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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.310' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

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Palminho de cara linda

DR / Joaquim Campos *fado amora*
Repertório de António Melo Correia

Palminho de cara linda
Carinha de lindo jeito
Que linda medalha davas
P'ra gente trazer ao peito

Eu dava o céu se o tivesse 
O céu, o mundo sem fim
Para esquecer o momento 
Que te esqueceste de mim

Se eu soubesse que voando 
Alcançava o meu desejo
Mandava fazer as asas 
Que as penas são de sobejo

Vocês devem perdoar-me 
Umas certas liberdades
Eu bem sei que ando a matar-me 
Mas ando a matar saudades

Porque te amo deste jeito

Alexandre Fontes / Renato Varela *fado varela*
Repertório de Tristão da Silva

Não sei sei se tu me queres como eu te quero
Não sei se tu me dás tua afeição
Só sei que este amor è tão sincero
E que pertence a ti meu coração

Não sei se tu anseias meu regresso
Não sei porque te amo deste jeito
Só sei que a tua imagem não esqueço
E que a trago gravada no meu peito

Não sei se no teu quarto, à noitinha
O meu lugar está ou não, vazio
Não sei se outro amor te acarinha
Como eu te acarinhei em desvario

Não
sei amor, não sei, não compreendo
Sem ti eu já não sei o que fazer
Só sei que a minha vida vai morrendo
Cada dia que passa sem te ver

Balada

Popular / Fontes Rocha
Repertório de Fernando Farinha

Tricana airosa não escolhas
Estudantes que te olharam
Que as tricanas são as folhas
Dos livros que eles deixaram

A lua quando te viu
Envergonhada, corou
Por não poder igualar-te
Foi para longe e chorou

Chegou o outono

António de Sousa Freitas / Nóbrega e Sousa
Repertório de Tony de Matos

De novo já no outono
Diz-me um adeus a tua mão
Que é tal e qual o adeus
Das folhas pelo chão

Depois nas sombras quietas
Ficamos ambos e a saudade
É como um céu que alaga
De eternidade

E a vida está nessas folhas
Que são as horas caídas
As horas em que desfolhas
As nossas vidas
E o outono está onde nós
Seremos névoa e dor
Eu sou tristeza, grito e voz
Pedindo amor
Ó meu amor

Minhas palavras não dizem

Letra e musica de Moniz Pereira
Repertório de Fernanda Maria

Minhas palavras não dizem 
O que eu te queria dizer
Mas os meus olhos bendizem 
Como è grande o meu sofrer;
E os meus braços maldizem
Não te poderem prender

Minhas palavras não dizem 
Nem podes compreender
Como è grande esta paixão 
Minhas palavras não dizem;
O que tu querias saber
Está dentro do coração

Não disse, mas sei de cor 
O que tu querias ouvir
Estas coisas do amor 
Não se costumam pedir

Eram palavras diferentes 
Que te queria dedicar
È um amor que tu sentes 
Mas que eu não sei confessar

Risca o teu passado

Aníbal Nazaré / João Vasconcelos
Repertório de Tony de Matos

Tens de riscar da memória o teu passado
Tens de pensar que nasceste novamente
P'ra nós vivermos lealmente, lado a lado
Tens de pensar apenas no presente

Risca os telefones
Os numeros que trazes na mala de mão
Tua perdição
Risca esses nomes
Que tens num caderno muito bem guardado
Sombra de pecado
Mas sobretudo risca da memória
Os nomes dos homens a quem tens amado
Tão presos à história
Que è, a triste história desse teu passado

Trago-te um copo de vinho

Carlos Barrela / António Mourão
Repertório de António Mourão

Trago-te um copo de vinho
Para beberes no caminho
Onde te leva a saudade
Dentro da noite vazia
Quando em madrugada fria
Não encontres claridade

Deves saber que em viagem
Vais
precisar de coragem 
P'ra matares a solidão
Conheço de cor a estrada
Já fiz essa caminhada 
Sou teu irmão, meu irmão

Queres esquecer a amargura
Queres destruir a ternura 
Queres o passado rasgar
Mas è tão longo o caminho
Trago-te um copo de vinho 
Só p'ra te não ver chorar

