-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
* 7.285' LETRAS <> 3.120.500 VISITAS * MARÇO 2024 *

. . .

Chama da vida

Mote de Olegário Mariana / Glosa de Conde Sobral
Júlio Proença *fado puxavante*
Repertório de António Rocha

Soprei apagou-se a chama
Disse-te adeus em seguida
Quem diz adeus a quem ama
Diz adeus à própria vida


Foi uma zanga sem jeito 
Mas não tem reparação
Tu julgavas ter razão 
Eu tinha-a dentro do peito
Com o coração desfeito 
Mas a alma decidida
Num gesto joguei a vida 
Desse amor que te deu fama
Soprei apagou-se a chama
Disse-te adeus em seguida

Nunca mais soube de ti 
Nem o procurei saber
Não me quero arrepender 
Daquilo que decidi 
Mas sei bem quanto perdi 
Na hora da despedida
Sou como folha caída 
Sou como fio sem chama
Quem diz adeus a quem ama
Diz adeus à própria vida

Quadras soltas

Amália Rodrigues / Amélia Muge
Repertório de Amélia Muge

Joguei às cinco pedrinhas
Perdi todas as jogadas
Quando vi que tu não vinhas
Pedrinhas eram pedradas

Papoila grito de cor 
Tanto trigo te quer bem
Mais quero eu ao meu amor 
Amor que amor não me tem

Abri-te o meu coração 
Tu fechas-me a tua casa
E não te vejo senão 
Com um grãozinho na asa

Tenho um lindo namorado 
Que me ama perdidamente
Tem um defeito coitado 
Ama assim a toda a gente

Quem o seu amor perdeu
 E não queria ter perdido
Anda a chorar como eu 
Que trago o meu no sentido

José Guimarães

Tributo do poeta 
Fernando Campos de Castro

Poeta que andaste pela rua
Que chamaste noiva à lua 
E irmão ao vento agreste
Neste dia em que te canto
Rimo alegria com pranto 
Nos poemas que me deste

Poeta amigo... 
Amante das coisas belas
Que soubeste ler nas estrelas 
Mistérios que ninguém lê
Poeta amigo... 
Que chamaste mãe à cidade
Só tu viste a claridade
Num mundo que ninguém vê

Poeta que viste longe e mais alto
Fazendo dum sobressalto
O teu mar de calmaria
Em cada noite perdida
Fizeste da própria vida
Uma loucura sadia

Poeta amigo... 
Que fizeste da madrugada
A tua casa encantada
Onde não posso morar
Poeta amigo... 
Que fecundaste a esperança
Nos teus olhos de criança
É que aprendi a sonhar
 
Dá-me os teus versos
teus mundos de fantasia
E toda a melancolia 
dos teus sentidos dispersos
Dá-me os teus versos
a tua vida secreta
Essa alma de poeta 
feita de mil universos

Avozinha

Henrique Rego / Alfredo Duarte *marceneiro*
Repertório de Alfredo Marceneiro

Ainda me lembro bem
Dessas noites invernosas 
Em que o vento sibilava
E das lendas amorosas
Que a minha avó que Deus tem 
Junto à lareira contava

Quando a feroz inverneira
Como se até nos infernos 
Rugia lá pelos montes
Ela aquecia os invernos
Que lhe pesavam nas frontes 
Indo sentar-se à lareira

Meiguices e seduções
P’ra minha avó se alegrar 
Eram certas como prendas
E tinha que me contar
As maravilhosas lendas 
Das mouriscas tradições

Então ela me contava
Contos feitos de paixões 
Com princesinhas formosas
Encantamentos de moiras
E de fontes preciosas 
Que davam ledos quebrantos
Enquanto que embevecido
Eu escutava os encantos 
Dessas lendas amorosas

Mas o conto mais dileto
E que mais beleza tinha 
P’ra meus sonhos joviais
Era o da terna avozinha
Que com beijos maternais
 Fora criando o seu neto

Tinha o conto semelhança
Ao acrisolado afeto 
Que minha alma gozava
Que eu, de gozo radiante
Solenemente escutava;
E hoje vivo sem desdém
Era o conto mais sentido
Que a minha avó que Deus tem 
Junto à lareira contava

