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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.350' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

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O lado bom do pecado

Tiago Torres da Silva / José António de Sabrosa *fado velho*
Repertório de Cristina Andrade

Não me ensines a pecar
Como eu te tenho ensinado
Ensina-me a aceitar 
O lado bom do pecado

Há quem peque por amor 
Mas eu cá não sou assim
Tenho um corpo pecador
Que peca tudo por mim

Não penses um minuto 
Que me vou arrepender
Eu peco sempre que escuto 
Uma guitarra a gemer

E se encontro a minha sina 
Nas palavras que há no fado
É só ele que me ensina 
O lado bom do pecado

A noite que não existe

Tiago Torres da Silva / João Maria dos Anjos
Repertório de António Vasco Morais

O meu corpo adormeceu
Mas a alma não esqueceu
A dor do teu abandono
E porque a dor é enorme
A minha alma não dorme
Quando está cheia de sono

Passa a noite vigilante
E não cede um só instante 
Ao cansaço que a persegue
Embala o meu coração
E murmura uma canção 
Para que o meu corpo sossegue

A alma não sente nada
Ficou p’ra sempre amarrada 
Ao momento em que partiste
E por mais que ela sossegue
Mais me arrisco a que se entregue 
À noite que não existe

Se te chega uma canção
P’ra sorrires à solidão 
Que de repente te assalta
Vem minha alma docemente
Que dormindo é que se sente 
Que a noite não nos falta

Versos de orgulho

Florbela Espanca / Miguel Ramos *fado margarida*
Repertório de Maria Leopoldina da Guia

O mundo quer-me mal porque ninguém
Tens as asas que eu tenho, porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus
Numa torre de orgulho e de desdém


Porque o meu mundo fica para além
Porque trago no olhar os vastos céus
E os oiros e clarões são todos meus
Porque eu sou eu e porque eu sou alguém

O mundo?  o que é o mundo, ó meu amor?
O jardim dos meus versos todo em flor
A
seara dos teus beijos, pão bendito

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços
Os meus braços dentro dos meus braços
Via láctea fechando o infinito

Asa de vento

Amália Rodrigues / Carlos Gonçalves 
Repertório de Amália

Sou charneca sou monte
Brisa a correr ligeira 
Sou água fresca a correr na fonte
Sou rosada roseira

Sou o cheiro das flores
Fé do meu pensamento
Filha d'amores, irmã das dores
Sou mãe do sofrimento

Tenho no peito 
Um pássaro encarnado
Que anda sem jeito
A mim amarrado

Sou charneca sou monte
Sou noite enluarada
Flor de alecrim, ramo de jasmim
Sou papoila encarnada

Sou flor de primavera
Sou sonho de verão
Planície aberta, praia deserta
Que espera a tua mão

Coração fruto 
Que é maduro e verde
Meu choro enxuto
Dor que se não perde

Sou charneca sou monte
Sou manhã perfumada
Planície aberta, praia deserta 
Sou ilha abandonada

Sou charneca sou monte
Verde fruta colhida
Erva cidreira, mansa oliveira
Sou lágrima perdida

Asa de vento
Inimiga da sorte 
Roseira brava
Não há quem me corte

Mentira

Miguel de Barros / Miguel Ramos *fado alberto*
Repertório de Manuela Cavaco

Mentiste sem piedade no momento
Em que juraste ter-me eterno amor
Fizeste uma promessa sem valor
Não te assustou o falso juramento

Mentiste cruelmente nessa hora
Mentiste sem piedade nesse dia
Mentiste sem ter dó do que sofria
E sem pensar na dor que sofro agora

Momentos de saudade e amargura
Lembrados como um sonho sem igual
Que trás o esquecimento do meu mal
E que me faz sofrer enquanto dura

Um sonho de alegria e sofrimento
Que afasta o meu desejo de morrer
Um sonho que me obriga a querer viver
E que por ser um sonho é um tormento

Em paga do inferno que me deste
Espero alcançar de Deus o teu perdão
Oferecendo minha dor em expiação
Por tão cruel pecado que fizeste

Fado vianinha

João Vasconcelos e Sá / Francisco Viana *fado vianinha*
Repertório de Margarida Bessa 

Devagar se vai ao longe
Eu bem vou devagarinho
Vamos ver se me não perco
Nos atalhos do caminho