Canoa de vela branca

Frederico de Brito / Martinho d'Assunção
Repertório de Fernanda Maria

Canoa de vela branca 
Que vens do cais da ribeira
E vais para Vila Franca 
Assim, num dia de feira

Já vem subindo a maré 
E hoje que a manhã 'stá linda
Quero ir ao Alcané 
Bailar um fandango ainda

Canoa tu conheces bem
Quando há norte pela proa
Quantas docas tem Lisboa
E as muralhas que ela tem;
Canoa por onde tu vais
Se outro barco te abalroa
Nunca mais tu atracas ao cais
Nunca, nunca, nunca mais


Canoa de vela panda 
Que sobes o Rio Tejo
E trazes da outra banda 
O sol do meu Ribatejo

Repara no meu campino 
Levando o gado a pastar
Sem conhecer o destino 
Que Deus tem para nos dar

Com este título escreveu Frederico de Brito uma versão pouco conhecida, 
muito próxima da anterior, do repertório de Fernanda Maria.
Não se sabe com segurança qual das versões é mais antiga. 
Pelas datas de registo, que nem sempre correspondem à cronologia da produção
*Canoa de Vela Branca* (1976) será posterior a Canoas do Tejo (1973).
Verifica-se ser aquela uma versão para mulher
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia
Livro *Poetas Populares do Fado-Canção*

Apenas por te deixar

Maria de Lurdes Carvalho / Martinho d'Assunção
Repertório de Manuel de Almeida

Deixei-te uma noite p'ra viver
Andaste sem destino a vida inteira
Entre estrelas queinaste o teu sorriso
Teu corpo repousou em muita esteira

Deixei-te a liberdade para amar
Correste braços, braços, sem parar
Buscavas com a sede de gazela
A àgua que ninguém te quis negar

Deixei-te ao prazer dos teus quereres
Apressaste no ventre os teus desejos
Passaram primaveras p'los jardins
E como em tantas bocas, os teus beijos

Deixei-te de olhos belos, brasa pura
No peito, esperança larga, céu imenso
Encontrei-te ajoelhada, noite escura
Vivendo das loucuras, o silêncio

Madeira terra de amor

Letra e música de João Nobre
Repertório de Tristão da Silva

Anda o mundo inteiro
Sempre, sempre a procurar-te
Ilha da Madeira
O teu encanto ninguém nega
Ės o lenço verde
Acenando p'ra quem parte
E um sorriso aberto
P'ra quem chega

Madeira, és sonho e prece
Milagre que Deus não esquece
Tuas noites lindas
Envolvem o amor no seu manto
E a saudade fala de ti, do teu encanto
Amor que nasce um dia
Será prá vida inteira
E quem fizeste feliz
Para sempre te bem diz
Ó terra d'amor, Madeira

Bendita saudade

Domingos Gonçalves Costa / Alfredo Duarte
Repertório de Fernanda Maria 
Este poema também foi gravado por Diana Vilarinho 
na música do fado Bragança de Alberto Costa

Quem chora por ter saudade
A meu ver não tem razão
Pois na vida, quanta vez
A saudade è na verdade
A doce recordação
D'ilusão que se desfez

Quem amou sem ser amada
Quem se embalou na miragem 
Dum falso amor a brilhar
Traz a saudade guardada
Para lhe dar mais coragem 
E nunca a pode deixar

Portanto, pobre de quem
Diz que a saudade anda unida 
Ao mais atroz padecer
Pois quem saudades não tem
Pode viver toda a vida 
Que não chegou a viver

Vagabundo das vielas

Maria de Lurdes Brás / João Nobre *ser fadista*
Repertório de Maria de Lurdes Brás

Fado... vagabundo das vielas
Tu paras em todas elas
Onde possas pernoitar
Fado... és amante da guitarra
Levas a noite na farra
Até ver o sol chegar

Querido fado
Eu quero ser tua amiga
Fazer de ti a cantiga
Que p’ra mim é oração
Vagabundo
Andas na boca do mundo
Mas tenho-te amor profundo
Fado do meu coração
Velho fado.
És vagabundo da noite
Já não tens onde te acoite
E fazes da noite dia
Fado amigo
Quero vaguear contigo
Fazer da noite um abrigo
Ser a tua companhia

