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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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Fado em bom português

Tiago Torres da Silva / Alfredo Duarte *fado laranjeira estilizado*
Repertório de Miguel Ramos
Letra cantada no espetáculo musical *Casa de Fado* 
Teatro Villaret, Lisboa, 2004

Portantos, uma canção
Para a conseguir cantar
Pode faltar coração
Tem de se saber falar

Estas novas raparigas 
Ganham p'ra mais de 100 contos
Mas as fadistas antigas 
É que o sabem tudo… e prontos

Mal ponho um disco a tocar
Fico cheio de saudades
Mas se hei-de ouvir a chorar
Por certo tu também há-des

Quem canta o fado sentido 
Pode às vezes ver-se à rasca
Para cantar o Corrido 
Fora da luz de uma tasca

Porque é à luz de uma vela
Com vinho do carrascão
Que o fadista abre a "jinela"
P'ra dentro do coração

Inté já me têm dito
Alguns de vossemecês
Que o fado é hoje erudito 
E fala bom português

Amor aos molhos

Teresinha Landeiro / Pedro de Castro
Repertório de Teresinha Landeiro

Amor aos molhos
Dizem meus olhos
Quando te vejo de noite, ao cantar
Digo o que sinto
Juro, não minto
Tenho o desejo de te namorar;
Digo o que sinto
Juro, não minto
Sei que um dia ainda vamos casar

A tua boca de noite voltou
Vinha mais bela que as ondas do mar
Essa que um dia saudade deixou
E o desejo de um dia a beijar;
Desde esse dia em meu sonho ficou
Esta loucura de amar

A tua boca de noite voltou
Nela, sem medo, poisei meu olhar
Desde esse dia meu fado ficou
Preso nas rimas do meu verbo amar;
Quando acordo e tua não sou
Peço prá noite voltar

Maré viva

Rosa Lobato Faria / Mário Pacheco
Repertório de Carlos Zel

Primeiro a minha mão sobre o teu seio
Depois um pé… o teu… sobre o meu pé
Logo o roçar urgente do joelho
E o ventre mais à frente na maré

É a onda do ombro que se instala
É a linha do dorso que se inscreve
A mão agora impõe, já não embala
Mas o beijo é carícia, de tão leve

O corpo roda: quer mais pele, mais quente
O boca exige: quer mais sal, mais morno
Já não há gesto que se não invente
Audácia que não ache um abandono

Então já a maré subiu de vez
É todo o mar que inunda a nossa cama
Afogados de amor e de nudez
Somos a maré alta de quem ama

Por fim, o sono calmo que não é
Senão, ternura, intimidade e enleio
O teu pé descansando no meu pé
A minha mão dormindo no teu seio

O mesmo mar

Letra e música de Fernando Girão
Repertório de Cláudia Leal 

Tentei encontrar
O teu pedaço de mar
No segredo das águas
Tentei decifrar
O que resta de mim
E assim lavar as mágoas

Tentei entender
Sentir a sensação
De ser parte do todo
Tentei refazer
O que tinha perdido
E começar de novo

Na orla dos teus sonhos
Tento chegar, mas nunca chego
Não sei se és tu que não deixas
Ou se eu de ti tenho medo

Viajamos por muitos rios
Apaixonados e ardentes
Procurando o mesmo mar
Por caminhos tão diferentes

A nova Rosa da Mouraria

Letra e música de Marco Oliveira
Repertório de Tânia Oleiro

De manhãzinha 
Voltou a Rosa, sem dizer nada
Vinha sozinha 
E mais formosa, bem apressada
Parou na Rua do Capelão
Onde esperava
O tal rapaz 
Que há muitos anos a namorava

Ai quem diria que um dia 
A Rosa da Mouraria
Voltava àquela casa
No Largo da Severa
Ai quem diria
Que a Rosa da Mouraria
Tinha a vida bem guardada
P'ra voltar a ser quem era

