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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.330' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

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De boa fé

Artur Ribeiro / Júlio Proença *fado esmeraldinha*
Repertório de Maria Valejo 

De boa fé cheguei à tua vida
E dei-me sem limites de carinho
De boa fé e de razão perdida
Eu fiz da tua rua o meu caminho

De boa fé até ao absurdo
Eu pus nas tuas mãos a vida minha
Pode não valer nada, mas é tudo
E é no fim de contas quanto tinha

Mas tenho tanta fé e tanta esperança
Que fiz da minha esperança finca-pé
E não creio que sejas tão criança
Que tentes abalar a minha fé

Sete anos de pastor

Luís de Camões / Carlos Gonçalves
Repertório de Amália

Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel serrana bela
Mas não servia a ele, servia a ela
Que a ela só por prémio pretendia

Os dias na esperança dum só dia
Passava contentando-se com vê-la
Porém o pai usando de cautela
Em lugar de Raquel, lhe dava Lia

Vendo triste pastor que com enganos
Lhe fora assim negada a sua pastora
Como se a não tivera merecida

Começa de servi-lo outros sete anos
Dizendo mais servira se não fora
Para tão longo amor, tão curta a vida

Sempre vieste, enfim

Florbela Espanca / Rocha Oliveira
Repertório de Dina do Carmo

És tu, és tu, sempre vieste, enfim
Oiço de novo o riso dos teus passos
És tu que eu vejo a estender-me os braços
Que Deus criou p’ra me abraçar a mim

Tudo é divino e santo visto assim
Foram-se os desalentos, os cansaços
O mundo não é mundo, é um jardim
Um céu aberto, longes, os espaços

Prende-me toda, amor, prende-me bem
Que vês tu em redor? não há ninguém
A terra? - um astro morto que flutua

Tudo o que é chama a arder, tudo o que sente
Tudo o que é vida e vibra eternamente

É tu seres meu, amor, e eu ser tua

Passeio fadista

Alberto Rodrigues / José António Sabrosa *fado pechincha*
Repertório de António Rocha

Vem comigo passear 
À noite, à luz das estrelas
Para veres as coisas mais belas
De Lisboa à beira-mar

Depois é só dar um salto 
E como queremos dar brado
Ceamos no Bairro Alto 
Ouvimos cantar o fado

Anda ver p'la vez primeira 
A Madragoa das Trinas
E verás lindas varinas 
A caminho da Ribeira

A Mouraria passou 
Já nada tem para ver
Mas vamos lá reviver 
Onde a Severa cantou

Vamos na Alfama acabar 
Esta noite que vivi
Que é lá que eu quero cantar 
O fado, só para ti

Lágrimas do céu

Carlos Conde / João Maria dos Anjos
Repertório de Raúl Pereira

Quando eu canto e a chuva cai
Uma nuvem de incerteza
Paira em mim de quando em quando
Cada gota lembra um ai
A rimar com a tristeza
Dos versos que vou cantando

E na doce melodia
De que o fado se reveste 
Quando o meu olhar embaça
Vivo a estranha sinfonia
Da chuva que o vento agreste 
Faz murmurar na vidraça

Então dou, no meu lamento
Ao fado que me prendeu 
Rimas tristes, pobrezinhas
Cai a chuva, geme o vento
São as lágrimas do céu 
Que fazem brotar as minhas

Heranças

Susana Lopes / Raúl Ferrão *fado carriche*
Repertório de Susana Lopes

Minha mãe deu-me esta voz
Este soluço magoado
Pôs-me na garganta a noz
Dolente e bela do fado

Meu pai deu-me a poesia 
E este gosto de escutar
A doce melancolia 
De uma guitarra a trinar

Também herdei a magia 
De ter nascido em Lisboa
No
meu peito há Mouraria 
Nos meus olhos, Madragoa

Trago o fado nos sentidos 
Que linda herança a minha
Que os meus dois amores queridos 
Deram à sua alfacinha

Minha herança é a mais bela 
Que alguém jamais recebeu
Azul e rosa aguarela 
O fado a guitarra e eu

O que tinha de ser

Vinícius de Morais / Tom Jobim
Repertório de Mafalda Arnauth

Porque foste na vida
A última esperança
Encontrar-te me fez criança

Porque já eras meu
Sem eu saber sequer
Porque és o meu homem 
E eu a tua mulher

Porque tu me chegaste 
Sem me dizer que vinhas
E tuas mãos foram minhas
Com calma
Porque foste em minha alma
Como um amanhecer
Porque foste o que tinha de ser