Fado... há quem te chame vadio
Mas sentes orgulho e brio
Se ouves assim chamar
Fado... ès velho não tens idade
E só te resta a saudade
Das histórias p’ra contar

Perguntas

Delfim da Silva / Raul Ferrão *fado carriche*
Repertório de Tristão da Silva

Não me perguntes, que importa
Quantos amores conheci
O passado è letra morta
Hoje só gosto de ti

Acaso uma flor mimosa 
Tenta saber, indiscreta
Por quantos botões de rosa 
Se perdeu a borboleta

Diz-me se a areia da praia 
Alguma vez perguntou
Ao mar que nela se espraia 
Quantas praias já beijou

Também o sol não se amua 
Nem a ciúmes se aferra
Por saber que à noite, a lua 
Com seu luar beija a terra

O amor passado desfaz-se 
Só saudades faz vibrar
E um novo amor, quando nasce 
È sol ardente a brilhar

Eu dou-te, em beijos na boca 
Pedaços do coração
Como podes minha louca 
Duvidar desta afeição

Todos os caminhos vão dar a ti

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de António Mourão

Tenho corrido estradas sem fim
Andado em ruas que nunca vi
Mas afinal, p'ra quê, amor
Todos os caminhos vão dar a ti

Às vezes quero não encontrar
Aquela rua que eu já perdi
Mas quando ando, não sei porquê
Todos os caminhos vão dar a ti;
Quero ir p'ra longe, quero partir
Não viver mais o que vivi
Ai que caminho vou eu tomar
Todos os caminhos vão dar a ti


Por toda a parte eu já andei
Por toda a parte, amor, vivi
Andei fugindo mas encontrei-me
Todos os caminhos vão dar a ti

Adeus à mocidade

Manuel de Almeida / Popular *fado menor*
Repertório de Manuel de Almeida

Disse adeus à mocidade
Entre lágrimas e ais
O tempo, grande verdade
Passando não volta mais

Passa breve a mocidade 
O tempo d'ilusões feito
Só não passa esta saudade 
Que trago dentro do peito

Vocês devem perdoar-me 
Umas certas liberdades
Eu bem sei que ando a matar-me 
Mas ando a matar saudades

Não sei contudo entender 
Estes balanços da sorte
Estou cansado de viver 
Mas tenho medo da morte

Ai amigos quem me dera

Domingos Gonçalves Costa / Raul Ferrão
Repertório de Fernanda Maria

Ai amigos quem me dera
Viver no tempo passado
Em que a Maria Severa
Era a rainha do fado

Poder cantar ao desafio
À luz do luar, noites a fio
Com malta fixe 
Da boémia e do passado
Correr enfim, toda a Lisboa
A Mouraria, a Madragoa
Mostrar contente a toda a gente 
O nosso fado

Ir em qualquer traquitana
De rosas toda enfeitada
Até ao Campo de Santana
A uma castiça toirada

Depois voltar à linda Alfama
E junto ao mar que tanto ama
Eu cantaria a serenata mais bairrista
Após raiar o novo dia
Ia descansar p'rá Mouraria
Louvando a Deus, amigos meus
Por ser fadista

Meus tempos de criança

Letra e música de Ataulpho Alves
Repertório de Tony de Matos

Eu daria tudo o que tivesse
Para voltar aos tempos de criança
Eu não sei porquê a gente cresce
E não sai da gente esta lembrança

Aos domingos, missa na matriz
Na cidadezinha onde eu nasci
Ai meu Deus, eu era tão feliz
No meu pequenino país

Que saudades da professorinha
Que me ensinou o bê à bá
Onde andará Mariazinha
Meu primeiro amor, onde andará

Eu igual a toda a garotada
Quantas diabruras eu fazia
Jogo do botão pela calçada
Eu era tão feliz e não sabia

Este mundo não presta

Fernando Farinha / Domingos Camarinha
Repertório de Fernando Farinha

Este mundo não presta
Nunca foi natureza
Não lhe mintas sorrindo
Não lhe inventes beleza

Morra eu em tristeza 
Vivas tu sempre em festa
Para
nós, para todos 
Este mundo não presta

Este mundo não presta 
É navalha apontada
Tanto ao rico de tudo 
Como ao pobre de nada

