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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.330' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

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Naufrágio

António Cálem / Francisco Viana
Repertório de Miguel Sanches

Passos perdidos na noite
Na noite passos perdidos
Viela negra de lama
Naufrágio dos meus sentidos

Ondas franjadas de espuma 
Ondas negras entre escolhos
Toda a cidade era bruma 
Só era luz nos teus olhos

Essa luz é que chamava 
À perdição, os navios
E depois os naufragava 
Entre areais e baixios

Foi assim que me perdi 
Entre a noite e os escolhos
Sonhei ver luz e morri 
Na negrura dos teus olhos

Deixaste a vida de outrora

Maria Manuel Cid / Armandinho *fado da adiça*
Repertório de Sancha Costa Ramos

Cruzei na rua contigo
Repara que mal te vi
E francamente te digo
Que nem eu te conheci

Que é dessa cinta vistosa 
Que enrolavas à cintura
E tornava tão airosa 
A tua linda figura

E esses safões de borrego 
De castanho desbotado
Da manta que era aconchego 
Quando guardavas o gado

A tua calça justinha 
E o teu verde barrete
Com a borda já velhinha 
A beijar o teu colete

Da maneira tão tão airosa 
Com que montavas, pimpão
Essa faquinha nervosa 
O teu cavalo alazão

Deixaste a vida de outrora 
Renegaste a tua raça
E quando passas agora 
És mais um homem que passa

Tentação

Amadeu do Vale / Carlos Dias
Repertório de Amália

Por muito gostar de ti 
Me perdi, e desprezada
Procurei mal te perdi 
Por outro ser encontrada

Da culpa com que me feriste 
Vens hoje pedir desculpa
P'ra quê se tu me traíste 
Apenas por tua culpa

Pedes perdão da traição
Mas se sentes que'inda mentes
Não me tentes, isso não
Que eu sou mulher e bem vês
Que a mulher em quem não crês
Ainda tem a ilusão
De perdoar-te
P'ra depois poder beijar-te
Amor do meu coração


Já sei que te arrependeste 
E eu também me arrependi
De quando me conheceste 
Deixar-me prender a ti

Mas presa a essa mentira 
Em que cega acreditei
Minh'alma ainda suspira 
Tão cega de amor fiquei

Em cada português há um fadista

Manuel Alegre / João Braga
Repertório de João Braga

Em cada português há um fadista
O fado está na alma e está na voz
Haverá sempre a ilha nunca vista
Só essa é nossa, o fado somos nós

Haverá sempre a flor inconquistada
Haverá sempre em nós um outro lado
O fado é ter-se tudo e não ter nada
Em cada português há sempre um fado

Haverá sempre em nós o amor louco
Em cada um Dom Pedro e Dona Inêz
O fado dá-nos tudo e é tão pouco
Há um fadista em cada português

Amor do amor, amor de perdição
E quando mais se perde mais conquista
O fado é sempre um sim, é sempre um não
Em cada português há um fadista

Fado chinês

Letra e musica de João Nobre
Repertório de Fernanda Batista

O fado é mais cantado
Pelo mundo fora, que se imagina
Coitado, chegou-me agora
Até aos confins da China

Vai ser divertido ver
Como é o abandono por todo o lado
As chinesas de quimono
Andam a cantar o fado

Desde Nequin a Pequim, Xangai
Até já muita vez
Tudo lá canta com gemidos na garganta
O nosso fado disfarçado de chinês


Na China quem o supôs
Com dois pauzinhos postos de lado
Até já se come arroz
Ouvindo cantar o fado

Talvez só p’ra nos mostrar
Como são amigos sem represália
Vão fazer jarrões antigos
Com a cara da Amália

Praia perdida

António Cálem / Fontes Rocha *fado isabel*
Repertório de João Braga

Hoje, presa à minha voz
Vive uma infância perdida
O mundo éramos nós
Nessa praia adormecida

Depois veio a mocidade 
Depois veio o meio-dia
Foi-se o amor, foi-se a idade 
Em que a areia nos unia

Mais tarde a vida girou 
Como a roda da má sina
E um vento cego cegou 
Os teus olhos de menina

Sinto morrer o luar 
É noite na minha vida
Só o murmúrio do mar 
Lembra essa praia perdida

Lá longe em Diu

João Alarcão / Miguel Ramos
Repertório de Rodrigo Costa Félix

Porque há-de este amor ser de saudade?
Porque hei-de acordar do que sonhei?
Porque hei-de ver morrer esta verdade
Que tão longe, em Diu, reencontrei?