Lembrando tradições

Letra e musica de Alice Pimenta
Repertório da autora

Recordando o fado velhinho
Fiz romagem p'los bairros antigos
E pisei de novo o caminho
P'ra rever meus velhos amigos

Mas chorei d'emoção e tristeza
Vendo Alfama e a Madragoa
Bairros que eram do fado a defesa
Choram hoje p'la velha Lisboa

Tradição, adeus tradição
Já não há sabor, é triste talvez
Tradição, tradição, tradição
Já não há labor ao sabor das marés;
Os pardais de telhado cantavam
Saltitando ao sol das vielas
Tradição, tradição, tradição
Varinas dançavam ao som das chinelas

Mão de mestre dava o testemunho
Ministrando regras consagradas
Honradez e respeito tamanho
Era a vida em pequenos nadas

Que saudade tenho dos tempos
Quando ouvia tão belos pregões
E nem era preciso argumentos
Gente simples, grandes corações

O fado

Guilherme Pereira da Rosa / Frederico Valério
Repertório de Fernanda Maria
Também gravado com o título *fado da consagração*

O fado, fado nascido em Lisboa
É voz de pena que soa 
Mágoa que do peito vem
O fado é bairro velho que chora
Alfama que se enamora
E conta o amor que tem

O fado é canto de feiticeiro
É Alfredo Marceneiro 
É um dom, uma expressão
E é fado, guitarra que nos murmura
Tudo aquilo que perdura
Bem dentro do coração
Ao fado Lisboa diz o que sente
Vai nela a alma da gente
Pois é ele o seu condão

O fado, fado que invade a cidade
É nostalgia, saudade 
Mal e bem, sorte e azar
O fado, é rumo de caravelas
E somos nós e são elas 
Que andamos a namorar

O fado, é moda da nossa gente
O passado e o presente 
O porvir, esse também
Pois fado é este jeito, esta briga
De chorar numa cantiga 
Um amor, tudo e ninguém
E é fado, aquele encanto profundo
Que vai daqui pelo mundo
E que ao mundo soa bem

Oh rio dos meus amores

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de António Mourão

Oh rio branco de prata
Que vais correndo sem fim
Vai perguntar a quem amo
Se ainda gosta de mim

Oh rio dos meus amores
Oh rio da minha alegria
Dá-me depressa o amor
Que tu me levaste um dia

Oh rio que vais cantando
Entre os campos a brilhar
Leva contigo a tristeza 
E ensina-me a cantar

Fado Batê

Maria Rita Louro / José António Sabrosa
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Eu só queria meu amor
Como os anjos do senhor
Ter asas, poder voar
Para quando me invade
Do passado a saudade
Eu te puder alcançar

Meu amor, se tu soubesses
E se meu coração lesses 
Choravam os olhos teus
Mas nunca o hás-de saber
Para findar meu sofrer
Bastava sabê-lo Deus

Pela dor do meu destino
Eu lhe peço, Deus menino 
Que me deixe ver alguém
Pois é tanta a minha dor
Que eu já nem sei ter amor
A quem amor por mim tem

Vou ouvir cantar o fado

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de António Mourão

Vou ouvir cantar o fado 
P’ra não falar mais em ti 
O fado sou eu agora 
No momento em que te vi

Vou ouvir cantar o fado 
Relembrando o fado meu
Ouvir uma voz magoada 
Cantar o pecado teu

Vou ouvir cantar o fado
Vou sentir ternura e dor
E vou calar no meu peito
A saudade e o amor


Vou ouvir cantar o fado 
O que a Severa cantou
Ouvir cantar sua morte 
E aquele amor que a levou

Vou ouvir cantar o fado 
Vou ouvir falar de ti
E falar do meu tormento 
No momento em que te vi 

Farrapo da vida

O.Trindade / J.Coutinho
Repertório de Tristão da Silva

Tu és farrapo da vida
Tens a alma perdida
E o amor próprio também
Tu és mulher desprezada
Não amas nem és amada
Não és filha de ninguém

Tu vives para enganar todo o mundo
Rico, pobre ou vagabundo
Um nome próprio não tens
Para uns és Madalena
Para outros Maria Helena
Mas para mim não és ninguém

