-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
* 7.330' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

. . .

Festa grande na Atalaia

Isidoro de Oliveira / Lino Teixeira *fado ginguinha*
Repertório de Maria Leopoldina da Guia

Há festa grande na Atalaia, há romaria
Chegam os círios com foguetes e morteiros
Vive a Atalaia um momento de euforia
Ao receber os peregrinos e romeiros

Há velhos ritos, hoje feitos tradição
Há festa grande na Atalaia, há romaria
Rude homenagem de sincera devoção
O povo faz à mãe de Deus, Santa Maria

Estalam foguetes, há guitarras, cantoria
Há vinho tinto a regar chocos na brasa
Há festa grande na Atalaia, há romaria
Portas abertas, mesa posta em cada casa

O tempo passa sem ninguém o pressentir
Esconde-se a lua, vai nascendo um novo dia
Todos se sentem sem vontade de partir
Há festa grande na Atalaia, há romaria

Estrada

Manuel Andrade / José António Sabrosa
Repertório de Teresa Siqueira

Sozinha, trilho na estrada
O meu caminho sem fim
Eu sou tudo e não sou nada
Mas o que sou, sou por mim

Já tive mil rosas belas 
Mil rosas não foram nada
Outros ficaram com elas 
Eu fui sozinha na estrada

Meu amor tudo me deste 
Que te posso dar de mim?
Se queres um caminho agreste 
Escolhe o meu que não tem fim

Dou-te o sol da minha estrada 
Dar-te-ei luar também
Serás tudo, sem seres nada 
Serás eu, sem seres ninguém

Falarei pela tua voz 
Serei diferente por fim
Serei tu, seremos nós 
Mas não serei só por mim

Um minuto, meu amor

João Fezas Vital / Nuno Nazareth Fernandes
Repertório de Vasco Rafael

No minuto que nos derem 
Aqueles que fecham janelas
Os meus dedos no teu rosto 
Farão desenhos de amor
E os caminhos que fizerem 
Os meus lábios no teu corpo
Terão, da ternura, o gosto 
E a força que vem da dor

Um minuto é quanto quero 
Para que possa tocar-te
Como quem descobre a casa 
Onde sempre quis viver
Com a sede e o desespero 
De ser gente, e dar por isso
E a fúria, quase brasa
De não querermos morrer

É preciso ter coragem
P’ra enlouquecer devagar
Na saudade adivinhada
Da saudade que nos tomem
Vamos sair de viagem
Meu amor, por um minuto
Que é o tempo que a madrugada
Leva a ser mulher e homem

Mãe tristeza

Cátia Oliveira / Valter Rolo
Repertório de Sandra Correia

Fui perdendo a inocência
Com os ais de minha mãe
Ela, que escondia as mágoas
Que olhos tristes, minha mãe

Nunca te vi chorar
Mas dói ver-te sorrir
Mãe tristeza, o amor
Dói pra além da hora de partir

Se sorris só para não chorar
Deixa as lágrimas cair
Ninguém as vê
Mas há-de vê-las o mar

Dia de São Martinho

Manuel Andrade / Popular *fado das horas*
Repertório e António Melo Correia
No livro do poeta lê-se *Tipóias e boleeiros* no 1°verso do poema
que aparece com o título *Manhã de São Martinho*
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia
Livro *Poetas Populares do Fado-Canção*


Tipóias e cavaleiros
E as carroças do povinho
Milordes e cavaleiros
É dia de São Martinho

Na Chamusca de manhã 
Há grandiosa corrida
À tarde na Golegã 
É a festa mais garrida

Cavalos a relinchar 
Fadistas cantarolando
A festa vai começar
O povinho vai andando

Os “breaks” aos solavancos 
Cavalos à desfilada
Não faltam os saltimbancos 
Para animar a toirada

Manhã do melhor ensejo 
À tarde prova-se o vinho
Ó povo do Ribatejo 
É dia de S. Martinho

