-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
As letras publicadas referem a fonte de extração, ou seja: nem sempre são mencionados os legítimos criadores dos temas aqui apresentados.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
* 7.280' LETRAS <> 3.120.500 VISITAS * MARÇO 2024 *

. . .

Não me perguntes

Joaquim Pimentel / Popular *fado menor
Repertório de Maria Valejo

Minha mão na tua enleias
Estão enleadas as duas
Que eu sinto nas minhas veias
Correr o sangue das tuas

Não me perguntes se venho
Novamente p’ra ficar
Não me perguntes se tenho
Ainda, amor p’ra te dar

Não me perguntes se quero 
4eviver o que passou
Pois neste meu desespero 
Já nem mais o que sou

Sou riso sem alegria 
Sou restos dum triste fado
Sou a saudade vazia 
Duma vida sem passado

Sou água triste a parada 
Sou esperança sem ter fé
Sou um zero, sou um nada 
Do nada que a vida é

A lua

Amália Rodrigues / Amélia Muge
Repertório de Amélia Muge

Olha a lua redondinha
Tão redonda coisa rara
Nem lhe descubro a covinha
De cada lado da cara

Anda cá ó lua cheia 
De cantigas p´ra me dar
Nem o mundo faz ideia 
Das cantigas ao luar

Tantas cantigas de amor 
Já terá ouvido a lua
Se as sabe todas de cor 
Sabe a minha e sabe a tua

Lua no quarto minguante 
Algum desgosto ela tem
Foi cantiga de estudante 
Que cantou p´ra mais alguém

Lua nova não se vê 
Anda de cara escondida
Não me perguntem porquê 
Que é uma pergunta atrevida

Na lua já ando eu 
Mesmo sem ter ido à lua
Meu amor é todo meu 
Meu amor sou toda tua

Será que de amores cresce 
Lua no quarto crescente
Ou será que a lua desce 
P'ra estar mais perto da gente

As luas são separadas 
Quartos minguante crescente
Já tem quatro assoalhadas 
Tem muito mais do que a gente

Sonho nunca entendido

Fernando João / Samuel Cabral
Repertório de Fernando João

Meu amor parido a frio
Meu sonho, meu sacrifício
Meu desejo escondido
Enseada do meu grito
Onda do meu precipício
Sonho nunca entendido

Meu resto de coisa finda 
Meu corpo feito uma chaga 
Meu desejo de ser eu
Minha saudade mais linda 
Minha conta sem ser paga
Ao peito que Deus me deu

Encruzilhada de sonho 
Rosa que nunca nasceu 
Momento que não passou
Estes silêncios medonhos 
Dum peito que se perdeu
E nunca mais se encontrou

E é minha contradição 
De ser ou não ser assim
Misto de riso e de pranto
É a única razão 
Que eu tenho dentro de mim
P’ra dar ao fado que canto

Já passaram tantos beijos

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de Maria Valejo

Já passaram tantos dias 
Tantos meses, tantos anos
E eu teimo ainda em ter 
Esperanças e desenganos

Já passaram tantos sóis 
Já passaram tantas luas
E eu sem dar com o caminho 
E andando por tantas ruas

Já passaram tantos beijos
Tantas palavras de amor
Tanta jura, tanta esperança
Tanta ternura, amargor
Tanta ansia de seres tu
Aquele que desejei
Passou tanta, tanta vida
E nunca mais te encontrei

Já passaram as tristezas 
Já passaram as traições
Já passaram tantas dores 
Que só p'ra dez corações

Já passaram, vida minha
Coisas que nunca contaste
Passou tudo, tudo, tudo
Somente tu não passaste

Bom dia madrugada

Jorge Neves / Joaquim Campos *fado alexandrino*
Repertório de Fernando João

Bom dia madrugada, eu levantei-me agora
Que linda que tu ‘stás aos meus olhos despertos
Talvez enevoada como nuvem que chora
E quer deixar pra trás os gritos encobertos

Bom dia minha amada, meu sonho permanente
Meu riso de olhos tristes, meu canto de horas frias
Bom dia madrugada, meu sol sempre presente
À dor a que resiste com loucas ironias

