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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.300' LETRAS <> 3.180.000 VISITAS * ABRIL 2024 *

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Saia rodada

Diogo Clemente / Valter Rolo
Repertório de Carminho

Vesti a saia rodada
P’r’apimentar a chegada
Do meu amor
No mural postei as bodas
Rezei nas capelas todas
Pelo meu amor

Vem lá de longe, da cidade e tem
Os olhos rasos de saudade em mim
E eu mando-lhe beijos e recados 
Em retratos meus
Pensa em casar no fim do verão que vem
Antes pudesse o verão não ter mais fim
Que eu estou tão nervosa 
Com esta coisa de casar, meu Deus

Por tantas vezes pensei eu, também
Sair daqui atrás dos braços seus
De cabeça ao vento 
E a duvidar o que faz ele por lá
São os ciúmes que a saudade tem
E se aos ciúmes eu já disse adeus
Hoje mato inteiras as saudades 
Que o rapaz me dá

Quando Morfeu não vem

Paco Gonzalez / Renato Varela *fado varela*
Repertório de Tristão da Silva

Fugiu de mim há muito, a voz do sono
Desperto, vivo a vida para sentir
Que não sendo de mim o próprio dono
Muito menos sou dono de dormir

Eu sou dos vendavais e dos caminhos
Mais tenebrosos que a vida pode ter
Sou a raiva de ver os pobrezinhos
E sou a dor de lhes não poder valer

Eu sou o pé descalço na calçada
Sou o jornal que serve de colchão
Sou a boca que mesmo amordaçada
Suspira por justiça, amor e pão

Ai se eu pudesse ser no mundo, o rei
Do mistério a que chamo poesia
Em versos eu diria o que não sei
Depois, então estou certo que dormia

Quando o fado for grande

Tiago Torres da Silva / Alberto Costa *fado torres do mondego*
Repertório de Ricardo Ribeiro

Quando o fado era menino
Dizia: quando eu for grande
Hei-de inventar um destino
Que meu coração comande

E percebeu que os poetas 
Eram quem, como as crianças
Abriam portas secretas 
Sem chaves nem alianças

Ao entrar no universo 
Dos poetas populares
Ele vai escrevendo versos 
Que já nascem milenares

E por saber que os adultos 
Podem voltar à infância
Não quer que os poetas cultos 
Se mantenham à distância

Rouba um poema a Pessoa 
Ao Ary pede uma glosa
E uns versos sobre Lisboa 
Ao mestre Linhares Barbosa

Se voltasse a ser menino 
Diria: quando eu crescer
Hei-de inventar um destino 
Num poema por escrever

Dois fados desiguais

Fernando Campos de Castro / Júlio Proença *fado esmeraldinha*
Repertório de Sandra Correia

Não me peças mais o fado que cantei
No momento dessa hora em que te vi
Depois disso quanta lágrima chorei
Sem ter nada, sem ter Deus e amor sem ti

Do poema que cantei e que era meu
Que falava dum amor que andava ausente
Tu disseste que era igual ao fado teu
E por isso era dos dois eternamente

Não me peças meu amor mais esse fado
Que foi dantes, não de agora, nem depois
Deixa os versos descansar nesse passado
Do passado que existiu entre nós dois


Não me peças que regresse ao tempo antigo
Dessa casa, nessa noite de ternura
Onde ainda eu te vejo a sós comigo
Nessa mesa iluminada de loucura

Ela è Lisboa

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de Cidália Moreira

Ainda há e há-de haver
Uma varina sempre a correr
Da lota à rua, da rua à toa
E sem saber ela è Lisboa

Chinela de trança
Anca a dar a dar
Sorrir de criança
Pregão pelo ar
O lenço, a canastra
Avental de chita
Sem ela, Lisboa 
Sem ela, Lisboa
Não è tão bonita

Ainda há e há-de haver
Caras bonitas prá gente ver
Saia rodada, pé com chinela
È aguarela d’uma viela

O pai de todos os fados

Tiago Torres da Silva / Popular *fado menor*
Repertório de Rodrigo Costa Félix

O pai de todos os fados
Chama-se fado menor
Os outros foram criados
Ali mesmo, ao seu redor

Seja em tom grave ou agudo 
Neste fado se recita
Tudo aquilo ou quase tudo
De que o fado necessita

Não tem sequer melodia
É apenas um lugar
Onde o fadista è que cria
Aquilo que vai cantar