Viu sardinheiras 
E margaridas numa janela
Namoradeiras 
Entristecidas à espera dela
Agora a casa t
em o encanto 
Que tinha outrora
Até a Rosa 
Já prometeu não ir embora

Eternos rituais

Ana Vidal / José Campos e Sousa
Repertório de António Pinto Basto


Percorro palmo a palmo o teu desejo
E palmo a palmo sinto-me vibrar
Primeiro, na lenta perfeição de um beijo
Que nos acende o corpo, devagar;
Tão devagar que sinto mais que vejo
Morrer na minha pele o teu olhar

Depois, nas mãos que inventam sábiamente
Novos desenhos, esboços delirantes
Perdidos tempo e espaço, de repente
Partimos à deriva, viajantes;
Somos cinco sentidos, simplesmente
Por novas dimensões alucinantes

E assim, de sal e mel embriagados
Cumprimos os eternos rituais
E ao som de coros loucos, inspirados
Dançamos com o vento nos trigais;
Entre a terra e o céu, entrelaçados
Senhores do universo uma vez mais

Por fim, quando o desejo é já cansaço
E voltamos a nós, devagarinho
Ancoramos na calma de um abraço
Feito de gratidão e de carinho;
E é prazer ainda, quando passo
A mão, no teu cabelo em desalinho

Somos amor

Hélder Moutinho / Carlos Macedo
Repertório de Maria Dilar 

Amantes somos nós e não sabemos
O quanto pode haver de amor em nós
O quanto desejamos e vencemos
Na força que retrata a nossa voz

Amantes somos nós e somos lua
A oferecer o brilho à noite escura
E somos aguarela viva e nua
Pintada com mil cores duma ternura

Por isso amor
Sabes de cor o que é ser gente
Para depois
Nenhum olhar andar ausente
Somos assim
Como um jardim de Abril em flor
Somos amantes a cantar
Somos amor

E toda a vida vamos ser amantes
Na nossa madrugada já vencida
Que até os nossos corpos radiantes
Darão à negra noite, a luz da vida

Amantes somos nós eternamente
Por mais que alguém condene o nosso amor
E somos a raiz duma semente
Que já cresceu botão e fez-se em flor

Ai fadinho

Letra e música de Carlos Paião
Repertório de José da Câmara

Ai fadinho… 
Andamos sempre a refilar, fadinho
Todos nos querem enganar, fadinho
Cuidadinho, tu vê lá
Ai fadinho… 
Põe a cabeça no lugar, fadinho
Que isso da gente arrepiar caminho
Ai fadinho… já não dá

Não dá pra ir agora aprender línguas
Pensar em esforços 
Com um sol deste tamanho
Se o colega não se esmera
Concerteza que não espera
Que eu sozinho 
Tenha a arte e o engenho

E depois, sabemos como é no estrangeiro
Lugar divino, onde enfim, tudo melhora
Assim sendo está previsto
Nem perder tempo com isto
Já que nunca vai ser bom como lá fora

E nem que desse e nem que fosse 
O que está a dar
O que está a dar nunca dá nada
Sabes bem
Mas podes crer que é altamente
Andar aí por entre a gente
Acreditando ser melhor do que ninguém

Fazer projectos muito, muito, opcionais
E ter ideias lindamente originais
Criticando as conjunturas
E a falta de estruturas
São desculpas 
Porque sonhamos demais

Fado triste, triste fado

João Ferreira Rosa / Michel Legrand (sinfonia concertante de Mozart) J.Braga
Repertório de João Braga

Fado triste, triste fado
Vida assim não sei viver
Mesmo sem voz, o pecado
Espera o perdão pra morrer

Fado triste, triste sina 
Mais valia não te ver
Teus lindos olhos, menina 
A razão de me perder

Portugal, país distante 
Em qualquer lado do mar
Meu amor e minha amante 
Branca bandeira sem par

Morre o soldado na guerra 
Morre o fadista a cantar
De novo regresso à terra 
Onde aprendi a brincar