Traz a cara tapada 
Tem cinismo de besta
Diz a todos que dá 
Mas no fim só empresta

Tu lhe pagas p'ra rir 
Eu lhe pago chorando
Alguns pagam morrendo 
Outros pagam matando

Até quando, até quando 
Vamos nós ter assim
Este mundo sem jeito 
Sem princípio nem fim

Lisboa bairrista

Lopes Victor e música de Martinho d'Assunção
Repertório de Fernanda Maria

Sempre que Lisboa deita 
Fora da porta, o seu pé
Alfama logo aproveita 
Logo aproveita a maré

A maré traz maresia 
Todos sabem que assim é
Sendo assim
A Mouraria mais a Guia 
Lá vão também na maré

Lisboa é sempre bairrista
Bisbilhoteira, sempre fadista
Quando na rua se mete
Tem logo sete p'ra namorar
Tem logo as Setes Colinas
Que são meninas do seu olhar
Lisboa lá vai com fé
Larilolé,  sempre a cantar


Vai à Bica, à Madragoa 
De Benfica até à Sé
Fazendo a corte a Lisboa 
Bairro Alto fica ao pé

P'ra Lisboa muito dela 
Sempre que Lisboa sai
Ninguém pode ter mão nela
E é só dela a rua p'ra onde ela vai

Saudades do Ribatejo

Maria de Lurdes Brás / Frederico Valério *cavalo ruço*
Repertório de Maria de Lurdes Brás

Eu já fui ao Ribatejo
E não esqueço com certeza
Aquela festa bravia
Que eu lá vi um dia
Bem à portuguesa

De tudo por lá havia 
Touros fado e vinho tinto
Dessas horas bem passadas 
Com fado e touradas
Que saudades, sinto

As charnecas e lezírias 
Que noutro lado não vejo
Mostram a quem por lá passa 
A destreza e a raça
Que há no Ribatejo

Gostava de lá voltar 
Àquela terra de encanto
Voltar a ver novamente 
Essa boa gente
P’ra quem hoje canto

Vou recordar para sempre 
A gente Ribatejana
Guardarei a imagem 
Da bela paisagem
Que é bem lusitana

Ao recordar tudo isto 
Uma tristeza me invade
E hoje a recordação 
Mora em meu coração
É tudo, saudade

A casa da malta

António Vilar da Costa / Nóbrega e Sousa
Repertório de Manuel de Almeida

A casa perdida à beira da estrada
Ande os meus sonhos encontram pousada
Não tem um brasão, nem ricas baixelas
Mas tem o telhado coberto d'estrelas

Às vezes desejo
Por minha pousada
A casa da malta
À beira da estrada


A casa da malta não tem sentinela
Apenas a lua lhe ronda a janela
As almas libertas dum rumo traçado
Não têm fronteiras de arame farpado

E chegam de noite, sacola vazia
Na casa da malta é sempre meio-dia
E colhem esperanças no sol e no vento
Que o sonho prás almas é meio sustento

Há frio nas almas, o mundo vai mal
Na casa da malta é sempre natal
Só lêem nos astros, são rudes plebeus
Mas sabem que todos são filhos de Deus

Eu canto para todos vós

Tema gravado por Rodrigo com o título 
*Nada é pobre quando é povo*
Vasco Lima Couto / António Chaínho
Repertório de Vasco Rafael

O fado, antigamente, era o recado
Das vielas sangrentas de Lisboa
E o protesto do amor desanimado
Canto livre dos olhos sem passado
Em mil versos que o tempo não perdoa

Nas tavernas do vinho, em noite suja
Onde as praias da voz não se encontravam
As guitarras falavam da cidade
Nos versos desse vinho onde a saudade
Cantava a maldição dos que choravam

Todos amordaçavam editais
A adormecer os ricos deste mar
Que pagavam o fado com o seu nome
E fingiam não ver a cor da fome
Em gerações sem tempo e sem lugar

Mas foram os poemas desse longe
Que ultrapassei, porque hoje me renovo
O tempo aberto e livre da canção
Do meu país chegado ao coração
Eu entrego feliz à voz do povo