Meu amor não tenhas pressa 
Porque não hás-de esperar
Tudo aquilo que começa 
Tarde ou cedo há-de acabar

Tudo mudou, entretanto 
Vê bem, que pouco juízo
Rio a pensar no teu pranto 
Choro a pensar no teu riso

Dá-me os teus olhos profundos 
E o mundo pode acabar
Que importa o mundo se há mundos 
Lá dentro do teu olhar

Malmequeres

Letra e musica de Manuel Paulino Gomes Júnior
Repertório de Manuela Cavaco

Malmequeres, bem me queres 
São flores de louco encanto
Malmequeres, bem me queres
Desfolham risos ou pranto

Os jovens apaixonados  
Perguntam baixinho à flor
Se são queridos desejados
Se são queridos desejados  
Ou felizes no amor

Se os malmequeres 
Gentis e formosos
Dizem bem me queres 
Aos rostos ansiosos 
Das lindas mulheres
Constroem castelos 
Nos seus corações
Loucas ilusões
Loucas ilusões 
E sonhos tão belos

Dois jovens enamorados  
Um malmequer desfolharam
Mas ficaram enganados  
Co’a resposta que apanharam

O Malmequer respondeu 
Com seu eterno sorrir 
Isso não respondo eu
Isso não respondo eu 
Pois não gosto de mentir

Fado antigo

Letra e música de João do Carmo Noronha
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Corria a vida, voava
Surgiste no meu caminho
E o tempo quando passava
Passava devagarinho

Antes ceguinha ficasse 
Naquela maldita hora
Se em vez de ver-te cegasse 
Sofria menos agora

Jurei há muito esquecer-te
 E a jura tão bem cumpri
Que não te esqueço a pensar 
Que me hei-de esquecer de ti

Chorai guitarras, chorai 
Acompanhem meu sentir
Que eu também choro e não tenho 
Ninguém que me queira ouvir

Canto de amor e de amar

Letra e musica de Fernando Machado Soares 
Repertório do autor

Um amor p’ra ser amor 
Dura sempre a vida inteira 
Quem amar segunda vez 
Não amou bem da primeira

De qualquer modo que existas
És a minha divindade
Ventura quando te vejo
Se te não vejo saudade

E quando já for saudade
Sem que nada nos conforte
É sinal que ainda vive 
Mesmo para além da morte 

Fado Rita

Rita Mariano de Carvalho / Alfredo Duarte
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Não vistas de preto a dor
Nem chores porque parti
Põe luto p’lo nosso amor
Põe antes luto por ti

Veste de branco essa dor 
De verde, azul, encarnado
Sempre vestiste de cor 
Quando eu morria a teu lado

Negra só a falsidade 
Que é toda um ser e não ser
É como a chama que arde 
Sem ganhar e sem perder

Veste de branco a saudade 
Trá-la de branco vestida
Morte só morte é verdade 
Nesta mentira da vida

Minhas saudades

Hermano Sobral / Popular *mouraria estilizado*
Versão do repertório de Manuela Cavaco
Este tema é uma criação de Maria Teresa de Noronha
na música do Fado Francisco Viana *Avé Maria Fadista+

O tempo que vai passando 
Traz saudades sem saber
Saudades que vão ficando
Para saudades fazer 


Oh meu amor que saudade 
Porque não hás-de voltar
Ao menos p’ra enganar 
O tempo, a triste verdade
Ainda tive a veleidade 
De lutar para esquecer
Mas perdi-me no sofrer 
Se já nem sei desde quando
O tempo que vai passando
Traz saudades sem saber


Uma saudade perdida  
Acolheu-se à minha beira
Fez-se a minha companheira  
Dedicada e preferida
E agora desiludida  
Sem acalentar sequer
A esperança de outro viver  
Levo a vida acarinhando
Saudades que vão ficando
Para saudades fazer

Vida da minha vida

Fernando Farinha / Armandinho *fado são romão*
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Na minha vida, vivia só por viver
No fundo, todo o meu ser
Era noite escura e fria
Mas quis Deus que o teu amor
Lhe desse sol e calor
E a noite tornou-se dia;
Hoje sinto a claridade
A dar cor e felicidade
À vida que não vivia