Lá longe, onde dorme a nossa história
No lajedo das muralhas que pisei
Lá, onde o sol é de oiro e o mar, memória
Do pranto desse eterno vice-rei

Uns olhos cor do mar me perguntaram
Se Portugal era uma vida ou um momento
E as sombras desses muros nos gritaram
Que era um caminho, uma verdade e um alento

Por isso este sonho dura ainda
Por isso a Índia estará em nós presente
Por isso é forte a sorte que não finda
Lá longe, tão longe, em Diu, na minha gente

Padre Zé

António Vilar da Costa / Nóbrega e Sousa
Repertório de Amália 

Tocam as matinas, nasce um novo dia
Já pelas colinas canta a cotovia
Vamos lá p’ra lida, toda a gente a pé
Que já está na Ermida o bom padre Zé

Ai, ai, já se murmura
Já se diz até
Não há outro cura, ai, ai
Como o padre Zé


Pelas tardes mansas, mal saem da escola
Chegam as crianças, poisam a sacola
E bailam de roda, ó lari ló lé
Cantigas à moda do bom padre Zé

É novos e velhos, mais velhos do que ele
Dá-lhes bons conselhos e bolos de mel
E ninguém se nega, ó lari ló lé
Ao vinho da adega do bom padre Zé

Ao findar a ceia, que bonito quadro
Vem a minha aldeia toda para o adro
Padre Zé no meio, como em oração
Num
divino enleio, toca violão

E ao luar de prata, os Manéis depois
Fazem serenata com os rouxinóis
E bailam de roda, ó lari ló lé
Cantigas à moda do bom padre Zé

A cidade saudade

Rodrigo Serrão / Casimiro Ramos *fado três bairros*
Repertório de Kátia Guerreiro

Quando as pedras do caminho
Vão chorando de mansinho
Por te ver já de partida
E a cidade estende os braços
Com saudade dos teus passos
Ao fundo de uma avenida

Fica tudo tão diferente
Pára o tempo e de repente 
Toda a cidade é só minha
Presa na margem do rio
Sou como um barco vazio 
Rumo ao futuro, sozinha

E as palavras que eu invento
Na tristeza do momento 
De te ver partir agora
São palavras, são carinhos
São os restos dos espinhos 
Do nosso amor que demora

E a cidade entristecida
Dorme à noite recolhida 
Porque a lembrança sorri
Como quem espera em ternura
Que
um dia à nossa procura 
Possas voltar sempre aqui

Vai aqui o Alto do Pina

Silva Nunes / Jorge D’Ávila
Repertório de Amália

Lisboa vem à janela
Olha a marcha, vem com ela
Lisboa vem ver num trono
O santinho, meu patrono

O bairro aonde moro 
Tem lá tudo que eu adoro
Lisboa cantando de novo
Traz o Alto do Pina 
Na boca do povo

O Alto do Pina faz um vistão
De cravo ao peito 
E arraiais no coração
O Alto do Pina, por brincadeira
Diz que ao passar 
Põe a cantar Lisboa inteira

Lisboa, quem foi que disse?
Que ir na marcha é tolice
A marcha tem luz aos molhos
E fogueiras nos teus olhos

Cantiga que o povo canta 
Põe a alma na garganta
Lisboa tem arte é ladina
Não há melhor marcha 
Que a do Alto do Pina

Em quatro luas

Aldina Duarte / António Zambujo
Repertório de António Zambujo

À janela corre o tempo
Na memória o esquecimento
E a vontade de ficar
Em teus braços distraídos
Entreabertos nos sentidos
Do teu corpo a meditar

O desejo que esqueci
Dorme agora ao pé de ti
No teu sonho a murmurar
Guardo a luz da tua pele
Duas rosas, vinho e mel
Quatro luas sobre o mar

Volto atrás nesta viagem
À procura da coragem
Que renasce de te ver
No regresso da saudade
Eu encontro a felicidade
Que por ti vou aprender

