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As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
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* 7.280' LETRAS <> 3.120.500 VISITAS * MARÇO 2024 *

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Fado Zé Manel

Miguel Coelho / Pedro Pinhal
Repertório de José Manuel Barreto 

Para ti que me livraste do deserto
Da triste solidão em que vivia
Ao fazer-me desejar, eu sentia
O amor do teu coração aqui tão perto

Procuro encontrar-te na distância
Deste grito imenso do teu peito
Neste querer amar-te tão perfeito
Deste louco viver mudado em ânsia

Por ti meu amor aqui é cantado
Nestas palavras tantas vezes ditas
Desta tela de um poema inscritas
Deste meu mais sentido e feliz quadro

Adeus, sê feliz

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de António Mourão

Foi só pra ti, pra ti que eu vivi
Tu foste toda a minha vida
Mas já nem sei se o amor que te dei
Foi uma ilusão perdida

Tu não estás mais a meu lado
E o meu coração magoado
Vive num mundo de dor
Eu nem sei bem o que sinto
E nem sei se ainda minto
Quando ‘inda falo de amor

Da felicidade
Só há saudade

E tudo passou, e nada mais ficou
Do que um amor só destroçado
Eu vou viver somente pra esquecer
Fazer do presente, o passado

Só espero que ainda um dia
Tu penses com nostalgia
Em mim, que tanto te quis
Digo-te adeus para sempre
Com carinho, docemente
Adeus amor, sê feliz

Canto três

Júlio Pomar / António Vitorino d’Almeida
Repertório de Carlos do Carmo 

Pá… o amor é urgente
Não dêem cabo da gente 
Do que temos de melhor
De que o Paredes dizia
Que era a própria poesia 
Porém sem menção d’autor

E para mais quanto ao resto
Saia o gado sem cabresto 
Dispensando-se o preceito
D’evitar o trinta e um
Ó meu tens aí algum 
E não digas bom proveito

A uma história esquisita
Na qual à Maria Rita 
Uns dentinhos de pescada
Na boca do corpo dita
Vieram à dita confita 
E a pobre amargurada

Nas noites desta Lisboa
As garinas numa boa 
Pela Travessa da Palha
Olhos fechados a mundos
Vindos do fundo dos fundos
Daquela triste batalha

D’Alcácer Quibir, dou fé
Morremos todos de pé 
Não digas à minha mãe
Varina da Madragoa
Que julga estar em Lisboa 
Um presidente em Belém

E se o fim ela não vê
Pede ajuda ao Carlos Tê 
Que não é parto sem dor
O disparate da vida
Uma história mas par’cida 
Com desfecho hardcore

Ronda dos quatro elementos

Rosa Lobato Faria / Júlio Proença *fado esmeraldinha*
Repertório de Carlos Zel

Os meus lábios deslizam-te na pele
A murmurar palavras inventadas
E ombro e seio e pé e coxa e espádua
Ganham nomes de terra fecundada

Porém, se acaso a água nos possui
Já são corais as partes do teu corpo
E tens algas nos pés, conchas azuis
No ventre nas orelhas, no pescoço

Mas se é o fogo rubro que me exalta
E à sua língua ardente é que me inflamo
Busco na labareda o que me falta
E são de chama os nomes que te chamo

E quando, enfim, mais lento o ar me toca
E a dolente carícia me deleita
Trato por cotovia a tua boca
Chamo gaivota à tua mão direita

Fado e Lisboa

Guilherme Pereira da Rosa / Francisco Carvalhinho
Repertório de Fernanda Maria 

Saudade é pena... saudade é mágoa 
Saudade é pranto
Dor que serena... olhos com água 
Fado que canto

Saudade é vida... saudade é morte 
Saudade é brado
É esta lida... é esta sorte 
É este fado

Saudade em mim
É que dá expressão ao fado
E canto assim
Meu coração destroçado
Ando distante
E meu fado quando soa
Tem, palpitante
Fado e Lisboa

Saudade é reza... água passada 
Mal que sentimos
Saudade presa... não pesa nada 
Quando fingimos

Mas a saudade... nem qualquer sente 
Tenho a certeza
Porque a verdade... pertence à gente 
É portuguesa

Fado do tempo morto

Carlos Leitão / Popular *fado menor*
Repertório de Ana Laíns

Se o tempo não chega a ser
Mais que as horas a passar
Talvez o mal de perder
Me deixe um dia ganhar

Das mil voltas que já dei 
Ao mundo que já foi meu
Fica-me o tem em que amei 
Todo o mundo que era teu

Talvez de mim me perdesse 
E me esquecesse de ti
Então o tempo dos dois 
Seria o que não vivi

Não sei bem se ainda te quero 
Se é sina que Deus me deu
Meu amor, se não te espero 
É porque o tempo morreu

A verdade da mentira

Sebastião Antunes / Paulo Loureiro
Repertório de Ana Laíns 

Coisas que o mundo não me quer contar
Ou eu não sei entender
Coisas que a vida me quer ensinar
E eu não quero aprender
Será que os rios sabem o caminho do mar
Pra lá chegar… ou alguém lhes vem mostrar

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada;
Mas se eu
 te contar a verdade
E te disser que é mentira
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira

Por trás do muro há uma voz a falar
Deste lado nada se vê
Dizem-me sempre par’acreditar
Mas não me dizem em quê
Tantas palavras cruzadas perdidas plo ar
E eu a pensar… como as hei-he eu arrumar?