Da tua vida fiz o meu próprio destino
Como se um poder divino
Despertasse o meu viver
Dos teus braços fiz dois laços
Do teu andar, os meus passos
Do teu sofrer, meu sofrer;

Dos teus olhos fiz dois guias
Que hão dar luz aos meu dias
E aos meus olhos p’ra te ver

Versículo da Mariquinhas

Letra de Silva Tavares / Versículo de Daniel Gouveia
Alfredo Duarte *fado maria marques*
Repertório de Daniel Gouveia

É numa rua bizarra / muito estreita
A casa da Mariquinhas / com floreiras
Tem na sala uma guitarra / tão bem feita
Janelas com tabuinhas / às carreiras

Vive com muitas amigas / dedicadas,
Aquela de quem vos falo / com prazer
E não há maior regalo / ou pode haver?
De vida de raparigas / azougadas;
É doida pelas cantigas / bem cantadas
Como no campo a cigarra / satisfeita
Se canta o fado à guitarra / e se deleita
De comovida até chora / ternamente;
E a casa alegre onde mora / tão contente
É numa rua bizarra / muito estreita

Para se tornar notada / entre as fadistas
Usa coisas esquisitas / donairosas
Muitas rendas, muitas fitas / vaporosas
Lenços de cor variada / a dar nas vistas;
Pretendida e desejada / nas conquistas
Altiva como as rainhas / sobranceiras
Ri das muitas coitadinhas / linguareiras;
Que a censuram rudemente / sem razão
Por verem cheia de gente / e animação
A casa da Mariquinhas / com floreiras

É de aparência singela / até modesta
E muito mal mobilada / o quanto baste
No fundo não vale nada / por contraste
O tudo da casa dela / sempre em festa
No vão de cada janela / junto à fresta;
Sobre coluna, uma jarra  / que ela enfeita
Colcha de chita com barra / bem direita
Quadros de gosto magano / afadistado;
E, em vez de ter um piano / aburguesado
Tem na sala uma guitarra / tão bem feita

P'ra guardar o parco espólio / a bom recato
Um cofre forte comprou  / a acautelar
E como o gás se acabou / por não pagar
Ilumina-se a petróleo / que é barato;
Limpa as mobílias com óleo / por bom trato
De amêndoa doce e, mesquinhas / galhofeiras
Pasmam de fronte as vizinhas / quadrilheiras
P'ra ver o que lá se passa /  que defeito;
Mas ela tem, por pirraça / e é bem feito
Janelas com tabuinhas / às carreiras

Não presta?

Mote: Nuno de Aguiar / Glosa: Daniel Gouveia / Popular *menor e corrido*
Repertório de Daniel Gouveia

Dizem que o fado não presta
Mas não sei qual a razão
Se é ainda o que nos resta
Que nos fala ao coração

Há p’ra aí muito sujeito 
Que se aposta em dizer mal
Do fado, mas, por sinal 
Nunca o ouviu a preceito;
Por soberba, ou por despeito 
Rebaixam esta canção
Sem qualquer explicação 
Afinal, que treta é esta?
Dizem que o fado não presta
Mas não sei qual a razão

Ao contrário, muitos há 
Que o sentem vibrar na alma
Sentem fervor, sentem calma
 Consolo na hora má
Estão bem onde o fado está 
E o povo desta nação
Se o ouve, tem-lhe afeição 
O seu valor não contesta;
Se é ainda o que nos resta
Que nos fala ao coração

O Zé pagante

Artur Soares Pereira / Alfredo Duarte *fado odeon*
Repertório de Daniel Gouveia

Nos tempos da outra senhora
Diz quem por ela não chora
A coisa era bem pior
Mas os anos vão passando
Os governos vão mudando
E a coisa não está melhor

Sempre que o Governo sai
Eu penso que a coisa vai 
Desta vez, p’ra melhorar
Mas depois fico zangado
Pois vejo que o ordenado 
Continua a não chegar

Às vezes fico a pensar
Se hei-de ou não acreditar 
Em quem se senta em São Bento
Pois nada, nada os comove
Se um partido diz que chove 
O outro diz que faz vento

E os senhores deputados
Com chorudos ordenados 
Gostam desta confusão
Cá vou carregando a trouxa
Quando o mar bate na rocha 
Quem se lixa é o mexilhão