- - - 
VERSÃO ORIGINAL

Põe-se na brasa o chouriço
Há vinho novo a provar
Há burburinho castiço
Cavalos a relinchar

Tipoias e boleeiros 
E as carroças do povinho
Milordes e cavaleiros 
É dia de São Martinho

Na Chamusca, de manhã 
Há grandiosa corrida
E à tarde, na Golegã 
É a festa mais garrida

Cavalos a relinchar 
Fadistas cantarolando
A festa vai começar 
O povinho vai andando

Os breakes aos solavancos 
Cavalos à desfilada
Não faltam os Saltimbancos 
Para animar a toirada

Manhã do melhor ensejo 
À tarde prova-se o vinho
Ó povo do Ribatejo 
É dia de São Martinho 

O tempo dos anjos

Tiago Torres da Silva / Joaquim Campos *fado tango*
Repertório de Anamar
Copiado do livro de poesia de TTS

Eu hoje acordei mulher
Do homem que outrora fui
Cada um é o que quer
No momento em que souber
O passo a que o tempo flui

Amanhã serei o oposto 
Da mulher que em mim invento
Terei o eterno rosto
Porque conheço de gosto
A velocidade do tempo

Então verás semelhantes
O que não queres e o que gostas
Que as vidas depois estão antes
Das horas que são instantes
Das coisas que são opostas

Trazia um nome nos olhos

Manuel Andrade / Franklim Godinho
Repertório de Bela Bueri
No livro do poeta este tema aparece com o título *Trazia um nome*

Trazia um nome nos olhos
Um nome não sei de quem
Trazia um nome nos olhos
Trazia um nome de alguém

Era de pedras musgadas 
O verde do seu olhar
Tinha nas faces queimadas 
Os beijos quentes do mar

Trazia um nome nos olhos 
Um nome da cor do céu
Nome de vento ou de escolhos 
Nome que não era o meu

Os seus cabelos ao vento 
Eram lenços a acenar
Tão longos como o lamento 
De uma mão que aponta o mar

Trazia o nome de alguém 
Nos meus braços o esqueceu
E nos meus olhos, também 
Outro nome se perdeu

Fado das caravelas

Isidoro de Oliveira / Casimiro Ramos *fado três bairros*
Repertório de Manuel Cardoso de Menezes

Ao partir as caravelas
Levavam cruzes nas velas
Enfoladas pelo vento
Levavam fé em Jesus
Todo o padrão tinha cruz
A cruz do descobrimento

Missionários e soldados
Todos a Deus devotados 
Deixando a pátria e os seus
Cruzavam o mar profundo
Dando mais mundos ao mundo 
Dando mais almas a Deus

O mar com todo o seu p’rigo
Dividia o mundo antigo 
Com medo de navegar
Já não há mundo perdido
Não há mundo dividido 
Mas unido pelo mar

Pelos cinco continentes
Juntam-se terras e gentes 
Mundo velho e mundo novo
Sujeitos à mesma lei
Muitos reinos, um só rei 
Muitas raças, um só povo

Descendentes de soldados
Tão temidos e honrados 
Degenerando dos seus
Cruzam hoje o mar profundo
Tirando mundos ao mundo 
Roubando almas a Deus

Ao voltar as caravelas
Não trazem cruzes nem velas 
O vento só as destroça
Renegamos a Jesus
Abandonamos a cruz 
Triste cruz será a nossa

Rouba ao vento a liberdade

Mote (5ª estrofe) Augusto Gil / Glosa: Fezas Vital / António Chaínho
Repertório de Teresa Siqueira

Lava as mãos em alfazema 
Vai ao campo ver crescer
Razões de ser dum poema 
Se um crime tens de fazer

Rouba ao vento a liberdade 
De ser raiva, e abandono
Pois se tu não fores verdade 
Antes fique vago um trono

Fizeram de ti soldado 
Corpo em flor de quem quiser
Ai menino mal mandado 
Antes um palácio a arder