Lar português

Maria Nelson / Jaime Santos
Repertório de Manuel Fernandes

A casinha de nós dois é pequenina
É mesmo em frente da capela
A dois passos uma fonte cristalina
Onde vou beber mais ela

É humilde a nossa casa mas é nossa
Dá-nos Deus esta riqueza
Um burrinho, uma carroça
Uma hortinha mimosa
A lareira sempre acesa

Uma candeia no topo 
A ceia feita com mato
Bebemos do mesmo copo 

Comemos do mesmo prato
Curiosa a lua cheia 
A janela vem espreitar
E vê, à luz da candeia 
Eu e ela a namorar

A nossa casa é um ninho pobrezinho
Onde há carinho, alegria, pão e vinho

Entra o sol e o luar pelo telhado
Cada um com sua chama
P’ra beijarem o senhor crucificado
Que está sobre a nossa cama

Os pardais em corridinhas pelo chão
Gostam da nossa pobreza
E comem com presunção
As migalhinhas de pão
Que caem da nossa mesa

Fado Alvim

Tiago Torres da Silva / Fernando Alvim
Reportório de Carlos do Carmo

Depois do mar / há um olhar 
Que ainda é mais azul
Azul de mim / azul sem fim 
Azul da cor dos mares do sul
Uma canção / cujo refrão 
Ninguém consegue decifrar
Se quem o canta / traz na garganta 
A voz do mar

Depois de ti / adormeci 
No alto mar, talvez
No mar gentil / no mar anil 
Num mar que em ondas se desfez
Não naufraguei / nem acordei
Nem te vi 
Pus-me a sonhar
Deite-me ao mar / pus-me a sonhar 
Adormeci

Depois da voz / deixe-te a sós 
Com a tua canção
Quando a ouvi / o que senti 
Fez-me entender a solidão
E o teu olhar / quase a chorar 
Foi-se fechando em timidez
Não tenho nada / só tenho a estrada 
Que a vida fez

Depois do bis / é  por um triz 
Que tu voltas para nós
Porque a guitarra / quase te agarra 
P’ra te levar na sua voz
E num tremor / descubro a cor 
Que há no sim
A cor do bis / azul-feliz 
Azul-Alvim

Era a noite que caía

Vasco Graça Moura / Carlos da Maia *fado perseguição*
Repertório de Joana Amendoeira

Era a noite que caía
E na sombra recolhia
O voo das andorinhas
Era a voz que se calava
Era a dor de ver que estava
Sem as tuas mãos nas minhas

Eram passos que escutei
Que eram teus ainda pensei 
Iludiu-me o coração
Foram pela rua escura
Longe da minha amargura 
E acompanhei-os em vão

Fiquei perto da janela
Pus-me a abri-la com cautela 
Fiz disfarce da cortina
Vi então na luz incerta
Que a rua estava deserta 
E deserta estava a esquina

Era só eu na escuridão
Era no peito um rasgão 
Era já no céu a lua
Que me importa, à minha porta
A sombra que se recorta 
Bem pode ainda ser a tua

Fado Deolinda

*Eu, guitarra*
Jorge Rosa / Edgar Nogueira
Repertório de Deolinda Maria

Todos sabiam que eu era 
A companheira do fado
Sempre vivi a seu lado 
Desde os tempos da Severa

Sofri com a sua dor 
Passei os mesmos tormentos
Nos bons e nos maus momentos 
Só lhe dei provas d'amor

Mas esse tonto
Quando teve a fantasia
De trocar a Mouraria 
Pelos bairros de alta roda
Chegou a ponto 
De me chamar inimiga
De me chamar velha antiga
Cansada e fora de moda

Mas o guitarra
Não me posso esquecer dele    
Ele continua fiel 
A todo o nosso passado
Acho bizarra 
A ideia de me afastar, mas não
Não vou deixar 
De ser amante do fado

Nas boites e casinos 
Onde faz da noite o dia
Toda e qualquer companhia 
Serve a esse valdevinos

Mas quando a voz do povo 
Lhe grita com emoção
É que ele chora e então 
Se lembra de mim de novo


EU, GUITARRA

Todos sabem como eu era
A companheira do fado
Que vivi sempre a seu lado
Desde os tempos da Severa

Sorria com o seu humor
Sofria com os seus tormentos
E nos bons e maus momentos
Só lhe dei provas de amor