Bom dia lua nova, bom dia noite escura
Viveremos os dois enquanto eu tiver vida
Fazendo a dura prova de vencer a amargura
E entre o nascer dos sóis, bom dia minha querida

Sombra triste de ninguém

António Cálem / Carlos da Maia
Repertório de Maria Valejo

E partias num navio
Com jeito de naufragar
Sei que era noite e era frio
E eu nem sabia chorar

Quem te mandou para longe
P’ra lá de terra e de mim
Que voz trouxe não sei donde
Aquela palavra fim

Porque não quebras os laços
Dessa voz que te chamava
E não voltas aos meus braços
A sonhares o que eu sonhava

Ó meu fim, meu desespero
Minha voz não sei de quem
Noite negra qu’inda espero
Sombra triste de ninguém

Ruas do fado

Artur Ribeiro / José Maria Antunes
Repertório de Artur Ribeiro

Ruas do fado nas ruas
Feitas de casas singelas
Onde há roupa nas janelas
Dando alegria à cidade;
E em cujas paredes nuas
Poetas improvisados
Escrevem rimas de fados
Para falar de saudade

Ruas do fado
Vielas de mil trapeiras
Com sardinheiras 
E guitarras a trinar
Ruas do fado
Onde a sombra da desgraça
Sempre que passa 
Deixa um fado a soluçar

Um candeeiro apagado
Que entristece a noite escura
Alguém que canta e procura
Calar o filho que chora;
Algures, um grito abafado
Sombras que passam unidas
A jogar às escondidas
Com quem passa áquela hora

Se há flores na primavera

António Cálem / Francisco José Marques *fado zé negro*
Repertório de Maria Valejo

Eu já nada sei de mim
Se sou flor ou jardim
Ou sou um lago sem margem
Nem sei o lado do vento
Sei que o sonho é pensamento
E o pensamento é miragem

O que sei é divagar
Sei que o fim não é chegar
E o chegar é uma espera
À noite pelas vielas
Pergunto ao céu se há estrelas
Ou se há flores na primavera

Visto gestos que me cansam
Oiço vozes que me lançam
Num desespero sem fim
Sei de ti, de mais ninguém
Mas haverá mais alguém
Se eu própria nem sei de mim

Lisboa à meia noite

Artur Ribeiro / António Mestre
Repertório de Artur Ribeiro
Este tema também foi gravado com o título *Lisboa às zero horas*

Quando a meia noite passa
E a boa gente adormece
É que Lisboa tem graça
E pelas ruas se esquece
De brincar pelas esquinas
Com ar de menina boa
Deixa o pregão dos ardinas
E das varinas da Madragoa

Gente a passar
Os cinemas a fechar
E um casal a chamar 
Por um táxi já tomado
E mais além
Teatros fecham também
E lá vai a gente de bem 
Para os retiros do fado

Que linda és
Lisboa dos cabarets
Das boates, dos cafés
Sem basbaques no Chiado
Anda no ar 
Uma voz triste a cantar
Uma guitarra a trinar 
Num beco mal afamado  

Passa um guarda de uniforme
Que desperta de seguida
Um vagabundo que dorme
Pelos bancos da avenida
Numa outra esquina desponta
Um grupinho a protestar
Porque bebeu mais que a conta
E agora a conta não quer pagar

Estive um dia sem te ver

Manuel Paião / Eduardo Damas
Repertório de Maria Valejo

Estive um dia sem te ver 
Nesse dia não vivi
E o meu coração batia 
Baixinho, a chamar por ti

Estive um dia sem te ver 
Estive um dia sem te ver
Pareceu-me um dia sem fim
Meu amor, p’lo amor de Deus 
P’lo amor de Deus
Nunca te afastes de mim

Eu sofro tanto por ti
É tão grande a minha dor
Que um dia, se estou sem ver-te
É como um ano de dor
Eu sofro tanto por ti
Que o meu coração assim
Quase nem sabe bater
Se não estás ao pé de mim

Eu sofro tanto por ti 
Num dia em que te não veja
Que não te afastes de mim 
Nem uma hora que seja

