-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
* 7.330' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

. . .

Serapião Pimenta

José Castro Carvalho / Alvaro Martins
Repertório de Zé Carvalho

O Serapião Pimenta
Que já passou dos oitenta
P’ró que lhe deu, vejam bem
Foi pedir em casamento
A filha do Chico Bento
Que nem vinte anos tem

Com tal diferença de idade
Havia necessidade 
A fim de evitar sarilhos
Fazer os dois uns testes
E lá foram um dia destes 
Saber se teriam filhos

Fez cada um sua análise
E até hemodiálise 
Num exame bem estudado
Uns vinte dias depois
Lá compareceram os dois 
P’ra saber o resultado

A sua análise está bem
Nada de grave contém 
É o que assinala esta cruz
A menina está intacta
Logo portanto, está apta 
P’ra casar e dar à luz

Perante tal resultado
O Pimenta entusiasmado 
Logo ali pediu a Deus
Que tudo lhe perdoasse
E lá do alto mandasse 
A benção prós filhos seus

Tenha calminha Pimenta
Porque o seu teste apresenta 
Uma cruz e mais um i
Boa saúde, de facto
Para casar está apto 
Mas só p’ra fazer xixi

O Tejo e as gaivotas

Mário Rainho / Nuno Nazareth Fernandes
Repertório de Vanessa Alves 

Não há nuvens sobre o Tejo
Há só bandos de gaivotas
São como estrelas remotas
Que num voo apaixonado
Lhe quisessem dar um beijo
Enlouquecidas, devotas
Com gorjeios, que são notas
Vestindo os versos dum fado

Este rio que corre 
Mas muito pouco apressado
Até ao mar, onde morre 
Tem gaivotas por telhado

Parece querer ficar 
Abraçado a uma canoa
E a brincar 
Com as gaivotas de Lisboa

Quando a Lua aparece 
E baixa até ele, do alto
Este rio adormece 
Mas acorda em sobressalto

E as gaivotas, despertas 
Sem ter gestos de abandono
D’asas abertas 
Vão guardar-lhe o sono

As mulheres

José Castro Carvalho / Alvaro Martins
Repertório de Zé Carvalho

Ai as mulheres... 
Deus me livre, Deus me livre
Ai as mulheres... 
Desse ser que um dia fez
Ai as mulheres... 
Há mulheres de tal calibre
Ai as mulheres... 
Em vez duma quero três

Ai pobres dos mal casados 
Que casaram por promessas
Andam na vida trocados 
Andam na vida às avessas

Quando é a mulher quem manda 
Dá-nos até a impressão
Que a vida pára, não anda 
Se cá vou é quem comanda
P’ra que serve o capitão

Quem desdenha quer comprar 
Toda a vida ouvi dizer
E a gente só quer amar 
A que mais nos faz sofrer

O homem tudo consente 
Quando vai em tal feitiço
A mulher é uma serpente 
Que se enrosca bem na gente
E o que a gente quer é isso

Desafio

Joaquim Nogueira Marques / Popular *fado mouraria estilizado*
Repertório de Maria Emília Sobral

Vou lançar-te um desafio
Vê se sabes responder
É um nome meigo, macio
Que é morada e é mulher

À volta sete colinas 
São seu tecto, chão e casa
Dos olhos são as meninas 
Os bairros que ela abraça

Por becos, escadas, vielas 
É que faz os seus caminhos
Tem luz, flores nas janelas 
O céu e o mar por vizinhos

Um namorado a seus pés 
Que beijos de água lhe dá
Tem fado de lés a lés 
Qual o seu nome ? diz lá!