Mas esse tonto, l
evado p’la fantasia
De trocar a Mouraria p’los bairros da alta roda
Chegou ao ponto de me julgar inimiga
De me chamar velha antiga
Cansada e fora de moda

Mas eu, guitarra, não posso viver sem ele
E continuo fiel a todo o nosso passado
Acho bizarra a ideia de me afastar
Mas não… 
Não posso deixar de ser a amante do fado

Nas boîtes e casinos
Onde faz da noite dia
Toda e qualquer companhia
Serve a esse valdevinos

E só quando a voz do povo
Lhe grita com emoção
É que ele chora e então
Se lembra de mim de novo

O lobo da serra

Paco Gonzalez / Popular *fado menor*
Repertório de Tristão da Silva

Quando o lobo desce a serra
Na fome que a neve traz
Não há nada que resista
À sua fome voraz

Falar-se de honestidade 
É bom para quem muito tem
Mas na serra da verdade 
Todos são lobos também

É lobo aquele que na glória 
Quer um trono requintado
Foi lobo aquele que na história 
Teve um lugar demarcado

Quando a a fome bate à porta 
Dum honrado cidadão
Não é homem mas é lobo 
Se não é lobo é ladrão

Nesta alcateia de lobos 
A que chamam sociedade
Não há lugar para todos 
Nem prós que falam verdade

A sombra dos teus desejos

Maria Manuel Cid / Jaime Santos *fado alvito*
Repertório de Carmo Moniz Pereira

Ai que bom que bom seria
Ter morrido nesse dia
E não ter de recordar
Vieste dizer-me adeus
Sem pores teus olhos nos meus
Partiste para não voltar

Vive o meu corpo sozinho
Dobrado sobre o caminho 
Onde o meu sonho morreu
Dei-te o amor mais profundo
Tudo o que tinha no mundo 
Fiquei mais perto do céu

Meus olhos choraram tanto
Ficaram secos de pranto 
Tristes, pesados e baços
Sinto o sabor dos teus beijos
A sombra dos teus desejos 
Mais o calor dos teus braços

Tu levaste a minha vida
Que ficaria perdida 
Se a tens deixado comigo
Porque a matéria não pensa
Que importa a tua presença 
Minha alma vive contigo

O lado bom do pecado

Tiago Torres da Silva / José António de Sabrosa *fado velho*
Repertório de Cristina Andrade

Não me ensines a pecar
Como eu te tenho ensinado
Ensina-me a aceitar 
O lado bom do pecado

Há quem peque por amor 
Mas eu cá não sou assim
Tenho um corpo pecador
Que peca tudo por mim

Não penses um minuto 
Que me vou arrepender
Eu peco sempre que escuto 
Uma guitarra a gemer

E se encontro a minha sina 
Nas palavras que há no fado
É só ele que me ensina 
O lado bom do pecado

A noite que não existe

Tiago Torres da Silva / João Maria dos Anjos
Repertório de António Vasco Morais

O meu corpo adormeceu
Mas a alma não esqueceu
A dor do teu abandono
E porque a dor é enorme
A minha alma não dorme
Quando está cheia de sono

Passa a noite vigilante
E não cede um só instante 
Ao cansaço que a persegue
Embala o meu coração
E murmura uma canção 
Para que o meu corpo sossegue

A alma não sente nada
Ficou p’ra sempre amarrada 
Ao momento em que partiste
E por mais que ela sossegue
Mais me arrisco a que se entregue 
À noite que não existe

Se te chega uma canção
P’ra sorrires à solidão 
Que de repente te assalta
Vem minha alma docemente
Que dormindo é que se sente 
Que a noite não nos falta

Versos de orgulho

Florbela Espanca / Miguel Ramos *fado margarida*
Repertório de Maria Leopoldina da Guia

O mundo quer-me mal porque ninguém
Tens as asas que eu tenho, porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus
Numa torre de orgulho e de desdém


Porque o meu mundo fica para além
Porque trago no olhar os vastos céus
E os oiros e clarões são todos meus
Porque eu sou eu e porque eu sou alguém

O mundo?  o que é o mundo, ó meu amor?
O jardim dos meus versos todo em flor
A
seara dos teus beijos, pão bendito

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços
Os meus braços dentro dos meus braços
Via láctea fechando o infinito

Asa de vento

Amália Rodrigues / Carlos Gonçalves 
Repertório de Amália

Sou charneca sou monte
Brisa a correr ligeira 
Sou água fresca a correr na fonte
Sou rosada roseira