Cantei cantigas antigas 
Quantas formas de te amar
Cantei quantas raparigas 
Nos meus sonhos de encantar;
Fado triste, triste fado 
Bem mais pior que chorar
Bem mais pior que chora

A vida que há na saudade

Tiago Torres da Silva / Alfredo Duarte *fado cravo*
Repertório de Cristina Nóbrega 

Quando o silêncio me diz
Que a vida está por um triz
E eu sei que fala verdade
Vou pra trás duma guitarra
E a minha voz agarra
A vida que há na saudade

Vem um fado e outro fado
E o coração cansado 
Diz que não quer sofrer tanto
Porque já sabe de cor
O que lhe faz o menor 
De cada vez que o canto

Mas o guitarrista toca
Uma guitarra que evoca 
Outra guitarra mais triste
Está guardada no meu peito
E toca um fado que é feito
Da dor mais forte que existe

Ao escutá-la no meu sangue
O meu coração exangue 
Volta a bater com vontade
E é nas cordas da viola
Que a minha vida se enrola 
Na vida que há na saudade

Senhora não vás ao rio

Manuel Alegre / João Mário Veiga, João Braga
Repertório de João Braga

Senhora, não vás ao rio
Não vás ao rio
Não deixes que te dispa o vento frio
E te mordam negros peixes
Senhora não vás ao rio

Senhora não vás à praia
Não vás, não vás
As marés e o vento, levam-te a saia
As algas prendem-te os pés
Senhora não vás à praia

Senhora não vás ao bosque 
Não queiras que de repente
Um fulano venha e se enrosque 
Dentro de ti, para sempre
Senhora não vás ao bosque

Não murches senhora, em casa 
A casa tem suas teias
Deixa entrar o golpe de asa 
Rompe rendas e cadeias
Não murches senhora, em casa

A vida não é castigo 
Solta os cabelos e a saia
Deixa-me ir voar contigo 
Sobre o rio, sobre a praia
Senhora, não é castigo

Refúgio

Aldina Duarte / José Ferreira
Repertório de Aldina Duarte

Passa-se o tempo a correr
Enquanto a vida deixar
Esperaremos como sempre
Que alguém nos venha salvar

Numa casa abandonada
Ronda a morte sem chorar
Do que foi não ficou nada
Pra quem parte e quer ficar

Não há ninguém 
Na solidão dos meus passos
E pouco a pouco, os abraços
São a cruz do dia escuro
Virá alguém 
Matar de vez estas mágoas
Caminhando sobre as águas
Sem passado e sem futuro

Que o mar da nossa incerteza
Seja a força que nos cega
Quando a terra nos despreza
E o céu nega a nossa entrega

No embalo da canoa
Adormecem desvalidos
No som das ondas à toa
A voz dos corpos vencidos

Fado às voltas

Tiago Torres da Silva / Alberto Costa *fado dois tons*
Repertório de Cristina Nóbrega 

Volta e meia estou de volta
Volta e meia já não estou
Quem me quis à rédea solta
Foi quem comigo ficou

Quem, em troca de carinho 
Quis prender-me o coração
Ficou a falar sozinho 
Nas voltinhas do Marão

Quantas voltas dá o mundo 
P'ra ensinar que a verdade
É que a vida é um segundo 
Aos olhos da eternidade?

Vamos lá: é volta e meia 
Cada qual escolhe o seu par
Que eu posso mudar de ideia 
Antes da noite acabar

Rua dos correeiros

Manuel Alegre / João Braga
Repertório de João Braga

Na Rua dos Correeiros 
Lisboa discreta e estreita
Tem por detrás dos letreiros
Outra Lisboa que espreita

Lisboa que nos aperta 
Com seu coração antigo
Onde o meu amor desperta 
Para me levar consigo

Lisboa que passa esguia
A lembrar amores primeiros
E a secreta poesia
Da Rua dos Correeiros
Rua que vai para o Tejo
Sem nunca o Tejo se ver
Rua onde passo e só vejo
O que ela finge esconder

Tudo sabe a intimidade 
A eternidade e os instantes
O futuro em outra idade 
O agora dentro do antes