O homem tem de cantar

Torre da Guia / Alvaro Martins *fado varito*
Repertório de Tony Lopes

O homem tem de cantar
À vida, constantemente
Para poder suportar
O lugar que lhe calhar
Na vida de toda a gente

Canta a mãe quando embala
Seu filhinho com amor
Canta o pai quando trabalha
O pão justo do suor

Canta inteira a natureza
Que acorda sempre a cantar
E canto eu a certeza

Do amor que quero dar

Menina de rosto oval

António Frazão / Alvaro Martins
Repertório de Nuno de Aguiar

Menina de rosto oval 
Que bates o linha novo
Na ribeirinha do povo 
A pensar no enxoval

Bates sem sentir fadiga 
Em suave movimento
Entoando uma cantiga 
Que fala de casamento

Seu avental
Baila com o vento
E o rosto oval
A sorrir sem um lamento

Inundando o areal 
Bate o sol no estendedoiro
Ai... corando a fios d’oiro 
O linho do enxoval

E lá no meio do remanso 
Onde a água é mais cristal
Ata linhos em descanso 
Menina do rosto oval

Eu e o mar

Maria Manuel Cid / Joaquim Campos *fado tango*
Repertório de Maria Emília Sobral

Fui ao mar buscar alento
E o mar nada me deu
Quem dera que num momento
Viesse o teu pensamento
Abraçar de novo o meu

Quem dera que as minhas penas 
Fossem nas ondas também
Que as minhas horas amenas
Ficassem calmas, serenas 
Como o mar às vezes tem

E que nunca a tempestade 
Transformasse o mar sem fim
Desse ao sonho a realidade
E nunca a voz da verdade 
Viesse gritar em mim

Homenagem a Sta Maria

Maria do Sameiro / Martinho d’Assunção
Repertório de Maria do Sameiro

Imaculada Virgem Maria
Foi visitada p’lo anjo de Deus 
Um certo dia
Um filho santo darás à luz
O Espírito Santo
Um filho de Deus chamado Jesus

Tu respondeste com humildade
Sou sua serva
Faça-se em mim a sua vontade
Entre as mulheres bendita serás
E bendito é o fruto 
Desse teu ventre que à luz darás

Maria... Santa Maria
Maria mãe de Jesus
Ao mundo déste alegria
E o mundo deu-te uma cruz
Maria... Santa Maria
Ó mãe do rei salvador
Ao mundo traz harmonia
Traz perdão, paz e amor

O mundo canta tua bondade
Rainha santa
Rogai por nós, ó majestade
Mulher bendita, mãe sem igual
Mãe infinita, mãe de nós todos
Mãe do Natal

Amor profundo, esposa de Deus
Rainha do mundo
Do sol e da terra, do mar e dos céus
És minha calma de noite e dia
Guardas minh’alma
Por isso te canto, ó Santa Maria

Ironias

Herculano Gonçalves / Alvaro Martins
Repertório de Nuno de Aguiar

Quem sofrer e calar penas
Em sofrimento dobrado
Quando mais fundo é o rio
Mais corre manso e calado

Não há amor sem ciúmes 
Tem ciúmes quem quer bem
E às vezes temos ciúmes 
Sem nós sabermos de quem

Penso que pensas que penso 
Em ti, a cada momento
E outra a pensar que eu dispenso 
Só a ela, o pensamento

Gosto é a razão sentida 
Desgosto a razão recente (?)
Gosto e desgosto é a vida 
Contra a vontade da gente

Para quem tenha saudades 
A tristeza nunca finda
E há sempre lugar no peito 
P'ra mais saudades ainda

O milagre que pedi

Letra e música de Carlos Macedo
Repertório do autor

Pedi a Nossa Senhora 
Uma graça com fervor
Meu amor não foi embora 
É maior o nosso amor

Eu prometi caminhar 
Até à Cova da Iria
Valeu a pena rezar 
Rezar à Virgem Maria

Senhora pelo vosso cuidado
Obrigado, obrigado
Senhora pelo vosso cuidado
Obrigado, obrigado

Ó Virgem tanto me deste 
Já não sofro o que sofri
Sou feliz porque fizeste 
O milagre que pedi

