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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.350' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

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Quem me dera

Letra e música de Matias Damásio
Repertório de Mariza 

Que mais tem de acontecer no mundo
Pra inverter o teu coração pra mim
Que quantidade de lágrimas 
Devo deixar cair
Que flor tem de nascer 
P'ra ganhar o teu amor

Por esse amor, meu Deus
Eu faço tudo
Declamo os poemas mais lindos 
Do universo
A ver se te convenço
Que a minha alma nasceu para ti

Será preciso um milagre
Para que o meu coração se alegre
Juro, não vou desistir
Faça chuva, faça sol
Porque eu preciso de ti para seguir

Quem me dera
Abraçar-te no Outono
Verão e Primavera
Quiçá, viver além uma quimera
Herdar a sorte 
E ganhar teu coração

Será preciso uma tempestade
Para perceberes 
Que o meu amor é de verdade
Te procuro nos outdoors da cidade
Nas luzes dos faróis
Nos meros mortais como nós

O meu amor é puro
É tão grande e resistente 
Como um embondeiro
Por ti eu vou onde nunca iria
Por ti eu sou o que nunca seria

Deixa caír

Carlos Leitão / Paulo Paz
Repertório de Carlos Leitão

Deixa cair, não faças nada
Tenho a almofada
E o meu sufoco faz de mim louco 
Por não partir
Deixa cair, fico no chão
Longe das mãos que não me querem 
E me desferem por não querer ir

Morres-me aqui 
Em cada acto onde me mato
E se sonhar é o verbo amar
Sonho-te a ti
Eu já não quero
Fico na cama onde se ama
Já não, não vou contigo e fico aqui

Teus olhos nos meus

Teresinha Landeiro / Carlos da Maia *fado perseguição*
Repertório de Teresinha Landeiro

Ao olhar-te da janela
Vi teus olhos pousar nela
Na janela que eu abri
Das cortinas voaram beijos
E entre eles alguns desejos
Que pedi quando te vi

Tinhas preso no teu jeito
Um sorriso imperfeito 
Que marcava quando rias
Trago ainda o olhar
Com que olhavas ao passar 
A janela onde me vias

Passavas noites e dias
Todas as vezes sorrias 
Com alguma timidez
Ia sempre prá janela
Pois sabia que por ela 
Passarias outra vez

Vou descer à tua rua
Numa noite em que a lua 
Pratear os olhos teus
Vou dizer-te num olhar
Não passei só por passar 
Queria os teus olhos nos meus

Das horas abandonadas

Rodrigo Costa Félix / Tiago Machado
Repertório de Sandra Correia

De onde me vem esta voz
Que é mais antiga que o tempo
Do tempo da minha idade
Virá do fundo de nós
Daquele breve momento
Em que não fomos saudade

De onde me vem esta dor
Que se solta quando canto
E me entorpece os sentidos
Virá de ti, meu amor
Do teu riso, do teu pranto
Ou dos meus sonhos perdidos

De onde virá a tristeza
Que me veste as madrugadas
Deste fado escuro e frio
Virá meu bem, concerteza
Das horas abandonadas
Do nosso quarto vazio

De onde vens tu, que não chegas
Não me abraças, não me beijas
Nem me esperas na entrada
Do futuro que me negas
Só lembranças tu me deixas
Mas eu não quero mais nada

Murmúrios secretos

Elsa Laboreiro / António Neto
Repertório de Elsa Laboreiro  

Trago lembranças do mar
Dentro do meu coração
Momentos de sol doirado
Sobre areias de paixão

Trago uma concha na mão
Refúgio dos meus segredos
Guardiã dos meus sossegos 
E da minha condição

E dos mais altos rochedos 
Voam asas de saudade
Em ânsias de liberdade 
P'ra mundos desconhecidos

Mas em qualquer infinito 
Na mais longínqua paragem
Seja qual for a viagem 
É só em ti que eu existo

E é por isso que o mar 
Nos seus murmúrios secretos
Fala de beijos e afetos 
Que trago no meu olhar

Ai meu amor, meu amor
Volta nas ondas do mar

Improviso

Rosa Lobato Faria / Popular *fado menor*
Repertório de Carlos Zel

Se uma palavra pudesse
Abrir o teu coração
E aquele que a dissesse
Inventasse uma canção

Se um gesto da tua mão
Nos apontasse o caminho
Que leva da solidão
Ao centro do labirinto;
Se tudo aquilo que eu sinto
Alcançasse noutra voz
O voo que ao teu ouvido
É ave dentro de nós;
Eu faria amor contigo
Quando não estamos a sós