Ao longe, um vapor apita 
E há o bater dos calceteiros
Que deixam Lisboa escrita 
Na Rua dos Correeiros

Terra prometida

Aldina Duarte / Francisco José Marques *fado zé negro*
Repertório de Aldina Duarte

Porque enganas a tristeza
Quando a idade te pesa
E a culpa reaparece
No teu olhar transparente
A verdade é indiferente
Ao teu corpo que envelhece

Recusamos a mudança
Ao contrário da criança 
Que insiste na descoberta
Somos filhos do segredo
Criados para ter medo 
De viver a vida incerta

Na suprema servidão
Negaremos a paixão 
E o amor é sacrifício
Quem nos vale à nossa beira
Para encontrar a maneira 
De voltar tudo ao início

No silêncio há mais vida
Que na terra prometida 
A quem parece ter sorte
Há memórias que se apagam
E outras que se alimentam 
No esquecimento da morte

Lisboa manda recado

Mário Martins / Nuno Nazareth Fernandes
Repertório de José da Câmara

Lisboa manda recado 
Como que faz um apelo
O rio perdeu a fragata 
Que lhe alisava o cabelo

Nunca mais a asa branca 
Da vela que o vento enchia
Desenhou no Mar da Palha
Uma sombra fugidia

Lisboa está pensativa
Lisboa, não há maneira
Perdeu-se a varina esquiva
Dona do Cais da Ribeira;
E o rio não pode com ela
Fragata sem vela que hoje é batelão
Lisboa à beira do Tejo
Afoga num beijo o mar solidão

Não há gaivotas que cheguem 
Desdobradas a acenar
Pra repor vida nos olhos 
Duma cidade a teimar

A teimar que não tem força 
P'ra de novo se enfeitar
Com sardinhas-lantejoulas 
Que o sol sabe apregoar

Tributo a Tio Alfredo

João Ferreira Rosa / Alfredo Duarte *fado bailarico*
Repertório de João Braga 

Tio Alfredo Marceneiro
Rei do fado por condão
Não conhece o Limoeiro
Teve sempre profissão

Senhor de Santa Isabel 
Menino de cada rua
Nas cegadas, voz de mel 
Prateada pela lua

És o fado que cantais
o sentir do coração
Lisboa dos arraiais 
Do São Luís é que não

Sem tua voz, menos fado 
Nas guitarras a trinar
Nem a Marcha nem o Cravo 
Eu teria de cantar

Senhora dos meus passos

Aldina Duarte / Alberto Correia *fado vanda - sem razão*
Repertório de Aldina Duarte 

Quem me dera ser aquilo que não vejo
Donde nascem as palavras prometidas
E ver um anjo caído
Por ter esquecido vidas vencidas
Rasgo o manto das certezas
Entre as coisas proibidas

Caminho pela estrada fora
Sem rumo nem perdição
Apenas num instante
O meu amor errante
Traçado na tua mão

Eu aceito a minha dor, a que não quer
Sangrar um coração em morte lenta
Eu poderia mentir
E até fingir quem se lamenta
Na procura da verdade
Só o destino me atormenta

Caminho pela estrada fora
Sem rumo nem perdição
Apenas quero ser
Um corpo sem querer
Feliz sem ter razão

A volta prometida

Carlos Leitão / Custódio Castelo
Repertório de Carlos Leitão

Há mel nesses teus olhos desenhados
Pelas mãos de um criador que eu inventei
Escondido nos trejeitos mais ousados
Sou eu a querer ser Deus porque não sei

Dói tanto esta saudade anunciada
Agora que de ti só fico eu
A história de nós dois, imaginada
Será o que partiu mas não morreu

Sou eu na lezíria já despida
Na presunção errada de te ver
À espera de um regresso feito vida
Para que eu possa ficar sem te perder

E agora, meu amor, enquanto espero
A volta prometida que inventei
O mel do teu olhar é o desespero
Sempre que Deus me esconde o que não sei