Ausência

Sebastião Silva / Ivan Pires
Repertório de Tony de Matos

Se a tua ausência durar
Vou sofrer, vou chorar... de saudade
Tudo o que me restou
Deste infeliz amor... foi a saudade

Se soubesses como penso em ti
Como
è triste um coração sozinho
Voltarias ao meu lado, amor
Reconstruir nosso ninho

Um erro
Um erro não justifica
Esta saudade infinita
Que me separa de ti

Lágrimas diferentes

Domingos Gonçalves Costa / Jaime Santos *alexandrino*
Repertório de Fernanda Maria
Editado com o título *O que as lágrimas dizem*
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia
Livro *Poetas Populares do Fado-Tradicional*

Quase ninguém dá conta, ao ver alguém chorar
Do que a lágrima diz quando aos olhos aflora
Essa boca de luz no seu estranho brilhar
É um espelho a refletir a vida de quem chora

A lágrima da vida nuns olhos divinais
Lembra a luz da manhã dum dia apetecido
Nem tem comparação com as lágrimas fatais
Que queimam como fogo os olhos dum vencido

A lágrima da mãe quando nos dá a vida
É cor que a tarde empresta a um dia divinal
E a lágrima chorada à hora da partida
É hino de saudade, às vezes imortal

Na vida em que se afunda sorrisos e cansaços
A lágrima mais pura, a que jamais tem par
É uma, a que se esconde atrás duns olhos baços
Que fartos de sofrer já nem sabem chorar

Longe da pátria

Vilar da Costa / Armandinho *fado mayer*
Repertório de Fernando Farinha

Se queres saber 
A dor pungente que um peito encerra
E o que é sofrer 
Um dia ausente da tua terra
Sai barra fora
Vive que uma vez no alto mar
E nessa hora
Se és português tens de chorar

Saindo a barra uma guitarra
No seu trinar fagueiro
E a voz dum marinheiro
Numa canção bizarra
È Portugal com a sua meiga voz
Sentimos a palpitar
Saudades dentro de nós


O português
Triste suspira e ninguém fala
Só no convés 
À voz da lira, o peito embala
Tudo emudece 
Ao recordar a pátria mãe
E até parece 
Que o próprio mar chora também

Ronda pelo passado

Maria de Lurdes Brás / José Duarte *fado seixal*
Repertório de Augusto Jorge

Eu passei, no Bairro Alto
Alta noite a horas mortas
E fiquei em sobressalto
Pensei logo dar um salto
Ao fado, fora de portas

Mas passei p’la Mouraria 
Quis recordar o passado
E senti, com nostalgia 
Pois vi que não existia
O velho sabor a fado

Fui à Bica e Madragoa 
Onde o fado teve fama
Nos recantos de Lisboa 
Onde o fado mais se entoa
É na doce e velha Alfama

Nesta ronda, p’lo passado 
Com fadistas de virtude
Descobri um novo fado 
E que vive abençoado
P’la Senhora da Saúde

Trova eterna

Domingos Gonçalves da Costa / Francisco Carvalhinho
Repertório de Manuel Fernandes

Com sua divina graça
Deus quis dar a Portugal
O fado, canção de raça
De mimo e graça
Trova imortal

Deu-nos um sol radioso
E o mais formoso luar
Por isso, como ditoso
Feliz garboso diz a cantar

Dá-me essa velha guitarra
E vem para a farra
A noite está linda
Vamos para a Mouraria
Que embora sombria
Não morreu ainda
Depois iremos p'ra Alfama
Um bairro de fama 
E de gente boa
P'ra dizermos lado a lado
Que é lindo o fado 
Desta Lisboa

Ao fado canta-se a lida
Feliz ou triste também
Com voz alegre ou sentida
Conforme a vida 
Que a gente tem

P'ra se cantar, finalmente
Serve um motivo qualquer
Por isso constantemente
A toda a gente se ouve dizer

Como palavras de fado

Fernando Campos de Castro / Filipe Pinto *fado meia-noite*
Repertório de João Loy

Estas mãos já não são minhas
Meu amor se te lembrasses
Dei-te as mãos que tu não tinhas
À espera que me tocasses

Sonhei noites, morri dias 
À espera dum toque teu
Dessas mãos que tu dizias 
Tão perto do corpo meu

