querer de nós o fim, de nós o adeus
Como punhais de mel e olhares atentos
Jurei ao grande mar
Grande mar dos meus lamentos
Cravar-te ao corpo os beijos que são meus
No tempo de correr dos quatro ventos

Hoje passo p’las ruas como vês,
À espera de outro dia, como agora
Chegou um outro amor que o amor desfez
E deixa esta saudade noite fora
Daquele tempo, amor, a esta hora
Daquele tempo, amor, a esta hora

Bons tempos

José Galhardo / Arnaldo Martins de Brito
Repertório de Carlos Ramos

Tempos antigos, tempos passados
Tempos de artistas
Tempos mornos que eu vivi
Velhos amigos, velhos pecados
Velhas fadistas 
Que eu não vejo agora aqui

Já lá vão todas, já lá vão todos
Já lá não falta senão um 
Que espera a vez
Foram-se as modas, foram-se os modos
Foi toda a malta 
Do meu tempo com vocês

Chorai, chorai
Por mim, por mim
Rapaz do tempo que lá vai
E eu vi no fim
Passou, passou
Morreu, morreu
E deste mundo que acabou
Fiquei só eu

Vi as esperas, vi as toiradas
Pegas e tudo 
No bom estilo português
Vi as galeras, vi as cegadas
O velho entrudo 
Com bisnagas e chéchés

Vi a avenida com luminárias
Toda empedrada 
A preto e branco sem metrô
Coisas da vida, extraordinárias 
O agora é nada 
Ao pé de tudo o que findou

Sonho fadista

Pedro Fortes Figueira / Popular *fado corrido*
Repertório de Ricardo Ribeiro


Sonhei que o fado corrido
Fugiu num barco doirado
E no mar anda perdido
Com saudades do passado


Neste mundo transcendente 
Uma eterna fantasia
Na tristeza ou na alegria 
Vai sonhando toda a gente
Assim eu sentidamente 
Com tristeza e desagrado
Tive um sonho apaixonado 
Muito embora dolorido
Sonhei que o fado corrido
Fugiu num barco doirado


E sonhando constrangido 
Como sincero fadista
A minh’alma saudosista 
P’la tristeza foi vencida
Só porque sonhei sentido 
Por ver um sonho magoado
Que o corrido, o triste fado 
Ausentou-se condoído
E no mar anda perdido
Com saudades do passado

Quis Deus que fosses Maria

Gonçalo Salgueiro / Joaquim Campos *fado tango*
Repertório de Gonçalo Salgueiro


Quis Deus que fosses Maria
Minha mãe, minha ternura
A que a vida por mim daria
Livra-me desta amargura
De nunca ter alegria

É todo teu o meu fado
É por ti que ainda canto
Apenas por ti amado
Só tu ouves meu pranto
Só por ti sou desejado

E mesmo não tendo mais nada
Que esse teu amor profundo
Ó minha mãe adorada
Mesmo deixando este mundo
Sempre serás minh’amada

Tantos caminhos

Tiago Torres da Silva / José António Sabrosa
Repertório de Ricardo Ribeiro

Existem tantos caminhos
Onde os homens vão sózinhos
Em busca de uma ilusão
Passo a passo, quem avança
Só vai andando na esperança
De enganar a solidão

Dá-se um passo e outro passo
Mas quando chega o cansaço 
E a gente pensa em parar
Por castigo ou por má sina
Há uma força divina 
Que nos obriga a andar

Existem tantas estradas
Onde se notam pégadas 
Que o vento não apagou
São pégadas que se arrastam
Mas que no tempo se gastam 
E ninguém por lá passou

Por isso sigo, seguindo
Há medida que vou indo 
Sei que nesta caminhada
Não se chega a um lugar
Só nos resta caminhar 
Porque só existe a estrada

A alma celta do fado

Pedro Assis Coimbra / Pedro Amendoeira
Repertório de Joana Amendoeira


Diz que seria da nossa cidade
Sem as festas, sem a tua ternura
Como poderia viver, viver sem ti
A vida toda à tua procura