Mas se uma alma se agrada 
De cantar um fado triste
Faz de um nada, ou quase nada 
A maior coisa que existe

Montes e a paz que há neles

Fernando Pessoa / Diogo Clemente
Repertório de Ana Sofia Varela

Montes e a paz que há neles
Pois são longe
Paisagens, isto é ninguém
Tenho a alma feita 
Para ser de um monge
Mas não me sinto bem

Se eu fosse outro, fora outro, assim
Aceito o que me dão
Como quem espreita para um jardim
Onde os outros estão

Que outros? não sei
Há no sossego incerto
Uma paz que não há
E eu fito sem o ler o livro aberto
Que nunca mo dirá

Num gesto se adivinha

Tiago Torres da Silva / Armando Machado *fado maria rita*
Repertório de Kátia Guerreiro

Eu uso um xaile bordado
Porque os p’rigos que há no fado
São bem maiores do que os da vida
O xaile é como uma pele
E quando me embrulho nele
Sinto-me mais protegida

Parece umas mãos de mãe
Sabem guiar-nos tão bem 
E sossegam tantos medos
Que sempre que elas me tocam
As franjas do xaile, evocam 
A ternura dos seus dedos

Num gesto que se adivinha
O xaile é uma andorinha 
Num céu que eu mesma criei
Mas assim que o braço pára
O xaile que antes voara 
Parece o manto de um rei

E quando o corpo desiste
Numa palavra mais triste 
Num grito mais demorado
O xaile velho e sem franjas
São asas de anjos ou de anjas 
Que me aconchegam ao fado

Cai chuva do céu cinzento

Fernando Pessoa / Popular c/arranjos de Ernesto Leite
Repertório de Mafalda Arnauth

Cai chuva do céu cinzento
Que não tem razão de ser
Até o meu pensamento
Tem chuva nele a escorrer

Tenho uma grande tristeza
Acrescentada à que sinto
Quero dizer-ma, mas pesa
O quanto comigo minto

Porque verdadeiramente
Não sei estou triste ou não
E a chuva cai levemente
Dentro do meu coração

Cai chuva do céu cinzento

Fernando Pessoa / Popular *fado das horas*
Repertório de Teresa Tarouca

Cai chuva do céu cinzento
Que não tem razão de ser
Até o meu pensamento
Tem chuva nele a escorrer

Tenho uma grande tristeza 
Acrescentada à que sinto
Quero dizê-la, mas pesa 
O quanto comigo minto

Que o grande jeito da vida 
É pôr a vida com jeito
Murcha a rosa não colhida  
Como a rosa posta ao peito

Sou como a praia, a que invade 
O mar que torna a descer
Mas nisto tudo a verdade 
É só o ter que morrer

Não me dou longe de ti

João Monge / Alfredo dos Santos *marcha do correeiro*
Repertório de António Zambujo

Não me dou longe de ti
Nem em sonhos eu consigo 
Ter alguém no meio de nós
Só Deus sabe o que perdi
Para tu ficares comigo 
E ouvires a sua voz;
Só eu sei o que sofri
Quando sonhava contigo 
E abria os olhos a sós

Sabes da minha fraqueza
Onde a faca tem dois gumes 
Onde me mato por ti
È da tua natureza
Cortar-me o peito em ciúmes 
E eu finjo que não morri;
Mas è da minha tristeza
Esconder no fado os queixumes 
E a cantar entristeci

À noite voltas de chita
Com duas flores no regaço 
E tudo o que a Deus pedi
Ès tão minha, tão bonita
Ès a primeira que abraço 
Aquela em que me perdi;
Nem a minha alma acredita
Que me perco no teu passo 
Não me dou longe de ti

Assim te quero guardar
Como se mais nada houvesse 
Nem futuro, nem passado
De tanto, tanto, te amar
Pedi a Deus que trouxesse 
O teu corpo no meu fado

Nesta noite

Letra e musica de Paulo Valentim 
Repertório de Kátia Guerreiro

Nesta noite em que me deito devagar
Sobre lençóis de silêncios acordados
Bebo a noite desta vida p’ra cantar
A alegria dos teus beijos devorados

Nesta noite eu sinto o quente d’alma pura
Que adormece ao meu lado tão cansada
Nesta cama, os momentos de ternura
São punhais a rasgar a madrugada

Nesta noite, o meu sonho vagabundo
Àè manhã, è tormento, è felicidade
Nesta noite a tua boca è o meu mundo
Como teu è o meu corpo em liberdade