REFRÃO DA VERSÃO ORIGINAL
Desconheço se esta letra foi gravida
Transcrevo-a na esperança de obter informação credível
Letra transcrita do livro editado pela Academia da Guitarra e do Fado

Música Carlos Dias *Fado Zé Cacilheiro*

Sou Zé pagante
Deste país vacilante
Onde cada governante
Vai dizendo a sua treta
Cá vou pagando
Sorridente e não bufando
E vendo, de quando em quando
Nosso ouro ir pró maneta

Noite dos amantes

João Dias / Carlos Simões  Neves *fado tamanquinhas*
Repertório de Vasco Rafael

Noite, noite, mãe imensa
Dos amantes proibidos
Que o dia jamais te vença
E a lua seja presença
Constante nos meu sentidos

Vou nadar na madrugada 
Nas asas dum sonho-mar
E não quero ver mais nada 
Do que uma rosa encarnada
Numa boca por beijar

Noite, noite, dos amantes 
Com gargalhadas de estrelas
Esperança de navegantes 
À noite mais confiantes
Na sorte das suas velas

Jardim de todos os medos 
Dos mitos, que havia dantes
Sobre o mar, tecendo enredos 
Prendo a noite nos meus dedos
Noite, noite, dos amantes

Quadras soltas

Torre da Guia / Alvaro Martins *fado sada*
Repertório de Adelaide Madrugada

Nunca dizes se gostaste
Daquilo que te calei
Sei bem que o adivinhaste
O que pensaste não sei

Adivinhei o que pensas 
Só por saber que não era
Qualquer das coisas imensas 
Que a minh’alma sempre espera

Dias são dias e noites 
São noites e não dormi
Os dias a não te ver 
As noites pensando em ti

Por muito que pense e pense 
Naquilo que me disseste
Teu silêncio não convence 
Falaste quando vieste

Fado do abraço

Letra e musica de Cuca Roseta
Repertório da autora

Quanto te abraço, meu amor
O mundo pára suspenso
Num momento constrangedor
Entre o tempo e o contratempo
Abraça-me meu amor

O teu abraço é a vontade 
Onde se adia prazer
Um só abraço na saudade 
A perfeição de um quase ser
Abraça-me meu amor

Quanto te abraço, meu amor 
Sustenho a respiração
Num momento constrangedor 
De uma prece em comunhão
Abraça-me meu amor

O teu abraço é o completo 
Onde a beleza contida
Está no quase incompleto 
Que dá sabor à vida
Abraça-me meu amor

Somos dois loucos

José Maria Antunes / Artur Ribeiro
Repertório de Artur Ribeiro

Fitei os olhos teus, só vi ternura
Beijei os lábios teus, vezes sem fim
Senti dentro de mim tanta loucura
Que fui roubar o sol e quando vim;
Eu pus raios de sol na noite escura
E tu roubaste a lua para mim

Somos dois loucos 

Seguindo em frente
Teimosamente, mãos
dadas
Rostos unidos
Somos dois loucos 

Apaixonados
Mas não culpados 
De sermos loucos varridos

Tu és toda a razão dos meus pecados
Eu sou a tentação dos sonhos teus
Também sou o porquê dos teus cuidados
E tu a inspiração dos versos meus;
Os dois, de corações ajoelhados
Pedimos deste amor, perdão a Deus

Fado do perdão

Cuca Roseta / André Sardet
Repertório de Cuca Roseta

Que não nos separe a vida
Que não posso cantá-la assim
Se canto à despedida
Perde-se a vida de mim

Que morro sem o teu beijo
Neste coração a bater
Aqui dentro do meu peito
Com medo de te perder

Ah, volta meu amor
Por favor, peço a Deus
Apaga a dor e o rancor
Que afasta os teus braços dos meus

A teus pés ponho o coração
Meus olhos lavam tua mão
Meus cabelos sangram no chão
Meu amor, peço perdão

Flor morta

Torre da Guia / Jaime Santos *fado alfacinha*
Repertório de Adelaide Madrugada

Quando me dás uma flor
Na ideia de me honrar
Nem sequer pensas na dor
Da flor que me queres dar

Como foste tu cortar 
Tanta vida florida
Pensando vir contentar 
Tristezas da minha vida