Partida

Manuel de Andrade / Jaime Santos
Repertório de João Braga 

Dos meus passos, ao partir
Não há rasto nem poeira
Não há rumo nem porvir
Parto sem saber partir
Mas parto à minha maneira

Longe ou perto, aonde seja 
Meus passos não pararão
Tarde ou cedo, quem os veja 
De mais ódio e mais inveja
Fará deles o que são

Meu amor, não fiques triste 
Não te culpes do que sou
Em nada me destruíste 
E meus passos sempre os viste
Pelo caminho onde vou

De meus passos cedo irão 
Pedaços de noite e dia
E os ventos espalharão 
Versos da minha canção
Estranha e louca, louca e fria

Teresa Torga

Letra e música de José Afonso
Repertório de Ana Laíns

No centro da Avenida 
No cruzamento da rua
Às quatro em ponto, perdida 
Dançava uma mulher nua

A gente que via a cena 
Correu para junto dela
No intuito de vesti-la 
Mas surge António Capela

Que aproveitando a barbuda
Só pensa em fotografá-la
Mulher na democracia
Não é biombo de sala

Dizem que se chama Teresa 
Seu nome é Teresa Torga
Muda o pick-up em Benfica 
Atura a malta da borga

Aluga quartos de casa 
Mas já foi primeira estrela
Agora é modelo à força 
Que o diga António Capela

T'resa Torga T'resa Torga
Vencida numa fornalha
Não há bandeira sem luta
Não há luta sem batalha

Amor ausente

Tiago Torres da Silva / Pedro Rodrigues
Repertório de João Braga 

Amar um amor ausente
Como se a dor fosse gente
Num coração que fingiu
Bater, como se parasse
Porque se viu face a face
Com tudo o que já sentiu

O tempo passa depressa
Mas quando um amor começa 
Baixinho, dentro de mim
Torna-se dor num segundo
Se nem mesmo o fim do mundo 
Pode vir a dar-lhe um fim

A paixão que chega tarde
Labareda que só arde 
Quando a chama da saudade
Lembra o fogo do inferno
Porque ao saber que é eterno 
Recusa a eternidade

Se me bate o coração
É como se a solidão 
Batesse à porta de entrada
Não abro, não vou abrir
A alma está a fingir 
Que ao amar não sente nada

Dá a surpresa de ser

Fernando Pessoa / José Campos e Sousa
Repertório de António Pinto Basto 

Dá a surpresa de ser
É alta, de um louro escuro
Faz bem só pensar em ver
Seu corpo meio maduro

Seus seios altos parecem
Se ela estivesse deitada
Dois montinhos que amanhecem
Sem ter que haver madrugada

E a mão do seu braço branco
Assenta em palmo espalhado
Sobre a saliência do flanco
Do seu relevo tapado.

Apetece como um barco
Tem qualquer coisa de gomo
Meu Deus, quando é que eu embarco?
Ó fome, quando é que eu cômo?

Vou querer saber de mim

Letra e música de Diogo Clemente
Repertório de Carolina 

Não foi assim que nos foi dito p'ra viver
O que a nós mesmos prometemos, era nosso
Não era andar pelos teus sonhos e obedecer
Não era só morar em ti, porque não posso

Pedi-te tantas vezes que viesses
Com olhos de criança arrependida
E vieste até ao fundo da minh’alma
E assim me vais matando e dando vida

Olhei pra mim do alto imenso dos teus olhos
E eu era sombra, e tão pequena ali no chão
Tu eras todo o mar azul e eu os escolhos
Eras o corpo inteiro e eu só coração

Perdemos p’lo caminho o que era meu
Do amor já nada vejo, nada sei
E sigo a perguntar: que aconteceu?
Vou querer saber de mim, onde fiquei

Caravela

Carlos Barrela / Mário Pacheco
Repertório de José da Câmara 

Tu foste, meu país, a caravela
Andamos todos nós no alto mar
Por ti rasgamos medos com as velas
Que a nossa solidão soube inventar

Fomos além, mais além que o além
Fomos bandeiras nos mapas de outros tempos
Com a cor do céu azul que ninguém tem
A não ser este país onde nasce o vento

Erguemos fortalezas de esplendor
Espalhamos pelo chão, ouro e canela
E abriu-se em nosso corpo a maior dor
Ao fazerem em filigrana as caravelas

Tu és, meu país, a água da forte
Vencedor de amarguras e da morte
Que de novo se cumpra Portugal

Ninguém

Letra e música de Diogo Clemente
Reportório de Carolina 

Falamos, demos abraços
Como era normal
Fechei-me ao som dos teus passos 
No frio do jornal

Parecia ser o que foi
Bem pra lá do que crês
Um gesto a mais que nos dói
E o vazio que não vês