Oh águia

Henrique Rego / Alfredo Duarte *fado cravo*
Repertório de Alfredo Marceneiro

Oh águia que vais tão alta
Num voar vertiginoso
Por essas serras de além
Leva-me ao céu, onde tenho
A estrela da minha vida
A alma da minha mãe

Loucos sonhos juvenis 
Fervilham na minha mente
Que me fazem ficar chorando
Quando tu, águia imponente 
Te vejo transpor, voando
As serras e os alcantis

Quando te vejo voar 
Pelo vasto firmamento
Sobre as campinas desertas
Com profundo sentimento 
Tu, em meu peito despertas
Sonhos que fazem chorar

Oh velha águia altaneira 
Vem aliviar-me, vem
Do mal que me veio ferir
Vê se ao céu me transportas 
Para de beijos cobrir
A alma da minha mãe

Perguntas-me

Linda Leonardo / Popular *fado das horas*
Repertório da autora

Perguntas-me o que é o fado
Perguntas-me de onde vem
É o caminho traçado
Que cada um de nós tem

Cantar o fado é juntar 
Guitarras com poesia
É saber entrelaçar 
A tristeza e a alegria

É trazer à flor da pele 
As emoções desta vida
É força que nos impele
Confissão apetecida

Ser fadista é ser maior 
É sentir como ninguém
Aquele desgosto de amo
Que foi desgosto d’alguém

Fado, é mais do que uma prece 
Fado, é voz do coração
Fado, que nos enternece 
Fado é reza, é oração

A voz do meu coração

Fernando Alves / Armando Machado *fado Maria Rita*
Reportório de Jorge César

Sou ave que já não canta
Sou fadista sem garganta
Tenho fado nos meus dedos
Nos momentos mais sofridos
Eu sinto nos meus sentidos
Desvendar os seus segredos

Nos meus versos canto um fado
Neste tom bem magoado 
Com tristonha melodia
E na voz do coração
Eu canto a solidão 
A saudade e nostalgia

No meu fado há outros fados
Destinos desencontrados 
Amores, desilusões
Retalho de muitas vidas
Recordações esquecidas 
E momentos de emoções

Quando o meu fado acabar
Meus dedos vão-se calar 
No silêncio bem profundo
Termina a solidão
E a voz do meu coração 
Já não canta neste mundo

Águas passadas

Henrique Rego / Miguel Ramos *fado alberto*
Repertório de Alfredo Duarte Jnr.

Não me importam loucuras que fizeste
Num desatino torpe e desvairado
Esqueci os desgostos que me deste
Sepultei para sempre o teu passado

Não me importa que exista quem se gabe
De outrora ter fruído os teus carinhos
Se todo o mundo abertamente sabe
Que águas passadas não movem moinhos

Se alguém nos bate à porta, nós devemos
Só perguntar quem é e não quem foi
Porque o presente com os dons supremos
As manchas do pretérito destrói

O teu passado, visto de relance
Foi um romance de tragédia viva
Mas hoje a tua vida é um romance
De ternura que nos prende e nos cativa

Se um demente ou qualquer ser imperfeito
É respeitado esteja onde estiver
Assim deve também haver respeito
P’lo passado infeliz duma mulher

Loucura de amor

Henrique Rego / Pedro Rodrigues *fado primavera*
Repertório de Carlos Anjos

Chamaste-me louco um dia
E mal, então, eu sabia
Como o amor nos sorri
Foi feita a tua vontade
Hoje sou louco, é verdade
Mas louco apenas por ti

Não é loucura de louco
Esta loucura que há pouco 
Roubou-me a voz da razão
Mas é loucura maior
Eu ando louco de amor 
Sou louco do coração

Vivendo assim sem ter cura
Esta amorosa loucura 
Que te acabo de contar
Só te peço, minha vida
Que não me negues guarida
No louco do teu olhar

Sou andorinha ferida

António Carvalho da Costa / Casimiro Ramos *fado freira*
Repertório de Fernanda Meireles

Sou andorinha ferida
Ave com asa partida
Que não pode mais voar
Minhas penas são a vida
São a esperança já perdida
Que ainda me venhas a amar

O meu ninho de beiral
Feito de lama e de sal 
De paz, amor e ventura
Não há remédio ideal
Para a cura deste mal 
Deste mal que não tem cura

As penas perdem beleza
São negras, mas de tristeza 
De viver penosa espera
Nesta dor, nesta incerteza
De já não seres com certeza 
Para mim, a primavera