Deixaste em mim a saudade 
Que o teu corpo me deixou
De viver nesta ansiedade 
De já nem saber quem sou

Não sei que fado é o fado 
Que me faz ficar assim
Com todo o mundo enleado 
À solta dentro de mim

Foste presente em passado  
No meu olhar todo azul
Como as palavras de fado 
Que canto de Norte a Sul

Casinha dum pobre

Frederico de Brito / Carlos Rocha
Repertório de Manuel Fernandes 

Uma casinha dum pobre
É um cantinho dos céus
Por sobre a telha que a cobre
Há sempre a benção de Deus

Tem mais graça mais encanto
Quanto mais pequena for
Estamos mais perto, portanto
Quanto mais perto melhor

Uma casa pequenina como a nossa
É duma graça tal 
Que até nos faz lembrar 
Um ninho num beiral
Uma casa pequenina como a nossa
A tanto se reduz
Que um beijo do luar
Enche-a toda de luz
Uma casa pequenina chega a ser
Um traço de união 
Entre o amor e o prazer

Ao princípio, a vida amena
A graça de Deus, depois
Eu chego a dizer, que pena
Ela não ser mais pequena
P’ra só cabermos os dois

A esperança é candeia acesa
Que nos dá vida e calor
A fé é quem põe a mesa
E assim vive o nosso amor

O trabalho acende o lume
Que não mais se apagará
Não se abre a porta ao ciúme
Porque não cabia lá

Como te quis e te quero

Mote: Linhares Barbosa / Glosa: Manuel de Almeida / Popular *fado corrido*
Repertório de Manuel de Almeida

Amei-te com desespero
Mais do que eu ninguém te quis
E agora que te não quero
Vejo as figuras que fiz


Adorei-te noite e dia 
Com toda a força da alma
Ninguém me levava à palma 
A querer-te como eu te queria
A minha vida daria 
P'lo teu amor de raiz
Vivi um sonho feliz 
Feliz e belo também
Amei- te como a ninguém
Mais do que eu ninguém te quis


Mas a vida atroz, medonha 
Quis este bem terminar
E não chorei com vergonha 
Que alguém me visse chorar
O que eu sofri a pensar 
Na crença com que te quis
Com razão o mundo diz 
Que o meu amor foi sincero
E agora que te não quero 
Vejo as figuras que fiz

Sofri bastante, confesso
Agora que te perdi
Mas se voltasse ao começo
Tornava a gostar de ti

No cais da Ribeira

Letra e música de Frederico de Brito
Repertório fe Fernanda Maria

No cais da Ribeira Nova 
Onde tanto barco aproa
Anda no ar uma trova 
Nascida na Madragoa

Passam uns olhos bonitos
 Da cor do mar sem ter fim
E ouvem a graça duns ditos 
Que sempre acabam assim

Varina gaiata, sorriso que alastra
Mentira que seja, diz lá donde vens
O peixe de prata da tua canastra
Até sente inveja dos olhos que tens


Quando ela passa bailando 
De chinelinhas nos pés
Parece um barco vogando 
Que anda ao sabor das marés

No seu olhar há saudade 
Ou um mistério qualquer
E a gente sente vontade 
Vontade de lhe dizer

Olhos fatais

Armando Neves / Alfredo Marceneiro *fado bailado*
Repertório de Alfredo Marceneiro


Que sorte que Deus me deu
Que p'ra sempre hei-de lembrar
Embora não seja ateu
Julguei encontrar o céu
Na expressão do teu olhar

Mas deitaste-me ao deserto 
Neste mundo enganador
Hoje o teu olhar incerto 
Já não é um livro aberto
Onde eu lia o teu amor

Enganaste os olhos meus 
Nunca mais te quero ver
Meus olhos dizem-te adeus 
Teus olhos não são dois céus
São dois infernos a arder

Coração p’ra amar a fundo 
Outro coração requer
Se há tanta mulher no mundo 
Vou dar este amor profundo
Ao amor doutra mulher
- - -
Versão Original
Do livro *Poetas do Fado Tradicional* 
De: Daniel Gouveia e Francisco Mendes