Sim, sorri assim, sorri p’ra mim
Pássaro azul saído do mar
Toutinegra do meu país a sul
Nesse voo que prende o meu olhar


Quando naquele dia sonhei
Que chegavam barcos doces e beijos
Na abundância da água, provei
O melhor medronho dos teus lábios

Sorri assim, olha assim para mim
Em viagem prolongada sobre o mar
Andorinha da nossa primavera
Lua nova que apetece cantar

Entreabre as portas do destino
A alma celta do fado antigo
No litoral, no cais do violino
Vertigem da noite passada contigo

Tive uma vida, deixei-a

Gonçalo Salgueiro / Popular *fado corrido*
Repertório de Gonçalo Salgueiro


Sou filho da lua cheia
Do sol um filho bastardo
Tive uma vida, deixei-a
Por nunca ter sido amado

Sou como o mar selvagem 
Que tudo mata e destrói
Por não encontrar coragem 
De aceitar o que me dói

Sou do fogo a chama 
Sou o vento, o tudo, o nada
Sou o abismo que brama 
Tua ausência prolongada

Sou alma que flameja 
Sedenta da vingança
A boca que ninguém beija 
A voz que não te alcança

Sou o fumo da candeia 
Que se extingue neste fado
Tive uma vida, deixei-a 
Por nunca ter sido amado

Todas as horas são breves

Hélder Moutinho / Francisco Viana *fado vianinha*
Repertório de Joana Amendoeira


Todas as horas são breves
Todos os dias são horas
Todo o amor que me deves
Aumenta quando demoras

Vejo as sombras do desejo
Que tenho por te encontrar
Em cada noite há um beijo 
Que nunca te posso dar

Na brisa da tarde calma 
Onde nasce a primavera
Nasce a dor na minha alma 
P’ra viver á tua espera

Sou do monte, sou da serra 
E os teus olhos são do mar
É tão longe a minha terra 
Que não te posso alcançar

Quando chegares a sorrir 
Não me tragas compaixão
Depois, terás de partir
Partir o meu coração

Sou moinho abandonado

Gonçalo Salgueiro / Georgino de Sousa
Repertório de Gonçalo Salgueiro

Sou moinho abandonado
Em terreno enlameado
Em paisagem tão sozinha
Meu amor foi embora
Cansou do tempo de outrora
A solidão é toda minha

As velas rasgam saudades
Trazendo cruas verdades 
Que o vento canta ao passar
No coração do moinho
Ainda chora baixinho 
A semente deste amar

No amargo deste pão
Ao calor da minha mão 
Peço ao vento p’ra trazer
Esse amor tão desejado
P’lo mundo condenado
A semente por nascer

Pede à saudade

António Rocha / Manuel Mendes
Repertório de Gonçalo Salgueiro


Pedi tão pouco... 
Tudo te dei... és o meu fado
Sei que fui louco... 
Porque te amei... sem ser amado

Quando a verdade 
Se atravessar no teu caminho
Pede à saudade 
P’ra te lembrar o meu carinho

Pede à saudade
Eu sei que vais ter saudade
Quando um dia a solidão 
Te recordar o passado
E se em verdade

Precisares dum ombro amigo
Sabes que estarei contigo
Basta pedires à saudade

Podes sorrir... 
Fazer alarde... pouco me importa
Sei que hás-de vir... 
Mais cedo ou mais tarde... bater-me à porta

Se é que preferes, que seja assim
Ri à vontade mas se quiseres saber de mim
Pede à saudade

Há mais fado que garganta

Letra e musica de Amélia Muge
Repertório de Joana Amendoeira


Há mais fado que garganta
Como há mais mar que marés
E mais amor que amar
Muitos mais passos que pés

Como há mais luz que velas
Mais energia que força
Mais fogo do que fogueira
E mais lume que lareira

É o fado um bailado a contra-luz
Inventado na figura de uma sombra
Que de espanto e de penumbra 
A nossa alma sustenta
Estranha luz que alimenta 
Um sopro que nos deslumbra
Nos desfaz e nos encanta
Nos revela que há mais fado
Há mais fado que garganta

Há mais fado que garganta
É do fado esse condão
E nós sabemos que sim
Sem perguntar a razão

