Repertório de Amália Rodrigues
Estreado em 1945 no Teatro República no Brasil *Revista Boa Nova*
Informação de Francisco Mendes e Daniel Gouveia
Livro *Poetas Populares do Fado-Canção*
Ai Mouraria
Da velha Rua da Palma
Onde eu um dia
Deixei presa a minha alma
Por ter passado mesmo a meu lado
Certo fadista
De cor morena, boca pequena
E olhar trocista
Ai Mouraria
Ai Mouraria
Do homem do meu encanto
Que me mentia
Que me mentia
Mas que eu adorava tanto
Amor que o vento como um lamento
Amor que o vento como um lamento
Levou consigo
Mas que ainda agora e a toda a hora
Trago comigo
Ai Mouraria
Dos rouxinóis nos beirais
Dos vestidos cor de rosa
Dos pregões tradicionais
Ai Mouraria
Das procissões a passar
Da Severa, e voz saudosa
Da guitarra a soluçar
Ai Mouraria
Dos rouxinóis nos beirais
Dos vestidos cor de rosa
Dos pregões tradicionais
Ai Mouraria
Das procissões a passar
Da Severa, e voz saudosa
Da guitarra a soluçar
- - -
É de notar que Amália só gravou metade dos versos. A outra metade, pouca gente a conhece.
Eis a parte da letra que não foi gravada
Ai Mouraria, travessas, ruas antigas
Melancolia, faias brigões e cantigas
Velhos fadistas, nobres e artistas
De braço dado
Bravos toureiros, com marinheiros
Cantando o fado
Saias rodadas, capelas, velhos solares
Pratas doiradas em jaquetões de alamares
Toscas guitarras, trovas bizarras pelas vielas
Telhados velhos, cravos vermelhos pelas janelas
Começou por ser a limitação de tempo nos discos de 78 rotações por minuto
onde só cabiam dois minutos e meio de cada lado.
Depois, quando os micro-sulcos permitiam seis músicas de cada lado de um
disco Long Play (LP), de 33 rotações por minuto, ou quatro de um Extended Play (EP)
de 45 r. p. m., a limitação passou a vir das estações de rádio, alegando obrigações
comerciais com anunciantes, preferindo trechos musicais que permitissem intercalar
publicidade mais vezes por hora e os dois ou três minutos continuaram
a pautar a duração de cada peça.
Então, os fados tradicionais de quadra glosada em quatro décimas (44 versos)
passaram a sê-lo apenas em duas e Alfredo Marceneiro queixava-se, com a sua
verrina habitual: «Agora, pedem-me fados curtos… Sei lá o que são fados curtos!».
Nos fados-canção, os autores passaram a limitar-se a duas voltas (coplas, ou couplets)
e uma repetição do refrão.
Este «Ai Mouraria» até cumpria essa estrutura. Mas o andamento relativamente lento
mesmo na versão abreviada que Amália gravou (ou foi obrigada a gravar) faz
a peça demorar três minutos e 17 segundos!
A primeira estrofe foi completamente omitida.
Amália começa logo pelo refrão e, na repetição deste após um curo solo
instrumental é reduzido aos dois primeiros e aos dois últimos versos:
Ai Mouraria!... / Dos rouxinóis, dos beirais / (…)
Da Severa em voz saudosa / Na guitarra a soluçar.