E são gritos deste amor que nos uniu
Os desejos desta dor vivida em ti
Obrigado meu amor, porque nasceste
Obrigado minha mãe, porque nasci

A tua voz, fala amorosa

Fernando Pessoa / Samuel Lopes
Repertório de Débora Rodrigues

A tua voz, fala amorosa
Tão meiga fala que me esquece
Que é falsa a sua branda prosa
Meu coração desentristece

Sim, como a música sugere 
O que na música não está
Meu coração nada mais quer 
Que a melodia que em ti há

Amar-me, quem o crera, fala
Na mesma voz que nada diz
Se és uma música que embala 
Eu ouço, ignoro e sou feliz

Nem há felicidade falsa 
Enquanto dura, é verdadeira
Que importa o que a verdade exalça 
Se sou feliz desta maneira

A tristeza do Roberto

João Dias / Joaquim Campos *fado rosita*
Repertório de Manuel Domingos
Gravado por Rodrigo com o título *Epigramas*

A verdade é como o pão
Conquista de quem de esforça
Quem faz da força razão
Nunca tem razão de força

Mil dias me julguei certo 
De ser livre um certo dia
A tristeza do Roberto 
No meio da feira vazia

Meu corpo de grão de areia 
Que de montanhas sonhaste
Prometeram-te uma ceia 
E nem migalha agregaste

Ai está raiva de ter 
Apenas cinco sentidos
Num corpo que quer viver 
Sem sentidos proibidos

Já fui arado na terra 
No mar fui rede vazia
Só não fui arma de guerra 
Nem mesmo de guerra fria

Poema dos olhos da amada

Vinicius de Moraes / Paulinho Soledade e Vinicius de Moraes
Repertório de António Zambujo

Oh minha amada que os olhos teus
São cais noturnos cheios de adeus
São docas mansas trilhando luzes
Que brilham longe, longe nos breus

Oh, minha amada que olhos os teus
Quanto mistério nos olhos teus
Quantos saveiros, quantos navios
Quantos naufrágios nos olhos teus

Oh, minha amada que olhos os teus
Se Deus houvera, fizera-os Deus
Pois não os fizera quem não soubera
Que há muitas eras nos olhos teus

Ah, minha amada de olhos ateus
Cria a esperança nos olhos meus
De verem um dia o olhar mendigo
Da poesia nos olhos teus

Tudo é sombra, medo e nada

Fernando Campos de Castro / Carlos Neves *fado tamanquinhas*
Repertório de Sandra Correia

Percorro tantos caminhos
Sem destino e sem saída
Pelas ruas do meu peito
Sempre sozinha me deito
Sem saber se tenho vida

Sinto as tuas mãos abertas 
Num adeus junto à vidraça
Tudo é sombra, medo e nada
Por dentro da madrugada 
Desta noite que não passa

Nos meus olhos desmedidos 
Onde a luz não quer morar
Moram vidas que passei
Mais os sonhos que sonhei 
Onde não tive lugar

Ó noite porque demoras 
Sobre a dor dos meus desejos
Deixa a manhã finalmente
Com mãos dum amor ausente 
Cobrir-me o corpo de beijos

Não existe fado antigo

Tiago Torres da Silva / João Noronha *fado pechincha*
Repertório de Celeste Rodrigues

Existe um e um só fado
Que assenta na tradição
E para ser bem cantado
Só faz falta um coração

Não é por pôr uma tuba 
Acrescentar bateria
Que uma geração derruba 
O que outrora se fazia

Não quero a eternidade 
Nem os momentos de glória
Quero deixar na saudade 
Um pouco da minha história

Não existe fado novo 
Como não há fado antigo
Ele é o grito que um povo 
Carrega sempre consigo

Sonhos quebrados

Fernando Campos de Castro / Popular *fado menor*
Repertório de Sandra Correia

Caminhos sem ter regresso
Sonhos quebrados sem fim
Negam-me tudo o que peço
Aos mundos dentro de mim

Vazia a noite infinita 
Toca-me os olhos fechados
Como um silêncio que grita 
Aos meus ouvidos cansados

Sinto medos que me arrastam 
Na solidão desta lama
Onde dois corpos se agastam 
No gelo da minha cama

Noite breve, ó noite louca 
Se me negaste o amor
Não negues à minha boca 
A dor do fado menor