Estive um dia sem te ver 
Estive um dia sem te ver
E a saudade sem fim
Bateu à porta e entrou 
Bateu e entrou
E veio sentar-se ao pé de mim

Eu vivo a vida perdida

Amália Rodrigues / Amélia Muge
Repertório de Amélia Muge

Viver é estar-se perdido
Não sei se o terei ouvido
Se o li ou inventei
Desta ou daquela maneira
Não sou menos verdadeira
Nesta verdade que achei

Eu vivo a vida perdida
Sem esperança de me encontrar
Nesta verdade que achei;
Cantai-me o último fado
Que eu vivo e vai-se-me a vida
Que eu vivo e vai-se-me a vida

Sem esperança de me encontrar
A tentar compreender
Eu vivo e vai-se-me a vida
Sem conseguir entender
Porque me sinto perdida
Porque me sinto viver

Eu já vou a enterrar
Peço flores dai-me flores
Já me mataram as dores
Do sol que eu tinha no olhar
Ficou-me a noite tão escura
Talvez fosse de chorar

Chama da vida

Mote de Olegário Mariana / Glosa de Conde Sobral
Júlio Proença *fado puxavante*
Repertório de António Rocha

Soprei apagou-se a chama
Disse-te adeus em seguida
Quem diz adeus a quem ama
Diz adeus à própria vida


Foi uma zanga sem jeito 
Mas não tem reparação
Tu julgavas ter razão 
Eu tinha-a dentro do peito
Com o coração desfeito 
Mas a alma decidida
Num gesto joguei a vida 
Desse amor que te deu fama
Soprei apagou-se a chama
Disse-te adeus em seguida

Nunca mais soube de ti 
Nem o procurei saber
Não me quero arrepender 
Daquilo que decidi 
Mas sei bem quanto perdi 
Na hora da despedida
Sou como folha caída 
Sou como fio sem chama
Quem diz adeus a quem ama
Diz adeus à própria vida

Quadras soltas

Amália Rodrigues / Amélia Muge
Repertório de Amélia Muge

Joguei às cinco pedrinhas
Perdi todas as jogadas
Quando vi que tu não vinhas
Pedrinhas eram pedradas

Papoila grito de cor 
Tanto trigo te quer bem
Mais quero eu ao meu amor 
Amor que amor não me tem

Abri-te o meu coração 
Tu fechas-me a tua casa
E não te vejo senão 
Com um grãozinho na asa

Tenho um lindo namorado 
Que me ama perdidamente
Tem um defeito coitado 
Ama assim a toda a gente

Quem o seu amor perdeu
 E não queria ter perdido
Anda a chorar como eu 
Que trago o meu no sentido

José Guimarães

Tributo do poeta 
Fernando Campos de Castro

Poeta que andaste pela rua
Que chamaste noiva à lua 
E irmão ao vento agreste
Neste dia em que te canto
Rimo alegria com pranto 
Nos poemas que me deste

Poeta amigo... 
Amante das coisas belas
Que soubeste ler nas estrelas 
Mistérios que ninguém lê
Poeta amigo... 
Que chamaste mãe à cidade
Só tu viste a claridade
Num mundo que ninguém vê

Poeta que viste longe e mais alto
Fazendo dum sobressalto
O teu mar de calmaria
Em cada noite perdida
Fizeste da própria vida
Uma loucura sadia

Poeta amigo... 
Que fizeste da madrugada
A tua casa encantada
Onde não posso morar
Poeta amigo... 
Que fecundaste a esperança
Nos teus olhos de criança
É que aprendi a sonhar
 
Dá-me os teus versos
teus mundos de fantasia
E toda a melancolia 
dos teus sentidos dispersos
Dá-me os teus versos
a tua vida secreta
Essa alma de poeta 
feita de mil universos

Avozinha

Henrique Rego / Alfredo Duarte *marceneiro*
Repertório de Alfredo Marceneiro

Ainda me lembro bem
Dessas noites invernosas 
Em que o vento sibilava
E das lendas amorosas
Que a minha avó que Deus tem 
Junto à lareira contava

Quando a feroz inverneira
Como se até nos infernos 
Rugia lá pelos montes
Ela aquecia os invernos
Que lhe pesavam nas frontes 
Indo sentar-se à lareira