Virgem Santa padroeira 
Se achais que merecemos
Fazei que a paz seja inteira 
Neste mundo em que vivemos

Os loucos não mentem

Torre da Guia / Alvaro Martins
Repertório de Maria d’Assunção

Loucos, que loucos que eu os vi
Junto com eles senti
Do que é capaz o amor
Loucos, loucos assim como eles
Eu p’ráli no meio deles
A viver a mesma dor

É sempre assim
O amor faz recordar
Faz viver e faz chorar
Magoa mesmo cá dentro
E há quem diga
Que é fácil de dominar
Que pode até amarrar
A força do sentimento

Loucos, os loucos não são vaidosos
Amam, insistem, teimosos
No amor que lhes consentem
Loucos, loucos sim mas na verdade
Merecem a felicidade 
Porque os loucos não mentem

Nome trocado

Joaquim Nogueira Marques / Joaquim Campos *fado rosita*
Repertório de Maria Emília Sobral

Trocaste meu nome um dia
Eu fingi não perceber
Fingi também que dormia
Não tive que responder

O nome que foi trocado 
Nem sei a quem pertenceu
A mim não me dá cuidado 
Um nome que não é meu

Agora quando me chamas 
Primeiro quero saber
Se desta vez não te enganas 
Se sou eu a responder

Qualquer se pode enganar 
Isso eu entendo, contudo
Quando um dia te trocar 
Troco nome e troco tudo

Acabou ontem à noite

Constantino Menino / Popular *fado menor*
Repertório de António Mourão
Este tema também aparece gravado com uma melodia 
de José Maria Nóbrega

Tudo acaba, tudo morre
Não pode o mundo parar
Acabou ontem à noite
A loucura de te amar

Muita vez a morte é vida 
Depois de muito sofrer
Acabei com a loucura 
Para voltar a viver

Libertei-me da maldade 
Cantei, chorei e bebi
Abençoada loucura 
Que me fez dono de mim

Quem me viu, chamou-me louco 
E sorriu do meu cantar
Sem saber que em mim morria 
A loucura de te amar

Poema da malta das naus

António Gedeão / Paulo Valentim
Repertório de Kátia Guerreiro

Lancei ao mar um madeiro
Espetei-lhe um pau e um lençol
Com palpite marinheiro
Medi a altura do sol

Com a mão esquerda benzi-me 
Com a direita esganei
Mil vezes no chão, bati-me 
Outras mil me levantei

Dormi no dorso das vagas 
Pasmei na orla das praias
Arreneguei, roguei pragas 
Mordi pelouros e zagaias

Tremi no escuro da selva 
Alambique de suores
Estendi na areia e na relva  
Mulheres de todas as cores

Moldei as chaves do mundo  
A que outros chamaram seu
Mas quem mergulhou no fundo 
Do sonho, esse, fui eu

O meu sabor é diferente 
Provo-me e saibo-me a sal
Não se nasce impunemente 
Nas praias de Portugal 

Como eu os vi

Neca Rafael / Alvaro Martins
Repertório de César Morgado 

Quando eu a vi 
Vi que me queria falar
Falou-me em ti 
E depois pôs-se a chorar

Pôs-se a chorar e coitada 
A chorar se despediu
Ela a chorar me pediu 
P’ra eu não te contar nada

Que coisas tem o amor
O riso a dor a alegria e pranto
Como tive pena dela
Dela, daquela que te ama tanto

Vejo-te agora 
Sozinho, triste e sem ela
Mandaste-a embora 
Andas a sofrer por ela

Não lembraste que depois 
Dum arrufo tão banal
Andam a sofrer o mal 
Da culpa que cabe aos dois

Quando isso acontecer

Tó Moliças / Carlos Macedo
Repertório de Carlos Macedo

Se sinto fugir-me a sorte
Que me abate tristemente
Quero lá saber da morte
Eu digo constantemente