De boa fé

Artur Ribeiro / Júlio Proença *fado esmeraldinha*
Repertório de Maria Valejo 

De boa fé cheguei à tua vida
E dei-me sem limites de carinho
De boa fé e de razão perdida
Eu fiz da tua rua o meu caminho

De boa fé até ao absurdo
Eu pus nas tuas mãos a vida minha
Pode não valer nada, mas é tudo
E é no fim de contas quanto tinha

Mas tenho tanta fé e tanta esperança
Que fiz da minha esperança finca-pé
E não creio que sejas tão criança
Que tentes abalar a minha fé

Sete anos de pastor

Luís de Camões / Carlos Gonçalves
Repertório de Amália

Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel serrana bela
Mas não servia a ele, servia a ela
Que a ela só por prémio pretendia

Os dias na esperança dum só dia
Passava contentando-se com vê-la
Porém o pai usando de cautela
Em lugar de Raquel, lhe dava Lia

Vendo triste pastor que com enganos
Lhe fora assim negada a sua pastora
Como se a não tivera merecida

Começa de servi-lo outros sete anos
Dizendo mais servira se não fora
Para tão longo amor, tão curta a vida

Sempre vieste, enfim

Florbela Espanca / Rocha Oliveira
Repertório de Dina do Carmo

És tu, és tu, sempre vieste, enfim
Oiço de novo o riso dos teus passos
És tu que eu vejo a estender-me os braços
Que Deus criou p’ra me abraçar a mim

Tudo é divino e santo visto assim
Foram-se os desalentos, os cansaços
O mundo não é mundo, é um jardim
Um céu aberto, longes, os espaços

Prende-me toda, amor, prende-me bem
Que vês tu em redor? não há ninguém
A terra? - um astro morto que flutua

Tudo o que é chama a arder, tudo o que sente
Tudo o que é vida e vibra eternamente

É tu seres meu, amor, e eu ser tua

Passeio fadista

Alberto Rodrigues / José António Sabrosa *fado pechincha*
Repertório de António Rocha

Vem comigo passear 
À noite, à luz das estrelas
Para veres as coisas mais belas
De Lisboa à beira-mar

Depois é só dar um salto 
E como queremos dar brado
Ceamos no Bairro Alto 
Ouvimos cantar o fado

Anda ver p'la vez primeira 
A Madragoa das Trinas
E verás lindas varinas 
A caminho da Ribeira

A Mouraria passou 
Já nada tem para ver
Mas vamos lá reviver 
Onde a Severa cantou

Vamos na Alfama acabar 
Esta noite que vivi
Que é lá que eu quero cantar 
O fado, só para ti

Lágrimas do céu

Carlos Conde / João Maria dos Anjos
Repertório de Raúl Pereira

Quando eu canto e a chuva cai
Uma nuvem de incerteza
Paira em mim de quando em quando
Cada gota lembra um ai
A rimar com a tristeza
Dos versos que vou cantando

E na doce melodia
De que o fado se reveste 
Quando o meu olhar embaça
Vivo a estranha sinfonia
Da chuva que o vento agreste 
Faz murmurar na vidraça

Então dou, no meu lamento
Ao fado que me prendeu 
Rimas tristes, pobrezinhas
Cai a chuva, geme o vento
São as lágrimas do céu 
Que fazem brotar as minhas

Heranças

Susana Lopes / Raúl Ferrão *fado carriche*
Repertório de Susana Lopes

Minha mãe deu-me esta voz
Este soluço magoado
Pôs-me na garganta a noz
Dolente e bela do fado

Meu pai deu-me a poesia 
E este gosto de escutar
A doce melancolia 
De uma guitarra a trinar

Também herdei a magia 
De ter nascido em Lisboa
No
meu peito há Mouraria 
Nos meus olhos, Madragoa

Trago o fado nos sentidos 
Que linda herança a minha
Que os meus dois amores queridos 
Deram à sua alfacinha

Minha herança é a mais bela 
Que alguém jamais recebeu
Azul e rosa aguarela 
O fado a guitarra e eu