Antes o medo, a tristeza 
E a dor de não ter sono
Mais valem flores d’incerteza 
Do que uma enxada sem dono

Se um crime tens de fazer
Antes fique vago um trono
Antes um palácio a arder
Do que uma enxada sem dono

Fado Carlota

Manuel Andrade / Fernando Pinto Coelho
Repertório de António Pinto Basto
Copiado do livro do poeta
                                                                                       
No tempo em que te amei
Sonhos lindos semeei
Num canto do meu jardim
E as sementes dolorosas
Fizeram-se lindas rosas
Que sorriam para mim

Já tudo o vento levou 
E do nosso amor ficou
Um roseiral de saudade
Para sempre me lembrar 
A sina triste de amar
Um dia de felicidade

E nos dias mais risonhos
Vivem ali os meus sonhos
As rosas riem p’ra mim
O teu rosto vive ainda 
Dentro da rosa mais linda
Das rosas do meu jardim

Vive ali por todo o dia 
Esse amor que me fugia
No teu riso sem igual
Para o mundo e para a vida 
Na paisagem recolhida
Do meu lindo roseiral

Amor perfeito

Isidoro de Oliveira / Raúl Ferrão *fado carriche*
Repertório de Manuel Cardoso de Menezes

Desfolhas um malmequer
Buscando um amor perfeito
Anda não viste, mulher
O que trago no meu peito

Buscando um amor perfeito 
Tu destróis qualquer flor
Mas não encontras amor 
Procurando desse jeito

Há que ter maior respeito 
Por quem nos ama e nos quer
O teu desprezo só fere 
Tu não queres falar comigo
Em vez de ouvires o que digo 
Desfolhas um malmequer

Anda não viste, mulher 
Que te tenho amor profundo
P’ra mim só existe mundo 
No dia em que te tiver

Tu não vês quem bem te quer 
Com carinho e com respeito
É este o amor perfeito 
Não o que buscas em vão
Já é teu um coração 
O que trago no meu peito

O que trago no meu peito
Não é um amor qualquer
Aceita este amor perfeito 
Deixa em paz o malmequer

Processo de loucura

João Fezas Vital / António Chaínho
Repertório de Hélder Cruz


Olhos de ave perdida num longe que não é seu
Como se o horizonte fosse mesmo o que era
O peito a arder de febre dum sol fechado ao céu
Tortura de ter falhado o tempo da primavera

Asas de ave perdida num voo feito de nada
E que a dor amordaçou como insulto derradeiro
Desespero de criança em busca da alvorada
Entontecida p’lo espanto do medo ser verdadeiro

Nudez de ave perdida no espaço do meu pecado
Soluço de abandono em acesso de aventura
Tão triste a liberdade de nunca ter cantado
Ave branda, minha sede, meu processo de loucura

Calçada de Carriche

Isidoro de Oliveira / Popular *fado mouraria*
Repertório de Teresa Siqueira

Carriche, a velha calçada
Tinha campo e liberdade
Era uma horta encantada
Mesmo às portas da cidade

Lisboa saía as portas 
Quando o calor apertava
E com prazer abancava 
Gozando o fresco das hortas
Só regressava horas mortas 
Depois da sardinha assada
Do peixe frito e salada 
E mesmo com muito vinho
Encontrava o seu caminho 
Carriche, a velha Calçada

Mal se falava em toirada 
Lá no Campo de Santana
Lisboa de traquitana 
Partia para a Calçada
A passo vinha a manada 
Bem conduzida, à vontade
Mas ganhava velocidade 
E então, se um toiro fugia
Começava a picardia 
Tinha campo e liberdade

Tudo era morto e fechado 
Na cidade adormecida
Lisboa buscando a vida 
Ia a Carriche ouvir fado
Num retiro improvisado 
Até alta madrugada
Cantava-se à desgarrada 
E a água nas regadeiras
Respondia às cantadeiras 
Era uma horta encantada

