-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
* 7.330' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

. . .

A mais linda namorada

Silvestre José / Miguel Ramos *fado alberto*
Repertório de José Guerreiro

Adoro, quando chega o entardecer
Olhando o pôr-do-sol, sós, de mão dada
Dizer, sentindo os dedos a tremer
Que tu és a mais linda namorada

Roçar a minha mão nos teus cabelos
Murmurar o meu amor nos teus ouvidos
Beijar com devoção teus lábios belos
Transmitir tudo o que há nos meus sentidos

Contornar a curva suave do teu seio
E ver-me nos teus olhos cristalinos
Abraçar-te, sentindo haver p’lo meio
A força que junta nossos destinos

O pôr-do-sol não é como a aurora
Que rompe duma fresca madrugada
Se um dia meu amor me for embora
Serás sempre a mais linda namorada

Lisboa és

Maria de Lurdes Brás / Alvaro Duarte Simões
Repertório de Maria de Lurdes Brás

Lisboa que linda és
Com tuas sete colinas
O Tejo beija-te os pés
Saúda as tuas varinas;
Nos bairros de lés-a-lés
Há fado pelas esquinas

Lisboa maravilhosa 
Tu és sol e és luar
De dia és cor-de-rosa 
À noite és prata a brilhar;
És madrugada ansiosa 
De ouvir o fado cantar

Lisboa, és capital 
Deste jardim encantado
És um sonho tropical 
À beira mar plantado;
Lisboa, és Portugal 
Tu és mulher, tu és fado

Levo o fado a Timor

Silvestre José / Armindo Fernandes
Repertório de José Guerreiro

Alimento a esperança
De um dia ir viajar
Ao outro lado do mar
Feliz como uma criança

E num barco cheio de amor 
Vou entregar livremente
Aquele abraço diferente 
A todo o povo de Timor

E quando o barco encostar 
Vai estar gente a entoar
Tendo na mão uma flor 
Tudo gente de Timor
O hino que se vai escutar 
E toda a Díli vai cantar
Escrito com muita humildade 
È o “Timor da Liberdade

Quero dar um contributo 
É nisso que mais aposto
E anuncio com todo o gosto 
Sorriso largo e enxuto

À noite contem comigo 
Vou cantar emocionado
Na bagagem trago o fado 
Canção pra qualquer amigo

E quando a luz se apagar 
Vai estar gente a escutar
Tendo na mão uma flor 
Tudo gente de Timor
É fado que vou cantar 
E a Díli vou dedicar
Desejar felicidade 
Timor em liberdade

Cais de outrora

Luís de Macedo / Alain Oulman
Repertório de Amália

Nos cais de outrora 
Há navios vazios
Nos cais de outrora 
Há navios vazios
E há velas esquecidas do alto mar
São sombrios os rios do recordar

Nos cais de outrora 
Há só barcos cansados
Nos cais de outrora 
Há só barcos cansados
E há remos esquecidos por não partir
Sinto cansaço vago de me fingir

Não há barcos, nem velas
Já não há remos
Não há barcos, nem velas
Já não há remos
Em frente ao mar d’outrora perdi meu cais
Em noite nos perdemos e nada mais

Óh velho Porto

Moniz Trindade / Henrique Terry
Repertório de Moniz Trindade


Oh velho Porto da Batalha e Fontainhas
Das catedrais já velhinhas, das tradições
És a cidade mais franca, mais verdadeira
Desde a bairrista Ribeira até Leixões

Nobre cidade, os teus velhos monumentos
São igrejas, juramentos de gratidão
E se há folia, o teu povo nobre ou rude
Canta com graça e virtude a São João

Óh Porto amigo
Oh cidade nobre e leal
Canta comigo 
Este hino a Portugal
Cidade linda 
Da Praça da Liberdade
Aonde reside ainda 
Também, a saudade

Oh velho Porto, pelos teus feitos de glória
Tens páginas d’oiro na história e és afinal
Berço de heróis que a pátria tem consagrado
E mais fama têm dado a Portugal

Oh velho Porto, chaminés enegrecidas
Cantando hinos à vida no seu afã
Que lindo é ver passar hostes matutinas
Dos gangas prás oficinas, pela manhã