O que tinha de ser

Vinícius de Morais / Tom Jobim
Repertório de Mafalda Arnauth

Porque foste na vida
A última esperança
Encontrar-te me fez criança

Porque já eras meu
Sem eu saber sequer
Porque és o meu homem 
E eu a tua mulher

Porque tu me chegaste 
Sem me dizer que vinhas
E tuas mãos foram minhas
Com calma
Porque foste em minha alma
Como um amanhecer
Porque foste o que tinha de ser

Lembrando tradições

Letra e musica de Alice Pimenta
Repertório da autora

Recordando o fado velhinho
Fiz romagem p'los bairros antigos
E pisei de novo o caminho
P'ra rever meus velhos amigos

Mas chorei d'emoção e tristeza
Vendo Alfama e a Madragoa
Bairros que eram do fado a defesa
Choram hoje p'la velha Lisboa

Tradição, adeus tradição
Já não há sabor, é triste talvez
Tradição, tradição, tradição
Já não há labor ao sabor das marés;
Os pardais de telhado cantavam
Saltitando ao sol das vielas
Tradição, tradição, tradição
Varinas dançavam ao som das chinelas

Mão de mestre dava o testemunho
Ministrando regras consagradas
Honradez e respeito tamanho
Era a vida em pequenos nadas

Que saudade tenho dos tempos
Quando ouvia tão belos pregões
E nem era preciso argumentos
Gente simples, grandes corações

O fado

Guilherme Pereira da Rosa / Frederico Valério
Repertório de Fernanda Maria
Também gravado com o título *fado da consagração*

O fado, fado nascido em Lisboa
É voz de pena que soa 
Mágoa que do peito vem
O fado é bairro velho que chora
Alfama que se enamora
E conta o amor que tem

O fado é canto de feiticeiro
É Alfredo Marceneiro 
É um dom, uma expressão
E é fado, guitarra que nos murmura
Tudo aquilo que perdura
Bem dentro do coração
Ao fado Lisboa diz o que sente
Vai nela a alma da gente
Pois é ele o seu condão

O fado, fado que invade a cidade
É nostalgia, saudade 
Mal e bem, sorte e azar
O fado, é rumo de caravelas
E somos nós e são elas 
Que andamos a namorar

O fado, é moda da nossa gente
O passado e o presente 
O porvir, esse também
Pois fado é este jeito, esta briga
De chorar numa cantiga 
Um amor, tudo e ninguém
E é fado, aquele encanto profundo
Que vai daqui pelo mundo
E que ao mundo soa bem

Oh rio dos meus amores

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de António Mourão

Oh rio branco de prata
Que vais correndo sem fim
Vai perguntar a quem amo
Se ainda gosta de mim

Oh rio dos meus amores
Oh rio da minha alegria
Dá-me depressa o amor
Que tu me levaste um dia

Oh rio que vais cantando
Entre os campos a brilhar
Leva contigo a tristeza 
E ensina-me a cantar

Fado Batê

Maria Rita Louro / José António Sabrosa
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Eu só queria meu amor
Como os anjos do senhor
Ter asas, poder voar
Para quando me invade
Do passado a saudade
Eu te puder alcançar

Meu amor, se tu soubesses
E se meu coração lesses 
Choravam os olhos teus
Mas nunca o hás-de saber
Para findar meu sofrer
Bastava sabê-lo Deus

Pela dor do meu destino
Eu lhe peço, Deus menino 
Que me deixe ver alguém
Pois é tanta a minha dor
Que eu já nem sei ter amor
A quem amor por mim tem

Vou ouvir cantar o fado

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de António Mourão

Vou ouvir cantar o fado 
P’ra não falar mais em ti 
O fado sou eu agora 
No momento em que te vi

Vou ouvir cantar o fado 
Relembrando o fado meu
Ouvir uma voz magoada 
Cantar o pecado teu

Vou ouvir cantar o fado
Vou sentir ternura e dor
E vou calar no meu peito
A saudade e o amor


Vou ouvir cantar o fado 
O que a Severa cantou
Ouvir cantar sua morte 
E aquele amor que a levou

Vou ouvir cantar o fado 
Vou ouvir falar de ti
E falar do meu tormento 
No momento em que te vi 