Pica do 7

Letra e musica de Miguel Araújo
Repertório de António Zambujo

De manhã cedinho 
Eu salto do ninho e vou p'rá paragem
De bandolete 
À espera do 7, mas não p’la viagem

Eu bem que não queria 
Mas um belo dia eu vi-o passar
E o meu peito que é céptico
Por um pica de eléctrico voltou a sonhar

Em cada repique que salta do clique 
Daquele alicate
De um modo frenético
Num peito que é céptico, toca a rebate
Se o trem descarrila
O povo refila e eu fico no sino
Pois o mero trajeto
No meu caso concreto é já o destino

Ninguém acredita
O estado em que fica o meu coração
Quando o 7 me apanha
Até acho que a senha me salta da mão
Pois na carreira desta vida vã
Mais nada me dá
A pica que o pica do sete me dá

Que triste fadário 
E que itinerário tão infeliz
Cruzar meu horário
Com o de um funcionário 
De um trem da Carris
Se eu lhe perguntasse
Se tem livre passe pró o peito de alguém
Vá-se lá saber
Talvez eu lhe oblitere o peito também

Mentiras

Rita Ferro / Pedro de Castro
Repertório de Kátia Guerreiro

Gostava muito de ti
Mas não posso gostar mais
As mentiras que me pregas
São facadas, são punhais

Olha quando me enganaste 
Com a maluca da Maria
Juraste mais de três vezes 
P’la alma da tua tia

A minha mãe apanhou-te 
A beijá-la, no barranco
A mim disseste que foste 
Levantar dinheiro ao banco

E quando, já desvairada 
Te obriguei a confessar
Alegaste não ter culpa 
Dela ser espetacular

Que estupidez exigir-te 
Honradez e seriedade
Consegues que doa menos 
A mentira que a verdade

Faz-me portanto um favor 
Nunca deixes de enganar-me
Se as mentiras matam gente 
As tuas podem salvar-me

A saudade e o tamborim

Tiago Torres da Silva / José Luís Tinoco
Repertório de Cristina Nóbrega

Vem do mar de Ipanema 
A saudade e o tamborim
Uma onda, um poema 
Que alguém escreveu p’ra mim
E sendo assim
Talvez o carnaval não vá ter fim

Vem do mar de Lisboa 
A guitarra e a solidão
A cantiga que às vezes 
Soa dentro do meu coração
E então, serei 
Porta-estandarte da canção

Carnaval dentro de mim
Carnaval não vai ter fim

Vem do mar ou do grito que aprendi 
Ouvindo Lemanjá
Vai levando pró infinito 
pancada do meu ganzá
Mas será ? talvez eu diga 
Que vou mas não vá

Ilha dos amores

Tiago Torres da Silva / Popular *fado corrido*
Repertório de Jorge Fernando

Em muitos livros que leio
Há gente culta que diz
Que pensa que o fado veio
Das Áfricas e dos Brasis

Não desprezo a teoria 
Mas eu cá, acho que o fado
Nasceu numa noite fria 
Num convés abandonado

Todos sabem mais do que eu 
Mas eu tenho a minha ideia
O fado p’ra mim, nasceu 
Do canto de uma sereia

Ou do peito solitário 
De um marinheiro valente
Que escrevia o seu diário 
Tendo o mar por confidente

Por isso peço perdão 
A quem tanto tem estudado
Mas os fados è que são 
As madrinhas do meu fado

Para que o fado se entenda 
Meus mestres e professores
Não pode ser uma lenda 
Ir à ilha dos amores

Fado da noite que nos fez

Samuel Úria / Alfredo Duarte *versículo*
Repertório de Kátia Guerreiro

Se o meu canto for estrada de tristura
E a viola der o passo onde me atraso
Nem o tom menor do fado me convence
Que não foi maior que a vida o nosso caso

Vejo pena em cada rosto que me avista
Cada ombro compassivo que me dão
Nem o pranto da guitarra me convence
Que foi triste a nossa história de paixão

Não ofereço o meu sorriso às cores do dia
Se a alegria me embaça, qual nudez
Nem o xaile preto agora me convence
Que foi negra aquela noite que nos fez

Se não sei ficar no sítio desta história
È um corpo e não o afeto quem se afasta
Nem palavras de saudade me convencem
Que è só esse o sentimento que nos basta

Eu gosto tanto de ti

Canção para Mafalda
Letra e musica de Kátia Guerreiro
Repertório da autora

Olha com teus olhos doces
Os de quem tiveres aí
Dá de ti a quem tu ames
Mas não te esqueças de ti