Quando cansar de vencido 
Se a sorte não me valer
Eu direi desiludido 
Que não me importa morrer

Eu digo constantemente 
Que não me importa morrer
Só não quero é estar presente 
Quando isso acontecer

Depois do mal me passar 
Vendo a vida alegremente
Se a morte me procurar 
Só não quero é estar presente

É tudo revolta minha 
Eu sei bem que hei-de morrer
Só que quero é ser velhinho 
Quando isso acontecer

Sem ti

Torre da Guia / Manuel dos Santos
Repertório de Maria d’Assunção

Sem ti
Não sei o que sou
O que faço, aonde vou
Vagueio louca, sem rumo
Sem ti
Sou mais uma entre a gentalha
Triste pedaço de palha
Que arde sem deitar fumo

A minha vida é a tua
Como as pedras são da lua
Como a lua é do céu
Tudo o que tenho é teu
Os meus sonhos e gemidos
E até os cinco sentidos
Que a natureza me deu

Sem ti
Não sonho nem penso
E nem preciso de lenço
Para acenar um adeus
Sem ti
Sou um pedaço de nada
Nos braços da madrugada
Errantes como judeus

Nesta vida tudo é fado

Letra e música de Carlos Macedo
Repertório do autor

Fado é tudo nesta vida 
Que a gente tem de enfrentar
Fado é uma voz dolorida 
Que canta p’ra não chorar

O beijo duma criança 
Quando beija a sua mãe
É ternura que não cansa 
Pode ser fado também

O gemer duma guitarra ao nosso lado
É fado... é fado
Se um fadista conta coisas do passado
É fado... é fado
Poder sorrir a seguir de ter chorado
É fado... é fado
Poder amar e também ser muito amado
É fado... é fado

Os namorados na rua 
Têm fado nos seus beijos
Fazem poemas à lua 
Para matarem desejos

Fado alegre e fado triste 
Existe em qualquer lugar
Um fadista não resiste 
Por isso vive a cantar 

Fado de Alfama

Torcato da luz / Nuno Nazareth Fernandes
Repertório de Maria da Fé

Não tem vielas, tem veias 
Alfama virada ao rio
Ancorada nas areias 
Como se fora navio;
Não tem vielas, tem velas
Içadas em desafio

Debruçada
das janelas 
Por onde assobia o frio
Postigos de caravelas 
A que o mar nunca se abriu

Alfama persegue o cheiro 
Nas voltas das escadinhas
De algum amor marinheiro 
Sabendo a sal e sardinhas

Na água dos chafarizes 
Mata a sede da lembrança
Desses momentos felizes 
Em que nunca foi criança

Ancorada nas areias 
Como se fora navio
Não tem vielas, tem veias 
Alfama virada ao rio

Tanto mundo e tanto fado

Mário Rainho / Alberto Janes
Repertório de Paulo Jorge Ferreira 

Com horizontes, até onde a vista alcança 
E com distâncias, bem mais longe, no olhar
Venci os medos que trazia de criança
Como um infante, meus sonhos quis navegar

Ergui os mastros, desfraldei as minhas velas
E em barquitos de papel, fui marinheiro
Segui o rumo desenhado nas estrelas
E um astrolábio indicou-me o mundo inteiro

Deixei na terra a saudade
Chorei por mais que uma vez
Ganhei a idade 
Deste sonho português
Do longe trouxe até nós
De mar em mar navegado
Em minha voz
Tanto mundo e tanto fado

Bebi paisagens, que outros olhos não beberam
Ao pôr-do-sol nas praias mais tropicais
Provei, nas Índias, sabores que me enlouqueceram
Aprendi danças, muitos costumes tribais

Adamastores e outros medos, fui vencendo
De peito erguido, sempre à proa dum navio
Só as saudades me foram anoitecendo
Dando desejos de voltar dos mares ao rio