Sou o cheiro das flores
Fé do meu pensamento
Filha d'amores, irmã das dores
Sou mãe do sofrimento

Tenho no peito 
Um pássaro encarnado
Que anda sem jeito
A mim amarrado

Sou charneca sou monte
Sou noite enluarada
Flor de alecrim, ramo de jasmim
Sou papoila encarnada

Sou flor de primavera
Sou sonho de verão
Planície aberta, praia deserta
Que espera a tua mão

Coração fruto 
Que é maduro e verde
Meu choro enxuto
Dor que se não perde

Sou charneca sou monte
Sou manhã perfumada
Planície aberta, praia deserta 
Sou ilha abandonada

Sou charneca sou monte
Verde fruta colhida
Erva cidreira, mansa oliveira
Sou lágrima perdida

Asa de vento
Inimiga da sorte 
Roseira brava
Não há quem me corte

Mentira

Miguel de Barros / Miguel Ramos *fado alberto*
Repertório de Manuela Cavaco

Mentiste sem piedade no momento
Em que juraste ter-me eterno amor
Fizeste uma promessa sem valor
Não te assustou o falso juramento

Mentiste cruelmente nessa hora
Mentiste sem piedade nesse dia
Mentiste sem ter dó do que sofria
E sem pensar na dor que sofro agora

Momentos de saudade e amargura
Lembrados como um sonho sem igual
Que trás o esquecimento do meu mal
E que me faz sofrer enquanto dura

Um sonho de alegria e sofrimento
Que afasta o meu desejo de morrer
Um sonho que me obriga a querer viver
E que por ser um sonho é um tormento

Em paga do inferno que me deste
Espero alcançar de Deus o teu perdão
Oferecendo minha dor em expiação
Por tão cruel pecado que fizeste

Fado vianinha

João Vasconcelos e Sá / Francisco Viana *fado vianinha*
Repertório de Margarida Bessa 

Devagar se vai ao longe
Eu bem vou devagarinho
Vamos ver se me não perco
Nos atalhos do caminho

Meu amor não tenhas pressa 
Porque não hás-de esperar
Tudo aquilo que começa 
Tarde ou cedo há-de acabar

Tudo mudou, entretanto 
Vê bem, que pouco juízo
Rio a pensar no teu pranto 
Choro a pensar no teu riso

Dá-me os teus olhos profundos 
E o mundo pode acabar
Que importa o mundo se há mundos 
Lá dentro do teu olhar

Malmequeres

Letra e musica de Manuel Paulino Gomes Júnior
Repertório de Manuela Cavaco

Malmequeres, bem me queres 
São flores de louco encanto
Malmequeres, bem me queres
Desfolham risos ou pranto

Os jovens apaixonados  
Perguntam baixinho à flor
Se são queridos desejados
Se são queridos desejados  
Ou felizes no amor

Se os malmequeres 
Gentis e formosos
Dizem bem me queres 
Aos rostos ansiosos 
Das lindas mulheres
Constroem castelos 
Nos seus corações
Loucas ilusões
Loucas ilusões 
E sonhos tão belos

Dois jovens enamorados  
Um malmequer desfolharam
Mas ficaram enganados  
Co’a resposta que apanharam

O Malmequer respondeu 
Com seu eterno sorrir 
Isso não respondo eu
Isso não respondo eu 
Pois não gosto de mentir

Fado antigo

Letra e música de João do Carmo Noronha
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Corria a vida, voava
Surgiste no meu caminho
E o tempo quando passava
Passava devagarinho

Antes ceguinha ficasse 
Naquela maldita hora
Se em vez de ver-te cegasse 
Sofria menos agora

Jurei há muito esquecer-te
 E a jura tão bem cumpri
Que não te esqueço a pensar 
Que me hei-de esquecer de ti

Chorai guitarras, chorai 
Acompanhem meu sentir
Que eu também choro e não tenho 
Ninguém que me queira ouvir

Canto de amor e de amar

Letra e musica de Fernando Machado Soares 
Repertório do autor

Um amor p’ra ser amor 
Dura sempre a vida inteira 
Quem amar segunda vez 
Não amou bem da primeira

De qualquer modo que existas
És a minha divindade
Ventura quando te vejo
Se te não vejo saudade

E quando já for saudade
Sem que nada nos conforte
É sinal que ainda vive 
Mesmo para além da morte 