Não o vês, irrefletido 
Que uma vida e uma flor
Têm tanto de parecido 
Quer no prazer, quer na dor

Se o fazes por amor 
Que amor estranho é o teu
Quando me dás uma flor 
Que já há muito morreu

O Infante

Fernando Pessoa / João Braga
Repertório de João Braga

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce
Deus quis que a terra fosse toda uma
Que o mar unisse, já não separasse
Sagrou-te e foste desvendando a espuma

E a orla branca foi de ilha em continente
Clareou, correndo, até ao fim do mundo
E viu-se a terra inteira, de repente
Surgir, redonda, do azul profundo

Quem te sagrou criou-te português
Do mar e nós em ti nos deu sinal
Cumpriu-se o mar e o Império se desfez
Senhor, falta cumprir-se Portugal

Fado da vaidade

Florbela Espanca / Cuca Roseta
Repertório de Cuca Roseta

Sonho que sou a poetisa eleita
Aquela que diz tudo e tudo sabe
Que tem a inspiração pura e perfeita
Que reúne num verso a imensidade

Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo, e que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita

Sonho que sou alguém cá neste mundo
Aquela de saber vasto e profundo
Aos pés de quem a terra anda curvada

E quando mais no céu eu vou sonhando
E quando mais no alto ando voando
Acordo do meu sonho e não sou nada

Fado proibido

Cuca Roseta / Pedro Lima
Repertório de Cuca Roseta

Não é um erro amar 
Nem é te querer
Nem mesmo desejar 
Pecado ou maldizer

Não é maldade amar 
Nem é te querer
Nem mesmo desejar 
Castigo ou dever

Água em pedra dura 
Se for obrigação
Bate até que fura 
Não dura e não é são, não

Não é proibido amar
Cá dentro só para mim
Amar só por amar 
Numa esperança sem fim
Ah!... só quero amar
Imaginar, enfim
Eu posso até sonhar 
Que és parte de mim

Na despedida

Boavida Pinheiro e Nuno de Aguiar
Joaquim Campos *fado puxavante estilado em versículo*
Repertório de Nuno de Aguiar

Na hora da despedida / tristemente
Dá-se um beijo mais intenso / qual loucura
Com o coração suspenso / infelizmente
No momento da partida / que tortura

Forte a emoção sentida / com fervor
Num enlace de bom senso / por bem querer
Eu direi que te pertenço / meu amor
P’ra sempre, p’ra toda a vida / até Deus querer

Na despedida, adeus não / não o direi
Que o desejo é regressar / para ficar
Se embacia o olhar / com que te olhei
Nos invade o coração / que sabe amar

Há que essa mágoa conter / e suportar
Na esperança de acreditar / em novo dia
Que em breve se vai voltar / voltar a amar
P’ra nossa vida viver / com alegria

Por quem choras, coração

Artur Ribeiro / Júlio Proença *fado proença*
Repertório de Francisco Martinho

Por quem choras, coração
Não chores, porque eu bem vi
Esse teu pranto sem fim
Diz-me lá porque razão
Andas a chorar por ti
Em vez de chorares por mim

Por quem vais nessa tristeza
Por quem vais perder as horas 
Perdido na noite escura
Não tenho bem a certeza
Mas penso, por quem tu choras 
Não anda à nossa procura

Por quem choras, coração
Diz lá porque não te queixas 
De quem te fez sofrer tanto
Esse teu choro é traição
Tu choras por ti, mas deixas 
Meus olhos rasos de pranto

A guerra das rosas

Manuela de Freitas / José Mário Branco
Repertório de Camané

Partiste sem dizer adeus nem nada
Fingiste que a culpa era toda minha
Disseste que eu tinha a vida estragada
E eu gritei-te da escada
Que fosses morrer sozinha

Voltaste e nem desculpa pediste
Perguntaste porque é que eu tinha chorado
Não respondi, mas quando vi que sorriste
Eu disse que estava triste
Porque tu tinhas voltado

Zangada, esvaziaste o meu armário
E em nada ficou meu disco preferido
De raiva, rasguei o teu diário
Virei teu saco ao contrário
Dei-te cabo de um vestido

Queimaste o meu jantar favorito
Deixaste o meu champanhe azedar
E quando cozinhei o periquito
Para abafar o teu grito
Eu comecei a cantar