Farrapo da vida

O.Trindade / J.Coutinho
Repertório de Tristão da Silva

Tu és farrapo da vida
Tens a alma perdida
E o amor próprio também
Tu és mulher desprezada
Não amas nem és amada
Não és filha de ninguém

Tu vives para enganar todo o mundo
Rico, pobre ou vagabundo
Um nome próprio não tens
Para uns és Madalena
Para outros Maria Helena
Mas para mim não és ninguém

Lar português

Maria Nelson / Jaime Santos
Repertório de Manuel Fernandes

A casinha de nós dois é pequenina
É mesmo em frente da capela
A dois passos uma fonte cristalina
Onde vou beber mais ela

É humilde a nossa casa mas é nossa
Dá-nos Deus esta riqueza
Um burrinho, uma carroça
Uma hortinha mimosa
A lareira sempre acesa

Uma candeia no topo 
A ceia feita com mato
Bebemos do mesmo copo 

Comemos do mesmo prato
Curiosa a lua cheia 
A janela vem espreitar
E vê, à luz da candeia 
Eu e ela a namorar

A nossa casa é um ninho pobrezinho
Onde há carinho, alegria, pão e vinho

Entra o sol e o luar pelo telhado
Cada um com sua chama
P’ra beijarem o senhor crucificado
Que está sobre a nossa cama

Os pardais em corridinhas pelo chão
Gostam da nossa pobreza
E comem com presunção
As migalhinhas de pão
Que caem da nossa mesa

Fado Alvim

Tiago Torres da Silva / Fernando Alvim
Reportório de Carlos do Carmo

Depois do mar / há um olhar 
Que ainda é mais azul
Azul de mim / azul sem fim 
Azul da cor dos mares do sul
Uma canção / cujo refrão 
Ninguém consegue decifrar
Se quem o canta / traz na garganta 
A voz do mar

Depois de ti / adormeci 
No alto mar, talvez
No mar gentil / no mar anil 
Num mar que em ondas se desfez
Não naufraguei / nem acordei
Nem te vi 
Pus-me a sonhar
Deite-me ao mar / pus-me a sonhar 
Adormeci

Depois da voz / deixe-te a sós 
Com a tua canção
Quando a ouvi / o que senti 
Fez-me entender a solidão
E o teu olhar / quase a chorar 
Foi-se fechando em timidez
Não tenho nada / só tenho a estrada 
Que a vida fez

Depois do bis / é  por um triz 
Que tu voltas para nós
Porque a guitarra / quase te agarra 
P’ra te levar na sua voz
E num tremor / descubro a cor 
Que há no sim
A cor do bis / azul-feliz 
Azul-Alvim

Era a noite que caía

Vasco Graça Moura / Carlos da Maia *fado perseguição*
Repertório de Joana Amendoeira

Era a noite que caía
E na sombra recolhia
O voo das andorinhas
Era a voz que se calava
Era a dor de ver que estava
Sem as tuas mãos nas minhas

Eram passos que escutei
Que eram teus ainda pensei 
Iludiu-me o coração
Foram pela rua escura
Longe da minha amargura 
E acompanhei-os em vão

Fiquei perto da janela
Pus-me a abri-la com cautela 
Fiz disfarce da cortina
Vi então na luz incerta
Que a rua estava deserta 
E deserta estava a esquina

Era só eu na escuridão
Era no peito um rasgão 
Era já no céu a lua
Que me importa, à minha porta
A sombra que se recorta 
Bem pode ainda ser a tua

Fado Deolinda

*Eu, guitarra*
Jorge Rosa / Edgar Nogueira
Repertório de Deolinda Maria

Todos sabiam que eu era 
A companheira do fado
Sempre vivi a seu lado 
Desde os tempos da Severa

Sofri com a sua dor 
Passei os mesmos tormentos
Nos bons e nos maus momentos 
Só lhe dei provas d'amor

Mas esse tonto
Quando teve a fantasia
De trocar a Mouraria 
Pelos bairros de alta roda
Chegou a ponto 
De me chamar inimiga
De me chamar velha antiga
Cansada e fora de moda

Mas o guitarra
Não me posso esquecer dele    
Ele continua fiel 
A todo o nosso passado
Acho bizarra 
A ideia de me afastar, mas não
Não vou deixar 
De ser amante do fado