Fado Rita

Rita Mariano de Carvalho / Alfredo Duarte
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Não vistas de preto a dor
Nem chores porque parti
Põe luto p’lo nosso amor
Põe antes luto por ti

Veste de branco essa dor 
De verde, azul, encarnado
Sempre vestiste de cor 
Quando eu morria a teu lado

Negra só a falsidade 
Que é toda um ser e não ser
É como a chama que arde 
Sem ganhar e sem perder

Veste de branco a saudade 
Trá-la de branco vestida
Morte só morte é verdade 
Nesta mentira da vida

Minhas saudades

Hermano Sobral / Popular *mouraria estilizado*
Versão do repertório de Manuela Cavaco
Este tema é uma criação de Maria Teresa de Noronha
na música do Fado Francisco Viana *Avé Maria Fadista+

O tempo que vai passando 
Traz saudades sem saber
Saudades que vão ficando
Para saudades fazer 


Oh meu amor que saudade 
Porque não hás-de voltar
Ao menos p’ra enganar 
O tempo, a triste verdade
Ainda tive a veleidade 
De lutar para esquecer
Mas perdi-me no sofrer 
Se já nem sei desde quando
O tempo que vai passando
Traz saudades sem saber


Uma saudade perdida  
Acolheu-se à minha beira
Fez-se a minha companheira  
Dedicada e preferida
E agora desiludida  
Sem acalentar sequer
A esperança de outro viver  
Levo a vida acarinhando
Saudades que vão ficando
Para saudades fazer

Vida da minha vida

Fernando Farinha / Armandinho *fado são romão*
Repertório de Maria Teresa de Noronha

Na minha vida, vivia só por viver
No fundo, todo o meu ser
Era noite escura e fria
Mas quis Deus que o teu amor
Lhe desse sol e calor
E a noite tornou-se dia;
Hoje sinto a claridade
A dar cor e felicidade
À vida que não vivia

Da tua vida fiz o meu próprio destino
Como se um poder divino
Despertasse o meu viver
Dos teus braços fiz dois laços
Do teu andar, os meus passos
Do teu sofrer, meu sofrer;

Dos teus olhos fiz dois guias
Que hão dar luz aos meu dias
E aos meus olhos p’ra te ver

Versículo da Mariquinhas

Letra de Silva Tavares / Versículo de Daniel Gouveia
Alfredo Duarte *fado maria marques*
Repertório de Daniel Gouveia

É numa rua bizarra / muito estreita
A casa da Mariquinhas / com floreiras
Tem na sala uma guitarra / tão bem feita
Janelas com tabuinhas / às carreiras

Vive com muitas amigas / dedicadas,
Aquela de quem vos falo / com prazer
E não há maior regalo / ou pode haver?
De vida de raparigas / azougadas;
É doida pelas cantigas / bem cantadas
Como no campo a cigarra / satisfeita
Se canta o fado à guitarra / e se deleita
De comovida até chora / ternamente;
E a casa alegre onde mora / tão contente
É numa rua bizarra / muito estreita

Para se tornar notada / entre as fadistas
Usa coisas esquisitas / donairosas
Muitas rendas, muitas fitas / vaporosas
Lenços de cor variada / a dar nas vistas;
Pretendida e desejada / nas conquistas
Altiva como as rainhas / sobranceiras
Ri das muitas coitadinhas / linguareiras;
Que a censuram rudemente / sem razão
Por verem cheia de gente / e animação
A casa da Mariquinhas / com floreiras

É de aparência singela / até modesta
E muito mal mobilada / o quanto baste
No fundo não vale nada / por contraste
O tudo da casa dela / sempre em festa
No vão de cada janela / junto à fresta;
Sobre coluna, uma jarra  / que ela enfeita
Colcha de chita com barra / bem direita
Quadros de gosto magano / afadistado;
E, em vez de ter um piano / aburguesado
Tem na sala uma guitarra / tão bem feita

P'ra guardar o parco espólio / a bom recato
Um cofre forte comprou  / a acautelar
E como o gás se acabou / por não pagar
Ilumina-se a petróleo / que é barato;
Limpa as mobílias com óleo / por bom trato
De amêndoa doce e, mesquinhas / galhofeiras
Pasmam de fronte as vizinhas / quadrilheiras
P'ra ver o que lá se passa /  que defeito;
Mas ela tem, por pirraça / e é bem feito
Janelas com tabuinhas / às carreiras