É uma coisa que acontece
Nos envolve e nos espanta
Há fado p’ra lá do som
Do silêncio, da guitarra

Túnel de saudade

Gonçalo Salgueiro / Jaime Santos *fado sevilha*
Repertório de Gonçalo Salgueiro

No meu túnel de saudade
Que me dói ao percorrer
Vou parar ao coração
Que não encontra a razão
De tal viagem fazer

Continua tentação 
De correr via tão escura
Sem saber o que esperar
Num coração a teimar 
A razão desta procura

Perdido na escuridão 
Num constante vai e vem
Este amor já não tem cura
É uma forma de loucura 
Não ter o amor de ninguém

Volto atrás no caminho 
Quero ir de novo à luz
Pois sei que não vou encontrar
A razão de arrastar 
A saudade numa cruz

O teu olhar é Portugal

Letra e musica de Fernando Girão
Repertório de Joana Amendoeira

Alfama banhada pelo sol
A tua luz é divina
Á tua volta envelhece Lisboa
Mas tu, sempre menina

Por ti passam os homens 
Mas tu, sempre senhora
Transformas o agora 
Num passado futuro
E os teus pátios interiores
Que histórias, que amores 
Nos poderiam contar

Como a Ribeira do Porto
Tem concerteza o direito 
A ser parte da nossa história
Já foram tantos desgostos
Já foram tantas as cheias
Que dizem que uma sereia 
Que guardava um tesouro
Fugiu das águas do Douro
Tornando-se padroeira 
Da gente daquele lugar

Oiro é a cor das águas do Tejo
Como os barcos que navegam no Douro
Os teus olhos são de azeite mouro
E o teu olhar é Portugal

Cálice de perdão

Gonçalo Salgueiro / Acácio Gomes *fado acácio*
Repertório de Gonçalo Salgueiro


Minha dor é um convento
Cheio de sombras por dentro
Onde o sol não quer entrar
Sombras são feitas de ti
Silhuetas que esculpi
Sem a luz do teu olhar

As paredes frias, nuas
Escondem saudades tuas 
Que o luar me vem mostrar
No templo és oração
Meu cálice de perdão 
Por viver só p’ra te amar

Passam noites passam dias
Sinos dobram agonias 
Que o vento geme por mim
Neste convento onde moro
Rezo, canto, grito e choro 
Ninguém sabe que é por ti!

Ambiente do fado

Adelino dos Santos / Frederico de Brito
Repertório de Manuel Fernandes

Há quem fale do passado 
P’ra dizer bem do presente
E jure que o pobre fado 
É o pecado de muita gente

Melopeia que’inda existe 
E a mesma graça contem
Mesmo assim alegra ou triste
Nunca fez mal a ninguém

Quem nunca andou na Mourama
E não viu Alfama das cigarreiras
Quem não entrou nas touradas
E nas patuscadas zaragateiras
Quem do povo andou ausente
E nunca o compreendeu
Desconhece o ambiente
Em que este fado viveu

Dizem que o fado existia 
Só onde havia tristeza
Mas cantou-se á luz do dia
Numa alegria bem portuguesa

Pode estar acostumado
A chorar o nosso mal
Mas que culpa tem o fado 
Do azar de cada qual

Amor duma só hora

Gonçalo Salgueiro / Alfredo Marceneiro *fado versículo*
Repertório de Gonçalo Salgueiro

Descalço, corro as ruas noites fora
Caminhando, caminhando sem parar
Onde estás ó meu amor d’uma só hora
Onde estás meu amor, para te abraçar

Esta dor que corre em mim cada segundo
Só pede à terra, ao céu o teu abraço
Nada sou, nada mais tenho neste mundo
Meu amor, sem teu amor, sem teu regaço

Grito ao vento pelo teu nome em solidão
Chora a noite nosso amor eternamente
Brotam lágrimas das pedras plo chão
Onde estás meu grande amor, amor ausente

Não te alcanço, não me encontro, desespero
Vou voltar à liberdade indesejada
Preso ao mundo onde apenas por ti espero
Sem amor, sem teu nome, sem ter nada