Nas boites e casinos 
Onde faz da noite o dia
Toda e qualquer companhia 
Serve a esse valdevinos

Mas quando a voz do povo 
Lhe grita com emoção
É que ele chora e então 
Se lembra de mim de novo


EU, GUITARRA

Todos sabem como eu era
A companheira do fado
Que vivi sempre a seu lado
Desde os tempos da Severa

Sorria com o seu humor
Sofria com os seus tormentos
E nos bons e maus momentos
Só lhe dei provas de amor

Mas esse tonto, l
evado p’la fantasia
De trocar a Mouraria p’los bairros da alta roda
Chegou ao ponto de me julgar inimiga
De me chamar velha antiga
Cansada e fora de moda

Mas eu, guitarra, não posso viver sem ele
E continuo fiel a todo o nosso passado
Acho bizarra a ideia de me afastar
Mas não… 
Não posso deixar de ser a amante do fado

Nas boîtes e casinos
Onde faz da noite dia
Toda e qualquer companhia
Serve a esse valdevinos

E só quando a voz do povo
Lhe grita com emoção
É que ele chora e então
Se lembra de mim de novo

O lobo da serra

Paco Gonzalez / Popular *fado menor*
Repertório de Tristão da Silva

Quando o lobo desce a serra
Na fome que a neve traz
Não há nada que resista
À sua fome voraz

Falar-se de honestidade 
É bom para quem muito tem
Mas na serra da verdade 
Todos são lobos também

É lobo aquele que na glória 
Quer um trono requintado
Foi lobo aquele que na história 
Teve um lugar demarcado

Quando a a fome bate à porta 
Dum honrado cidadão
Não é homem mas é lobo 
Se não é lobo é ladrão

Nesta alcateia de lobos 
A que chamam sociedade
Não há lugar para todos 
Nem prós que falam verdade

A sombra dos teus desejos

Maria Manuel Cid / Jaime Santos *fado alvito*
Repertório de Carmo Moniz Pereira

Ai que bom que bom seria
Ter morrido nesse dia
E não ter de recordar
Vieste dizer-me adeus
Sem pores teus olhos nos meus
Partiste para não voltar

Vive o meu corpo sozinho
Dobrado sobre o caminho 
Onde o meu sonho morreu
Dei-te o amor mais profundo
Tudo o que tinha no mundo 
Fiquei mais perto do céu

Meus olhos choraram tanto
Ficaram secos de pranto 
Tristes, pesados e baços
Sinto o sabor dos teus beijos
A sombra dos teus desejos 
Mais o calor dos teus braços

Tu levaste a minha vida
Que ficaria perdida 
Se a tens deixado comigo
Porque a matéria não pensa
Que importa a tua presença 
Minha alma vive contigo

O lado bom do pecado

Tiago Torres da Silva / José António de Sabrosa *fado velho*
Repertório de Cristina Andrade

Não me ensines a pecar
Como eu te tenho ensinado
Ensina-me a aceitar 
O lado bom do pecado

Há quem peque por amor 
Mas eu cá não sou assim
Tenho um corpo pecador
Que peca tudo por mim

Não penses um minuto 
Que me vou arrepender
Eu peco sempre que escuto 
Uma guitarra a gemer

E se encontro a minha sina 
Nas palavras que há no fado
É só ele que me ensina 
O lado bom do pecado

A noite que não existe

Tiago Torres da Silva / João Maria dos Anjos
Repertório de António Vasco Morais

O meu corpo adormeceu
Mas a alma não esqueceu
A dor do teu abandono
E porque a dor é enorme
A minha alma não dorme
Quando está cheia de sono

Passa a noite vigilante
E não cede um só instante 
Ao cansaço que a persegue
Embala o meu coração
E murmura uma canção 
Para que o meu corpo sossegue

A alma não sente nada
Ficou p’ra sempre amarrada 
Ao momento em que partiste
E por mais que ela sossegue
Mais me arrisco a que se entregue 
À noite que não existe

Se te chega uma canção
P’ra sorrires à solidão 
Que de repente te assalta
Vem minha alma docemente
Que dormindo é que se sente 
Que a noite não nos falta