Os velhinhos

Henrique Rego / Alfredo Duarte *lembro-me de ti*
Repertório de Alfredo Marceneiro

Sentados nos degraus musgosos duma ermida
Dois velhos aldeões mortinhos de saudade
Com palavras de amor cândidas como as rosas
Lembravam com ternura a morta mocidade

Nos olhos do velhinho e com doce lembrança
Transparecia o amor do tempo já passado
E da velhinha, a voz, imersa em confiança
Lembrava um par gentil em dia de noivado

Eu tenho uma ambição, um grande e vasto sonho
Diz o velhinho em voz de estática doçura
Já que Deus nos uniu neste mesmo lar risonho
Só peço que nos dê a mesma sepultura

A festa do fado

Letra e música de Alice Pimenta
Repertório da autora

Eu sonhei em tempos idos
E aspirei ser feliz
Ninguém matou meus sentidos
E eu tenho aquilo que quis

Fiz um tapete d’esperança
Que de mansinho pisei
Já deixei de ser criança
Mas p’ra mim o sonho é rei

Versos ao fado, eu canto
P’ra não sofrer de amor
Com este encanto a vida é melhor
P’ra não ter dissabores
Pois por enquanto meu mal é d’amores

Vou cantando uma cantiga
E ao vento que passa, digo
O teu conforto me abriga
Quero ir passando contigo

Ao sol belo e majestoso
Peço que deixe brilhar
Aquele ser já idoso
Que teima em se enamorar

Mocidade perdida

Henrique Rego / última estrofe de Linhares Barbosa / Popular *fado menor*
Dueto de Alfredo Marceneiro e Alfredo Duarte Jnr

Amar demais é doidice
Amar de menos maldade
Rosto enrugado é velhice
Cabelo branco é saudade

Saudades são pombas mansas 
A quem nós damos guarida
Paraíso de lembranças 
Da mocidade perdida

Se a neve cai ao de leve 
Sem mesmo haver tempestade
O cabelo cor da neve 
Às vezes não é da idade
       
Pior que o tempo em nos pôr 
A cabeça encanecida
São as loucuras de amor 
São os desgostos da vida

Para o passado não olhes 
Quando chegares a velhinho
Porque é tarde, já não podes 
Voltar atrás ao caminho

É como a lenha queimada 
Dos velhos, o coração
As cinzas são as saudades 
Dos tempos que já lá vão

Linhares Barbosa
É tão bom ser pequenino 
Ter pai, ter mãe, ter avós
Ter esperança no destino 
E ter quem goste de nós

Passei ao lado

Letra e música de João Fernando
Repertório de Afonso Oliveira

Quando olho para trás
Sinto a dor de quem trabalha
Sem nada poder escolher
Nem mesmo a voz que o comanda;
O sentido da palavra
O mal de ter ou não ter

Passei ao lado 
Da canção que não cantava
Dos fados que me ensinaram
E por amor estou aqui
Passei ao lado 
Das coisas que eu sonhava
Quando ninguém me afirmava
Deves seguir por aí
Nasci num porto 
Que me deu a aventura
E consentiu a ternura
Dum novo amanhecer
E eu falava 
Com a margem do meu Tejo
Pedindo que desse um beijo
À força do meu querer

Olho a luz que me rodeia
No acender da candeia
Que me faz continuar;
Então agora é verdade,
Aquilo que se semeia
Pode ser o meu cantar

Rua do penedo

Carlos Leitão / Frederico de Brito *fado dos sonhos*
Repertório de Mara Pedro

Fiquei atrás da janela
Sem saber olhar por ela
À espera de te encontrar
Ainda pensei que talvez
Me sorrisses outra vez
Quando te visse passar

Mas a manhã demorou
E quando a tarde chegou 
Tu não vieste com ela
Pode ter sido ilusão
Mas juro que a minha mão 
Já não fechou a janela

As horas passam por mim
O dia já está no fim 
Quando te vejo sorrir
O tempo guarda a vontade
De amanhã ter mais saudade 
Quando voltares a partir

Já não há fora de portas

Henrique Rego / Popular *fado corrido*
Repertório de Alfredo Duarte Jnr.