Amar é não voltar duma cruzada

Henrique Segurado / Miguel Ramos
Repertório de António Mourão

Quando o dia na noite se intercala
Fica a vidraça toda ensanguentada
Eu mordo a tua boca, ninguém fala
Amar è não voltar duma cruzada

Procurei-te de noite em minha cama
E tal como te queria, extenuada
Amanhece num pinheiro em verde rama
Amar é não voltar duma cruzada

A pele dos nossos corpos por fronteira
Logo as unhas te querem tatuada
Leva a noite contigo, bem inteira
Amar é não voltar duma cruzada

Amor e fé

Domingos Gonçalves da Costa / Martinho d'Assunção
Repertório de Manuel Fernandes 

Deitou p'ra trás o boné 
E contente a assobiar
Subiu a Rua da Fé 
Levando a fé no olhar

Depois bateu à janela 
Do modesto rés-do-chão
Onde morava a donzela 
Dona do seu coração

E ela vestida de chita bonita
Qual rosinha de toucar
Sai para a rua, dá-lhe o deu braço
E traz promessas no meigo olhar
Ele ao vê-la tudo esquece e parece
De contente, uma criança
E há quem diga que o destino
Juntou nos dois a fé e a esperança


E num dia de bonança 
Na igreja de São José
Casou cheiinho de fé 
Co'a dona da sua esperança

E a partir daquele dia 
Alguém que os vê diz até
Há mais luz e alegria 
Na velha Rua da Fé

Fado dos autores

Tiago Torres da Silva / Joaquim Campos *fado rosita*
Repertório de Cristina Gonçalves

Não há fado sem poetas
Que trazem, do dia a dia
As palavras mais secretas
P'ra cantar na Mouraria

E sem os compositores 
Que encaixam nas melodias
As alegrias, as dores 
E as nossas fantasias

Tenho uma alma inquieta 
Que não me tem ajudado
Mas diz-me que eu sou poeta 
Cada vez que canto o fado

E se eu ainda m'espanto 
Por ser fadista, talvez
Todos os fados que canto 
Agradeço a quem os fez

Sem desejar ser profeta 
Profeço-te à minha fé
Sempre que nasce um poeta 
O fado aplaude de pé

A tua constipação

Fernando Farinha / Carlos M. Lima
Repertório de Fernando Farinha

Nunca mais te hei-de beijar
Quando estiveres constipada
Levas tempo a respirar
E não se aproveita nada


Sempre um beijo te quis dar 
Sempre um beijo me negaste
E logo no pior dia 
Um beijo meu aceitaste

Porque razão não esperaste 
Altura mais indicada
Beijo è graça por Deus dada  
Que devemos respeitar
Nunca mais te hei-de beijar
Quando estiveres 
constipada

Por favor meu bem, não penses 
Que esta minha afirmação
È com medo que me pegues 
A tua constipação

Imponho a minha razão 
Só porque o beijo me agrada
Sem essa tosse malvada 
Que te faz perder o ar
Levas tempo a respirar
E não se aproveita nada

Endereço do fado

Silvestre José / Carlos da Maia *fado perseguição*
Repertório de José Guerreiro

Desde o sul até ao norte
O meu povo canta a sorte
De um marinheiro embarcado
Que endurece o coração
E combate a solidão
Cantando um sentido fado

Meu povo tem sentimento
E canta a todo o momento 
Poetas e trovadores
O fado que é seu destino
Dá-lhe o poder divino 
De enaltecer os amores

Povo do fado è feliz
Canta-o por todo o país 
Deixando ver nostalgia
Os sofrimentos guardados
São espelho de tantos fados 
Cada noite em cada dia

Desde o norte até ao sul
Debaixo de um céu azul 
Que a nossa noite ilumina
Meu povo com mágoa canta
E o som de cada garganta 
Mostra ao mundo a sua sina

O fado é minha oração

Maria de Lurdes Brás / Lino Bernardo Teixeira *fado ginguinha*
Repertório de Maria de Lurdes Brás

Que estranho modo de sentir e de cantar
Um sentimento que faz de mim outro ser
E talvez seja esta a maneira de eu mostrar
Este prazer de ser fadista e ser mulher

Eu canto o fado com ternura e muita garra
Seguro o xaile com carinho e muito jeito
E ao ouvir o trinar de uma guitarra
Meu coração quase me salta do peito