Que sorte que Deus me deu
E que sempre hei-de lembrar

Embora não seja ateu
Julguei encontrar o céu
Na expressão do teu olhar

Neste mundo, mar de escolhos 
Unimos nossos destinos
E nesta vida de abrolhos 
Para mim teus lindos olhos
Eram dois céus pequeninos

No espelho do teu olhar 
Vi dois céus em miniatura
E para mais me encantar 
Vão-se neles mirar
A minha própria ventura

E tão mística atracão 
Tinha o teu olhar profundo
Que em sua doce expressão 
Era um manto de perdão
Sobre as misérias do mundo

Mas deitaste-me ao deserto 
Deste mundo enganador
Pois o teu olhar incerto 
Já não é um livro aberto
Em que eu lia o teu amor

Enganaste os olhos meus 
Nunca mais te quero ver
Meus olhos dizem-te adeus 
Teus olhos não são dois céus
São dois infernos a arder

Coração para amar a fundo 
Outro coração requer
Se há tanta mulher no mundo 
Vou dar este amor profundo
Ao amor doutra mulher

Recordando amores esquecidos

Domingos Gonçalves da Costa / Pedro Rodrigues
Repertório de Fernanda Maria

Pensei escrever um poema
Onde cantasse a revolta
Que anda a par da minha dor
Porém, na hora suprema
Minha inspiração à solta
Fez um poema d'amor

Recordou amores esquecidos
Momentos belos vividos 
Sol da minha mocidade
E obrigou-me, por fadário
A desfiar o rosário 
De amor, ternura e saudade

E então, ante o meu olhar
Vi o triste desfilar 
Dos sonhos que já vivi
E nessa doce miragem
Eu vi passar a imagem 
De alguém que há muito perdi

Entre os poemas dispersos
Que canto com ansiedade 
Nas horas do meu sofrer
Eu fiz destes pobres versos
Uma oração de saudade 
Que rezo p'ra não esquecer

Obrigado

Letra e musica de João Nobre
Repertório de Tony de Matos

Obrigado
Só sei dizer muito obrigado
Ai como foi bom p'ra mim
Ter-te por fim encontrado

Que saudade
Se não estivesses a meu lado
Por tanta felicidade que me tens dado
Obrigado

Minha vida sem carinho
Era p'ra mim como um deserto
Pôs-te Deus, no meu caminho
Encontrei o rumo certo

Se perdido andei na vida
Hoje esqueci todo o passado
E quero apenas viver p'ra te dizer
Meu amor, muito obrigado

Quimera perdida

Maria Manuel Cid / Francisco José Marques *fado zé negro*
Repertório de Fernanda Maria

Ó lume que me arrefece
Ó ventura que enlouquece
Ó saudade de ninguém
Pobre sombra fugidia
Fresta de luto se abria
Se há luar, de luto vem

Quanto silêncio gritado
Quanto sonho abandonado 
Quanta quimera perdida
Rosto marcado de traços
Sombra seguindo os meus passos 
Sempre de luto vestida

È brisa de mar, salgada
Lume cortante de espada 
Tudo o que penso e não sei
Morte de vida sem vida
Sangue vermelho de ferida 
Beijo que sinto e não dei

Nem Deus sabe

Artur Ribeiro / Jaime Santos
Repertório de Manuel de Almeida

Quem separou nossas vidas
Quem te roubou do meu lado
Nas minhas noites perdidas
Vou perguntar às bebidas
Quem vou cantar no meu fado

Quem vais amar com loucura 
Quem vai dormir nos teus braços
Negro como a noite escura 
Grita cheio de amargura
Meu coração em pedaços

Quem
vais trazer na lembrança 
A quem vou dar os bons dias
Quem me vai chamar criança 
E vai pôr raios de esperança
Nas minhas horas sombrias

Já perguntei à saudade 
Até já fiz mil promessas
Já corri toda a cidade 
Mas desisti, que em verdade
Só Deus sabe se regressas

Namoro às escondidas

Gabriel de Oliveira, Fernando Farinha / António Menano
Repertório de Fernando Farinha

Nem teu pai nem tua mãe
Querem que a gente se fale
A gente rala-se bem
Não vai a bem, vai a mal


