Versão de Carlos do Carmo
Cansados vão os corpos para casa
Dos ritmos imitados de outra dança
A noite finge ser
Ainda uma criança de olhos na lua
Co'a sua cegueira da razão e do desejo
A noite é cega e as sombras de Lisboa
São da cidade branca a escura face
Lisboa é mãe solteira
Amou como se fosse a mais indefesa princesa
Que as trevas algum dia coroaram
Não sei se dura sempre esse teu beijo
Ou apenas o que resta desta noite
O vento, enfim, parou
Já mal o vejo por sobre o Tejo
E já tudo pode ser tudo aquilo que parece
Na Lisboa que amanhece
O Tejo que reflete o dia à solta
À noite é prisioneiro dos olhares
Aos Cais dos Miradoiros
Vão chegando dos bares os navegantes
Amantes das teias
Que o amor e o fumo tecem
E o Necas que julgou que era cantora
Que as dádivas da noite são eternas
Mal chega a madrugada
Tem que rapar as pernas para que o dia
Não traia Dietriches
Que não foram nem Marlénes
Em sonhos, é sabido, não se morre
Aliás... essa é a única vantagem
De após o vão trabalho o povo ir de viagem
Ao sono fundo, fecundo
Em glórias e terrores e aventuras
E ai de quem acorda estremunhado
Espreitando p'la fresta a ver se é dia
Ai essas ansiedades
Ditam sentenças friamente, ao ouvido
Ruído que a noite a seu costume transfigura