Se Lisboa fatigada 
Quer descansar de Lisboa
Percorre estradas à toa 
E regressa mais cansada
Lembrando a velha Calçada 
Com sua simplicidade
Decerto sente saudade 
Dos tempos que ali passava
De tudo o que ela lhe dava 
Mesmo às portas da cidade

Todo feito de rosas

Manuel Andrade / Fontes Rocha *fado Isabel*
Repertório de Carlos Mendes Pereira
No livro do poeta o tema aparece com o título *É todo feito de rosas*

É todo feito de rosas
O trilho do teu caminho
São mil pétalas formosas
Que eu desfolho sozinho

E na esteira que deixaste 
A tua estrada florida
São rosas que desfolhaste 
No jardim da minha vida

Quando as pétalas caírem 
Hei-de pisar com carinho
Essas flores que cobrirem 
O trilho do teu caminho

E quando a noite cair 
Fazendo negras as rosas
O leito onde irei dormir 
São mil pétalas formosas

Em passadas dolorosas 
Hei-de ferir-me p’lo caminho
Nos espinhos dessas rosas 
Que eu desfolho sozinho

Janeiro proíbido

João Fezas Vital / Alfredo Duarte *fado louco*
Repertório de João Braga 

Mãos abertas fui ausente
Em jeito de primavera
Meu amor ficou contente
Pois sabia quem eu era

Trago mais claro, no rosto 
O meu amor tão sentido
Hoje é raiva, foi desgosto 
Num janeiro proibido

Ando doido p’la cidade 
E ninguém repara em mim
Julgo morrer de saudade 
Mas meu amor é assim

Os seus braços voltarão 
Como ramos, aos meus braços
E onde bate um coração 
Sentiremos nossos passos

Segredo sagrado

Tiago Torres da Silva / Pedro Rodrigues
Repertório de Clara

Quis saber o teu segredo
Mas depois fiquei com medo
De não o saber guardar
As palavras que se calam
Parece que às vezes falam
No fundo do nosso olhar

Jurei pela minha vida
Nunca dar por repartida 
A história que te escutei
Quiseste algo mais sagrado
Então jurei pelo fado 
E nunca mais o cantei

Antes não o ter sabido
Do que escutar o Corrido 
Refém daquela promessa
Nas juras com que me amarras
Eu sei que ao som das guitarras 
Qualquer alma se confessa

Guitarra!... sei os segredos
Que bailam por entre os dedos 
Da alma do tocador
Mas se um dia, por loucura
Eu quebrar a minha jura 
Toca... toca, por favor

Cantar é desabafar

Mário Rainho / Paco Gonzalez
Repertório de Jaime Dias  

A minha voz cantou p’ra não chorar
Porque a saudade dói, quando acontece
Às vezes, cantar é desabafar
E o frio que há em nós, quase arrefece

A minha voz cantou dum jeito terno
Numa oração sentida onde se espera
Alcançar o final dum longo inverno
Florir um novo fado em primavera

A minha voz cantou a noite inteira
Para afastar de mim, a solidão
Que teimou em ficar à minha beira
A envelhecer meu tonto coração

A minha voz cantou um novo fado
Marcado pelo tom da despedida
E mal se despedia do passado
Voltaste tu de novo à minha vida

Onde nem entra a saudade

Tiago Torres da Silva / Carlos Neves *fado tamanquinhas*
Repertório de Clara

Numa tasca escura e fria
Onde nem entra a saudade
Não há mar nem maresia
Mesmo assim, a poesia
Sente-se ali à vontade

Na mesa mais recolhida 
Está um poeta sentado
Busca o mar numa bebida
Onde ele encontre outra vida 
Que talvez se chame fado

Rabisca numa toalha 
Uns versos que ela lhe ensina
Cada verso é uma mortalha
Onde o poeta agasalha 
Os gritos de uma varina

E depois, quando eu lhe canto 
Os versos que ele escreveu
Ele afasta-se no espanto
De descobrir que o seu pranto 
É tão grande como o meu