Amor perfeito

Letra e música de Héber Marques
Repertório de Mariza

Eu ouço as marchas de São João
E o coro negro que me traz tanta emoção
Na rua a amargura calou a voz
Só resta entanto, um quando espanto
Que me faz erguer a voz dos meus avós
Daquilo que era, que sempre será

Mais do que o fogo 
Que arde sem se ver
Mais que a palavra 
Que o mundo faz esquecer
Mais que o ciúme 
Que a terra conheceu
Amor perfeito
Quem será que o entendeu

Olhai o triunfante trovador       
Cantar o seu romance, o seu esplendor
É sol de pouca dura, dá luz sem cor
Pois falta entanto um quanto espanto
Que me faz erguer a voz dos meus avós
Daquilo que era e sempre será

Porque choras, coração

Ricardo Maria Louro / Popular *fado menor*
Repertório de Cláudia Leal

Porque choras, coração
Porque cantas a chorar
Que retalhos de solidão
Andas tu a namorar

Porque teimas, incerteza 
Em aninhar-te no meu peito
Tu semeias a tristeza 
Ao teu gosto e ao teu jeito

Porque escorres, solidão 
Pela vida num olhar
Tu queres ter uma afeição 
E só cantas a chorar

Não insistas, coração 
Em bater tão magoado
Que afinal a solidão 
É mais um verso do meu fado

Por môr de bailar

Tiago Torres da Silva / Valter Rolo
Repertório de Sandra Correia 

Quem nunca foi a Viana
Não conhece viras ou gótas
E se julga que me engana
Bem pode ir arrumando as botas

Sou rapariga do Minho
Mas não me hão-de chamar galega
E nenhum homem sozinho
Me canta um fadinho
Que um pra mim não chega

Quem nunca foi a Viana
Não conhece gótas ou viras
E não julgue que me engana
Apenas com duas mentiras

Sou rapariga do Minho
E não me hão-de levar à certa
Mas se houver um rapazinho
Que me dê carinho
Deixo a porta aberta

Não convidem prá bailação
Quem chegou mas já trouxe par
Deixem isso às raparigas
Que ensaiam cantigas
Por môr de bailar
Deixem isso às raparigas
Não façam intrigas
Porque arranjam par

Quem nunca foi a Viana
Poderá ser pobre ou ser rico
Mas não julgue que engana
Se não vier ao bailico

Sou rapariga do Minho
E sem ser nenhuma beleza
Levo a água ao meu moinho
Pois visto de linho
Bem à portuguesa

Fado do cívico

Ernesto Rodrigues, Félix Bermudes e João Bastos / Bernardo Ferreira
Versão do repertório de Gustavo Leal
Criação de Estevão Amarante na revista *Torre de Babel* em 1917
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia
Livro *Poetas Populares do Fado-Canção*


Eu sou polícia, por desgraça
Faço frente à populaça
Que me odeia porque a livro dos ladrões                                   
E se dou caça aos malandrões
Sou apupado, sou corrido, apedrejado
Vou corrido aos encontrões;
E se faço um gesto vago 
P'ra bater nos refilões                    
Eu sou corrido e mal pago  

Hei-de multar, fazer prisões
Hei-de apitar contra os ladrões
E tudo por seis tostões

Quando a república se fez
Comi tanto dessa vez
Fiquei logo com a cabeça partida
Ai veio o 14 de Maio
Ai, pai da vida,  e ferram-me um outro ensaio     
Que a coisa esteve gaudida
E tanto tenho levado que já estou acostumado
Que não quero outra comida   
                      
São traulitadas, cachações
São ??? de pinhões
E tudo por seis tostões
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Versão Original

Criação de Estevão Amarante na revista *Torre de Babel* em 1917
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia no livro
Poetas Populares do Fado-Canção

Eu sou polícia, por desgraça
Faço frente à populaça
Que me odeia porque a livro dos ladrões
E se dou caça aos malandrões
Sou apupado, sou corrido, apedrejado
Vou corrido aos encontrões
E se faço um gesto vago 
P’ra bater nos refilões
Eu sou corrido e mal pago.