Meiguices e seduções
P’ra minha avó se alegrar 
Eram certas como prendas
E tinha que me contar
As maravilhosas lendas 
Das mouriscas tradições

Então ela me contava
Contos feitos de paixões 
Com princesinhas formosas
Encantamentos de moiras
E de fontes preciosas 
Que davam ledos quebrantos
Enquanto que embevecido
Eu escutava os encantos 
Dessas lendas amorosas

Mas o conto mais dileto
E que mais beleza tinha 
P’ra meus sonhos joviais
Era o da terna avozinha
Que com beijos maternais
 Fora criando o seu neto

Tinha o conto semelhança
Ao acrisolado afeto 
Que minha alma gozava
Que eu, de gozo radiante
Solenemente escutava;
E hoje vivo sem desdém
Era o conto mais sentido
Que a minha avó que Deus tem 
Junto à lareira contava

Oh águia

Henrique Rego / Alfredo Duarte *fado cravo*
Repertório de Alfredo Marceneiro

Oh águia que vais tão alta
Num voar vertiginoso
Por essas serras de além
Leva-me ao céu, onde tenho
A estrela da minha vida
A alma da minha mãe

Loucos sonhos juvenis 
Fervilham na minha mente
Que me fazem ficar chorando
Quando tu, águia imponente 
Te vejo transpor, voando
As serras e os alcantis

Quando te vejo voar 
Pelo vasto firmamento
Sobre as campinas desertas
Com profundo sentimento 
Tu, em meu peito despertas
Sonhos que fazem chorar

Oh velha águia altaneira 
Vem aliviar-me, vem
Do mal que me veio ferir
Vê se ao céu me transportas 
Para de beijos cobrir
A alma da minha mãe

Perguntas-me

Linda Leonardo / Popular *fado das horas*
Repertório da autora

Perguntas-me o que é o fado
Perguntas-me de onde vem
É o caminho traçado
Que cada um de nós tem

Cantar o fado é juntar 
Guitarras com poesia
É saber entrelaçar 
A tristeza e a alegria

É trazer à flor da pele 
As emoções desta vida
É força que nos impele
Confissão apetecida

Ser fadista é ser maior 
É sentir como ninguém
Aquele desgosto de amo
Que foi desgosto d’alguém

Fado, é mais do que uma prece 
Fado, é voz do coração
Fado, que nos enternece 
Fado é reza, é oração

A voz do meu coração

Fernando Alves / Armando Machado *fado Maria Rita*
Reportório de Jorge César

Sou ave que já não canta
Sou fadista sem garganta
Tenho fado nos meus dedos
Nos momentos mais sofridos
Eu sinto nos meus sentidos
Desvendar os seus segredos

Nos meus versos canto um fado
Neste tom bem magoado 
Com tristonha melodia
E na voz do coração
Eu canto a solidão 
A saudade e nostalgia

No meu fado há outros fados
Destinos desencontrados 
Amores, desilusões
Retalho de muitas vidas
Recordações esquecidas 
E momentos de emoções

Quando o meu fado acabar
Meus dedos vão-se calar 
No silêncio bem profundo
Termina a solidão
E a voz do meu coração 
Já não canta neste mundo

Águas passadas

Henrique Rego / Miguel Ramos *fado alberto*
Repertório de Alfredo Duarte Jnr.

Não me importam loucuras que fizeste
Num desatino torpe e desvairado
Esqueci os desgostos que me deste
Sepultei para sempre o teu passado

Não me importa que exista quem se gabe
De outrora ter fruído os teus carinhos
Se todo o mundo abertamente sabe
Que águas passadas não movem moinhos

Se alguém nos bate à porta, nós devemos
Só perguntar quem é e não quem foi
Porque o presente com os dons supremos
As manchas do pretérito destrói

O teu passado, visto de relance
Foi um romance de tragédia viva
Mas hoje a tua vida é um romance
De ternura que nos prende e nos cativa

Se um demente ou qualquer ser imperfeito
É respeitado esteja onde estiver
Assim deve também haver respeito
P’lo passado infeliz duma mulher