Esta noite com o fado

Fernando Campos de Castro / Carlos da Maia
Repertório de Carla Linhares

Nesta hora que se arrasta
Procuro na noite vasta
Um cantinho p’ra ficar
Um espaço que me acoite
Onde as horas desta noite
Não custem tanto a passar

De longe um vento gelado
Vem colocar-se a meu lado 
Como se fosse um assombro
Sinto as suas mãos tão frias
De saudade e agonias 
Sobre o gelo do meu ombro

Percorro as ruas sozinhas
E todas elas são minhas 
Nas suas sombras e medos
Não passa um vulto sequer
Onde possa adormecer 
Os meus sonhos e segredos

Ó noite da minha alma
Dá-me luz e toda a calma 
Do teu mundo sossegado
Dá-me espaço p’ra ficar
Onde me possa deitar 
Esta noite com o fado

Dei-te tudo quanto tinha

Letra e música de Carlos Macedo
Repertório do autor

Dei-te tudo quanto tinha
Apenas p’ra ver sorrir
Teus olhos minha paixão
A tua mão sobre a minha
Disse-me todo o sentir
Que sentia o coração

Sentimos um só desejo
De vivermos lado a lado 
Este amor que é meu e teu
Bebemos do mesmo beijo
Cantamos o mesmo fado 
E o amor aconteceu

Hoje vivemos a vida
Que sonhamos num abraço 
E se fez realidade
Não há meta definida
O meu mundo é o teu regaço 
Onde deito a felicidade;
Não há meta definida
O meu mundo é o teu regaço 
Onde mora a felicidade 

Quando a dor bateu à porta

Aníbal Nazaré / Maximiano de Sousa 
Repertório de Max

Quando a dor bateu à porta 
Eu corri e fui abrir
Ela entrou, vinha cansada 
Sentou-se logo a seguir

Sem sequer pedir desculpa 
De vir sem ser convidada
Disse-me que ficaria 
Comigo, uma temporada

A dor sentou-se 
E ficou à minha beira
Habituou-se 
A ser minha companheira
Eu compreendo 
Que ela esteja junto a mim
Mas às vezes não entendo 
Porque me persegue assim

Mas o tempo vai passando 
E a dor não se vai embora
Já começo até pensando 
Porque tanto se demora

Até penso nesta lida
Já que a dor só quer ser minha
Hei-de mudar desta vida 
E deixar a dor sozinha

Um fado para vós

Manuel Carvalho / Eduardo Jorge *fado moreno*
Repertório de Aida Arménia

Dou aos fados que canto
A magia do encanto
Que me vem da minha voz
Cantando menos padeço
E com carinho ofereço
Meus fados p’ra todos vos

É condão que o fado tem
Se choro, chora também 
E cantando sou feliz
Com a voz que Deus me deu
E o sentir que lhe dou eu 
Canto ao povo, ao meu pais

É minha vida meu fado
Meu poema meu recado 
Que canto p’ra não chorar
O fado nasceu comigo
Em meu peito tem abrigo 
Hei-de morrer a cantar

Quase

Mário de Sá Carneiro / Jorge Barradas
Repertório de Alexandra

Um pouco mais de sol, eu era brasa
Um pouco mais de azul, eu era além
Para atingir faltou-me um golpe d'asa
Se ao menos eu permanecesse 
aquém

De tudo houve um começo e tudo errou
Ai a dor de ser quase dor sem fim
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim
Asa
que se enlaçou mas não voou 

Num ímpeto difuso de quebranto
Tudo encetei e nada possuí
Hoje de mim, só resta o desencanto 
Das coisas que beijei mas não vivi

Tanto me faz

Miguel Novo / José Mário Branco *fado balança
Repertório de Camané

Andas a dizer p’raí 
Que morres por me não ver
Eu já não gosto de ti 
Não me interessa nem saber

Nem que peças de joelhos 
Que eu volte a dar-te o que dava
Não embarco em contos velhos 
Era só o que faltava