A noite negra tem seu encanto e feitiço
Me envolve nesta magia de cantadeira
Gosto do fado quando ele é bem castiço
Eu sou castiça muito à minha maneira

Meu xaile é negro mas meu fado não é não
É com orgulho e altivez que sei cantar
Dou alma ao fado e faço dele uma oração
Eu sou fadista e é assim que sei rezar 

Fado das notícias

Piedade Fernandes / Sidónio Pereira
Repertório de Sara Coito

Notícias leva-as o vento
E novas o vento não traz
Resta no peito um lamento
Que as nossas vidas desfaz

Porém p'ra ti abro o meu leito 
Morno e aconchegado
Onde a chama no meu peito 
Volta a arder contigo ao lado

E quando a vida porém 
Um do outro nos levar
Juro, não digo a ninguém 
Mas vou morrer a chorar

Ainda assim, peço a Deus 
Que não me faça esperar
Pois quem sabe, ainda nos céus 
Te poderei encontrar

A senhora Mouraria

Fernando Farinha / Alberto Correia
Repertório de Fernando Farinha 

A Mouraria deixou de ser cantadeira
Já veste de outra maneira 
Está com aspecto mais novo
Lisboa quis ser sua protetora
E fez dela uma senhora 
Já não é mulher do povo

Fez do passado um segredo
Agora deita-se cedo 
E acorda cedo também
E o fado, seu antigo namorado
Já se sente envergonhado 
Da beleza que ela tem

Lisboa 
Disse adeus à Mouraria
E o fado desde esse dia
Com saudade
Sem saber onde morar
Andou perdido a cantar 
Pela cidade
Agora 
Que o Bairro Alto o prendeu
E que o povo o recebeu 
Em sobressalto
Eu
peço nesta cantiga
Que Lisboa nunca diga
Um adeus ao Bairro Alto


A Mouraria já não é a rapariga
Boémia, simples e amiga 
De noitadas e de farra
Não quis o velho xaile franjado
Pôs as cantigas de lado
E até vendeu a guitarra

Já não usa tamanquinhas
Não entra no Campainhas 
Nem se dá com o rufia
Por isso, o velho Apolo, saudoso
Morreu triste e desgostoso 
Com pena da Mouraria

Uma sombra qualquer

Letra e música de Carlos Alberto França
Repertório de António Mourão

Ando perdido na noite do tempo
Como o luar pelo espaço vazio
Olho-me às vezes e não reconheço
O que sobra de mim é meu rosto sombrio

Sonho acordado que tenho o teu corpo
Quero dormir mas o tempo demora
Triste destino de barco sem porto
Como um peso morto ao romper da aurora

Como uma sombra qualquer
Minha vida é viver sem sentido sequer
Disperso de mim, do meu próprio ser
É talvez uma loucura que ainda perdura
Tentar esquecer
Se já não há cura para o meu viver

Ando esquecido daquilo que fui
Pelo amor que a teu lado vivi
Onde estou eu que já não sei quem sou
Desde o dia cinzento em que te perdi

Imaginar o que farás agora
Que te encontraste e és feliz finalmente
É o veneno que hoje me devora
Porque eu fiquei só num mundo tão diferente

Conselhos para quê

Mote de Augusto Gil / Glosa de Carlos Conde 
Música de Adriano Batista *fado macau*
Repertório de Fernando Maurício

Maria da da Graça é uma
Cachopa, de olhos em brasa
Usa
cigarros, não fuma
Mas tem cinzeiros
em casa

Tem
na sala de visitas 
Veludos, divãs d'espuma
E se há cachopas bonitas 
Maria da Graça é uma

Dotada de graça infinda 
Todos lhe arrastam a asa
É p'ra outros a mais linda 
Cachopa, de olhos em brasa

Dorme
de bem durante o dia
Liberta de crise alguma
Diz que não quer companhia 
Usa cigarros, não fuma

Se não é certa a resposta 
P'ra quem os nervos arrasa
Não fuma porque não gosta 
Mas tem cinzeiros em casa

Esta fome de viver

Vasco Lima Couto / Jaime Santos *fado alfacinha*
Repertório de Vasco Rafael

Esta fome de viver
Esta fome de cantar
Este cruel movimento
De quem não sabe esperar