Fumavas, eu nem suportava o cheiro
Teimavas em me acender um cigarro
E quando tu me ofereceste um isqueiro
Atirei-te com o cinzeiro
Escondi as chaves do carro

Não queria que visses televisão
Em dia de jogos de Portugal
Torcias contra a nossa seleção
Se eu via um filme de acção
Tu mudavas de canal

Tu querias que eu fosse contigo ao bar
Só ias, se eu não entrasse contigo
Saía p’ra não ter de te aturar
Tu ficavas a dançar
Com o meu melhor amigo

Gozavas porque eu não queria beber
Ralhavas ao veres-me de grão na asa
Eu ia  festa sem te dizer
Nunca cheguei a saber
Se tu ficavas em casa

Tu
deste ao porteiro roupa minha
Soubeste que eu lhe dera o teu roupão
Eu dei o teu anel à vizinha
E p’ la estima que eu lhe tinha
Ofereceste-lhe o meu cão

Foste-te me lendo o teu romance de amor
Sabendo que eu não gostava da história
No dia de o mandares pró editor
Fui ao teu computador
Apaguei-o da memória

Se cozinhavas, eu jantava sempre fora
Juravas que eu havia de pagá-las
Põe-te na rua; dizias-me a toda a hora
E quando eu me fui embora
Tu ficaste-me coas malas

Depois desses anos infernais
Os dois éramos caso arrumado
Achando que também era demais
Jurámos pra nunca mais
Foi cada um pra seu lado

No escuro, tu insistes que eu não presto
Eu juro que falta a parte melhor
Um beijo acaba com o teu protesto
Amanhã conto-te o resto
Boa noite meu amor

Atrás de um sonho

Frederico de Brito / Shegundo Galarza
Repertório e Carlos Ramos

Fui atrás dum sorriso
Que deixou minh’alma louca
E para quê? para alguém me dizer
Que o ladrão lhe fugira da boca

Fui atrás do encanto
Que eu achei num meigo olhar
E só voltei carregado de pranto
Que a saudade hoje pôs a secar

Andamos nós a vida inteira 
Atrás dum sonho
E o que acontece a um qualquer
Por mim suponho
Foge uma esperança 
E nós sentimos a revolta
Indo atrás dela 
A confiança que não volta;
Vem o ciúme a conversar 
Por uns momentos
P’ra nos mentir
P’ra nos dizer 
Que não vem mais
E cá pra nós
É sempre mau  semear ventos
Sabendo já 
Que só colhemos vendavais

Fui atrás da saudade
Desta vez tive cautela
É que eu levei a tristeza também
P’ra constar que ando às vezes com ela

Fui atrás dum desejo 
E apartei-me dos meus ais
É que as tristezas já são de sobejo
E as saudade p’ra mim são demais

Saudades não as quero

Frederico de Brito / Lopes Vieira
Repertório de Fernanda Maria

Bateram, fui abrir, era a saudade
Que vinha p’ra falar a teu respeito
Entrou com um sorriso de maldade
Depois sentou-se à beira do meu leito;
E quis que eu lhe contasse só metade
Das dores que trago dentro do meu peito 

Não mandes mais esta saudade
Ouve os meus ais, por caridade
Ou eu então, deixo esfriar esta paixão;
Amor... podes mandar se for sincero
Saudades... isso não, pois não as quero

Bateram novamente, era o ciúme
E eu mal me apercebi de que bateram
Trazia o mesmo ódio do costume
E todas as intrigas que lhe deram;
E vinha sem um pranto ou um queixume
Saber o que as saudades me fizerem

A nova Mouraria

José Araújo / Alfredo dos Santos *marcha do correeiro*
Repertório Liliana Martinho Santos

Tem a forma de chinela
A velhinha Mouraria
Orgulhosa do passado
Mas quem hoje vive nela
Sente uma imensa alegria
Neste espaço renovado

Tem almas de todo o mundo
Numa manta colorida 
Que nos dá tanto calor
Sentimento bem profundo
Dos que lutam uma vida 
Dando e recebendo amor

E quem vem doutra Lisboa
Sente toda a emoção 
Desta vida em harmonia
Aqui vive gente boa
Amando com devoção 
O Bairro da Mouraria