Hei-de apitar contra os ladrões
Hei-de prender os malandrões
E tudo por seis tostões


Quando a República se fez
E eu comi tanto, dessa vez
Fiquei logo com a cabeça partida.
Mas veio o 14 de Maio, ai Pai da Vida
Ferraram-me um outro ensaio 
Que a coisa esteve gualdida
E tanto tenho levado
Que já estou habituado
E não quero outra comida

Hei-de apitar contra os ladrões
Hei-de prender os malandrões
E tudo por seis tostões


Eu uma vez caí na asneira 
De atirar-me a uma sopeira
Que me dava boas pernas de galinha
E vai daí, de manhãzinha
Ardendo em brasa, subo a escada
Entro em casa, vou direito à cozinha
Apalpei uma pessoa
Vai-se a ver, era a patroa
Que me fechou logo na cozinha

Veio o marido aos encontrões
Lá fui corrido aos cachações.
E tudo por seis tostões

Passamos para o âmbito mais doméstico do Ministério do Interior, neste fado
que descreve as atribulações de um «cívico», isto é, um polícia de giro. 

Incompreendido (vá-se lá saber porquê), a população não lhe fica reconhecida por
livrá-la dos ladrões, malandrões e refilões, com explícitas queixas pelo baixo salário: 
seis tostões. 

Mais uma vez a política, com referência à «traulitada» por ocasião da implantação da
república e da posterior revolta de 14 de Maio de 1915, que derrubou o governo de
Pimenta de Castro (mais uma das que ocorreram entre 7 parlamentos, 8 presidentes 
da república e 39 governos de 1910 a 1926, ano em que foram repostos a estabilidade 
e o equilíbrio das finanças públicas, até 1974).

Em 1970, Vicente da Câmara, que em criança ouvia este fado numa grafonola de 
manivela, cantado pelo próprio Estêvão Amarante, aproveitou a música para uma 
letra de Francisco Branco Rodrigues, gravando assim o seu êxito 
*O Fado Antigo é Meu Amigo* reeditado em 2004 num CD biográfico 
deste grande fadista.

Santo António traiçoeiro

Teresinha Landeiro / Alfredo Mendes *fado fininho*
Repertório de Teresinha Landeiro

Eu sempre quis um santo pra meu par
António foi por quem me apaixonei
De santo tinha o nome e o olhar
Abençoado o dia que o encontrei

Um dia fui às festas populares
Lisboa festejava o Santo António
Comprei uns manjericos singulares
E em dois rimava António com demónio

Então vi o meu par no bailarico
Dançava junto dela na igreja
Daí estar escrito no meu manjerico
Não é o António o santo que se deseja

E foi no baile que o meu coração
Parou ao ver tão falsa santidade
Pedi a Santo António um João
E que fosse esse um santo de verdade

De novo perguntei ao manjerico
Que quadra me havia de calhar
E a rima disse não ao namorico
Pois nela, o João vai me enganar

Andava por Alfama a vaguear
Coberta de tristeza e solidão
Talvez houvesse um Pedro pra casar
Que não fosse parecido ao tal João

Juntei todas as rimas populares
E então me apercebi do pandemónio
Que o santo casamenteiro dos altares
Criou com o João, o Pedro e o António

Abandonei a festa popular
Subi a São Vicente e confessei
Não quero mais santos pra me enganar
Pra esse peditório eu já dei;
Não quero mais santos pra me enganar
Pois pra esse peditório eu já dei

Fado em bom português

Tiago Torres da Silva / Alfredo Duarte *fado laranjeira estilizado*
Repertório de Miguel Ramos
Letra cantada no espetáculo musical *Casa de Fado* 
Teatro Villaret, Lisboa, 2004

Portantos, uma canção
Para a conseguir cantar
Pode faltar coração
Tem de se saber falar

Estas novas raparigas 
Ganham p'ra mais de 100 contos
Mas as fadistas antigas 
É que o sabem tudo… e prontos

Mal ponho um disco a tocar
Fico cheio de saudades
Mas se hei-de ouvir a chorar
Por certo tu também há-des

Quem canta o fado sentido 
Pode às vezes ver-se à rasca
Para cantar o Corrido 
Fora da luz de uma tasca

Porque é à luz de uma vela
Com vinho do carrascão
Que o fadista abre a "jinela"
P'ra dentro do coração

Inté já me têm dito
Alguns de vossemecês
Que o fado é hoje erudito 
E fala bom português

Amor aos molhos

Teresinha Landeiro / Pedro de Castro
Repertório de Teresinha Landeiro

Amor aos molhos
Dizem meus olhos
Quando te vejo de noite, ao cantar
Digo o que sinto
Juro, não minto
Tenho o desejo de te namorar;
Digo o que sinto
Juro, não minto
Sei que um dia ainda vamos casar

A tua boca de noite voltou
Vinha mais bela que as ondas do mar
Essa que um dia saudade deixou
E o desejo de um dia a beijar;
Desde esse dia em meu sonho ficou
Esta loucura de amar