Este falar de infinito 
Tão finito no prazer
Tão reservado em meu grito 
Como a fome de viver

Este sair para a rua 
Como quem se apressa a entrar
E na loucura insinua 
Esta fome de cantar

Este olhar sem direção 
Feito de esquinas de vento
Mercenário coração 
Deste cruel movimento

Tem um retrato e um nome 
Na carta de marear
Venham ajudar a fome 
De quem não pode esperar

Ai se eu pudesse

Domingos Gonçalves da Costa / Martinho d'Assunção
Repertório de Fernanda Maria

Ai se eu pudesse falar
Gritar o meu desespero
Contar ao mundo 
A quem eu amo e quero

Sem que o mundo 
Pudesse murmurar
Então, meu Deus, seria mais feliz
Porque é veneno o segredo
Que a boca cala e não diz

E fiz desta canção 
A meiga confidente
Do segredo d'amor 
Que guardo avaramente
Até que chegue a hora 
Em que eu puder viver feliz
Junto de quem 
É a razão do meu viver

Ai se eu pudesse abraçar
Quem foge dos meus abraços
Quem sinto andar 
Na sombra dos meus passos

Sem que eu, pobre de mim, 
Possa alcançar
Escusava de sofrer a dor ruim
De andar na vida à procura
De quem se afasta de mim

Quatro facas

Manuel Alegre / Acácio Gomes *fado bizarro*
Repertório de Camané

Quatro letras nos matam, quatro facas
Que no corpo me gravam o teu nome
Quatro facas, meu amor, com que me matas
Sem que eu mate esta sede e esta fome

Este amor é guerra de arma branca
Amando ataco, amando contra-atacas
Este amor é de sangue que não estanca
Quatro letras nos matam, quatro facas

Armado estou de amor e desarmado
Morro assaltando, morro se me assaltas
E em cada assalto sou assassinado
Armado estou de amor e desarmado

Quatro letras amor, com que me matas
E as facas ferem-me mais, quando me faltas
Quatro letras nos matam, quatro facas
Quatro letras amor, com que me matas;
E as facas ferem-me mais, quando me faltas
Quatro letras nos matam, quatro facas

Alma sentida

Moreira da Cruz / Júlio Proença *fado puxavante*
Repertório de António Mourão

Quando o teu olhar desmente
Tua boca, quando fala
Deixa lá, minh'alma sente
O que o teu coração cala

Só Deus sabe quanto ilude 
Uma expressão de candura
Às vezes, num gesto rude 
Vai um mundo de ternura

Não percas, ó minha mãe 
O teu jeito de embalar
Lá no céu conserva-o bem 
Pois a ele quero voltar

Ai a vida, o que è a vida 
Que sentido è que ela tem
Uma ânsia desmedida 
Daquilo que nunca vem

Adeus Açores

Letra e música de Fernando Farinha
Repertório do autor

Adeus Açores
Ó minha terra natal
Tuas ilhas são as flores
Mais belas de Portugal
Adeus Açores
Linda terra onde eu nasci
Quanto mais longe te vejo
Mais pertinho estou de ti

Pátria bendita
Por Jesus abençoada
Motivo desta saudade
Que não te esquece por nada

Da Terceira a São Miguel
Corvo, São Jorge e Faial
Tudo em ti è um painel
De beleza sem igual
Santa Maria te abraça
Pico e Flores faz-te formosa
E para te dar mais graça
Até tens a Graciosa

Aquele amor que vivi

Silvestre José / Acácio Gomes *fado acácio*
Repertório de Maria do Rosário 

Aquele amor que vivi
Precocemente o perdi
Deixou-me pra sempre à espera
Foi uma bênção celeste
Neste mundo tão agreste
Tão bom como a primavera

Aquele amor que partiu
Nunca mais ninguém o viu 
Destino, não mo recordes
Se este mundo amargurado
Sob a tristeza è cantado 
Ainda escuto seus acordes

Aquele amor que è saudade
Vivido com intensidade 
Não durou mais que uma hora
Tanto que havia a fazer
Tanto a dar e a receber 
Deixou-me só, foi-se embora

Aquele amor que mais quero
Tanto que ainda o espero 
Nos momentos de amargura
Dos beijos deixou-me o gosto
Na minha boca, no rosto 
Deixou marcas de ternura