Não vês que me perco primeiro
E perco as razões a seguir
E que trago este amor de permeio
Por chegar e partir

E eu sorrio ao ver-te outra vez 
Num dia descuidado
O lume mal apagado
E dizes tu que eu sou mais forte 
E sei olhar por nós   
Foi isto que há nos olhos meus
Que o que fica de um adeus
Às vezes faz-se voz
Só pra não estarmos sós

Pra quê palavras e verbos 
De querer ser feliz
Se somos escravos e servos 
Do que a alma nos diz

Sempre se cumprem as preces 
De quem o amor tem
Que ao me acabar
Recomeces às mãos de ninguém

Ninguém que te prenda num beijo
Ninguém que te oculte de nós
O ninguém que te seja em desejo
A nascente a e foz

Palavras não eram ditas

Manuel Alegre / José Carlos Gomes *fado magala*
Repertório de João Braga 

Palavras não eram ditas
Já o teu corpo se abria
Aos afagos e convites
Que o meu olhar te fazia

Já dentro de ti floriam 
Mil carícias interditas
Que os meus olhos sugeriam 
Palavras não eram ditas

E até as aves traçavam 
Suas rotas infinitas
Quando os meus olhos te olhavam 
Palavras não eram ditas

Já tu calando falavas 
E tinhas no rosto, escritas
As proibidas palavras 
Que eram ditas sem ser ditas

Segue o teu destino

Ricardo Reis / Sueli Costa
Repertório de Carolina 

Segue o teu destino
Rega as tuas plantas, ma as tuas rosas
O resto é a sombra de árvores alheias

A realidade
Sempre é mais ou menos do que nós queremos
Só nós somos sempre iguais a nós próprios
 
Suave é viver só
Grande e nobre é sempre viver simplesmente
Deixa a dor nas aras como ex-voto aos deuses

Vê de longe a vida, nunca a interrogues
A resposta está além dos deuses

Mas serenamente
Imita o Olimpo no teu coração
Os deuses são deuses porque não se pensam

Fado das violetas

Maria Manuel Cid / Jaime Santos *fado alvito*
Repertório de António Vasco Moraes

As violetas sozinhas
Pousadas como andorinhas
Num vaso de dor sentida
São assim tal como eu
A pedir amor ao céu
A sofrer de amor na vida

Tão triste como a tristeza
Tão pobre como a pobreza 
Mais bela que a santidade
Essa flor beijando a terra
Deixa o perfume que encerra 
O calor de uma saudade

Violetas perfumadas
No mesmo ramo enlaçadas 
Ao preço do meu castigo
Assim juntamos as penas
Que as violetas apenas 
Quiseram chorar comigo

Cega-rega

*cantata para uma velha só*
Ary dos Santos / Nuno Nazareth Fernandes
Repertório de Maria Armanda                    

Uma velha tinha um gato 
Debaixo da cama o tinha
Uma velha tinha um velho 
Debaixo da campa o tinha
Sape gato, bate papo 
Com um sapo na caminha
Coitadinha, coitadinha da velhinha

Salta, pula, cata a pulga 
Catapulta na cozinha
Foge o gato, morre o sapo
Viva o velho da velhinha
Velho morto, velho posto 
A cozer na panelinha
Da velhinha com pézinhos de galinha

Lá vai a velha de lancheira e bengalinha
Levar ao morto o consolo da sopinha
Rega-lhe a campa com miúdos de galinha
E o defunto vai enchendo a barriguinha

Lá volta a velha regalada pel’alminha
A quem matou os seus desejos de galinha
E já que tem o gato morto na cozinha
Vai acender-lhe um fogareiro de sardinha

Uma velha tinha um gato 
Debaixo da cama o tinha
Uma velha tinha um velho 
Debaixo da campa o tinha
Sape gato, bateu papo 
Com o velho na campinha
Coitadinha, coitadinha da velhinha

Não darei o teu nome

Sophia de Mello Breyner / Nuno Nazareth Fernandes
Repertório de João Braga 

Não darei o teu nome à minha sede
De possuir os céus azuis sem fim
Nem à vertigem súbita em que morro
Quando o vento da noite me atravessa

Não darei o teu nome à limpidez
De certas horas puras que perdi
Nem às imagens de oiro que imagino
Nem a nenhuma coisa que sonhei

Pois tudo isso é só a minha vida
Exaltação da terra, flor da terra
Fruto pesado, leite e sabor

Mesmo no azul extremo da distância
Lá onde as cores todas se dissolvem
O que me chama é só a minha vida

Canto ainda por alguém

Manuel de Andrade / Custódio Castelo
Repertório de Cristina Branco 

Canto ainda por alguém
Que não voltarei a ver
Cantam meus olhos também
Teus olhos, sem o saber

Dizem que trago mais triste 
O cansaço no olhar
Com a cor de quem desiste
De quem não pensa voltar

O meu sorriso é tão frio 
Como os meus olhos parados
Trago em meu cantar vazio 
A amargura dos meus fados

Mas em mim nada mudou 
De quem parte nada vem
Eu fui a mesma que sou 
Canto ainda por alguém