Faz do sorriso o segredo 
P’ra gostares de viver
Abre os teus braços à vida 
Aceita o que ela oferecer

Beija o sol pela manhã 
Sente a chuva no teu rosto
Bebe os abraços que dás 
Nunca lhes percas o gosto

Acorda sempre a sorrir 
Não tenhas medo do mar
Ele não te vai mentir 
E o sonho è p’ra sonhar

Olha a terra, olha o mar 
Escolhe lá a tua cor
Pinta todo o coração 
Mas que seja com amor

È da vida que te falo 
Um pouco do que vivi
E canto agora bem alto 
Eu gosto tanto de ti

Guarda como aquele loiro 
O teu jeito de criança
Porque a beleza inocente 
È jeito que nunca cansa

Abraça vales e montes 
Olha este mundo sem fim
Conhece o cheiro das flores 
E não te esqueças de mim

Canção

Letra e musica de Martim Vicente
Repertório de Carminho

Vem com o teu corpo são
Tocar no meu coração aberto
Vem e vê que a canção
Não é mais do que cinzas 
Do meu ser incorreto

Abre-me uma janela do teu coração
E olha-me ao espelho
Que eu estou mesmo atrás de ti
P’ra te amar e sentires 
O meu ser correto

Deus criou-nos
E só depois separou a terra e o céu
E até o pobre se alegrou
Quando soube do nosso amor

Esta dor não é mais do que amor
Que no feto vinha em nós
Mas o futuro só nos pertence
Se a canção não for mais do que nós

Bem sei que o meu eu 
Não foi sempre teu
Por minha loucura
Mas se a corda esticou 
E mesmo assim não partiu
È porque algo perdura

Mesmo que a raiva em ti mesmo
Crie a ilusão de que já nada há
Olha os meus olhos brilhantes
Por teres crescido 
E veres que ainda estás cá

Disse ao mar que te amava

José Fialho Gouveia / Franklim Godinho
Repertório de Kátia Guerreiro

Espalho os teus olhos no chão
Estendo a noite no convés
Deito ao mar o coração
Dou este fado às marés

E peço às ondas que levem 
Estes versos, esta voz
São palavras que te pedem 
Que não te esqueças de nós

Na restinga das guitarras 
Segue a espuma do meu peito
Nesta noite sem amarras 
Lanço as redes do meu beijo

Nas gaivotas veio o dia 
Veio a manhã que acordava
E quando a noite morria 
Eu disse ao mar que te amava

Quase um fado

Letra e musica de Rodrigo Maranhão
Repertório de António Zambujo

Trago no peito segredos
Amores confessos, ocultos desejos
O tempo apressado, o beijo partido
Inteiro aos pedaços da vida eu duvido
Trago no peito um segredo
Dos mares que desafio

Trago no peito o meu mundo
Fagulha, centelha, amor vagabundo
Que bate calado o seu bate-fundo
E sempre navega pró mesmo lugar
Trago no peito o segredo
Dos mares por navegar

Fado do melhor amigo

Tiago Torres da Silva / Alves Coelho *fado maria vitória*
Repertório de Maria Ana Bobone

Quem tem um melhor amigo
Dos que está sempre a seu lado
Vai entender o que eu digo
Quando sei que não consigo
Viver distante do fado

Nas longas horas de estudo 
Passa depressa uma hora
E é dele que me acudo
Se parece saber tudo 
O que a gente não decora

E na hora do recreio 
Quando brincamos os dois
Ninguém se mete no meio
Toda a gente tem receio 
Do que acontece depois

Eu tenho um melhor amigo
 Dentro do peito, guardado
E nunca me falta abrigo
Se o trago sempre comigo 
O meu amigo é o fado

Barroco tropical

José Eduardo Agualusa / Ricardo Cruz
Repertório de António Zambujo

O amor é inútil, luz das estrelas
A ninguém aquece ou ilumina
E se nos chamam, a chama delas
Logo no céu lasso declina

O amor é sem préstimo, clarão
Na tempestade depressa se apaga
E è maior depois a escuridão
Noite sem fim, vaga após vaga

O amor a ninguém serve e todavia
A ele regressamos dia após dia
Cegos por seu fulgor, tontos de sede
Nos damos sem pudor em sua rede

O amor è uma estação perigosa
Rosa ocultando o espinho
Espinho disfarçado de rosa
A enganosa euforia do vinho