Aquele amor verdadeiro
Foi último mas foi primeiro 
Ainda paira no meu leito
Dorme comigo a meu lado
Está comigo em cada fado 
Que canto e que sai do peito

Coração desfeito

Maria de Lurdes Brás/ José Moreira *fado sinfonia do desejo*
Repertório de Maria de Lurdes Brás

Não sei se é de pedra ou de madeira
O coração que tens dentro do peito
Seja desta ou assim doutra maneira
Esse jeito de amar não è perfeito

Eu queria um coração de pedra dura
P’ra não sofrer com tanta desilusão
Pois quando precisamos mais ternura
È quando sofre mais o coração

As rosas são tão belas, delicadas
Também são grandiosos os espinhos
Só precisam ser colhidas e mimadas
E tratadas com doçura e carinhos

Tenho a marca da saudade, bem presente
Tatuada na parede do meu peito
Com conta peso e medida, docemente
Vou mimando o meu coração desfeito

É quando canto o meu fado

Letra e musica de Manuel Alcobia
Repertório de Vasco Rafael

É quando canto o meu fado
E que Lisboa anoitece
Que o meu amor acontece
Nas longas asas da noite;
Que é de noite que eu existo
E afasto a melancolia
Com que me visto de dia

É quando canto o meu fado
Que me encontro inteiramente
Neste corpo onde m' invado
Me ultrapasso intensamente;
Febrilmente vejo sombras
Refletindo um tal bailado
Nos movimentos dum fado

É quando canto o meu fado 
Que o meu amor se enternece
E que me meu corpo estremece
Nos braços da fantasia;
Que fantástica harmonia
E os movimentos da noite

Têm sons de sinfonia

A fazer horas prá saudade

Francisco Nicholson / Eugénio Pepe
Repertório de António Mourão

Ando a brincar co'a madrugada
A fazer horas prá saudade
A noite corre apressada

É tão tarde, já é tão tarde

E vou fingindo não ser nada
Eu sou herói sendo covarde
Ando a brincar co'a madrugada
Mas é tarde, já é tão tarde

Não, não, n
ão quero viver sem ti
Não quero crer nada do que ouvi

E vou correndo a madrugada
De rua em rua, ao Deus-dará
Voltar p'ra quê se à chegada
Tu não estás, sei que não estás

Fazendo horas prá saudade
Vou enganando a minha dor
Não volto e finjo que m'esperas

Meu amor, ó meu amor

Estante velhinha

Linhares Barbosa / Alberto Costa *fado dois tons*
Repertório de Fernanda Maria

Lisboa, estante velhinha
Do tão livro, a Mouraria
Andam-te a arrancar as folhas
Uma a uma, dia a dia

Foste a cartilha do fado 
Moirama triste e sincera
Livrinho d’apontamentos 
Que pertenceu à Severa

Os homens que te mutilam 
São como aquelas crianças
Que rasgam sem piedade 
Uma agenda de lembranças

És um livrete sem capa 
Se teima a destruição
Roubam-te a mais linda página 
A rua do Capelão

Pede a Deus esta ventura 
Por muito que tudo mude
Conserva a iluminura 
Da senhora da Saúde

Uma saudade que és tu

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de Pedro Vilar

Há solidão no nosso quarto tão nu
Onde apenas há saudade
Uma saudade que és tu
Ah solidão, pior do que estar sozinho
Pois nosso quarto está cheio
Da ausência do teu carinho

Solidão
Hoje és minha companheira
Tu e eu somos um nada
Um nada que nos rodeia


Tu, solidão, sozinha na noite escura
Meus braços querem teus braços
Loucos à tua procura
Há solidão no nosso quarto tão nú
Onde apenas há saudade
Uma saudade que és tu

Chegada

Ulisses Duarte / José Marques do Amaral
Repertório de António Mourão

Fui dar com a minha barca
Errando no meio da bruma
Embalada pelas ondas
Que a beijavam una a uma

Minha barca torturada 
Queria ao menos ver o céu
Mas a bruma cor de prata 
A cegava com seu véu

Barca, ruma ao teu porto 
Vai ser doce o teu chegar
Não tem estrelas no céu 
Mas tens estrelas no mar