Fartei-me de te avisar
Não vale a pena insistir
Voltar p’ra ti a chorar... 
Deixa-me rir
Quando se acaba o amor
Não se volta pata trás
Sejas tu, seja quem for... 
Tanto me faz

Não te adianta querer 
Que eu te procure ou te siga
Eu tenho mais que fazer 
Não vou na tua cantiga

Dizes que te sentes só 
Que choras ter-me perdido
Se esperas que eu tenha dó 
Tira daí o sentido

Que podemos ser felizes 
Que já não ‘stás magoada
Dar ouvidos ao que dizes 
Não me faltava mais nada

Talvez tu tenhas razão 
Talvez eu nunca t’esqueça
Mas que eu te peça perdão 
Nem te passe p’la cabeça

Não sei mais que te dizer
As coisas são mesmo assim
Mas se me queres convencer
Volta p’ra mim

Gosto mais de ti

Luís Simão / Francisco Carvalhinho *fado cachorrinha*
Repertório de Florinda Maria

Gosto do sol e do mar
E da chama da lareira
Tenho voz, ando a cantar
O fado, à minha maneira

Gosto da ave que voa 
Que sem entraves caminha
Não sei viver sem Lisboa 
Sem o Tejo e Sé velhinha

Tenho amor pela peixeira 
Que não teme os vendavais
Dou apreço à costureira 
Que se anela com dedais

Tenho a tudo amor profundo 
Mas também já percebi
Eu posso gostar do mundo 
Mas gosto bem mais de ti

Eu queria ser

Domingos Gonçalves Costa / Jaime Santos
Repertório de Fernanda Maria

Eu queria ser motivo dos teus sonhos
Eu queria ser o sol que te ilumina
Eu queria ser nos teus dias risonhos
Do amor a inspiração meiga e divina

Eu queria ser a sombra dos teus passos
Eu queria ser a luz dos olhos teus
Eu queria ser alguém que nos teus braços
Pudesse confiar-te os sonhos seus

Porém, passas por mim tão indiferente
Que nunca mais serei quem queria ser
E peço a Deus p’ra ser eternamente
Ceginha para nunca mais te ver

Procurando a felicidade

Fernando Campos de Castro / Armando Machado *fado mortalha*
Repertório de Maurício Cordeiro

Se o passado está vivido
E passou a ser história
Se o passado em ti abunda
Dá-lhe a gaveta mais funda
Dos armários da memória

O presente é o que importa 
Traga ele o que trouxer
Tens de senti-lo presente
E vivê-lo intensamente 
Em tudo o que ele te der

Quanto ao futuro, deixá-lo 
Há que ter esperança e fé
Que o futuro é coisa incerta
Uma porta entreaberta 
Que ninguém sabe o que é

São três fases duma vida 
Com a cor da nossa idade
Feitas de sol e de bruma
Em que uma vida se arruma 
Procurando a felicidade

Vamos em frente

António laranjeira / Raul Ferrão *fado alcântara*
Repertório de António Laranjeira

Se neste fado há pressa num verso novo
Quisera levar ao povo, mais alegria
Em cada dia quando tudo recomeça
Alguém na vida tropeça, por ironia

Por esta hora ao resgatar o passado
Um sonho foi adiado, inutilmente
É no presente que alguém espera de nós
Escutar em alta voz, vamos em frente

Meu país eu não reconheço
Quem fala de ti sem nada dizer
É suspeito chamar-te de berço
Aqueles que cresceram sem nada saber
Minha voz que se junta à tua
E que te defende com o coração
Enquanto a nação flutua
O povo na rua não perde a razão

Se neste grito em fúria sem direcção
Aumenta a contradição nem mais um passo
Porque o espaço parece fugir ao tempo
E o nosso constrangimento é um cansaço

Por mais um dia a fervilhar de surpresas
Ponham as velas acesas rapidamente
É no presente que alguém espera de nós
Escutar em alta voz vamos em frente