Desapareceram as hortas
Retiros de patuscadas
Já não há fora de portas
Nem saudosas guitarradas

Foram-se as festas pacatas 
De fado a horas mortas
Findaram as serenatas 
Desapareceram as hortas

Boémios afidalgados 
Das estúrdias e touradas
Frequentavam afamados 
Retiros de patuscadas

O imortal corridinho 
Que tu, guitarra, transportas
Perdeu o brilho e o carinho 
Já não há fora de portas

Perdeu-se o nosso passado 
De cantos e desgarradas
Já não há esperas de gado 
Nem saudosas guitarradas

As fontes da minha aldeia

Henrique Rego / Alfredo Duarte 
Repertório de Alfredo Marceneiro

As fontes da minha aldeia
Murmuram, gemem em coro
E as águas que vão correndo
Levam consigo o meu choro

Era perto dessas fontes 
Que em transportes de poeta
Amei pastora dileta 
Como o sol adora os montes
Era linda e tinha as frontes 
Orladas de tranças d’ouro  
Mas a parca, por desdouro 
Veio ceifar-lhe a sua vida;
E as fontes, com dor sentida
Murmuram, gemem em coro                       

Ao ver as linfas serenas 
Gemerem queixas e mágoas
Mergulhei em suas águas 
O meu rosário de penas
Assim foram mil verbenas 
Por entre as pedras nascendo
E o musgo que vai crescendo 
Enlaça-as com singeleza;
Conservando-lhe a beleza
As águas que vão correndo

É fado a nossa vida

Vitor de Deus / Arménio de Melo
Repertório de Mónica Pinto

É fado a nossa vida e sem maldade
Os sonhos vão crescendo
Cresce a esperança
Venturas, desventuras e de criança
Tudo fica na mente com saudade

Eu vivo assim
Porque já tenho a meu lado
Uma dor sem fim
Que me deu meu triste fado
Talvez um dia
Para ficar sossegada
A nostalgia vá viver
P’ra outro lado

A dor que me destrói é o tormento
Da vida que me embala há muitas luas
Desespero cruel, mas sem lamento
Carrego as minhas mágoas e as tuas

Amor campestre

Henrique Rego / Popular *fado mouraria*
Mariana Silva e Alfredo Marceneiro

Ela
São duas amoras pretas 
Teus olhos enfeitiçados
Ai quem me dera colhê-los 
P’ra acabarem meus cuidados

Ele  
P’ra acabarem meus cuidados 
P’ra acabar minha paixão
Dou-te os meus olhos e tu 
Dá-me em troca o coração

Ela
Dá-me em troca o coração 
Quando o sol bater na eira
Terra que o sol não aqueça 
Não dá boa sementeira

Ele
Não dá boa sementeira 
Nem dão frutos os pomares
Não há sol que abrase mais 
Do que o sol de dois olhares

Ela
Do que o sol de dois olhares 
P’ra alumiar os amantes
Quando cantam rouxinóis 
Pelas quebradas distantes

Ele
Ontem à tarde na fonte 
Meu amor foi desprezado
Ou falavas com as águas 
Ou tens outro conversado

Ela   
Ou tens outro conversado 
Não me digas tal loucura
Ele  
Tua boca é um pão alvo 
Que a minha boca procura

Cabelo branco

Mote de José Ferreira / Glosa de Henrique Rego / Popular *fado mouraria*
Repertório de Alfredo Marceneiro
Este poema (com algumas alterações) também foi gravado 
por Manuel Dias com música de Amadeu Ramim

Mais uma noite perdida
Mais uma noite de fado
É mais um dia de vida
A recordar o passado

Amar demais é doidice 
Amar de menos maldade
Rosto enrugado é velhice 
Cabelo branco é saudade

Saudades são pombas mansas 
A quem nós damos guarida
Paraíso de lembranças 
Da mocidade perdida

Se a neve cai ao de leve 
Sem mesmo haver tempestade
O cabelo cor da neve 
Às vezes não é da idade
       
Pior que o tempo em nos pôr 
A cabeça encanecida
São as loucuras d’amor 
São os desgostos da vida

Para o passado não olhes 
Quando chegares a velhinho
Porque é tarde, já não podes 
Voltar atrás ao caminho

Esta estrofe não foi gravada
É como a lenha queimada 
Dos velhos o coração
As cinzas são as saudades 
Dos tempos que já lá vão