Fugindo aos olhares daninhos
Das vizinhas atrevidas
Contigo ando, p'los cantinhos
Namorando às escondidas
Os elos das nossas vidas 
São mal vistos em geral
Nosso
amor que tanto vale 
Não está certo p'ra ninguém
Nem teu pai nem tua mãe
Querem que a gente se fale


Já inventei mil maneiras
Sem conseguir evitar
Tão ruíns alcoviteiras
Que nos andam a espreitar
Ambos querenos casar 
Ter um lar e amor leal
Mas nem assim, afinal
Estamos certos para alguém
A gente rala-se bem
Não vai a bem, vai a mal

O fado que me acompanha

Américo Portela / Georgino de Sousa *fado georgino*
Repertório de Fernanda Maria

O fado da minha vida
Não è feio nem bonito
Não è menos nem è mais
È a voz da linguagem
Usada já noutros tempos
No fadário dos meus pais

Se nada posso fazer
À vida da minha vida 
Desenhada no passado
Nada sou que valor tenha
Porque valor não existe 
Na imperfeição do pecado

Se este fado me acompanha
Creio que já não me resta 
Nem uma esperança esquecida
Que este fado vem do fruto
Que a semente dos meus pais 
Transformou na minha vida

Não mintas

Jorge Rosa / Domingos Camarinha
Repertório de António Mourão

Por te amar, amo a verdade
Fé no amor ninguém me tira
Não quero não, que a mentira
Roube a minha felicidade

Se queres tanto como eu
Dar forna a este sonhar
Não deves não, enganar
O amor que è teu e meu

Não mintas, acredito no que dizes
Não mintas, tenho fé no teu carinho
Não mintas, poupa-me horas infelizes
Não destruas as raízes
Dos trevos do meu caminho

Não mintas, meu amor, quero-te tanto
Não digas, não digas o que não sintas
Näo mintas, não me quebres o encanto
Meu amor quero-te tanto
Não mintas, não mintas

Regresso à vida

Fernando Farinha / Joaquim Campos *fado vitória*
Repertório de Fernando Farinha

Estive entre a vida e a morte
E Deus deu-me a feliz sorte
De poder viver ainda
Pode a vida ser maldosa
Difícil e caprichosa
Mas não há coisa mais linda

Por um milagre sagrado
Regresso hoje ao meu fado 
Ao fado que me embalou
Feliz por voltar de novo
A cantar p'ra este povo 
Que sempre me acarinhou

Nesta hora que me aquece
Minha voz reaparece 
Depois duma ausência atroz
Fados que tenho de meu
Cantigas que Deus me deu 
Para dar a todos vós

Bairro amado

Letra e música de Frederico de Brito
Repertório de Fernanda Maria

Gemem guitarras
Notas bizarras dum fado triste
Choro e queixume
Dor e ciume que ainda existe
Tristes baladas
Canções magoadas e olhos em brasa
Isso
que importa
Se estão à porta da minha casa

È este o meu bairro amado
Que os outros são muito iguais
Ai do meu tempo passado
Que foi e não volta mais
A minha rua è tão linda
Como outra igual nunca vi
Basta que lá esteja ainda
A casinha onde eu nasci


Bairro tristonho
Que foste um sonho da fadistagem
De aventureiros
E cavaleiros de alta linhagem
Bairro tranquilo
Tu ès aquilo que eu mais adoro
Minh'alma è tua
Bairro da rua aonde eu moro

Maria da Paz

Nóbrega e Sousa / Boavida Portugal
Repertório de Tristão da Silva

Maria da Paz
Foi longe, na França 
Que o teu bem morreu
E um filho, mais tarde
Ainda uma criança
No mar se perdeu 

Teu netinho, agora
Soldado garboso
Quer a pátria honrar
E o teu pensamento 
Embora saudoso
Anda a perguntar

Dei-te um amor verdadeiro 
Daquele que Deus me deu
Dei-te um filho marinheiro 
E o neto è também teu
Dei-te lágrimas e ais 
O melhor da minha vida
O que posso eu dar-te mais 
Ó pátria querida

Maria da Paz
Toda a imensa dor 
Que o teu peito encerra
Nasceu afinal
No gelado amor 
Da maldita guerra 

Teu olhar velhinho
De mágoa fenece
Farto de chorar
E o teu pensamento
Como numa prece
Anda a murmurar