Barca que voltas na noite 
Dá-lhe a tua madrugada
E desfaz teu sonho inteiro 
Só de encontro à amurada

Deixa a saudade

António Rocha / Popular c/arranjos de Fontes Rocha
Repertório de António Rocha

Deixaste em mim uma saudade sem ter par
Da tua ausência fiz versos que não cantei
Mas hoje vi o céu azul do teu olhar
E de meus tristes pesadelos, acordei

Mais bela ainda que no dia em que partiste
Qual ser divino, surgiste na minha frente
Eu que pensando em ti, estava sozinho e triste
Voltei à tua realidade sorridente

Breve ilusão, curto sorrir, breve verdade
Alto castelo que amanhã já será pó
Pois vais de novo, nas deixa a saudade
P'ra que me sinta menos triste e menos só

Fado da Cezária

Silva Tavares / Filipe Duarte
Versão do repertório de Tony de Matos
Criação de Adelina Fernandes na opereta “Mouraria” 
Teatro Apolo em 1926. 
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia 
Livro *Poetas Populares do Fado-Canção*

Tanto a desgraça me alcança 
Que já me sinto cansado
Da vida que não se cansa 
De me fazer desgraçado

E como o fado alivia 
As mágoas que a gente sente
Eu brindo à minha agonia noite e dia
Cantando constantemente

Foi um beijo venenoso
Demorado, langoroso
Que perverso me tornou;
Eu faço o que me fizeram
Pois ninguém foge ao seu fado;
Foi a mentir que mo deram
É a mentir que eu vos dou
  


Aquela a quem dei a vida
E o que eu tinha de mais meu
Não passa duma perdida
Sem saber quem a perdeu

É por isso que p'lo fado 
A minh'alma se desgarra
Pois esquece o meu passado torturado
Quando chora uma guitarra
- - -
Versão Original

Tanto a desgraça me alcança 
Que já me sinto cansada
Da vida que não se cansa 
De me tornar desgraçada

E como o Fado alivia 
As mágoas que a gente sente
Eu minto à minha agonia, noite e dia
Cantando constantemente

Foi um beijo venenoso
Demorado, langoroso
Que perversa me tornou
E eu faço o que me fizeram 
Pois ninguém foge ao seu fado
Foi a mentir que mo deram
É a mentir que eu os dou


Aquele a quem dei a vida 
E o que tinha de mais meu
Hoje chama-me perdida 
Mas não diz quem me perdeu

É por isso que no Fado 
A minh’alma se desgarra
Pois esqueço o meu passado torturado
Quando chora uma guitarra


É curioso como o poder e a popularidade de certas letras tornaram irresistíveis 
determinados fados fazendo-os ser trauteados por muito boa gente 
fora do meio fadista.
Na verdade, muitas senhoras bem casadas e de conduta irrepreensível 
trauteavam o fado Perseguição 
(«Lá porque és rico e elegante / Queres que eu seja tua amante…») 
bem como este Fado da Cesária, confessando-se «desgraçadas», «perdidas» 
porque alguém as perdeu e, sobretudo, admitindo que «Foi um beijo venenoso 
demorado, langoroso / Que perversa me tornou (…) / 
Foi a mentir que mo deram / É a mentir que eu os dou», em clara alusão à vida 
pecaminosa de qualquer mulher mundana. 
Fica por saber se os maridos se importavam mas, aparentemente, não.

Desastre

Manuela de Freitas / José Mário Branco
Repertório de Camané 

A pedra bateu na fachada 
A casa ruiu
A onda varreu a amurada 
Perdeu-se o navio

O lápis sujou-se na lama 
Estragou o desenho
A jovem matou-se na cama 
Ao lado de um estranho

O homem saltou p'la janela 
Morreu na calçada
O grito soou na viela 
Ninguém deu por nada

A faca apareceu na mão 
O corpo caiu
O fogo abateu a prisão 
Mas ninguém fugiu

A chave sumiu no tapete 
A porta fechou
A sorte saiu no bilhete 
Que ninguém comprou

O guarda soltou o ladrão 
Prendeu o pedinte
A morto acordou em vão 
No dia seguinte

O medo impediu a diferença 
O sono não veio
No palco vazio a presença 
Que ficou a meio