A tua boca de noite voltou
Nela, sem medo, poisei meu olhar
Desde esse dia meu fado ficou
Preso nas rimas do meu verbo amar;
Quando acordo e tua não sou
Peço prá noite voltar

Maré viva

Rosa Lobato Faria / Mário Pacheco
Repertório de Carlos Zel

Primeiro a minha mão sobre o teu seio
Depois um pé… o teu… sobre o meu pé
Logo o roçar urgente do joelho
E o ventre mais à frente na maré

É a onda do ombro que se instala
É a linha do dorso que se inscreve
A mão agora impõe, já não embala
Mas o beijo é carícia, de tão leve

O corpo roda: quer mais pele, mais quente
O boca exige: quer mais sal, mais morno
Já não há gesto que se não invente
Audácia que não ache um abandono

Então já a maré subiu de vez
É todo o mar que inunda a nossa cama
Afogados de amor e de nudez
Somos a maré alta de quem ama

Por fim, o sono calmo que não é
Senão, ternura, intimidade e enleio
O teu pé descansando no meu pé
A minha mão dormindo no teu seio

O mesmo mar

Letra e música de Fernando Girão
Repertório de Cláudia Leal 

Tentei encontrar
O teu pedaço de mar
No segredo das águas
Tentei decifrar
O que resta de mim
E assim lavar as mágoas

Tentei entender
Sentir a sensação
De ser parte do todo
Tentei refazer
O que tinha perdido
E começar de novo

Na orla dos teus sonhos
Tento chegar, mas nunca chego
Não sei se és tu que não deixas
Ou se eu de ti tenho medo

Viajamos por muitos rios
Apaixonados e ardentes
Procurando o mesmo mar
Por caminhos tão diferentes

A nova Rosa da Mouraria

Letra e música de Marco Oliveira
Repertório de Tânia Oleiro

De manhãzinha 
Voltou a Rosa, sem dizer nada
Vinha sozinha 
E mais formosa, bem apressada
Parou na Rua do Capelão
Onde esperava
O tal rapaz 
Que há muitos anos a namorava

Ai quem diria que um dia 
A Rosa da Mouraria
Voltava àquela casa
No Largo da Severa
Ai quem diria
Que a Rosa da Mouraria
Tinha a vida bem guardada
P'ra voltar a ser quem era

Viu sardinheiras 
E margaridas numa janela
Namoradeiras 
Entristecidas à espera dela
Agora a casa t
em o encanto 
Que tinha outrora
Até a Rosa 
Já prometeu não ir embora

Eternos rituais

Ana Vidal / José Campos e Sousa
Repertório de António Pinto Basto


Percorro palmo a palmo o teu desejo
E palmo a palmo sinto-me vibrar
Primeiro, na lenta perfeição de um beijo
Que nos acende o corpo, devagar;
Tão devagar que sinto mais que vejo
Morrer na minha pele o teu olhar

Depois, nas mãos que inventam sábiamente
Novos desenhos, esboços delirantes
Perdidos tempo e espaço, de repente
Partimos à deriva, viajantes;
Somos cinco sentidos, simplesmente
Por novas dimensões alucinantes

E assim, de sal e mel embriagados
Cumprimos os eternos rituais
E ao som de coros loucos, inspirados
Dançamos com o vento nos trigais;
Entre a terra e o céu, entrelaçados
Senhores do universo uma vez mais

Por fim, quando o desejo é já cansaço
E voltamos a nós, devagarinho
Ancoramos na calma de um abraço
Feito de gratidão e de carinho;
E é prazer ainda, quando passo
A mão, no teu cabelo em desalinho

Somos amor

Hélder Moutinho / Carlos Macedo
Repertório de Maria Dilar 

Amantes somos nós e não sabemos
O quanto pode haver de amor em nós
O quanto desejamos e vencemos
Na força que retrata a nossa voz

Amantes somos nós e somos lua
A oferecer o brilho à noite escura
E somos aguarela viva e nua
Pintada com mil cores duma ternura

Por isso amor
Sabes de cor o que é ser gente
Para depois
Nenhum olhar andar ausente
Somos assim
Como um jardim de Abril em flor
Somos amantes a cantar
Somos amor

E toda a vida vamos ser amantes
Na nossa madrugada já vencida
Que até os nossos corpos radiantes
Darão à negra noite, a luz da vida

Amantes somos nós eternamente
Por mais que alguém condene o nosso amor
E somos a raiz duma semente
Que já cresceu botão e fez-se em flor