O sino tocou a rebate 
A igreja ardeu
O pai pagou o resgate 
O filho morreu

O mar levou muita gente 
Ninguém foi ao fundo
O rato matou a serpente 
Na selva mundo

São voltas e voltas da vida 
A vida é assim
Às voltas nas voltas da vida 
Que farei de mim

Amor que é feito de ti

António Avelar de Pinho / Jorge Atayde
Repertório de António Mourão

Amor, que é feito de ti 
Em que sonhos te perdeste
Perdi-te, mas não perdi 
O amor que me quiseste

Trago um beijo bem guardado 
Bem calado e mal sofrido
Algum dia há-de ser dado
Amor perdoado 
Amor não esquecido

Teu lugar é a meu lado
De noite e de dia
Havia sempre um recado
Nas janelas que te abria
Agora espero por ti
Escutando o frio das horas
Amor, que é feito de ti
Amo, onde é que tu moras?


Disseram que tu moravas 
Em lugar desconhecido
Fui lá ver e tu não estavas 
Disseram que tinhas ido

Por isso canto este fado 
Mais que triste é bem sentido
Hás-de ouvi-lo em qualquer lado
Amor perdoado 
Amor não esquecido

Este dia que hoje abraço

José Gonçalez / Alfredo Duarte *fado cravo*
Repertório de José Gonçalez

Trago junto ao coração
Esta dor que é solidão
Que não sei dizer ao mundo
Trago a fé que já não tenho
Porque o tempo de onde venho
Se perdeu no mar profundo

Tenho em mim hoje amarro 
Um presente tão errado
Culpa de um passado antigo
Que é feito da criança 
Se nem mesmo hoje a esperança
Se quer vir deitar comigo

Onde está essa firmeza 
Do ontem que a certeza
No amanhã garantia
Se este dia que hoje abraço 
Envolvido no cansaço
É uma tristonha alegria

Peço a Deus que já não guarde
Outros sonhos p'ra mais tarde 
Se os que tive nunca quis
Não me queiram dar guarida
P'ra que quero eu outra vida 
Se nesta não sou feliz

Madrugada sem ter sono

Alexandre Fontes / Franklim Godinho
Repertório de Tristão da Silva

Madrugada sem ter sono
Dando voltas no meu leito
Ao lembrar teu abandono
Sinto angústias no meu peito

Dorme comigo o luar 
Não tenho sono, que importa
Mas eu não quero sonhar 
Sem entrares aquela porta

Se Deus quiser que um dia 
Tu regresses novamente
Ao sentir tanta alegria 
Eu vou dormir, finalmente

Eu prometo, meu amor 
Vou esquecer o que sofri
E digo seja a quem for 
Que sou feliz junto a ti

Fado fado

Nito / Pedro Rodrigues
Repertório de Deolinda Rodrigues

Ser fadista é ter no peito
Um coração contrafeito 
E um poema de afeição
É cantar constantemente
O amor de toda a gente 
Nos versos de uma canção

Em cada espaço de dor
É já saudade maior 
O pranto que se adivinha
É porta-voz de ansiedade
Daquele que chegou tarde 
E ficou de alma sozinha

Ó fado fado
Este povo que te canta
Ó fado fado
Vives na nossa garganta
Ó fado fado
Das horas boas e más
Quanta alegria tu nos dás
Ó fado fado

Se alguém anda amargurado
Busca o consolo no fado 
Conta-lhe s penas da alma
O fado que ao fado narra
Vai dedilhar na guitarra 
E o peito logo se acalma

Este fado que não passa
Canção-pátria, sol da raça 
Onde houver um português
Todos sabemos cantá-lo
P'ra tanto basta escutá-lo 
E repeti-lo outra vez

Vento feito de punhais

António Campos / Alfredo Duarte *fado bailado*
Repertório de Pedro Vilar

O vento corta meu peito
Numa volúpia certeira
Porque dorme no meu leito
A saudade derradeira
O vento corta meu peito

Vento feito de punhais 
Punhais vermelhos, ciúme
São tantos os vendavais
E não se apaga este lume 
Vento feito de punhais

Porque não vais, solidão
Que fazes aqui tão triste
Acalma-te coração
Se estás cansado, desiste
Porque não vais, solidão